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A sustentabilidade na arquitetura e urbanismo

Por:   •  13/7/2016  •  Trabalho acadêmico  •  64.016 Palavras (257 Páginas)  •  876 Visualizações

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UNIVERSIDADE FEDERALDEMINASGERAIS NÚCLEODE PÓSGRADUAÇÃOEMARQUITETURAEURBANISMO DIANNASANTIAGOVILLELA A SUSTENTABILIDADENA FORMAÇÃOATUAL DOARQUITETOEURBANISTA BeloHorizonte EscoladeArquiteturadaUFMG 2007 DiannaSantiagoVillela ASUSTENTABILIDADENA FORMAÇÃOATUAL DOARQUITETOEURBANISTA Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado do Núcleo de Pós-Graduação da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do títulodeMestreemArquiteturaeUrbanismo. Área de concentração:Teoria, Produção e Experiência do Espaço. Orientador:RobertoLuísdeMeloMonte-Mór BeloHorizonte EscoladeArquiteturadaUFMG 2007 FICHA CATALOGRÁFICA Villela, Dianna Santiago V735s A sustentabilidade na formação atual do arquiteto e urbanista / Dianna Santiago Villela - 2007. 179f. : il. Orientador: Roberto Luís de Melo Monte - Mór Dissertação (mestrado) - Universidade Federal de Minas Gerais, Escola de Arquitetura. 1. Arquitetura – Estudo e ensino 2. Desenvolvimento sustentável 3. Educação ambiental 4. Ambientalismo 5. Arquitetura – Aspectos ambientais I. Monte-Mor, Roberto Luís de Melo II. Universidade Federal de Minas Gerais. Escola de Arquitetura III. Título CDD : 720.47 DiannaSantiagoVillela ASUSTENTABILIDADENA FORMAÇÃOATUAL DOARQUITETOEURBANISTA Dedico este trabalho a todos que, de alguma maneira, tentam ajudar o nosso planeta e seus habitantes.Mesmo quando o atoépequeno, paraumobjetivo grande demais. AGRADECIMENTOS ADeus, porSuapresençaconstanteemtodos osmomentosdaminhavida.. Ameumarido, CesarDurão,companheiro, amigo, emeuamoreterno. A meus pais, Alvaro e Marcia, a quemdevo minha educação e muito da minha formação, espero que este trabalhoretribuaumpouco. Àsminhasirmãs, AlessandraeSabrina, emeuirmãozinho, Pedro Murillo, quesempremefizeram sermaisfeliz. Àtodaminhafamília,meusavós, tios, primos, sogrosecunhadas, peloapoiomesmoàdistância. Aosmeus grandes amigos, os de anos, e aqueles que fiz ao longo do desenvolvimento do meu trabalho.Em especialaosamigosdomestrado, aogrupoDoisirmãos, eàsamigasMariaFernandaOppermannBentoeVeraFerreiraCrespo, que, cadaumaàsuamaneiracontribuiumuitocomotérminodestetrabalho. Ao meu orientador Roberto Monte-Mór, pelo acompanhamento equilibrado, dosando direcionamento seguro e consistente e liberdade para a elaboração do trabalho. ÀorganizaçãodoOperaprima, quemeforneceutodos osdadosnecessários. Atodos aqueles que responderamaos questionários oume ajudarama distribuir osmesmos.Emespecial aos ganhadoresdoOperaprima. Atodosquefizerampartedomeutrabalho, ouqueapenasfazempartedaminhavida. A Arquitetura não pode salvar o mundo, mas pode agir como um bom exemplo. Alvar Aalto RESUMO Este trabalho tem por objetivo central analisar se a sustentabilidade tem sido suficientemente abordada e discutida na formação do arquiteto e urbanista. O conceito de sustentabilidade, apesar de bastante utilizado, é amplo e falta-lhe, além de precisão, conteúdo. Portanto, tenta-se explicá-lo com base em suas múltiplas definições e seu surgimento, bem como tendências anteriores ao conceito. Para averiguar o discurso atual da inserção da sustentabilidade na formação do arquiteto, são pesquisadas e discutidas as diretrizes curriculares gerais, assim como os programas de alguns cursos de graduação, em arquitetura e urbanismo no país. Em seguida, são apresentados os conceitos de educação ambiental e educação para a sustentabilidade, tomados como necessários para dar suporte e embasamento à formação do arquiteto. Posteriormente, são apresentados os resultados de uma pesquisa realizada, através de questionários com estudantes de arquitetura, arquitetos e, em seguida, com os premiados do Concurso Opera Prima de 2001 a 2006, para verificar, através da opinião dos jovens arquitetos, como tem sido percebida a abordagem e discussão da sustentabilidade nos cursos de arquitetura e urbanismo. Os resultados mostram que a sustentabilidade não tem sido suficientemente abordada na graduação, e isto pode, e deve estar afetando a formação atual do arquiteto e urbanista, que termina a graduação sem uma visão global. Aqueles que se interessam particularmente pelo tema procuram cursos de pós-graduação nessa área específica sem que, todavia, a sustentabilidade arquitetônica e urbanística como um todo faça parte da bagagem teórica e técnica do arquiteto. Entretanto, há um consenso entre os arquitetos e estudantes entrevistados que a formação do arquiteto deve incluir questões de sustentabilidade, referentes à melhoria e qualidade de vida humana em plena integração com a natureza. Assim, esta questão deve ser prioridade para o ensino profissional básico e não restrita a disciplinas optativas ou pósgraduações. ABSTRACT The objective of this work is to analyze if sustainability has been sufficiently discussed through the architect and urban designer’s formation. Although largely used, the vast concept of sustainability lacks precision and content. The effort to explain it is based on definitions, as well as on the previous trends to the concept. The architecture undergraduate program of some Brazilian universities is searched in order to investigate the current influence of sustainability in the