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Análises de Produções Escritas Sobre Abrigos para Crianças e Adolescentes

Por:   •  22/10/2015  •  Trabalho acadêmico  •  10.082 Palavras (41 Páginas)  •  405 Visualizações

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Análises de Produções Escritas Sobre Abrigos para Crianças e Adolescentes

Resumo

O artigo traz algumas análises feitas a partir de uma pesquisa bibliográfica que teve como objetivo discutir as diferentes instituições que atravessam as produções acadêmicas sobre abrigo de crianças e jovens. Para tanto, foi realizado levantamento de textos (livros, artigos, dissertações e teses), material que possibilitou a explicitação de alguns analisadores, dentre os quais três foram escolhidos para debates mais aprofundados no presente artigo: “Ditos do ECA e cotidiano dos abrigos”, “Rede de proteção a crianças e adolescentes” e “Estigma institucional”. Esses analisadores possibilitaram problematizar os discursos/práticas construídos a respeito dos abrigos e os efeitos dessa construção.

Palavras-chave: abrigo; pesquisa bibliográfica; subjetividade; infância

Tal pesquisa propõe colocar em análise diferentes instituições que atravessam as produções escritas no espaço acadêmico, relativas aos seguintes temas: abrigo, convivência familiar e destituição do poder familiar.

Dessa forma, realizou-se levantamento e análise de textos (14 livros, 35 artigos e 28 dissertações e teses) de diferentes espaços de divulgação acadêmica, relativos aos temas propostos para o estudo. O critério de escolha dos textos foi a sua divulgação após o ano 2000, considerando-se que, passados dez anos da promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), de 1990, poderia ser esperada a consolidação dos seus princípios no espaço social. Como durante a primeira década de vigência da legislação ocorreram ajustes às novas ordenações jurídicas de proteção à infância e juventude, apostamos ser essa uma data de referência importante para a discussão do cotidiano dos abrigos, dispositivo que entrou em vigor com o Estatuto.  Acreditando que uma lei não funciona apenas pela imposição de um decreto, mas pelos efeitos que sua aplicação produz, a pesquisa visou discutir as narrativas escritas a esse respeito. Ou seja, estávamos interessadas em problematizar os efeitos trazidos pelo ECA, tomando como ponto de partida os abrigos.  

Pode-se dizer que, com a nova legislação, ocorreu uma importante mudança na lógica de guarda e proteção de crianças e adolescentes que, devido a diferentes critérios, não podem viver com seus familiares. Antes dela, a internação acontecia nas chamadas instituições totais, onde as crianças e jovens frequentemente permaneciam por muitos anos, chegando mesmo a completar a maioridade dentro dos estabelecimentos em que se encontravam. O Estatuto propôs o rompimento com essa lógica, pensando a política de abrigo sob o viés da proteção integral, que prioriza a preservação dos vínculos familiares, o atendimento personalizado e em pequenos grupos, o não desmembramento de grupos de irmãos e a necessidade de integração com a comunidade local. Os complexos para crianças e adolescentes, legitimados pelo antigo Código de Menores, consistiam em espaços de internação destinados à população infanto-juvenil pobre, considerada potencialmente perigosa ou em perigo. Classificados como menores (ou melhor dizendo, “classificados como menores em situação irregular” já que qualquer criança pode ser considerada menor de idade), essas crianças e jovens eram mantidos num sistema de tal maneira fechado que o rompimento dos laços familiares acabava sendo um de seus efeitos principais, seguido pela destituição do pátrio poder[1].

No Brasil, na medida em que as condições de sobrevivência em situação de pobreza atingem índices alarmantes e impensados em termos de dignidade humana, as questões relativas à destituição do poder familiar se banalizam. Estudos realizados em 2004 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) em parceria com o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA) sobre os abrigados no Brasil revelaram que essa população, em sua maioria, é composta por meninos de 7 a 15 anos, negros e pobres. Famílias com graves dificuldades financeiras e o dito abandono foram apontadas como os principais motivos para o uso de abrigos. Contrariando o senso comum, que diz que a maioria dos abrigados é composta de órfãos, a pesquisa do IPEA mostrou que mais de 80% da população desses estabelecimentos tem família, sendo que quase 60% mantêm vínculos com ela.  

Tomando esse quadro como uma realidade no Brasil, o recolhimento em abrigo vem atingindo quase que maciçamente mulheres/mães/pobres que, frente ao estado de miserabilidade a que estão submetidas, fazem uso frequente de abrigos como alternativa de cuidado para seus filhos.

Estudar questões como a destituição do poder familiar, o chamado abandono de crianças e o acolhimento em estabelecimentos específicos para a população infanto-juvenil que não pode ser cuidada por seus familiares leva a debates e pesquisas sobre a instituição abrigo. Assim sendo, produções acadêmicas sobre o tema vêm sendo realizadas e a pesquisa que embasa as discussões feitas aqui se propôs colocá-las em análise, visando pensar as construções subjetivas que se constituem a partir delas e discutir as verdades que fabricam. Dessa forma, passamos a estudar os discursos presentes nos textos produzidos na/pela academia com relação ao abrigo de crianças e jovens, buscando colocar em debate as múltiplas instituições que os atravessam.  

Como Foucault (2003), entendemos que todo discurso é político e, quando proferido por um especialista, assume o lugar de verdade absoluta e incontestável, produtora de subjetividades. A partir dessa compreensão, buscamos pensar que subjetividades estão sendo construídas pelos discursos presentes nas produções acadêmicas levantadas. Ao colocar em análise as narrativas escritas pelos diferentes autores pesquisados, foi possível perceber, nos relatos das práticas que ocorrem nos abrigos, as relações de poder, os objetos, instituições e mitos construídos nesse campo, ou seja, a produção materializada no discurso dos diferentes sentidos circulantes sobre abrigos. 

A pesquisa se fez utilizando a ferramenta da análise do discurso tal como proposta por Foucault, interessando-nos os processos subjetivos construídos pelos textos investigados, suas escolhas políticas e a forma como trataram o objeto de estudo abrigo. Assim se configurando, a análise buscou pensar o sentido das práticas dimensionando-as no tempo e no espaço, pela via das formações discursivas que, para tanto, se orientam na/pela concepção de que o discurso é o efeito de sentidos entre sujeitos e objetos e não um simples veículo de comunicação, um mero transmissor de informação.

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