Família e trabalho na reestruturção produtiva
Por: Jthuana • 3/11/2015 • Trabalho acadêmico • 10.589 Palavras (43 Páginas) • 158 Visualizações
FAMÍLIA E TRABALHO NA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA: ausência de políticas de emprego e deterioração das condições de vida* Lilia Montali RBCS Vol. 15 no 42 fevereiro/2000 A reestruturação produtiva intensificou-se na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) a partir de 1990 e teve por principais conseqüências, até 1994, o aumento do desemprego, a precarização das relações de trabalho, mudanças na inserção dos diferentes componentes da família no mercado de trabalho e deterioração da renda familiar. A não expansão das oportunidades de trabalho levou a que, para enfrentar esse momento de desemprego dos principais mantenedores da família, ocorressem rearranjos familiares de inserção no mercado de trabalho que se diferenciam segundo os tipos de família, construídos com base em sua estrutura- ção e momentos do ciclo vital familiar. Um dos temas privilegiados neste estudo são as alterações na relação família-trabalho relacionadas às transformações das atividades econômicas e a possível influência destas na mudança das relações hierárquicas na família.1 A crescente precarização das relações de trabalho, a deterioração da renda familiar — interrompida no período inicial do plano de estabiliza- ção econômica (1995) e retomada em 19982 — e a acentuação, desde meados de 1997, das já elevadas taxas de desemprego na RMSP vêm reforçar as indagações de Bruno Lautier (1994-1995) acerca dos limites da atuação da família como “um amortecedor da crise”. A questão levantada por Lautier, e que merece atenção, é saber se, e a partir de que momento, a família, como conseqüência das polí- ticas de ajuste, cessará de cumprir os papéis que há muito vem sendo obrigada a desempenhar, embora imperfeitamente, como os de atenuar a carência de políticas sociais por parte do Estado e acolher os desempregados mais ou menos invisíveis socialmente. O temor do autor, cuja pesquisa inclui países da América Latina, Europa e África, é que, eficiente nesse papel nos anos 70, a família perde gradativamente, nos últimos anos, a possibilidade de ser um amortecedor da crise, em conseqüência da adequação das economias latino-americanas aos modelos impostos. Lautier argumenta que a redução dos salários e das aposentadorias, de um lado, e a redução dos investimentos estatais em políticas sociais e das pessoas cobertas pelo seguro social, de outro, “podem atuar de tal sorte que o desmantelamento das políticas sociais acelerará em espiral cumulativa a decomposição das estrutu- * Versão revisada de trabalho apresentado no GT Família e Sociedade, XXII Encontro Anual da Anpocs, Caxambu, MG, outubro de 1998. 56 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 15 No 42 ras familiares” (Lautier, 1994-1995, p. 28). Sinais destes limites já estão dados na Grande São Paulo, com o empobrecimento crescente das famílias, o crescimento do número de “meninos de rua”, bem como de moradores adultos de rua, e o aumento da violência, correspondendo às previsões de Lautier. Os resultados de pesquisa por mim realizada no início dos anos 80 (Montali, 1995) confirmam o relativo sucesso da família como amortecedora da crise econômica então vivida, apesar do aumento do desemprego e da redução dos rendimentos familiares. Esta nova pesquisa se estende até o final dos anos 90 e deverá permitir responder à questão de Lautier sobre a continuidade do papel da família como um amortecedor nas conjunturas de crise e de ajustamentos econômicos. Os resultados da análise do período 1990-1994 evidenciam, por um lado, a capacidade das famílias de se rearranjarem em sua inserção no mercado de trabalho diante das mudanças nos padrões de incorporação da força de trabalho e das restrições diferenciadas encontradas pelos membros da família. Mostram, por outro lado, que os rearranjos realizados nos diferentes tipos de família da RMSP no contexto da reestruturação produtiva e em uma conjuntura inflacionária não conseguiram manter os níveis dos rendimentos familiares.3 Em 1990, 39% das famílias encontravam-se abaixo da linha de pobreza e, em 1994, 48% delas4 eram consideradas pobres, ou seja, não dispunham de rendimentos suficientes para suprir sua necessidade de bens e serviços. A ausência de políticas de emprego no perí- odo 1990-1994, como meio de enfrentar a redução dos postos de trabalho decorrente da reestrutura- ção das formas de produção e de gerenciamento — a não ser o apoio temporário ao desempregado através do seguro-desemprego; a intenção de implementar políticas de emprego só foi esboçada a partir de julho de 1995 (Azeredo e Ramos, 1995) —, bem como o pequeno alcance das políticas adotadas até 1998 (Presidência da República, 1998), têm tornado evidente que os trabalhadores estão, até este momento, entregues aos mecanismos de incorporação da força de trabalho regidos pelas necessidades e conveniências do capital. Mesmo o movimento sindical tem tido pouco êxito no sentido de impedir o aumento do desemprego e a precarização das formas de inserção no mercado de trabalho. Tendências do mercado de trabalho nos anos 90 Uma das principais questões que se pretende responder é como as transformações recentes na economia e no mercado de trabalho se manifestam nos arranjos familiares de inserção e quais as possíveis conseqüências destas na mudança das relações hierárquicas na família e nas condições de sua sobrevivência. Nesse processo destacam-se as respostas do mercado de trabalho aos momentos de recessão e expansão, bem como ao ajuste das empresas aos requisitos das novas formas de gestão e produção, efetuado como condição para garantir a competitividade em face da abertura da economia a partir de 1990. Algumas tendências do mercado de trabalho nos anos 90 já se faziam presentes na década de 80. Nesta última década eleva-se o nível de desemprego, cresce a informalização do trabalho, ou seja, torna-se tendencialmente menor a parcela dos ocupados que se inserem no mercado através de emprego regular e regulamentado (Pochmann, 1997a; Baltar, 1996), ocorre a redução do assalariamento e também do emprego industrial. Essas tendências, além de serem resultantes das mudan- ças introduzidas com a reestruturação produtiva, refletem, por outro lado, a dinâmica do nível de atividade da economia nacional, cuja oscilação ao longo das duas últimas décadas repercutiu negativamente sobre nível geral de emprego. Pochmann (1997a) identifica cinco diferentes oscilações no nível de atividade da economia nacional no decorrer dos anos 1981-1996, quando se sucederam fases de recessão (1981-1983 e 1990-1992), de desaceleração (1987-1989), e períodos de recuperação do Produto Interno Bruto (1984-1986 e 1993- 1996). Tais oscilações, segundo ele, caracterizam o período como de elevada instabilidade monetária, incerteza nas decisões empresariais e de múltiplas inseguranças para os trabalhadores. Por outro lado, para um determinado grupo de autores5 o desemprego elevado e a precariza- ção das relações de trabalho resultam da orienta- FAMÍLIA E TRABALHO NA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA 57 ção da política macroeconômica e não apontam para a construção de um modelo de crescimento sustentado, como é previsto por alguns. “Os efeitos combinados, a partir de 1990, de políticas recessivas, de desregulação e redução do papel do Estado, de abertura comercial abrupta, de taxas de juros elevadas