architect's education. Also, environmental education is discussed to emphasize the importance of learning sustainability for the architect's and city planner's intellectual growth. Lastly, the results of an interview with architecture students, architects, and “Opera Prima” awarded students (between 2001 and 2006) are presented showing through the young architect’s opinions how the discussion about sustainability has been perceived in architecture and urban design programs. The results show that sustainability has not been enough discussed in the undergraduate courses. It can and probably is affecting the architect and urban designer’s formation since they graduate without a global vision about the subject. The ones especially interested in this topic look for graduate courses in this area. Architects and students interviewed have the common belief that the architect’s formation should include issues about sustainability since these are important issues for improvement of human life quality and it’s full integration with nature. This topic should be a priority in the basic professional education and not restricted to elective classes and graduate programs. LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 Logo marca da WWF 45 FIGURA 2 WWF-Brasil no Rio de Janeiro 45 FIGURA 3 “Chega de caça às baleias!” 46 FIGURA 4 Campanha “Energia Renovável Já!” 46 FIGURA 5 Logo e Lema Green Cross 47 FIGURA 6 Certificação Blue Angel 47 FIGURA 7 Selo verde CNDA (Conselho Nacional de Defesa Ambiental) 48 FIGURA 8 Selo verde – Programa de rotulagem ambiental ISO-14020 50 FIGURA 9 Selo Procel 50 FIGURA 10 Sidwell Friends Middle School – certificação LEED Platina 52 FIGURA 11 Casa da Cascata, Pensilvânia, EUA, arquiteto Frank Lloyd Wright, 1936 62 FIGURA 12 Arcosanti, deserto do Arizona, EUA, arquiteto Paolo Soleri 63 FIGURA 13 Fukuoka Prefectural Internacuional Hall – Edifício em Fukuoka, Japão, projetado por Emilio Ambasz e associados. 65 FIGURA 14 Pergola Building, Costa Rica, arquiteto Bruno Stagno, 2003 65 FIGURA 15 Construção circular da comunidade de Y Felin Uchaf 66 FIGURA 16 Centro Cultural Jean-Marir Tjibau, Noumea, arquiteto Renzo Piano, 1998 67 FIGURA 17 Crianças separando resíduos em um aterro sanitário 75 FIGURA 18 Moradias irregulares na cidade 76 FIGURA 19 Parque Rota das Cachoeiras: Implantação/ Cobertura 124 FIGURA 20 Parque Rota das Cachoeiras: Vista Frontal - Centro de Educação Ambiental 124 FIGURA 21 Arquitetura x Meio Ambiente: Perspectiva do edifício 127 FIGURA 22 Torre Bioclimática: Perspectiva aérea 129 FIGURA 23 Cantina e Casa Noturna: Foto da maquete do projeto 131 FIGURA 24 Cantina e Casa Noturna: Vista do interior 132 FIGURA 25 Usina de Tratamento de Resíduos Sólidos: Perspectiva 133 FIGURA 26 Centro De Referência Ambiental Lobo-Guará: Foto da maquete 136 FIGURA 27 Escola Náutica: Foto da maquete 138 FIGURA 28 Casa De Caranguejo Caminho Butantã: Centro de estudos do mangue 141 FIGURA 29 Casa De Caranguejo Caminho Butantã: Elevação grelha estrutural em pré-fabricados de concreto preenchida por containers expropriados 141 FIGURA 30 Núcleo De Difusão Cultural: Perspectiva geral 142 FIGURA 31 Núcleo de Educação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável 147 FIGURA 32 Habitação Social em Madeira Industrializada 148 LISTA DE QUADROS QUADRO 1 Comparação entre matérias do currículo mínimo de 1969 e de 1994 85 LISTA DE TABELAS TABELA 1 Questão sobre a definição de desenvolvimento sustentável: Avaliação das respostas por profissão 109 TABELA 2 Conhecimento e interesse 110 TABELA 3 Impacto das edificações 110 LISTA DE GRÁFICOS GRÁFICO 1 Classificação dos 115 entrevistados, por período na graduação ou ano de formado. 112 GRÁFICO 2 Conhecimento sobre o conceito de sustentabilidade na arquitetura e urbanismo, por grupamentos de período na graduação e ano de formatura. (Total de 115 entrevistados) 113 GRÁFICO 3 Conhecimento sobre o conceito de sustentabilidade na arquitetura e urbanismo, por % de respondentes em cada item. 114 GRÁFICO 4 Abordagem do assunto na graduação, por % de respondentes em cada item. 114 GRÁFICO 5 Abordagem do assunto na graduação, por grupamentos de período na graduação e ano de formatura. 115 GRÁFICO 6 Como melhorar a discussão sobre sustentabilidade e arquitetura/urbanismo na graduação, por grupamentos de período na graduação e ano de formatura. 116 GRÁFICO 7 Como melhorar a discussão sobre sustentabilidade e arquitetura/urbanismo na graduação, por % de respondentes em cada item. 116 GRÁFICO 8 Classificação dos 50 entrevistados quanto ao ano do concurso. 149 GRÁFICO 9 Abordagem do assunto na graduação, por % de respondentes em cada item. 149 GRÁFICO 10 Abordagem do assunto na graduação, por concurso. 150 GRÁFICO 11 Abordagem do assunto no trabalho final, por concurso. 151 GRÁFICO 12 Abordagem do assunto no trabalho final, por % de respondentes em cada item. 152 GRÁFICO 13 Opinião sobre abordagem da sustentabilidade na formação atual do arquiteto, por % de respondentes em cada item. 152 GRÁFICO 14 Abordagem do assunto na graduação, por concurso. 153 GRÁFICO 15 Como melhorar a discussão sobre sustentabilidade na graduação de arquitetura/ urbanismo, por % de respondentes em cada item. 153 GRÁFICO 16 Opinião sobre abordagem da sustentabilidade na formação atual do arquiteto, por % de respondentes em cada item (Total de 165 questionários). 