Resenha critica sobre morte
Por: Renata Sidronio • 29/4/2018 • Trabalho acadêmico • 3.197 Palavras (13 Páginas) • 517 Visualizações
KOVÁCS, Maria Júlia. EDUCAÇÃO PARA A MORTE. São Paulo. p. 484-497, 2005.
Maria Júlia Kovács, possui graduação em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (1975), mestrado em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo (1985) e doutorado em Psicologia Escolar e do Desenvolvimento Humano pela Universidade de São Paulo (1989). Atualmente é professora livre docente do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Os temas de estudo e pesquisa são: morte, luto, bioética, formação de profissionais de saúde e educação. Concluiu livre docência em 2002 com a tese: Educação para a Morte: Desafio na formação de profissionais de saúde e educação. Coordena o Laboratório de Estudos sobre a Morte do Instituto de Psicologia da USP.
De acordo com Kovács (2005, p.485) “A morte faz parte do desenvolvimento humano desde a mais tenra idade e acompanha o ser humano no seu ciclo vital, deixando suas marcas. Como preparar pessoas para esse fato tão presente na existência? Esse desafio é ainda mais urgente para os profissionais de saúde e educação”. Ou seja, para os profissionais da saúde parece mais fácil desconhecer e negar a morte do ter que encará-la e enfrentá-la. Conforme Kovács (2005, p.487) “[...] profissionais de saúde que se empenham numa luta de vida e morte contra as doenças, e que, muitas vezes, vêem seus empenhos frustrados, e não sabem o que e como falar com seus jovens pacientes e familiares sobre o porquê da não melhora e sobre a possível morte.”
O artigo traz que “a educação para a morte é um estudo sobre a possibilidade do desenvolvimento pessoal de uma maneira mais integral, no sentido entendido por Jung (1960) como individuação, o desenvolvimento interior que se propõe durante o existir, desenvolvimento que também pressupõe uma preparação para a morte.” Kovács (2005, p.486), ou seja, na escola aprendemos e nos preparamos para a vida social, também deveríamos aprender e nos preparar para a morte na escola, como saber lidar com ela, como entender as perdas de pessoas significativas, fases do desenvolvimento, doenças, acidentes e até confronto com a própria morte. Atualmente em nossa sociedade, a aceitação da morte já não é mais observada, mas sim, recusada e considerada um tabu. Apesar de termos a certeza da morte, não possuímos tranquilidade para dialogar sobre a morte e das consequências que ela pode ocasionar em nossas vidas.
Segundo Kovács (2005, p.487) “Com o avanço da tecnologia médica, muitas doenças puderam ser eliminadas; outras, que já foram fulminantes, hoje não mais o são, ocorrendo uma cronificação das mesmas e um consequente prolongamento da vida. Entretanto, mesmo com a sofisticação dos tratamentos, frequentemente são acompanhados de intenso sofrimento. Vários idosos reclamam de muitas dores, mas, com a naturalização desse processo, diz-se que é normal que adoeçam e tenham dores, aumentando ainda mais os sofrimentos.” Isto é, com o desenvolvimento da tecnologia médica para o melhoramento dos tratamentos para se ter prolongamento de vida, nem sempre traz qualidade de vida, principalmente para os idosos. A maioria deles, como não tiveram durante toda a vida aprendizado e preparação para entender a morte, como se preparar psicologicamente para a mesma, eles têm mais dificuldades para rejeitar esse tipo de tratamento que acaba trazendo mais sofrimento para a vida do que qualidade de vida.
Não só em questão de doenças, mas também saber lidar com a morte de uma pessoa próxima, como cônjuge, amigos, familiares, para que o sofrimento não se agrave tanto na sua vida; lembrando que cada pessoa tem o seu tempo e a sua forma de lidar com a morte e deve ser respeitada e compreendida. A autora Elisabeth Kubler-Ross traz no seu livro “Sobre a morte e o morrer” publicado em 1969, o desenvolvimento das cinco fases do luto que são: Negação, Raiva, Barganha, Depressão e Aceitação. Elisabeth definiu cinco estados mentais que atuam como referência para entendermos como vai acontecendo a evolução do luto que a pessoa vai passando, desde o momento que ela recebe a notícia até a aceitação desta nova situação. Isso não quer dizer que todas as pessoas em fase de luto irão passar pelas 5 etapas, nem na ordem que está escrita e nem irão passar por esse processo completo, pois, algumas pessoas ficam estagnadas em uma dessas fases que citei. A mesma considerou que estas etapas eram muito úteis como sistemas de categorias para poder conceituar de um modo relativamente simples todas as diferenças do modo como se administra o luto.