e de apreciação cambial seriam responsáveis pela montagem de um cenário desfavorável ao comportamento geral do emprego nacional.” (Pochmann, 1997a, p. 7). Partilhando da mesma opinião, Dedecca (1996) afirma, em sua análise sobre o mercado de trabalho brasileiro, que a reorientação da política econômica, ao promover um processo de abertura da economia brasileira e induzir um movimento generalizado de racionalização econômica no país, tem representado uma ruptura com o padrão dominante até o final da década de 80. Segundo sua interpretação, até os anos 70 a indústria de transformação e a construção civil dinamizaram fortemente o mercado de trabalho urbano. Nos anos 80, a proteção externa garantiu um movimento lento de reorganização produtiva e defendeu o emprego industrial, ao mesmo tempo em que uma expansão dos serviços públicos sociais e os servi- ços produtivos e voltados para o consumo de alta renda sustentaram a estrutura ocupacional. Em movimento contrário, “a racionalização econômica dos anos 90 tem ferido violentamente a capacidade de geração e o nível de emprego dos diversos setores econômicos, levando a uma redução acentuada da dimensão ocupacional do trabalho assalariado protegido nos mercados urbanos e metropolitanos de trabalho.” (Dedecca,1996, p. 60). Em conseqüência desses processos, o desemprego nos anos 90 tem assumido características específicas, atingindo mais pesadamente as atividades industriais, os ramos metal-mecânico, têxtil e vestuário, os postos de chefias intermediárias (pelo “achatamento da estrutura hierárquica das empresas” — Matesco, 1995), os empregos assalariados regulamentados e os trabalhadores menos qualificados. Já no início da década os níveis de desemprego na Região Metropolitana de São Paulo, a região mais industrializada do país, eram mais elevados que os observados na segunda metade dos anos 80. Para indicar a gravidade do desemprego nessa região, deve-se ressaltar que a partir de 1992 as taxas de desemprego total registradas pela Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED/Funda- ção Seade), excetuando-se 1995 (1992: 15,5%; 1993: 16,1%; 1994: 15,3%; 1995: 13,5%; 1996: 15,9%; 1997: 15,9%),6 são bastante próximas daquelas verificadas nos anos recessivos do início da década de 80 (1981: 16%; 1983: 16,5%).7 A partir de maio de 1997 recrudesce o desemprego na RMSP, que atinge em 1998 a média anual de 18,3%. Resultados de pesquisa da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP) mostram a continuidade da redução de postos de trabalho na indústria paulista. Entre junho de 1994 e janeiro de 1998 foram eliminados 401.347 empregos industriais. O mês de janeiro de 1998 é apontado como o pior resultado desde agosto de 1996: foram eliminados 27.856 postos de trabalho (Folha de S. Paulo, 13/2/1998). Em junho de 1998 o número de empregados na indústria paulista era 5,3% menor que o registrado em junho de 1997. Outro indicador divulgado pela FIESP no final de julho, o INA (Indicador do Nível de Atividade), mostra a estabilização da atividade industrial nos meses de maio e junho de 1998 em níveis inferiores (-6,2%) aos de outubro de 1997, isto é, em momento anterior ao desencadeamento da crise no Sudeste Asiático (Folha de S. Paulo, 30/7/1998). Além das tendências nacionais, deve-se considerar que a Região Metropolitana de São Paulo vem passando por profundas transformações em suas atividades econômicas ao longo dos anos 80 e 90. A análise dessas transformações deve obrigatoriamente levar em conta processos relacionados: a desconcentração industrial, o desenvolvimento do setor terciário e a reestruturação produtiva.8 As transformações regionais, associadas à instabilidade da economia nas duas últimas décadas, têm provocado, desde então, a redução do emprego industrial, o crescimento das ocupações ligadas ao terciário — de caráter formal ou informal — e o progressivo empobrecimento da população. Estas tendências definem, portanto, o perfil atual das atividades econômicas da RMSP e afetam as possibilidades de emprego, os arranjos familiares de inserção no mercado de trabalho e as condições de vida da população. 58 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 15 No 42 Mudanças e permanências na relação família-trabalho Este estudo sobre a primeira metade dos anos 90, como já foi dito, é uma continuação de estudo anterior sobre a relação família-trabalho nos anos da crise econômica do início dos anos 80 (Montali, 1995). Dessa maneira, embora considerando o novo momento de reorganização das atividades produtivas e as tendências recentes de transforma- ção da família, que são as referências empíricas deste estudo e que se articulam através do conceito de divisão sexual do trabalho, os conceitos básicos para a interpretação da realidade, bem como os cortes de análise adotados, são os mesmos do primeiro estudo. Isto significa levar em conta, no estudo da relação família-trabalho, as influências recíprocas tanto da estruturação das atividades produtivas quanto da estruturação das famílias. Significa, portanto, tratar os achados de pesquisa como resultantes de uma complexa relação entre os determinantes econômicos e os determinantes culturais no acesso dos componentes da família ao mercado de trabalho. A articulação entre a esfera da produção e as estruturas produtivas e a esfera da reprodução e as estruturas familiares é feita pela lógica da divisão sexual do trabalho vigente tanto no mercado de trabalho como na família (Barrère-Maurisson, 1992). Uma análise desta natureza não dissocia, portanto, a abordagem macro das relações internas à família. Por outro lado, a importância do conceito de divisão sexual do trabalho na análise da mudança na relação família-trabalho está em possibilitar a articulação das duas dimensões que definem essa relação, superando análises que supõem determinações de uma esfera sobre a outra.9 Dessa maneira, busca-se apreender a relação entre família e trabalho como “um ator reunificado que intervém ao mesmo tempo nas duas esferas” (Barrère-Maurisson, 1992, p. 28). Como a divisão do trabalho nas sociedades industriais opera “simultânea e indissoluvelmente nas duas instâncias”, não é suficiente estudar os efeitos da vida profissional sobre a família e o inverso. É necessário tratá- las em conjunto, sob uma mesma lógica que atribui ao homem e à mulher lugares específicos nestas estruturas. Não se pode, assim, “dissociar o estudo do lugar dos homens e das mulheres na produção de seu lugar na família. Estes se remetem sempre um ao outro” (idem, p. 30). A construção teórica da relação família-trabalho e da divisão sexual do trabalho como elos de ligação entre as esferas produtiva e reprodutiva constitui, pois, uma importante referência teórica para esta análise.10 Dessa perspectiva, é importante reter aspectos do momento conjuntural da economia, das transformações por que passa a família e também as características da relação homemmulher predominante na sociedade, que define tanto as atribuições de ambos na família quanto as representações acerca de sua inserção no mercado de trabalho. Indicações gerais sobre as mudanças que ocorrem nas atividades econômicas da Região Metropolitana de São Paulo foram apresentadas acima. No que se refere à família, pode-se mencionar transformações importantes ocorridas tanto nos anos 80 como em momento anterior. A expressiva queda dos níveis de fecundidade no país como um todo deu-se entre 1965 e 1975. Mudanças significativas ocorreram também, a partir de então, nos padrões