154 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ABEA - Associação Brasileira de Ensino de Arquitetura e Urbanismo ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas AGCB - Associação Green Cross Brasil BREEAM - Building Research Establishment Environmental Assessment Method CANTOAR - Canteiro Oficina de Arquitetura CDS-UNB - Centro de Desenvolvimento Sustentável da Universidade de Brasília CEAU - Comissão de Especialistas de Ensino de Arquitetura e Urbanismo CIMA - Comissão Interministerial para a Preparação da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento CNDA - Conselho Nacional de Defesa Ambiental CMMAD - Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento CO2 - Gás carbônico CONAMA - Conselho Nacional do Meio Ambiente DNOCS - Departamento Nacional de Obras contra a Seca DS - Desenvolvimento Sustentável EA - Educação Ambiental EDS - Educação para Desenvolvimento Sustentável EIA - Estudos de Impacto Ambiental EUA - Estados Unidos da América FAAP - Fundação Armando Alvares Penteado FAU - Faculdade de Arquitetura e Urbanismo FSC - Forest Stewardship Council (Conselho de Manejo Florestal) IBAMA - Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IBGE - Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IED - Istituto Europeo di Design IFOCS - Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas IPCC - Intergovernmental Panel on Climate Change IOCS - Inspetoria de Obras Contra as Secas ISO - International Organization for Standardization IUCN - União Internacional pela Conservação da Natureza LDB - Lei de Diretrizes e Bases MCT - Ministério da Ciência e Tecnologia MEC - Ministério da Educação MMA - Ministério do Meio Ambiente do Brasil NABERS - National Australian Building Environmental Rating System NPGAU - Núcleo de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo NR - Norma Regulamentadora ONGs - Organizações Não-Governamentais ONU - Organização das Nações Unidas OSCIP - Organização da Sociedade Civil de Interesse Público PIB - Produto Interno Bruto PIEA - Programa Internacional de Educação Ambiental PNUD - Programa das Nações Unidas de Desenvolvimento PNUMA - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente POPs - Poluentes orgânicos persistentes PROARQ-UFRJ - Programa de Pós-Graduação em Arquitetura da FAU UFRJ PROCEL - Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica PRODEMA - Programa Regional de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente PROURB-UFRJ - Programa de Pós-Graduação em Urbanismo da FAU UFRJ PUC MINAS - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais PUC RS - Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul PVC -Policloreto de vinila SEMA - Secretaria Especial do Meio Ambiente SEMAM - Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República SESP - Serviço Especial de Saúde Pública SINIMA - Sistema Nacional de Informações sobre o Meio Ambiente SISNAMA - Sistema Nacional do Meio Ambiente UEL - Universidade Estadual de Londrina UFBA - Universidade Federal da Bahia UFF - Universidade Federal Fluminense UFJF - Universidade Federal de Juiz de Fora UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais UFMS - Universidade Federal de Mato Grosso do Sul UFPA - Universidade Federal do Pará UFPE -Universidade Federal de Pernambuco UFPR - Universidade Federal do Paraná UFRJ - Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRGS - Universidade Federal do Rio Grande do Sul UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina UMA - Universidade Livre da Mata Atlântica UnB - Universidade de Brasília UNCTAD - Confederação das Nações Unidas Sobre o Comércio-Desenvolvimento UNE - União Nacional dos Estudantes UNESCO - United Nations Education, Scientific and Cultural Organization UNEP - United Nations Environment Programme UNICAMP - Universidade Estadual de Campinas UNIFOR - Universidade de Fortaleza UNILIVRE - Universidade Livre do Meio Ambiente UNIRITTER - Centro Universitário Ritter dos Reis UNISINOS – Universidade do Vale do Rio dos Sinos UNOPAR - Universidade do Norte do Paraná USC - University of Southern Califórnia USGBC - United States Green Building Council USP - Universidade de São Paulo WBCSD - World Business Coucil for Sustainable Development (Conselho Empresarial Mundial para o desenvolvimento Sustentável) WSSD - World Summit on Sustainable Development WWF - World Wide Fund For Nature (Fundo Mundial para a Natureza) SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 17 1.1 Contextualização 23 1.2 Justificativa 27 1.3 Objetivos 29 1.3.1 Objetivo geral 29 1.3.2 Objetivos específicos 29 1.4 Delimitações do trabalho 29 1.5 Procedimentos metodológicos 30 1.5.1 Etapas da pesquisa 30 1.6 Organização do trabalho 31 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 33 2.1 A origem do termo 33 2.1.1 Os eventos internacionais do ambientalismo 33 2.1.1.1 As dimensões da sustentabilidade 36 2.1.2 O ambientalismo no Brasil 41 2.1.3 Organizações não-governamentais (ONGs) 44 2.1.4 Normas e selos de qualidade 47 2.1.4.1 Norma Regulamentadora (NR) 48 2.1.4.2 International Organization for Standardization (ISO) 49 2.1.4.3 Selo Procel 50 2.1.4.4 Leadership in Energy and Environmental Design (LEED) 51 2.1.5 Movimento ambientalista: as áreas do pensamento ecológico 52 2.2 A problemática da sustentabilidade 55 2.3 A sustentabilidade: uso na arquitetura e urbanismo 57 2.3.1 Organicismo 60 2.3.2 Arquitetura Orgânica 