Acrescentando que o luto e as cinco fases do luto não são só para questões de perdas de entes queridos, através da “Teoria de Desenvolvimento Psicossocial” do autor Erik Erikson, ele traz oito estágios e os idosos estão incluídos no oitavo estágio que é “Integridade vs. Desespero”. Neste estágio é feita uma reflexão sobre o que tem feito, o que não tem feito, as conquistas, realizações, desejos, as coisas positivas e as coisas negativas durante toda a sua vida, a sua história. O indivíduo pode entrar em um período de desespero por acreditar que a sua vida está chegando ao fim e que não fez nada do que queria, não alcançou as suas conquistas, realizações e desejos, ou pode sentir a sensação de dever cumprido, de ter alcançado as suas conquistas, as suas realizações, os seus desejos e as suas metas durante a sua vida; com o sentimento de integridade, para que possa repassar para as futuras gerações com sabedoria o conhecimento adquirido ao longo da vida.
A autora traz propostas para a ampliação dos espaços de reflexão sobre o tema da morte, em locais e instituições que ainda necessitam de maior desenvolvimento. Nas escolas, o tema da morte não está presente usando-se como argumento a falta de preparo dos professores. Kovács (2005, p.488) “propõe então parceria entre as escolas e os instituto de Psicologia, na figura do Laboratório de Estudos sobre a Morte, com as atividades de oferecer a disciplina Psicologia da Morte, especialmente para os professores ou convidá-los a frequentarem a disciplina regularmente oferecida no Instituto e propor espaços de treinamento em serviço na própria escola, com módulos específicos, como por exemplo: como falar com uma criança que sofreu a perda de pessoas significativas; como integrar uma criança gravemente enferma nas atividades didáticas e de recreação; como lidar com o suicídio de pessoa conhecida na escola.” Ou seja, é muito importante a interação do professor com os alunos sobre esse tema, pois os professores precisam saber lidar com crianças e adolescentes que possam estar passando por situações de perda e luto e prepará-las e ensiná-las para que possam compreender esse luto e aprender sobre a morte. E, além disso, os professores e todos os profissionais da escola, tem que saber a compreender a situação, a dialogar, dar atenção, ajudar a minimizar os problemas e dividir as dores, que são de extrema importância para a recuperação do luto.
Segundo Kovács (2005, p.490) “A discussão dos temas relacionados à morte e ao morrer dentro dos hospitais é de fundamental importância. Entre os principais temas que merecem debate, estão: morrer com dignidade, pedidos para morrer, testamentos em vida, não implantação ou não manutenção de tratamentos com objetivo de prolongamento de vida, eutanásia, distanásia, suicídio assistido, sedação, uso de analgesia (...) os locais por excelência para esse tipo de discussão são os hospitais, já que o cenário principal de mortes, por vezes com muito sofrimento e dor, e os profissionais que se sentem perdidos sobre como lidar com o fim da vida e a aproximação da morte.” Essas discussões dos temas que foram citados acima, são extremamente importantes, pois os profissionais deverão estar preparados para lidar com situações difíceis dos pacientes e com os seus familiares, como entender, compreender e respeitar qualquer decisão que os familiares ou o próprio paciente possa vim a tomar, principalmente se for parar o tratamento que anda lhe fazendo mal, o profissional deverá oferecer-lhe cuidado, apoio, acolhimento para que esse sofrimento seja amenizado.
Falar sobre a morte para a criança, é um assunto delicado que envolve muita resistência por parte dos familiares, no intuito de proteger a criança do sofrimento diante de uma perda. Ao contrário das metáforas que a família usa para esconder a realidade, como por exemplo: “seu pai viajou para um lugar muito bonito e ficará por lá durante um bom tempo”, é necessário que exista um diálogo sobre a morte com naturalidade e acolhimento, para que a criança compreenda o que significa esse fenômeno e que não venha a ter fantasias que podem confundi-la ao longo da sua vida ou entrar em conflito entre o que é dito e o que ela vê acontecer em seu ambiente familiar (silêncio, tristeza, distância). Essa conversa deve ser franca e viva, utilizando até mesmo filmes infantis, como por exemplo: o Rei Leão, que aborda esse tema para que a criança tenha um maior entendimento e perceba que a morte é algo natural, que faz parte da vida.