familiares, tais como o crescimento das separações e da proporção de famílias monoparentais, especialmente aquelas encabeçadas por mulheres. Algumas das transformações na família que já se anunciavam nos anos 80 acentuaram-se na Região Metropolitana de São Paulo no início dos anos 90, tais como a redução da proporção das famílias compostas por casais e filhos e o crescimento das famílias nucleadas por “chefes de famí- lia” sem cônjuge, masculinos ou femininos, não obstante a predominância dos últimos e o aumento no número de domicílios unipessoais (Montali, 1998a). O crescimento das famílias chefiadas por mulheres reflete não apenas a transição demográ- fica e as alterações dos padrões de nupcialidade, mas também um conjunto complexo de fenômenos, com destaque para aqueles que se explicitam através da articulação entre estruturas produtivas e estruturas familiares. Neste sentido, merecem menção as transformações da família que FAMÍLIA E TRABALHO NA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA 59 estão relacionadas aos novos papéis que a mulher vem assumindo na sociedade e à mudança de expectativas em relação a ela. Estas mudanças têm a ver com as posições conquistadas pela mulher no mercado de trabalho e com as oportunidades crescentes de absorção, apesar da sexualização das ocupações, ou seja, apesar de a atividade da mulher no mercado de trabalho permanecer concentrada em determinadas atividades e setores (Bruschini, 1994), prevalecendo, tanto nas regras do mercado para sua absorção como nas escolhas individuais, a divisão sexual do trabalho definida pelas representações das atribuições da mulher em relação à família. Dessa maneira, o crescimento das famílias chefiadas por mulheres verificado na Região Metropolitana de São Paulo sem dúvida expressa as maiores possibilidades de autonomia da mulher para garantir sua subsistência. Não obstante isso, porém, importante parcela das famílias chefiadas por mulheres apresenta nível acentuado de pobreza.11 A disponibilidade dos diferentes componentes da família para o mercado de trabalho é, portanto, diferenciada conforme sua posição na família e expressa relações de hierarquia e de gênero. Por outro lado, é também afetada pelo padrão de absorção da força de trabalho vigente no mercado, que define as possibilidades de emprego desses componentes. A crise de 1981-1983 mostrou-se um momento importante para se estudar modificações na relação família-trabalho, especialmente quando analisadas através da tipologia construída para a investigação, que tem por referência o ciclo vital das famílias (Montali, 1995). A análise do comportamento dos membros das famílias nesse momento de crise econômica mostrou a importância da mobilização para o mercado de trabalho dos filhos (especialmente das filhas) e da mulher-cônjuge, sobretudo em determinados tipos de família. Além de nossa pesquisa, outros estudos sobre a década de 80 mostraram o crescimento da participação no mercado de trabalho de outros componentes da família além do chefe. Estudos do IBGE (1995) mostram que na década de 80 cresce no país o número de membros da família que trabalham, reduzindo-se assim a proporção de famílias em que apenas uma pessoa trabalha de 46,8%, em 1981, para 42,4% em 1989. Cresce, por outro lado, o percentual daquelas em que duas ou mais pessoas trabalham, de 44,3% das famílias em 1981 para 48,5% em 1989. Entre 1981 e 1989, as principais tendências em relação à inserção dos componentes da famíla no mercado de trabalho observadas no Brasil apontam para o aumento do trabalho feminino, destacando-se o aumento da participação no mercado de trabalho das cônjuges, cujas taxas de atividade cresceram 33% entre 1981 e 1989, passando de 27,4% para 36,5% (IBGE, 1995). Crescem também as taxas de atividade das filhas com mais de 18 anos (de 60,5% em 1981 para 65,3% em 1989) e das chefes femininas (de 46,5% em 1981 para 52% em 1989). As taxas de atividade masculinas apresentaram menor crescimento: os chefes homens praticamente mantiveram suas taxas nesse período (87,9% em 1981 e 87,6% em 1989) e os filhos maiores de 18 anos apresentaram pequeno crescimento em suas taxas de atividade, passando de 85,6% em 1981 para 87,1% em 1989 (IBGE, 1995). O crescimento das taxas de participação da família na força de trabalho, em função do aumento da participação da mulher-cônjuge e dos filhos, é constatado também em outras regiões metropolitanas do país, e com maior intensidade naquelas do Sudeste (Jatobá, 1990). Os estudos sobre a década de 80 confluíam, assim, na indicação das tendências concomitantes de redução do peso do chefe entre os ocupados da família e de crescimento da importância dos demais componentes familiares. Tais estudos e a pesquisa sobre os anos recessivos de 1981-1983 (Montali, 1995) induziam à suposição de que aquelas tendências permaneceriam na atual conjuntura de redução das oportunidades de trabalho, que afeta especialmente os homens em idade ativa. No entanto, nos anos recentes, considerando-se os dados agregados para a Região Metropolitana de São Paulo como um primeira aproxima- ção, nota-se o estabelecimento de um outro padrão, no qual a participação dos chefes de família se mantém em torno de pouco menos que a metade dos ocupados da família (46%) e a participação dos filhos cai progressivamente, em especial 60 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 15 No 42 a partir de 1992. Desde então (até pelo menos 1997), os filhos passaram a representar cerca de um quarto dos ocupados da família, quando foram mais que um terço deles em 1983. Configurando um fato novo a partir de 1992, observa-se também o crescimento progressivo da participação da cônjuge entre os ocupados da família (Tabela 1). O peso da participação da mulher-cônjuge entre os ocupados da família apresenta tênue tendência de crescimento entre 1981 e 1985, passando de 13,5% no primeiro momento da crise a 14% no ano de início da recuperação econômica. Chega a 15,6% no ano de 1986, caracterizado como de expansão da economia, e mantém esse patamar até 1990. Sua participação entre os ocupados continua a crescer nos anos recessivos do início da década de 90 (1990-1992) e nos subseqüentes, aparentemente compensando oscilações na participação ora dos filhos, ora dos chefes de família (Tabela 1). A partir de 1992 verifica-se uma mudan- ça no patamar de participação da mulher-cônjuge entre os ocupados da família: de 17,4% em 1992 para mais de 18% nos anos 1995-1996, chegando a 18,9% em 1997. Dessa maneira, observa-se como tendência entre 1992 e 1997 um padrão de ocupação dos membros da família em que a participação do chefe fica ao redor de 46% dos ocupados, a participação da cônjuge, próxima a 18% dos ocupados e a dos filhos, cerca de 25% destes; outros parentes e não parentes oscilam ao redor dos 10% dos ocupados. Padrão bastante distinto da composição dos ocupados da família em 1981, quando o chefe representava 45,3% dos ocupados, a cônjuge, 13,5% e os filhos, 31,8% (Tabela 1). A análise das tendências recentes apresentadas pelos diferentes componentes da família a partir destes dados agregados e também do conjunto dos resultados desta pesquisa leva a supor que cada vez mais a responsabilidade pela manutenção da família será partilhada pelo casal, no caso das famílias biparentais, que são as predominantes na Região Metropolitana de São Paulo, em oposição ao modelo do chefe provedor. Dessa maneira, o rearranjo da inserção dos componentes da família no mercado de trabalho nos anos 90 