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Si puo fare - Lei Basaglia

Por:   •  26/6/2017  •  Trabalho acadêmico  •  1.970 Palavras (8 Páginas)  •  843 Visualizações

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Introdução:

O destino da loucura em terras ítalas transcorre dos manicômios às pseudocooperativas sociais possibilitada pela lei Basaglia no filme italiano “Si può fare” (“Dá para fazer”) produzido em 2008 pelo diretor Giulio Manfredonia que critica a ilusão acarretada pelo nome “cooperativa social” em relação aos tratamentos dos chamados doentes mentais.

O enredo começa com o Nello discutindo e, logo em seguida, sendo expulso do sindicato de esquerda por “defender” o mercado, mas para não ficar desamparado, o deixam um emprego na Cooperativa 180. Ao chegar, percebe que não há muita cooperação na suposta cooperativa social por se tratar de um local para os ditos loucos. Constata mais ainda quando conversa com o Dr. Del Vecchio e ele lhe diz que a Lei Basaglia fechou os manicômios, mas as famílias não querem os antigos pacientes de volta e por isso existe esse local, pois não há cura na loucura e ela não se cura com leis, somente à base de remédios. Dentre os pacientes, encontra Ossi que não toma decisões sozinho; Luca que é violento por isso toma uma dose maior de remédio que os outros e Gigia que tem problemas para se relacionar socialmente. Começa a interagir com eles de um modo não convencional, escutou e ajudou-os a emitir opiniões e disso incentivou-os a trabalharem “de verdade” com parquet. Com o tempo, Ossi começa a tomar decisões sozinho, Luca deixa de ser violento e Gigia melhora nos relacionamentos sociais e enfrenta a mãe. Percebe depois de um tempo que as drogas ministradas pelo Dr. Del Vecchio lhes deixam sonolentos, impotentes e desanimados, por isso, com a ajuda do Dr. Frederico Furlan - que é adepto de Basaglia - conseguem retirar os pacientes-sócios do poder legal do Dr. Del Vecchio e do antigo local. No novo local, as doses são diminuídas e ministradas pelo Dr. Frederico Furlan, há liberdade, sendo a doença encarada sob outra forma. Gigia apaixona-se por Catarina, é convidado a uma festa e vai junto com o Luca. Na festa um conhecido de Catarina faz uma brincadeira jocosa da atitude de Gigia em relação à comida e Luca - impaciente - bate no indivíduo. O ato é levado à delegacia com a possibilidade de voltarem para a antiga cooperativa social. Catarina os defende e demonstra sentimento de dó pela loucura deles, é ouvida pelo Gigia que se sente “impotente” e triste com a situação, sem saber o que fazer e comete suicídio. Dessa morte abrupta, acaba o direito à liberdade e todos eles voltam para a antiga casa. Nello sentindo-se culpado pelo suicídio começa a trabalhar em outro emprego; ao se encontrar com o Dr. Del Vecchio que reconhece a eficácia do modo de tratamento lhe oferece o emprego de volta, porém o mesmo não o aceita. Frente a isso, Luca levanta-se e inspira os outros da cooperativa a irem até ele para o convencer a trabalhar novamente com eles.

Identidade Institucionalizada:

A percepção de Franco Basaglia (1924-1980) acerca da psiquiatria, trouxe não só a ideia de humanização – qual não é o bastante, mas sim profundas transformações no modelo de assistência psiquiátrica e nas relações entre a sociedade e a loucura. Basaglia considerava que a psiquiatria por si só não era capaz de dar conta do fenômeno complexo da loucura e com isso se fomentou o movimento de abolição de hospitais psiquiátricos italianos. Nisto defendia-se a reinserção dos pacientes na sociedade, sendo assim, a reconstrução da complexidade com o objeto – “doentes” – por parte de manicômios.

Ao observar a nova psiquiatria americana baseada somente na inibição e medicação do problema, teve em mente que a psiquiatria era usada como ideologia, não avaliando holisticamente o paciente – como ser humano em um meio sócio cultural, mas sim como um doente que somente isolando-o e drogando-o seria possível o tratamento. Isto interage com o filme demonstrando que, embora não haja o horror dos castigos físicos de antes, há a grande influência da psiquiatria americana com pacientes sendo dopados e isolados para não atrapalharem a sociedade. 

Sendo assim, é palpável a desordem que Nello causa ao tratar todo o grupo como uma cooperativa e não como doentes; há um atrito entre o médico/diretor do manicômio e sua conduta, apesar de que, desde 1978, a polêmica Lei 180 – ou Lei da Reforma Psiquiátrica – já era presente como nova forma de lidar com a loucura.

O longa se passa com ênfase esse período, ou seja, começo dos anos oitenta, talvez caracterizando a dificuldade de se ter a quebra com a institucionalização psiquiátrica clássica qual exaltava, juntamente com a sociedade, a segregação com a desculpa de periculosidade e irrecuperabilidade do indivíduo – visivelmente vista no personagem Luca e mais tarde, em Gigia. Segundo Amarante, Basaglia não concebe nesse método a possível cura da “doença” mental, muito menos compreende a errônea distinção entre o normal e o patológico – fato bem assinalado pelas falas do Dr. Del Vecchio – apenas demonstra que essa condição é mais institucionalizada que compreendida. A sua importância para a psiquiatria chega principalmente nisto: a luta prática contra a institucionalização científica.

 Entretanto, tanto no enredo cinematográfico - assim como na vida real - a imposição da ideologia de institucionalização psiquiátrica ainda ecoa dentro desses recintos e, mais ainda, dentro da sociedade (como por exemplo, na família) que com o término dos manicômios rejeitaram os considerados ‘doentes’, sem ajudá-los e, por conseguinte, deram direito a sua total negação de liberdade.

Uma das únicas ‘incapacidades’ que a doença mental poderia apresentar, no filme vinha, principalmente, deste cuidado extremo (ou inibição) – tanto médico como familiar – causado pelo estereótipo e pela tecnificação deste tipo de doença. A ruptura descrita no texto facilmente interage com o filme neste sentido: há claramente a ressignificação e a retomada da “vida normal” dos personagens a partir do trabalho e da comitiva, tendo em vista que os mosaicos gerados a partir de um problema (que poderia facilmente ter sido um erro) os tornaram requisitados e úteis para a sociedade novamente; quebrou-se assim, o estigma de que a doença mental os descapacitava.

O uso de remédios foi mostrado até o fim não como, em sua totalidade, algo que gerasse bem-estar: sua intenção era “dopar”, novamente se gerando a alienação, qual é marcante na estrutura manicomial institucionalizada até então. Isto se enquadra claramente na luta contra a tecnificação de Basaglia citado no parágrafo acima: não há necessidade de novas intervenções que sobressaiam a razão do indivíduo. Só assim se é possível a desospitalização e a reinserção dos pacientes na sociedade, fato que é corroborado pelo trabalho, pois constata-se que o “doente mental” precisa de um trabalho digno para se sentir melhor – assim como para qualquer ser humano, sendo assim terapêutico e dignificando com um novo sentido à vida humana – por isso os sócios de Nello, com a cooperativa obtêm melhoras nos “surtos psiquiátricos” e desenvolvem a sociabilidade.

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