Diante da situação de luto, a criança deve viver a sua dor, assim como os outros que estão ao seu redor. Não adianta esconder o choro perto da criança ou evitar falar sobre o assunto, pois, esconder também traz sofrimento, faz com que a criança acredite que expressar a dor é errado e até mesmo traz o sentimento de traição pela confiança quebrada. Ela precisa chorar, lembrar, desabafar, ser agressivo ou até mesmo se calar, para que então possam conseguir saber lidar da melhor forma com essa situação.
Para ajudar essa criança no processo de luto, Torres (1999, p. 127) enumera algumas atitudes necessárias como: Promover comunicação aberta e segura dentro do ambiente familiar, informando a criança sobre o que aconteceu; garantir que terá o tempo necessário para elaborar o luto; disponibilizar um ouvinte compreensivo toda vez que sentir saudade, tristeza, culpa e raiva; assegurar que continuará tendo proteção. Além disso, é papel da família oferecer meios de ajudar a criança a expressar os seus sentimentos, através de brincadeiras e desenhos; garantir um ambiente tranquilo, de acolhimento para que não se sintam sozinhas; e ajudar a criança a entender que apesar da pessoa que ama ter morrido, ela continua existindo em seu coração para sempre.
Por outro lado, quando é a criança que se encontra doente, também é necessário que os pais sejam claros quanto a doença e a morte da criança, além de fazer com que ela sinta sozinha, principalmente no ambiente hospitalar, que ela não perca os seus sonhos e esperança, e que se mantenha sempre ligada a vida, como por exemplo: com brincadeiras, estudo e proximidade com os seus amigos.
Já o falar de morte com o adolescente é diferente, pois é uma fase em que envolve diversão, independência, identidade e a busca pela novidade, o que se torna um grande perigo. Como diz Kovács (2005, p. 492): “Para o adolescente, é como se a morte não existisse: há uma vivência de onipotência em sua força total. Com essa forma de pensar, um carro a km por hora jamais se espatifa num muro, uma pipada de crack não vicia”, ou seja, para o adolescente tudo tem que ser vivido da maneira mais intensa e mais rápida possível, sem medir as consequências que podem ocorrer no futuro. A prática de rachas, esportes radicais sem proteção, as afrontas agressivas a grupos rivais, as fugas de casa, a pichação de muros e monumentos, os distúrbios alimentares, a liberdade sexual e o uso de drogas lícitas e ilícitas ilustram como adolescentes desafiam a morte para se aproximar da ideia que possuem de vida (ESSLINGER; KOVÁCS, 1999).
No entanto, apesar dessa imortalidade que o adolescente acredita possuir, na morte de um ente querido ou de um amigo, o adolescente também sofre como o adulto e precisa de ajuda para superar a dor. É necessário que eles saibam que não estão sozinhos e que tem apoios, tanto dos familiares como do seu grupo de amigos (que no momento fazem um papel fundamental na construção da sua identidade). É importante demostrar carinho, pois apesar dos adolescentes mostrarem que são independentes e não precisam de ninguém, eles ainda precisam de amor e de segurança por parte da família; conversar sobre a morte e esclarecer que a importância de ter limites nos seus atos; estabelecer confiança para que exista o diálogo; acompanhar e dar suporte, mandando mensagens, perguntando como se sente, fazendo visitas e o chamando para sair.
“A morte com relação ao idoso, além de ser difícil por pensarem que a morte está mais próxima por causa da idade, também remete a uma reflexão das perdas que teve ao longo da vida e dos sonhos que não pôde realizar, o que pode trazer para esse idosos doenças psíquicas, comportamentos autodestrutivos e o sentido de que a vida não valeu a pena. A morte e os lutos dos idosos (da perda de si, perda do outro e da perda contra si), de forma geral, acarretam sentimentos de depreciação, sofrimento, desgosto, dor e ideia de descanso, que se não forem cuidados, podem levar os idosos a depressão. A depressão mais profunda está vinculada à desesperança, podendo levar ao suicídio e a comportamentos autodestrutivos. A velhice é a fase do desenvolvimento em que ocorre o maior número de suicídios ainda, estando por vezes associada ao sentimento de menos valia, solidão, não ver sentido na vida” (KOVÁCS, 2009, p. 68).