parece apontar para direção um pouco distinta da observada na década anterior. Nos anos 80, tanto por características da composição familiar, como pelas maiores possibilidades de emprego para os mais jovens, era maior o peso dos filhos entre os ocupados da família. A tendência recente está sendo a maior presença do casal (chefe e cônjuge) entre os ocupados da família. Se em 1981 o casal compunha cerca de 60% dos componentes ocupados da família, em 1992 já representava 63,6% dos ocupados e em 1997, 65% destes (Tabela 1). As alterações observadas no período sob análise (1981-1997) relativas ao peso dos componentes entre os ocupados da família são, com certeza, decorrentes tanto de alterações na disponibilidade diferenciada dos componentes da famí- Tabela 1 Distribuição dos Ocupados segundo Posição na Família Região Metropolitana de São Paulo 1981-1997* Em porcentagem Posição na Distribuição dos Ocupados Família 1981 1983 1985 1986 1987 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 Chefe 45,3 42,2 47,1 47,0 45,4 46,3 45,5 46,2 45,9 46,9 46,0 46,6 46,0 Cônjuge 13,5 13,6 14,0 15,6 15,6 15,3 16,2 17,4 17,7 17,9 18,3 18,7 18,9 Filhos 31,8 36,4 28,7 27,6 29,0 27,5 27,6 25,6 26,5 25,6 25,6 24,5 25,0 Outros 9,4 7,8 10,2 9,9 10,0 10,8 10,7 10,8 9,9 9,7 10,1 10,2 10,1 Total 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 * Os dados de 1981 são de março-abril; os de 1983, de março e junho; os de 1985 a 1996 são referentes ao trimestre móvel fevereiro-março-abril; os de 1997 são dados anuais. Fontes: PPVE/DIEESE, para 1981 e 1983; PED/Fundação Seade,1985 a 1996. Dados consolidados até 1991 apud Montal i (1995). De 1991 a 1997, ver PED/Fundação Seade, Home Page Seade 1998. FAMÍLIA E TRABALHO NA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA 61 lia oriundas das relações internas a esta — podendo-se supor que se estejam reduzindo nas famílias as restrições ao trabalho remunerado da mulhercônjuge — quanto das restrições e possibilidades de inserção no mercado de trabalho que têm atuado também de forma diferenciada para cada um dos componentes familiares. Os dados agregados apresentados nesta seção possibilitam visualizar apenas aspectos gerais dessas tendências na década de 90 para a Região Metropolitana de São Paulo; maior detalhamento para o período 1990- 1994 é apresentado mais adiante. Estas tendências, consideradas no contexto das transformações mais gerais que ocorrem na sociedade brasileira, expressam ajustes entre as dinâmicas de transformação da família e das atividades econômicas. Na verdade, elas indicam mais do que simples ajustes, pois repercutem sobre as relações familiares de autoridade e de negociação, afetando mutuamente as relações internas à família e as possibilidades de inserção de seus componentes no mercado de trabalho. Não obstante as mudanças ocorridas na família e na incorporação de seus componentes no mercado de trabalho, o padrão de família culturalmente aceito no país é o da família tradicional, ao qual corresponde a divisão sexual do trabalho em que o homem é o responsável pela manuten- ção da família e a mulher, pelos cuidados da casa e dos filhos, sendo as relações de poder e autoridade hierarquizadas a partir do homem.12 Pesquisas recentes, mesmo indicando tendências a relações mais igualitárias em segmentos das camadas médias, mostram a manutenção, nos dias atuais, deste padrão, especialmente valorizado nas famílias de estratos de renda mais baixos, nestes incluindo segmentos inferiores das camadas médias.13 Indícios de mudança e das contradições por esta geradas são evidenciados pelos estudos de caso que mostram que as tensões se originam exatamente da contradição entre rela- ções mais igualitárias e a tradicional atribuição de papéis (Carvalho, 1992; Romanelli, 1991; Sarti, 1994, dentre outros). Os resultados da pesquisa sobre a relação família-trabalho na crise do início dos anos 80 (Montali,1995) oferecem suporte para se afirmar a existência de um movimento de mudança na famí- lia em curso; ou seja, ao mesmo tempo em que mostram modificações na relação família-trabalho, evidenciam objetivamente as dificuldades de concretização do padrão de manutenção da família pelo chefe provedor, vivenciadas com especificidade nos diferentes tipos de família, que correspondem aos momentos do ciclo vital da família. Por outro lado, colocam em discussão a questão de que a permanência e a mudança desse padrão de família culturalmente aceito passam pela ruptura ou não da possibilidade concreta de sua efetiva- ção. Essa ruptura, por hipótese, tenderá a provocar uma nova divisão do trabalho na família, ou seja, a alterar a relação família-trabalho, levando, a médio ou a longo prazo, a uma nova divisão sexual do trabalho que implicaria uma redefinição dos papéis masculino e feminino e alterações nas rela- ções de hierarquia e poder. A hipótese deste estudo de mais longo prazo sobre os anos 90 é que a progressão, nos anos 80 e 90, das tendências identificadas no início da década de 80 com relação à impossibilidade concreta de realização do padrão do chefe provedor pode estar sinalizando mudanças mais profundas na família, que se expressam na alteração na divisão sexual do trabalho interna a ela. A continuidade dessa tendência na Região Metropolitana de São Paulo evidencia-se na intensificação do trabalho da mulher casada e na participação crescente do conjunto dos componentes da família para sua manutenção. É acentuada nos anos 90 pela conjuntura de crescimento do desemprego masculino e dos chefes de família. Neste momento, não é apenas a situação de desemprego do homem do casal que ameaça a possibilidade de realização do padrão de família do chefe provedor. Em muitos casos, especialmente após o desemprego industrial, a qualidade da ocupação obtida não consegue reproduzir a situação anterior. Assim, a impossibilidade concreta de realiza- ção do padrão de família baseado no “chefe provedor”, já evidenciada em estudo anterior referente à crise do início dos anos 80 (Montali, 1995), é reafirmada para a primeira metade dos anos 90. Tais tendências, associadas às pressões dos movimentos de mulheres e às transformações que 62 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 15 No 42 vêm ocorrendo na sociedade no sentido de maior igualitarismo entre homens e mulheres, sinalizam para transformações profundas tanto nas relações de hierarquia no interior da família como nas possibilidades de acesso das mulheres ao mercado de trabalho, na medida em que estas são limitadas (freadas) pelas relações familiares e respectivas atribuições. Dessa maneira, a impossibilidade concreta de realização do padrão de família mantida pelo chefe provedor que se verifica de maneira crescente na Região Metropolitana de São Paulo pode impulsionar ou favorecer transformações nas relações de gênero tanto no âmbito da família como no âmbito do mercado de trabalho e na sociedade como um todo. Outra questão a ser evidenciada é que a crescente impossibilidade de efetivação do padrão da família mantida pelo “chefe provedor”, caro às famílias de baixa renda, pode ser, em grande parte, responsável pelo crescimento das famílias chefiadas por mulheres. Estudos de caso mostram que a impossibilidade concreta de realização desse padrão de família considerado como ideal significa para a mulher-cônjuge a ruptura da reciprocidade da divisão sexual do trabalho esperada; para o homem significa a incapacidade de cumprir seu papel, levando-o ao alcoolismo ou ao abandono da família.14 Essa