62 2.3.3 Arquitetura bioclimática 64 2.3.4 Arquitetura ecológica 66 2.4 Considerações sobre a sustentabilidade na arquitetura e no urbanismo 67 3 EDUCAÇÃO AMBIENTAL E SUSTENTBILIDADE NO ENSINO DE ARQUITETURA E URBANISMO 69 3.1 Consciência ambiental 70 3.1.1 As linhas de pensamento: capitalistas selvagens x ambientalistas fanáticos 71 3.1.2 Defensores ambientais: consciência ambiental x mudança de atitude 72 3.1.3 A segunda linha de pensamento 73 3.1.3.1 Pobreza x Meio ambiente 75 3.2 Educação ambiental 77 3.3 Educação para o desenvolvimento sustentável (EDS) ou Educação para a Sustentabilidade 79 3.4 Ensino de arquitetura 81 3.4.1 Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso graduação em Arquitetura e Urbanismo 83 3.4.2 Graduação, cursos de capacitação, projetos de extensão e pesquisas 88 3.4.3 Pós-graduação em arquitetura e urbanismo 95 3.4.4 Considerações sobre a sustentabilidade no ensino de arquitetura 102 4 A PESQUISA E O OPERA PRIMA 106 4.1 Pesquisa quantitativa 111 4.2 Pesquisa qualitativa: Opera prima 118 4.2.1 Concurso Opera Prima - Concurso Nacional de Trabalhos Finais de Graduação em Arquitetura e Urbanismo 119 4.2.2 Opera Prima 2001 121 4.2.2.1 Ecoturismo: Parque Rota das Cachoeiras - Thais Inês Krambeck, UFSC 122 4.2.3 Opera Prima 2002 124 4.2.3.1 Arquitetura x Meio Ambiente - Fabio Toffano, UFF 125 4.2.3.2 Torre Bioclimática: Conservação de Energia e Fontes Alternativas –Juliana Iwashita, USP 128 4.2.4 Opera Prima 2003 129 4.2.4.1 Cantina e Casa Noturna: Il Vecchio Mulino - Luciano Lerner Basso, PUC-RS 130 4.2.4.2 Usina de Tratamento de Resíduos Sólidos - Kim Ribeiro Ruschel, Centro Universitário Belas Artes de São Paulo 132 4.2.5 Opera Prima 2004 133 4.2.5.1 Centro De Referência Ambiental Lobo-Guará - Mara Oliveira Eskinazi, UFRGS 135 4.2.5.2 Escola Náutica: Intervenção Na Orla Do Lago Paranoá – Izabel Torres Cordeiro, UnB 137 4.2.6 Opera Prima 2005 138 4.2.6.1 Casa De Caranguejo Caminho Butantã / Zona Noroeste / Santos -Pablo Iglesias, USP 139 4.2.6.2 Núcleo De Difusão Cultural - Ricardo Alexandre Packer, Universidade Regional de Blumenau 141 4.2.7 Opera Prima 2006 143 4.2.7.1 Núcleo de Educação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável – Clariane Menegusso Nogueira, UFMS 146 4.2.7.2 Habitação Social em Madeira Industrializada - Estela Cristina Somensi, UFSC 147 4.2.8 Análise e interpretação dos dados / apresentação dos resultados 148 4.3 Análise das duas pesquisas 154 4.4 Considerações finais da pesquisa 154 5 CONCLUSÃO 157 REFERÊNCIAS 161 APÊNDICES 168 APÊNDICE A Questionário estudante 168 APÊNDICE B Questionário arquiteto 170 APÊNDICE C Questionário premiados Concurso Opera Prima 172 ANEXO Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de graduação em Arquitetura e Urbanismo de 2006 174 17 Atingir o objetivo de uma cidade sustentável não é uma meta utópica, ela depende de uma série de ações perfeitamente alcançáveis, conquanto algumas difíceis por fortes injunções culturais, políticas e econômicas. [...] A médio e longo prazos, a saída está no que se conseguir fazer hoje no sistema educacional. [...] As tarefas podem ser gigantescas, mas pelo menos estão evidentes. Alfredo Sirkis 1 INTRODUÇÃO Durante muito tempo julgou-se que a Terra era um lugar de recursos infinitos, que estes nunca seriam preocupação para a humanidade e que o homem não poderia afetá-la de forma incisiva ou irreparável. Porém a partir da Revolução Industrial, que se espalhou pelo mundo com processos produtivos geradores de riquezas, mas altamente poluentes, a degradação ambiental inicia um percurso, que só pode ser freado com a participação efetiva e conscientização de toda a sociedade (PINHEIRO, 2002, p. 11). A Revolução Industrial foi um fenômeno que ocorreu de forma gradativa a partir de meados do século XVIII. Tendo início na Inglaterra, a Revolução provocou mudanças nos meios de produção, afetando a economia e a sociedade. Enquanto o período medieval era praticamente agrário e artesanal, o período industrial iniciou-se com a mecanização dos meios de produção. Além disso, proporcionou o comércio em escala mundial. Os grandes latifundiários, os senhores feudais, bem como a estrutura agrária feudal, entraram em franco declínio, dando lugar para a burguesia, que, ávida por maiores lucros, menores custos e produção acelerada, buscava alternativas para melhorar e aumentar a produção de mercadorias. Vê-se aí o capitalismo da burguesia industrial emergente. Nessa época, observa-se um grande salto tecnológico, tanto no maquinário para a produção, quanto nos transportes. Um dos grandes exemplos é a invenção da máquina a vapor. Na área dos transportes, destacavam-se as locomotivas e trens a vapor, a melhoria generalizada dos transportes, tanto ferroviários quanto marítimos, mas também nas redes de estradas. Com o enorme aumento da produtividade, em função da utilização dos equipamentos mecânicos, da energia a vapor e, posteriormente, da eletricidade, passaram a substituir e dispensar parte da força humana. Juntando-se a isso, as verdadeiras explosões demográficas, seguidas pelo êxodo rural, e assim por um grande excesso de mão-de-obra nas grandes cidades, observa-se uma enorme quantidade de desempregados e também de diminuição dos salários dos trabalhadores. Além dos salários recebidos pelos empregados serem extremamente baixos, as condições de trabalho nas fábricas eram