Por esses motivos, é importante que os familiares e a equipe de saúde não permaneçam no silêncio quanto à questão da morte e abordem esse assunto com clareza e naturalidade; que eles não estejam sozinhos, para que não se sintam apenas como um fardo e um problema na vida das pessoas ao seu redor; que eles expressem seus medos e fantasias diante desse fenômeno; que a sociedade, assim como os idosos, não entendam a velhice como um sinônimo de morte, mas entendam a morte como algo natural da vida que pode acontecer com qualquer um; e que eles percebam que não se deve perder os sonhos em nenhum momento da sua existência, ou seja, permitindo ao idoso uma melhor qualidade de vida.
Uma outra forma que a morte também é abordada no artigo, é através dos meios de meios de comunicação, onde percebemos que a morte é abordada de forma escancarada através das novelas, noticiários e programas, invadindo as casas em todos os momentos, com cenas chocantes que despertam a morte como um fenômeno banal e sem importância. Filmes, desenhos trazem também a morte pela perspectiva de algo fantasioso, como se fosse uma realidade distante de todos nós. Ou seja, até mesmo entre os meios de comunicação existem o tabu de não mostrar a morte para as pessoas como um fenômeno natural, que deve ser respeitado e que deve trazer reflexão as pessoas, não sendo apenas “mercadoria cujo único objetivo seja o aumento do índice de audiência” (KOVÁCS, 2005, p. 494).
Além disso, a morte também é abordada como sendo companheira no ambiente de trabalho dos profissionais de saúde e educação. Sendo a aceitação da morte, ou seja, o entrar em contato com a realidade, importante para que o profissional saiba entrar em contato com situações dolorosas que envolvam a morte sem vim a adoecer ou entrar em depressão. Essas doenças psíquicas que infelizmente aparecem nesses profissionais, normalmente se dá pelo luto que não conseguem elaborar, ou seja, por não terem tempo de cuidar da sua dor e de se expressar, pois estão preocupados demais com o sofrimento do paciente, e pelo sentimento de impotência que aparece nesses profissionais por não poderem mais ajudar mais o paciente, por um tratamento não ter dado certo, ou seja, por se sentir impotente diante de não poder controlar a morte. Como afirma Kovács (2003) “não conseguir evitar, adiar a morte ou não poder aliviar o sofrimento pode trazer ao profissional a vivência dos seus limites, impotência e finitude, o que pode ser extremamente doloroso”.
Isso tem acontecido porque que a maioria dos profissionais de saúde não se preparam para lidar com a morte, mesmo estando numa profissão que precisar lidar o tempo inteiro com esse fenômeno, afirmando que a faculdade não deu um foco importante nesse assunto, sendo que na realidade eles não estão para lidar com esse assunto que ainda é visto como um fenômeno que traz aflição e que deve ser evitado a todo custo. Sendo assim, é importante que eles desenvolvam que “a consciência da própria morte é uma importante conquista constitutiva (...) e que a aceitação e conscientização de que existe um tempo limitado de vida para cada um leva, em geral, as pessoas é um estado reflexivo e a uma busca de sentido útil para vida de ficar passeando enriquecimento psíquico (KOVÁCS, 1992).
A obra tem por objetivo oferecer alternativas de reflexão sobre a importância da educação para a morte, tanto para as crianças, adolescentes e adultos, como para os profissionais de saúde e educação que precisam lidar com esse fenômeno todos os dias.
Se trata de um artigo que possui linguagem clara e viva, o que ajuda na compreensão do leitor a entender o que significa a morte. Dessa forma, recomendamos este artigo para todos os educadores que precisam tratar sobre a morte em salas de aula e também para os profissionais de saúde que precisam de preparação para ajudarem os pacientes e os seus familiares, a enxergarem que o luto é um momento fundamental que deve ser vivido para a superação da dor, além de perceberem que a morte deve ser entendida como um momento natural da vida.
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