impossibilidade, acentuada pelas dificuldades de emprego e remuneração suficiente nas conjunturas de crise e de instabilidade dos anos 80 e 90, deve ter contribuído para a tendência ao crescimento de famílias monoparentais, especialmente as chefiadas por mulher. Este fenômeno, nas famílias de baixa renda, ao mesmo tempo em que é gerado pelas condições precárias de renda e trabalho, reproduz a pobreza. Deve-se esclarecer, entretanto, que ao discutir mudanças no padrão do chefe como provedor da família tendo por referência os dados empíricos que evidenciam a participação de outros componentes na manutenção desta, ou indicadores de insuficiência de renda, não estou supondo rupturas mecânicas nesse processo. Em outras palavras, não se está supondo que, rompida a possibilidade de manutenção da família pelo chefe, estaria rompido este modelo de família culturalmente estabelecido na sociedade brasileira. Sem dúvida, os padrões culturais demonstram sua força conservadora ao redefinirem, de forma dominante na sociedade, o trabalho da mulher e dos filhos como complementares ao do chefe, reafirmando a autoridade deste como provedor. O que se propõe para discussão, a partir dos dados, é que a permanência e a mudança na família passam pela ruptura da possibilidade objetiva de efetivação desse padrão culturalmente dominante. E que esta ruptura, ao provocar uma nova divisão do trabalho na família, leva a longo ou a médio prazo a uma nova divisão sexual do trabalho na família, com a redefinição dos papéis de gênero, que, por sua vez, apresentará reflexos tanto na família como na disponibilidade para o mercado de trabalho. Aspectos dos efeitos diferenciados da reestruturação produtiva sobre o emprego por sexo e a inserção dos componentes da família no mercado de trabalho As análises sobre o mercado de trabalho na Região Metropolitana de São Paulo na primeira metade dos anos 90 evidenciam que o processo de reestruturação produtiva intensificado a partir de 1990 tem afetado com mais ênfase os postos de trabalho masculinos. Brandão e Montagner (1996) mostram, para o período, acentuada queda na taxa de ocupação masculina, ao mesmo tempo em que se mantêm as taxas de ocupação feminina. A crescente participação da mulher no mercado de trabalho no Brasil — fenômeno relevante para se estudar as transformações na família e na relação família-trabalho — é uma tendência desde o final dos anos 70 e que se vem acentuando nas décadas de 80 e 90, apesar de as duas últimas décadas caracterizarem-se por baixas taxas de crescimento econômico, embora com alguns perí- odos de recuperação.15 Tal fenômeno insere-se em um tendência internacional manifesta tanto em países desenvolvidos como nos países da América Latina desde a década de 70 e que se tem mantido crescente quer nos períodos de recessão, quer nos de expansão da economia (Posthuma e Lombardi, 1997).16 FAMÍLIA E TRABALHO NA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA 63 Também a tendência observada na RMSP de crescimento da taxa de participação feminina simultaneamente à queda da taxa de participação masculina é comum a outros países tanto da América Latina como da Europa nas últimas décadas, mais especialmente nos anos 90 (Posthuma e Lombardi, 1997; Hirata, 1997; Abramo, 1997; González de la Rocha, 1997). “Nota-se uma diferença entre a natureza da participação dos homens e das mulheres na maioria dos países do mundo: a taxa feminina da força de trabalho aumentou tanto durante períodos de prosperidade como nos de recessão, enquanto a participação masculina tem decrescido.” (Posthuma e Lombardi, 1997). Na análise das curvas de evolução das taxas de participação e de ocupação das pessoas em idade ativa da RMSP, Brandão e Montagner (1996) explicitam que a queda nas taxas de ocupação ocorrida a partir de 1990 é resultado, principalmente, da redução das oportunidades de trabalho para os homens. As autoras enfatizam que embora, a partir de 1991, tenha crescido para ambos os sexos a parcela das pessoas em idade ativa desempregadas, são distintos os determinantes básicos desse crescimento: o desemprego masculino é explicado pela menor disponibilidade de postos de trabalho na região e o crescimento do desemprego feminino, pela maior oferta de mão-de-obra. Ambas as tendências verificadas no mercado de trabalho no decorrer da reestruturação das atividades econômicas na Região Metropolitana de São Paulo — redução do emprego masculino e preservação do emprego feminino — guardam relação com a divisão sexual do trabalho. Como já mencionado anteriormente, existe uma “sexualiza- ção” das ocupações, ou seja, existem funções e setores de atividade que concentram diferencialmente homens e mulheres (Bruschini, 1994). A divisão sexual do trabalho opera tanto na família como no mercado de trabalho através de conteú- dos históricos e culturais. Dessa maneira, são os conceitos da divisão sexual do trabalho e das relações de gênero que possibilitam explicar os modos diferenciados de inserção de homens e mulheres no sistema produtivo, bem como as formas de gestão da força de trabalho também diferenciadas por sexo, que nos auxiliam a entender os efeitos diferenciados da reorganização das atividades econômicas sobre o emprego masculino e o feminino. É conhecida a relativamente pequena participação feminina — da ordem de 27% dos ocupados — no trabalho industrial, o setor de atividade econômica mais atingido nesse processo. Por outro lado, é muito pequeno nesse setor o número de mulheres que ocupam cargos de chefia, uma das funções mais afetadas com a redução das hierarquias nas empresas. Também a inovação de processos, com a introdução de novos equipamentos, motivo de substituição ou eliminação de homens, sobretudo os muito qualificados, não afetou significativamente as mulheres, uma vez que raramente elas operam máquinas. A adoção de novas formas de gestão da produção, por sua vez, afeta de forma semelhante homens e mulheres muito qualificados (Matesco, 1995; Lavinas e Matesco, 1996). Assim, a divisão sexual do trabalho vigente na indústria, que tem sido objeto de muitos estudos (Lobo, 1991) que denunciaram a desigualdade entre homens e mulheres, especialmente quanto a oportunidades de treinamento e de acesso a chefias, tem possibilitado, nesta etapa da reorganização das atividades econômicas, a redu- ção menos drástica da atividade feminina no mercado de trabalho, ainda que favoreça uma maior fragilidade das formas de vinculação das mulheres a este mercado. O setor de serviços, que absorve a maior parte das mulheres ocupadas em países desenvolvidos e não desenvolvidos, também concentra grande parte da força de trabalho feminina na RMSP. Este setor tem continuado a oferecer oportunidades de trabalho, apesar de alguns de seus ramos também passarem por reestruturações, tais como os serviços financeiros e o comércio. Mas, se por um lado as mulheres estão concentradas em um setor com relativa expansão de oportunidades de trabalho, sabe-se que no setor terciário, considerando-se sua diversidade, são maiores as possibilidades de vinculações precárias ao mercado de trabalho, o que afeta as possibilidades de inserção da mulher em empregos de qualidade. Reafirmando a manutenção da precariedade da inserção feminina no mercado de trabalho sob 64 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 15 No 42 a reestruturação produtiva na Região Metropolitana de São Paulo, estudo realizado pela Fundação Seade, com base em informações disponibilizadas pela PED,17 mostra que em 1996 havia maior