deploráveis. Os empregados trabalhavam 12, 14 e até 18 horas por dia, e ainda estavam sujeitos a castigos físicos. As máquinas eram desprotegidas e ocasionavam freqüentes acidentes de trabalho, muitas vezes até mutilando os trabalhadores. Os 18 ambientes eram sujos, abafados e com péssima iluminação. Em relação às habitações da grande maioria, a situação era igualmente precária. Pode-se dizer que: tomando-se como ponto de partida as denúncias dos higienistas e dos reformadores sociais na primeira metade do século XIX, considera-se confirmado o fato de que a qualidade das moradias piorou, em conseqüência da pressa e das exigências especulativas (BENEVOLO, 1976, p. 56). Os trabalhadores mais pobres moravam em horríveis ambientes, muitas vezes quartos de porão, destituídos de luz, água e esgoto. As casas, desde que ficassem de pé (ao menos temporariamente), e desde que as pessoas que não tinham outra escolha pudessem ser induzidas a ocupá-las, ninguém se importava se eram higiênicas ou seguras, se tinham luz ou ar ou se eram abominavelmente abafadas (CROOME; HAMMOND1 , citado por BENEVOLO, 1976, p. 71). Algumas conseqüências nocivas da revolução foram, além do êxodo rural aliado ao crescimento desordenado urbano, o grande aumento da poluição sonora e atmosférica, o desemprego, o grande número de mendigos, e também a fome, miséria, a precariedade dos ambientes de trabalho e moradia, que também levava à epidemia de várias doenças. É interessante ressaltar que o aumento da população é acompanhado e acompanha o grande desenvolvimento na produção. Benévolo (1976, p.22) comenta que “O incremento demográfico e o industrial influenciam-se mutuamente de modo complicado”. Assim, com o aumento da população, conseqüentemente das cidades, das distâncias e dos transportes, são necessárias e passam a ser construídas, estradas mais amplas, canais mais largos e profundos, novas moradias, e edifícios públicos maiores. Além disso, cresce rapidamente o desenvolvimento das vias de transporte, tanto por terra quanto por água, e a multiplicação e diversidade de tarefas e o impulso dado pelas especializações requerem tipos novos de construções. “A revolução Industrial modifica a técnica das construções, embora possa fazê-lo de maneira menos visível do que em outros setores”(BENEVOLO, 1976, p. 35). A máquina, a qual na primeira metade do século XIX está invadindo a indústria, em certa medida, também começa a invadir os canteiros de obra, difundindo-se o uso das máquinas de construir. Os progressos científicos permitiam que os materiais fossem utilizados mais conveniente e racionalmente. Eram inventados mecanismos capazes de medir a resistência dos materiais, e aos materiais tradicionais uniam-se novos materiais como o ferro gusa, o vidro e mais tarde o concreto. O ferro e o vidro já eram anteriormente empregados na construção (o ferro era utilizado para tarefas acessórias como correntes e tirantes), mas foi nesse período que os progressos da indústria permitiram que seus usos fossem ampliados e que novas técnicas fossem introduzidas. Alguns exemplos são a difusão do uso do vidro para janelas em lugar do papel, o 1 CROOME, H.M.; HAMMOND, R.J. Storia economica dell` Inghilterra. Milão: [s.n.], 1951. 19 uso da ardósia ou de telha para coberturas, ao invés da palha, o ferro e a gusa para cercas, balaustradas e utensílios de fechar e clarabóias em ferro e vidro. Na geometria, os progressos permitiam que se representassem por desenhos, de modo rigoroso, todos os aspectos da construção. As duas principais invenções tiveram origem na França: a invenção da geometria descritiva e a introdução do sistema métrico decimal. Assim, na medida que evoluíam as técnicas e materiais na construção civil, bem como as representações projetuais em função dos progressos na geometria, surgiam propostas de ordenamento urbano, imagens da cidade futura ideal e críticas às cidades industriais. Iniciava-se assim uma conscientização de parte da sociedade que se preocupava e estudava formas de melhorar a cidade e suas edificações. O estudo da cidade no século XIX denunciava, de forma crítica, a precária higiene física e moral das grandes cidades industriais, tais como os ambientes insalubres do trabalhador, as enormes distâncias entre a habitação e o trabalho, os lixões deploráveis e amontoados, a falta de jardins públicos nos bairros populares, o grande contraste entre os bairros habitados pelas diferentes classes sociais, entre outros. Choay (1979) classificou os modelos ideais urbanísticos como progressista, culturalista e naturalista. Os urbanistas progressistas, tais como Le Corbusier e seus discípulos, defendiam a geometria, a simetria e a ortogonalidade, sendo representantes do estilo internacional, onde as formas puras, retas e simples poderiam ser locadas em qualquer local. Para Le Corbusier2 (citado por CHOAY, 1979, p. 184, 188, 194) A grande cidade é hoje uma catástrofe ameaçadora, por não ter sido mais animada por um espírito de geometria.[...] A cidade atual morre por não ser geométrica.[...] Ora, uma cidade moderna vive praticamente de linhas retas. [...] A circulação exige a linha reta. A reta é sadia também para a alma das cidades. A curva é prejudicial, difícil e perigosa; ela paralisa. [...] A rua curva é o caminho dos asnos; a rua reta, o caminho dos homens. O modelo progressista e o modelo culturalista eram praticamente um a antítese do outro. Do lado oposto, o culturalista, Camillo Sitte3 (citado por CHOAY, 1979, p. 207), defendia: Por que suprimir a qualquer preço as desigualdades do terreno, destruir os caminhos existentes e até desviar cursos d´água para obter uma banal simetria? Melhor seria, pelo contrário, conserva-los com alegria, para motivar quebras nas artérias e outras regularidades. [...] além disso, essas irregularidades permitem que nos orientemos facilmente através do labirinto das ruas e, até certo ponto de vista da higiene, não deixam de ter suas vantagens. É graças às curvas e aos cortes de suas artérias que a violência do vento é menos sensível nas cidades antigas. Ele somente sopra com força sobre os tetos, ao passo que, nos bairros modernos, ele se engolfa pelas ruas retas de modo bem desagradável, até mesmo prejudicial à saúde. 2 LE CORBUSIER [Charles Edouard Jeanneret-Gris]. Urbanisme. Paris: Crès, 1923. 3 SITTE, Camillo. L`art de bâtir dês villes. Genebra: Atar; Paris: H. Laurens, 1918. 20 O modelo naturalista, liderado pelo arquiteto Frank Lloyd Wright, teve seu correspondente no pré-urbanismo chamado de antiurbanismo americano, que ainda não apresentava qualquer modelo. A tradição antiurbana começou com Thomas Jefferson, e depois com Emerson, Thoreau, Henry Adams, Henry James e Louis Sullivan, e não obteve o alcance das correntes progressistas e culturalistas, mas teve grande influência sobre o urbanismo americano do século XX. O modelo naturalista apresentou algumas características progressistas e outras culturalistas, e foi elaborado com o nome de Broadacre-City. O progresso técnico teve grande importância em seu modelo, mas o ponto focal é a natureza. Frank Lloyd Wright4 (citado por CHOAY, 1979, p. 237) dizia que: Se a livre disposição do solo se baseasse em condições realmente democráticas, a arquitetura resultaria autenticamente da topografia; dito de outra forma, os edifícios assemelhar-se-iam, em uma infinita variedade de formas, à natureza e ao caráter do solo sobre o qual estivessem construídos; seriam parte integrante dele. [...] Broadacre seria edificada em tal clima de simpatia para com a natureza que a sensibilidade peculiar ao lugar e a sua própria beleza constituiriam um requisito fundamental exigido pelos novos construtores de cidades. A beleza da paisagem seria procurada não como um suporte, mas como um elemento da arquitetura. Além dos modelos urbanísticos e pré-urbanísticos, algumas críticas sem modelo como as de Engels e Marx tiveram grande importância. Eles criticaram as grandes cidades industriais contemporâneas sem propor algum modelo de cidade ideal, pois achavam impossível prever um futuro planejamento. Para eles a perspectiva de uma ação transformadora substituía os irreais modelos. No século seguinte surge, em função dos modelos e de algumas realizações, uma nova crítica, uma crítica de segundo grau. A primeira crítica foi classificada por Choay (1979) como Tecnotopia, tendo como alguns de seus representantes Henard, Xenakis, P. Maymont, Fitzgibbon, Friedman, Kikutake, Schultze-Fielitz, e O. Hansen. Baseava-se principalmente nas novas possibilidades tecnológicas, tornando as cidades futuristas, como por exemplo, a cidade sobre estacas, a cidade cósmica vertical, o urbanismo subterrâneo. Uma característica de bastante destaque era a preocupação com o aumento da população mundial, assim todas propõem concentrações humanas, liberando a superfície terrestre pelo avanço no subsolo, no mar, na atmosfera. Outra crítica de segundo grau foi classificada por Choay (1979) como Antrópolis. Ela pode ser qualificada de humanista, e foi desenvolvida por sociólogos, psicólogos, historiadores e economistas. Dividiu-se em três tendências: a primeira relaciona-se com o contexto espaçotemporal da localização humana e se destaca Patrick Geddes, seu discípulo Lewis Munford, e 4 WRIGHT, Frank Lloyd. The living city. New York: Horizon Press, 1958. 21 Marcel Poete; a segunda aborda a higiene mental com Jane Jacobs e Leonard Duhl entre seus representantes; e a terceira sobre a percepção urbana com grande destaque a Kevin Lynch. Os modelos urbanísticos e as críticas, apesar de não terem adotado o discurso da sustentabilidade, traziam consigo preocupações com as questões ambientais, culturais, econômicas e sociais, referentes à época em questão, porém pertinentes e atuais. Como exemplo, pode-se citar a participação popular no processo decisório, que perseguida atualmente por nós, foi representada em Ícara, modelo de cidade ideal de Etienne Cabet. Cabet defendia a representação popular em cada discussão para descobrir e aplicar melhoramentos e aperfeiçoamentos. Leonard Duhl5 (citado por CHOAY, 1979, p.46) também afirmava que “é preciso encontrar meios que permitam a todos participar mais plenamente de decisões que lhes digam respeito assim tão vitalmente”. Assim, quem melhor que os próprios usuários para analisarem e discutirem o melhor para cada região, visto que “para situar corretamente o meio ambiente, não devemos considerar a cidade simplesmente como uma coisa em si, mas tal como seus cidadãos a percebem” (LYNCH 6 , citado por CHOAY, 1979, p.309). Uma das características dos modelos urbanísticos dos séculos XIX e XX que faz parte atualmente do cotidiano de todas as cidades diz respeito à normalização e legislação. Cada modelo definia várias leis de planejamento e também da construção, tais