semelhança entre homens e mulheres nas proporções de inserção regulamentada e não regulamentada no mercado de trabalho. Avalia-se que o perfil ocupacional na Grande São Paulo em 1996, que “resulta de uma evolução regional nos anos 90, embora não tenha eliminado a maior fragilidade estrutural da inserção das mulheres na força de trabalho, tornou os homens mais semelhantes a estas últimas” (Fundação Seade, 1997, p. 1). Deve-se, no entanto, observar que, apesar da maior fragilização das inserções masculinas no mercado de trabalho, e das semelhanças aparentes entre os sexos, permanecem vigentes a segregação horizontal e a segregação vertical (Posthuma e Lombardi, 1997), restringindo a participação das mulheres a determinados setores e ramos de atividade e a funções definidas, tendo por referência atributos de gênero e representações acerca destes. O resultado dessas formas de segrega- ção, caracterizando o que Posthuma e Lombardi (1997) denominam de “inserção excluída”,18 são as remunerações mais baixas para as mulheres relativamente às dos homens, conforme constatado pelo estudo especial da Fundação Seade citado acima. Esta situação vem sendo registrada pela literatura especializada não só na RMSP e no Brasil como um todo, como também na maior parte dos países do mundo, incluindo os desenvolvidos. As tendências aqui apresentadas sinalizam profundas modificações nas formas de inserção no mercado de trabalho na Região Metropolitana de São Paulo e se refletem nos arranjos familiares para garantir a sobrevivência. A crescente participação das mulheres no mercado, como se viu, é um fato importante na alteração dos arranjos familiares percebidos como possíveis e articulados pelas famílias. Nesse sentido, dois aspectos devem ser considerados na análise do crescimento da participação da mulher em atividades remuneradas. Por um lado, a seletividade do mercado, tendo por base um novo padrão de absorção da força de trabalho, tem possibilitado a manutenção e o crescimento da participação da mulher; por outro, alterações nos valores relativos ao papel da mulher na sociedade, bem como na estruturação dos núcleos domésticos, têm aumentado a disponibilidade da mulher, em todas as idades e posições na família, para o trabalho remunerado. A síntese que apresentamos a seguir sobre as formas predominantes de inserção dos componentes da família no mercado de trabalho na RMSP nos anos de 1990 e 1994 guarda estreita relação com as características da inserção no mercado de trabalho por sexo na região. Enquanto as análises a partir do mercado de trabalho indicam as tendências do emprego e do desemprego, a análise a partir da unidade familiar permite conhecer as respostas das famílias e dos sujeitos com diferentes atribuições familiares à conjuntura que condiciona as possibilidades de emprego. Nesse sentido, a análise das formas de vinculação ao mercado de trabalho dos componentes da família mostra que se delineiam padrões que caracterizam as inserções predominantes. Ao mesmo tempo, mostra os efeitos diferenciados, sobre cada um dos componentes familiares, da redução das oportunidades e da precarização das condições e das relações de trabalho nos anos 90, tomando por indicadores o setor de atividade, a posição na ocupação, a existência de registro profissional em carteira de trabalho e a continuidade/descontinuidade no trabalho. Sintetizando as indicações sobre as formas de vinculação ao mercado e a precarização do trabalho observadas (Montali, 1998a), fica evidente que os componentes da família que estão sendo mais afetados no acesso a empregos de qualidade são os jovens e os muito jovens. Os filhos e filhas maiores de 18 anos, que têm elevadas taxas de participação no mercado e crescente taxa de desemprego, têm sofrido a perda do assalariamento no setor privado — especialmente na indústria, onde apresentam concentração mais elevada que a média regional — e buscado inserção no setor de serviços, embora parte deles permaneça na indústria de transforma- ção. Ainda que apresentem carteira de trabalho assinada em proporções acima da média da região, observa-se o crescimento da proporção de assalariados desse segmento trabalhando sem carteira de FAMÍLIA E TRABALHO NA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA 65 trabalho e a redução daqueles com vinculação regulamentada ao mercado. No caso dos filhos maiores masculinos, além dessa tendência chama a atenção o crescimento mais acentuado das vinculações não regulamentadas e não assalariadas. Por outro lado, embora os filhos maiores, de ambos os sexos, apresentem aumento na instabilidade no emprego, no caso das filhas, além de maior descontinuidade na ocupação, observa-se também maior parcela de desempregadas. Este conjunto de indicadores mostra, para o período analisado, uma maior fragilização da vinculação deste componente adulto da família ao mercado de trabalho, em comparação ao filho do sexo masculino (Montali, 1998a). A situação mais grave em termos de instabilidade é a dos ocupados menores de 18 anos, sejam eles filhos ou parentes. Se em 1990 a descontinuidade no trabalho neste segmento era o dobro da média regional, sua instabilidade parece ter aumentado ao longo do primeira metade da década. Somada ao conjunto de indicações que temos sobre a situação dos filhos e filhas menores, especialmente sobre sua concentração em atividades assalariadas não regulamentadas, a maior descontinuidade na ocupação registrada neste segmento reafirma a precariedade da inserção do adolescente no mercado de trabalho e evidencia as restrições que sofre no acesso ao trabalho. As chefes femininas e as cônjuges — ambas componentes responsáveis pela família — vêm apresentando elevação em suas taxas de participa- ção no mercado, de ocupação e de desemprego de forma semelhante, ainda que com intensidades distintas. Apresentam semelhanças também em seu perfil de inserção. Em sua grande maioria estão ocupadas no setor de serviços. Apesar das indica- ções de vinculações precárias, têm sofrido poucas alterações na sua forma de vinculação ao mercado no período estudado (1990-1994) e apresentam continuidade no trabalho em proporções mais elevadas que a média regional (Montali,1998a). Os chefes masculinos, um dos principais componentes responsáveis pela família, apresentam uma das mais elevadas taxas de participação e de ocupação. No entanto, têm sofrido o aumento do desemprego com maior intensidade em decorrência da redução dos postos de trabalho na indústria, onde se concentram em proporções acima da média da RMSP. Têm perdido postos de trabalho regulamentados, com a redução daqueles com registro profissional em carteira de trabalho e o conseqüente aumento das inserções assalariadas sem carteira de trabalho assinada e com vincula- ções precárias, principalmente como autônomos (Montali, 1998a). O conjunto de indicadores analisados sobre as alterações nas formas de vinculação ao mercado de trabalho na Região Metropolitana de São Paulo entre 1990 e 1994 permite constatar a clara deterioração da qualidade do emprego na região, cujos impactos foram sentidos por todos os ocupados, de modo diferenciado de acordo com sua posição na família, idade e sexo. Arranjos familiares e empobrecimento das famílias entre 1990 e 1994 A pequena expansão das oportunidades de trabalho no período, associada ao crescente desemprego dos principais mantenedores da família, levou a que se estabelecessem novos arranjos familiares de inserção no mercado de trabalho para garantir a subsistência. Os