como altura dos prédios, afastamentos das casas e edifícios, largura das ruas, obrigatoriedade de ventilação e iluminação natural em todos os cômodos, ângulos arredondados nas paredes, teto e piso, entre outros. Muitas das limitações não correspondiam e nem correspondem à realidade, mas várias outras ainda são aplicadas nas legislações das cidades, até porque, “limitações de gabarito, densidade, superfície, são absolutamente necessárias para as relações sociais reais” (GEDDES7 , citado por CHOAY, 1979, p. 43). Outra normalização da época se referia à formação das primeiras leis sanitárias, como a lei de 1834, que foi formulada por Edwin Chadwick logo depois que a cólera se propaga da França para a Inglaterra (BENEVOLO, 1976). Outro importante exemplo refere-se à habitação. Era enorme a importância dada a esse setor pelos progressistas. A solução progressista para o problema da habitação era o alojamento-padrão e os edifícios altos, que, conforme Gropius, diminuiriam custos e aumentariam qualidade, além de diminuir deslocamentos. No modelo naturalista preconizava-se o alojamento individual, e então, as residências unifamiliares teriam uma área mínima de terreno onde os ocupantes destinariam às hortas e aos lazeres diversos (CHOAY, 1979). 5 DUHL, Leonard. The urban condition. New York; London: Basic Books, 1963. 6 LYNCH, Kevin. The image of the city. Cambridge; Massachucetts: The Technology Press & Harvard University Press, 1960. 7 GEDDES, Patrick. Cities in evolution. London: Williams and Norgate Press, 1915. 22 Em relação aos espaços verdes livres e os urbanizados, uma das idéias de Mumford, com inspiração nas cidades medievais, era a concepção de integrar a natureza ao meio urbano, ligando às construções e ao habitat. Os espaços livres deveriam ter papel social e não só higiênico, ser ativos e não mortos. Dessa forma ele concluía que a cidade deveria ser, ao mesmo tempo, mais urbana e mais rural que os modelos progressistas. Leonard Duhl defendia que o vazio gratuito era angustiante, e que o verde precisava tomar forma e se localizar em pontos estratégicos (CHOAY, 1979). As preocupações urbanísticas no século XIX e início do XX eram, principalmente, com a melhoria da qualidade de vida do homem no meio ambiente construído, através de propostas referentes a espaços urbanos e ambientes bem arejados e com luz natural; preocupação com o lixo, com a limpeza dos espaços, e assim com a higiene e saneamento; com espaços verdes livres; com a sociabilidade do homem no espaço urbano; com o patrimônio cultural histórico; com a circulação (transporte e trânsito); com a habitação, etc. No que se trata do incentivo à conservação, reutilização e reciclagem de recursos, especialmente energia e água, e matérias primas, poluição do ar e sonora, e demais preocupações com o meio ambiente, são poucos os registros nessa época. Alguns, como Considerant, pensaram em aproveitar o calor perdido das cozinhas para aquecer estufas e banhos, assim como o aproveitamento das águas das chuvas para regar jardins, lavar fachadas ou ser utilizada em chafarizes e fontes. Também ocorreram tentativas ingênuas de filtros para purificação da fumaça, onde ela é desprovida das partículas de carbono e torna-se incolor, proveniente de lareiras residenciais como na cidade de Richardson, a Hygeia, e na Franceville de Julio Verne (CHOAY, 1979). Essa situação pode ser explicada devido à, até então não tão conhecida e difundida situação ambiental e energética nas grandes cidades. A preocupação com os problemas de deterioração ambiental começou a partir de meados da década de 1950, quando surgia o chamado ambientalismo dos cientistas. Na década de 60 proliferam vários processos que vão constituir o movimento ambientalista global, como organizações e grupos que lutam pela proteção ambiental e agências governamentais encarregadas desta proteção. Nesta época, as transformações progressivas no meio ambiente começam a ser mais percebidas, pois até então a natureza era entendida como infinita, e simplesmente matéria-prima do homem. Os recursos naturais que parecem esgotar-se não são apenas os mesmos do passado recente. Se antes eram os minérios, carvão, o petróleo, hoje se trata, também, da água, da atmosfera, que considerados recursos renováveis, parecem atingir um limite para sua recomposição, pois o tempo geológico contrasta cada vez mais com a velocidade de utilização. Velocidade intensificada no século XX. O buraco na camada de ozônio é um exemplo, a poluição das águas é outro. [...] os imensos depósitos de resíduos tóxicos, 23 demonstram a incapacidade, pelo menos atual, de destruir os “produtos/ resíduos” desta população (RODRIGUES8 , citado por MARTINS, 2001, p. 104.). 