rearranjos familiares observados em 1994 — diferenciando-se daqueles encontrados em 1990 e na década de 80 — indicam o deslocamento da responsabilidade pela manutenção da família dos principais mantenedores identificados para cada tipo de família em pesquisa anterior (Montali, 1995) e seu maior partilhamento com outros componentes do grupo familiar. Com a redução dos postos de trabalho, principalmente para ocupações predominantemente masculinas, e diante das maiores dificuldades de absorção encontradas pelos jovens a partir de 1992, a tendência geral verificada, com especificidades nos diversos tipos de família,19 é a conjugação dos seguintes comportamentos: crescimento da participação da mulher-cônjuge entre os ocupados da família; redução da participação dos filhos, tanto maiores como menores de 18 anos, e redução do peso do chefe masculino. O peso do chefe entre os ocupados da família cresce, por sua vez, nas famílias de 66 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 15 No 42 chefe feminino sem cônjuge e nas famílias na etapa da “velhice” com a presença de filhos residentes.20 Os rearranjos observados em 1994 expressam, assim, o maior partilhamento da responsabilidade pela manutenção da família entre os principais mantenedores e outros componentes do grupo doméstico, como mencionado anteriormente. Como não é possível a substituição pura e simples dos diferentes componentes da família em sua inserção no mercado de trabalho, uma vez que cada um deles nele se coloca com suas características de gênero, idade e papéis familiares, sofrendo restrições ou vantagens a partir delas, os rearranjos familiares estabelecidos para o enfrentamento deste novo momento de elevado desemprego dificilmente possibilitam ao grupo familiar reproduzir ou manter nos mesmos níveis suas condições de existência. Na maior parte dos rearranjos analisados as cônjuges passam a assumir parcela maior na composição da renda familiar, especialmente em alguns tipos de família, como casais sem filhos residentes, casais de até 34 anos sem filhos residentes e casais de 35 a 49 anos com filhos, nos quais a renda da mulher chega a representar a segunda maior renda em volume (Montali, 1998a e 1998b). No entanto, sua participação ainda permanece muito menor que a participação do chefe masculino porque, apesar da maior inserção da cônjuge no mercado de trabalho, esta ocorre marcada pelas atribuições de gênero, que se expressam tanto por sua disponibilidade, como pelas possibilidades de absorção pelo mercado, através de vinculações precárias de trabalho e jornadas menores que as dos demais componentes adultos da família. Merece destaque, na análise dos rearranjos familiares de inserção, o fato de que, no segundo momento analisado, 1994, nas famílias chefiadas por mulheres, as chefes de família passam a assumir o maior encargo na composição da renda familiar, para fazer face ao aumento do desemprego dos filhos. Além da deterioração no emprego e da redu- ção das oportunidades de trabalho na Região Metropolitana de São Paulo, com certeza o empobrecimento verificado nos diferentes tipos de famí- lia entre 1990 e 1994 está relacionado aos rearranjos de inserção familiar e às diferentes vantagens e restrições que cada componente encontra em sua inserção no mercado, considerando-se que não existe “permutabilidade” entre eles. A Tabela 2 mostra como, apesar dos rearranjos familiares de inserção efetivados, os rendimentos médios familiares no período reduziram-se para todos os tipos de família analisados. Tabela 2 Renda Familiar per Capita Média*, segundo Tipologia de Família Região Metropolitana de São Paulo 1990-1994** em porcentagem Tipologia de 1990 1994 Família SM SM Casal sem filhos 5,69 5,22 Casal até 34 anos com filhos 3,37 2,69 e parentes Casal de 35-49 anos com filhos 4,06 3,67 e parentes Casal de 50 anos e mais com filhos 5,63 4,68 e parentes Chefe feminino sem cônjuge 3,68 2,92 Total*** 4,13 3,54 * Em salários mínimos de julho de 1994. ** Foram excluídas as famílias sem informação de renda e também aquelas em que algum componente apresenta ausência de informação para renda. *** Inclui outras configurações familiares. Fontes: Fundação Seade, PCV-90 e PCV-94. Elaborado por Lilia Montali, NEPP/Unicamp. Considerações finais A reestruturação produtiva afetou a inserção dos diferentes componentes da família no mercado de trabalho e, na ausência de políticas de emprego e de políticas de proteção social, teve por principais conseqüências a precarização das relações de trabalho e a deterioração da renda familiar. Uma das conclusões desta pesquisa (Montali, 1998a) é que no período analisado, 1990-1994, caracterizado por inflação elevada, os rearranjos de inserção no mercado articulados nos diversos tipos de FAMÍLIA E TRABALHO NA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA 67 família na Região Metropolitana de São Paulo não conseguiram manter os níveis dos rendimentos familiares. No período subseqüente, entre 1995 e 1997, houve uma recuperação da renda familiar per capita na região relacionada aos efeitos do plano de estabilização econômica (Plano Real). Entretanto, o recrudescimento do desemprego e a continuidade da deterioração das formas de vincula- ção ao mercado de trabalho continuam a ter impacto sobre os arranjos familiares de enfrentamento das situações adversas, afetando, já nos primeiros meses de 1998, a renda familiar per capita. O agravante neste último ano é que, pela primeira vez desde o início do plano de estabilização, ou seja, desde 1994, a deterioração na renda real familiar veio somar-se à deterioração do mercado de trabalho. A redução dos rendimentos dos ocupados afetou inclusive as cônjuges, os únicos componentes das famílias que vinham apresentando crescimento na renda real até 1997. A análise de tais processos nos anos de 1997 e 1998, etapa atual desta pesquisa, mostra que o crescente desemprego e a contínua precarização das relações de trabalho começam a fazer ruir, nas famílias mais pobres e mesmo nos segmentos médios da sociedade, as possibilidades até então encontradas para o enfrentamento das situações de crise econômica com desemprego e escassez de recursos. Estas indicações sugerem que poderemos nos deparar, nos últimos anos da década de 90, com o mesmo processo indicado por González de la Rocha (1997) para as metrópoles mexicanas, por ela denominado de “erosão do modelo de sobrevivência”. Na Região Metropolitana de São Paulo, às restrições ao emprego e à renda analisadas acima agregam-se a ausência por longo período de polí- ticas de emprego e a ineficácia daquela que vem sendo implementada até o momento. Em conseqüência dessa situação, as insuficientes políticas de proteção social implementadas não têm conseguido amenizar a crise social que se instaura na região. Em relação à família, esta nova situação do mercado de trabalho, que resultou, no decorrer dos anos 90, em maior partilhamento dos componentes da família na responsabilidade pela manutenção do grupo doméstico, com a crescente importância da participação da renda obtida pelo trabalho da mulher-cônjuge (Montali, 1998a e 1998b; Troncoso, 1998), evidencia a impossibilidade concreta de realização da família estruturada com base no “chefe provedor”, que já se vinha manifestando como tendência desde os anos 80 (Montali, 1995). O que se pode esperar é que essa tendência impulsione transformações também nas relações internas à família. A hipótese de trabalho é que a impossibilidade concreta de manutenção da família pelo chefe, e também de mantê-la sob sua autoridade, deverá provocar, a médio prazo, associada a outros fatores que têm indicado maior equalização das relações de gênero, mudanças na família: inicialmente, na divisão do trabalho interna à família, através das alterações na inserção dos seus componentes no mercado, e, num segundo momento, na divisão sexual do trabalho na família, o que implicará mudanças nas relações hierarquizadas de gênero no seu interior. NOTAS 1 Este trabalho apresenta resultados de um projeto de pesquisa de mais longo prazo sobre os anos 90 intitulado “Família, trabalho e condições de vida na Região Metropolitana de São Paulo: um estudo da mudança na família e na relação família-trabalho no contexto da transformação das atividades econômicas”, financiado pelo CNPq e desenvolvido junto ao NEPP/Unicamp. Os resultados aqui apresentados foram extraídos de Montali (1998a). A continuidade do estudo inclui os anos de 1997 e 1998, nos quais se experimenta o aprofundamento do desemprego. 2 Estudo do IPEA mostra redução de 5,1% no rendimento médio das pessoas ocupadas nas regiões metropolitanas de Porto Alegre, São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador e Recife entre os meses de janeiro e maio de 1998 (cf. “Renda pára de crescer e cai pela primeira vez no Real”, Folha de S. Paulo, 27/8/1998). A Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), realizada pela Fundação Seade, mostra que a renda familiar per capita da Região Metropolitana de São Paulo, que se manteve em R$ 519 entre 1996 e 1997, caiu para R$ 501 em 1998. 3 O referencial empírico para as análises é a Pesquisa de Condições de Vida (PCV) realizada pela Fundação Seade em dois anos do início da década: 1990, caracterizado como o início de um novo período recessivo (1990-1992), e 1994, ano de recuperação econômica sob 68 REVISTA BRASILEIRA DE CIÊNCIAS SOCIAIS - VOL. 15 No 42 a vigência da reestruturação produtiva, ambos momentos de elevados níveis de desemprego e com indícios de empobrecimento para a população da região. 4 Utilizou-se a linha de pobreza adotada pela PCV/ Fundação Seade, base de dados empíricos deste estudo. A linha de pobreza “equivale ao montante necessário para atender a estrutura de despesas de famílias com rendimento entre um e três salários mínimos, calculada pela Pesquisa de Padrão de Vida e Emprego (PPVE) na RMSP, realizada pelo DIEESE entre 1982 e 1983”. Cf. Brandão e Jannuzzi (1995). 5 Dentre outros, Mattoso e Baltar (1996), Dedecca (1996), Baltar (1996), Pochmann (1997a e 1997b) e DIEESE (1994). 6 Dados da Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED), realizada pela Fundação Seade e o DIEESE, referentes ao trimestre fevereiro-março-abril, utilizados para permitir a comparação com os dados de pesquisa de 1981 e 1983 (PPVE/DIEESE). Cf. Fundação Seade (1996 e 1997). 7 Dados da Pesquisa de Padrão de Vida e Emprego (PPVE/DIEESE), apud Montali (1995). Os dados de 1981 referem-se ao período março-abril e os dados de 1983 ao período março-junho. 8 Maior detalhamento sobre as mudanças nas atividades econômicas e nas oportunidades de trabalho na Região Metropolitana de São Paulo pode ser encontrado em Montali (1998a e 1998b). 9 Os conceitos aqui apresentados foram extraídos dos capitulos 1 e 2 de Montali (1995). 10 Barrère-Maurisson (1992) constrói uma sociologia da relação trabalho-família redefinindo seus instrumentos específicos (conceitos, métodos). Seu trabalho inscreve-se em uma corrente de pesquisas desenvolvidas na França desde os anos 70 voltadas para as transforma- ções familiares e sua concomitância com as transforma- ções do sistema produtivo e da relação com o trabalho, não estabelecendo determinações de uma esfera sobre a outra. Os estudos dessa corrente de pesquisa diferenciam-se em dois momentos: num primeiro momento tratam da relação entre estruturas produtivas e estruturas familiares e, nos últimos tempos, da articulação entre elas. 11 Sobre a análise das condições de vida das famílias chefiadas por mulheres no ano de 1990 ver Fundação Seade (1993). 12 Sobre a concepção da família tradicional ver especialmente Durham (1980) e Sarti (1993 e 1994). 13 Sobre camadas médias ver, dentre outros, Bruschini (1987), Romanelli (1989 e 1991) e Salém (1986). Sobre famílias pobres ver Zaluar (1985) e Sarti (1993 e 1994), apud Montali (1995). 14 Referências importantes sobre essas representações são encontradas em Sarti (1994, pp. 80-81): “A vulnerabilidade da família pobre, quando centrada no pai/provedor, ajuda a explicar a freqüência de rupturas conjugais, diante de tantas expectativas não cumpridas, para o homem, que se sente fracassado, e para a mulher, que vê rolar por água abaixo suas chances de ter alguma coisa através do projeto de casamento. [...] As famílias pobres dificilmente passam pelos ciclos de desenvolvimento do grupo doméstico, sobretudo pela fase de criação dos filhos, sem rupturas, o que implica altera- ções muito freqüentes nas unidades domésticas. As dificuldades enfrentadas para a realização dos papéis familiares no núcleo conjugal, diante de uniões instáveis e empregos incertos, levam a desencadearem-se arranjos que envolvem a rede de parentesco como um todo, para viabilizar a existência da família, tal como a concebem.” 15 Informações mais detalhas sobre estas questões podem ser encontradas em Montali (1998a e 1988b), de onde foram extraídas. 16 A taxa de atividade das mulheres no mundo desenvolvido experimentou forte progressão, passando de 38% em 1970 para 52% em 1990; atualmente as mulheres representam cerca de 44% da população economicamente ativa (Hirata, 1997). Na América Latina, as mulheres representavam 21,1% da PEA em 1970, passaram a 25,3% em 1980 e a 28,1% em 1990 (Valdés e Gomáriz, 1995, apud Abramo, 1997). 17 No ano de 1996, 38,3% das mulheres ocupadas estavam inseridas em ocupações precárias (assalariadas sem carteira assinada e autônomas: 25,8%; empregadas domésticas sem carteira de trabalho e diaristas: 13%), contra 35,4% dos homens (assalariados sem carteira assinada e autônomos: 35%; empregados domésticos sem carteira de trabalho e diaristas: 0,4%). Comparandose estes dados com os valores observados em 1989, verifica-se que apesar das maiores proporções de mulheres em inserções precárias que os homens, tanto em 1989 (34,2%) como em 1996 (38,3%) foi menor a intensidade do crescimento de inserções precárias para as mulheres (de 12%) do que para os homens (de 36%). Dentre os homens ocupados, 26% estavam em inserções precárias em 1989 e 35,4% em 1996 (Fundação Seade, 1997). 18 Utilizando como referências Gore (1995) e Rogers (1995), Posthuma e Lombardi (1997) definem quatro formas de exclusão social em relação ao mercado de trabalho: desemprego aberto; formas precárias de inserção no mercado de trabalho; formas de trabalho não remunerado; exclusão das oportunidades para desenvolver novas habilidades. As três últimas formas, que comumente envolvem o trabalho feminino, “poderiam constituir-se em uma espécie de ‘inserção excluída’” (Posthuma e Lombardi, 1997, p. 125). 19 Os tipos de família foram construídos a partir da estruturação das famílias (biparentais e monoparentais) e dos momentos do ciclo vital familiar. 20 Tais rearranjos são apresentados aqui de maneira bastante indicativa. Análises mais detalhadas podem ser encontradas em Montali (1998a e 1998b). FAMÍLIA E TRABALHO NA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA 69 BIBLIOGRAFIA ABRAMO, Laís. 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