1.1 Contextualização Pela primeira vez na história metade da população mundial vive em um ambiente urbano. Aproximadamente 70% da população urbana do mundo vive na África, na Ásia ou na América Latina. Estima-se que a população urbana cresça 2% ao ano, entre 2000 e 2015, e que chegue a um total de 65% em 2050. Atualmente com mais de seis bilhões de habitantes, a população do mundo duplicou nos últimos sessenta anos, a do Brasil quadruplicou, e nas áreas urbanas brasileiras foi multiplicada por onze (PNUMA, 2004). As cidades brasileiras abrigavam, há menos de um século, 10% da população nacional. Atualmente são 82%. Incharam, num processo perverso de exclusão e de desigualdade. Como resultado, 6,6 milhões de famílias não possuem moradia, 11% dos domicílios urbanos não têm acesso ao sistema de abastecimento de água potável e quase 50% não estão ligados às redes coletoras de esgotamento sanitário. Em municípios de todos os portes, multiplicam-se favelas. A evidente prioridade conferida ao transporte individual em detrimento do coletivo tem resultado em cidades congestionadas de tráfego e em prejuízos estimados em centenas de milhões de reais (MINISTÉRIO DAS CIDADES, [200-]). Esse acentuado e desordenado crescimento urbano gera maior quantidade de consumo, com a conseqüente necessidade de aumento da infra-estrutura, da produção e dos deslocamentos, reduzindo recursos, energia, e aumentando resíduos. Esse quadro se complica ainda mais com o capitalismo, cujo maior interesse na produção é a valorização do capital, objetivando maiores lucros. Do ponto de vista ambiental, a natureza está vinculada a esses interesses econômicos, pois é utilizada simplesmente como recurso para produção de bens e eliminação de resíduos. Assim, a produção desenfreada aumenta a poluição do ar, das águas, o desmatamento das florestas e vegetações nativas, a extinção de animais e esgota as matérias primas e recursos finitos. São intensos os impactos sobre o meio ambiente. As implicações de um crescimento urbano acelerado incluem, além de degradação ambiental, desemprego crescente, serviços urbanos inadequados, sobrecarga da infra-estrutura existente, falta de acesso à terra, a financiamentos e à moradia adequada. Nas cidades dos países em desenvolvimento, uma em cada quatro famílias vive em estado de pobreza, sendo que 40% das famílias urbanas da África e 25% das famílias urbanas da América Latina vivem abaixo da linha de pobreza definida em cada país. Nas grandes cidades a situação piora, 40% da população da Cidade do México, e um terço da população de São Paulo vivem na linha da pobreza ou abaixo desta. No Brasil, em 100% dos municípios com mais de 500 mil habitantes existem grandes contingentes de moradias irregulares e grande concentração de favelas. Estas 8 RODRIGUES, Arlete M. (Org.). Meio ambiente: ecos da Eco. Campinas: Unicamp/IFCH, 1993. 24 irregularidades ocorrem também em quase 90% dos municípios com população entre 100 e 500 mil habitantes e em cerca de 60% dos que possuem de 20 a 100 mil habitantes. Este fenômeno acontece mesmo nas cidades pequenas, com até 20 mil habitantes, onde 36% possuem moradias irregulares (PNUMA, 2004; ROSETTO, 2003). Os problemas urbanos vão além das irregularidades, como colocado pela Secretaria Nacional de Saneamento Ambiental, cerca de 60 milhões de brasileiros, moradores em 9,6 milhões de domicílios urbanos, não dispõem de coleta de esgoto. Destes, aproximadamente 15 milhões (3,4 milhões de domicílios) não têm acesso à água encanada, e parte dos que a possuem não tem água potável diariamente e nem de qualidade. Também é grande a deficiência de tratamento de esgoto coletado. Quase 75% de todo o esgoto sanitário coletado nas cidades é despejado in natura, o que contribui decisivamente para a poluição dos cursos d'água urbanos e das praias (ROSETTO, 2003). Dessa forma, a água doce, que já foi considerada infinita, passou a despertar discussões quanto ao seu uso e destinação. Ela representa de 2,5% a 3% do total da água existente no mundo, sendo que 99,7% dela encontram-se nas geleiras e sob o solo, nos lençóis freáticos profundos. Grande parte é contaminada por esgotos industriais e urbanos, também são freqüentes as contaminações nos lençóis freáticos e córregos devido aos depósitos de lixo e produtos químicos. Aproximadamente um terço da população mundial vive em países que sofrem de estresse hídrico entre moderado e alto, onde o consumo de água é superior a 10% dos recursos renováveis de água doce. Falta água para cerca de 1,1 bilhão de pessoas em todo o mundo, e 2,4 bilhões carecem de saneamento adequado. A maior parte dessas pessoas vive na África e na Ásia. A falta de acesso à água potável e a serviços de saneamento causa centenas de milhões de casos de doenças associadas à água e mais de cinco milhões de mortes a cada ano. O Brasil, com uma das maiores reservas do planeta é um dos países que mais desperdiça esse recurso. O uso doméstico consome cerca de 10% do total, e economizar água faz muita diferença já que uma pessoa chega a consumir mais de 300 litros por dia na realização das suas atividades cotidianas (GREENPEACE, [200-]; PNUMA, 2004). Além da questão da água e do esgoto, 16 milhões de brasileiros não são atendidos pelo serviço de coleta de lixo. Nos municípios de grande e médio porte, onde o sistema convencional de coleta poderia atingir toda a produção diária de resíduos sólidos, esse serviço não atende adequadamente às moradias irregulares, favelas, e bairros populares, devido à precariedade da infra-estrutura viária naquelas localidades. Em 64% dos municípios o lixo coletado é depositado em lixões ao ar livre, e em muitos municípios pequenos sequer há serviço de limpeza pública minimamente organizado. A isso se soma a falta de drenagem, percebida 25 especialmente a cada chuva mais intensa, quando provoca alagamentos e enchentes nas áreas de estrangulamento dos cursos d'água (ROSETTO, 2003). A poluição do ar é uma das principais causas de doenças e da queda da qualidade de vida em geral. É um problema comum, principalmente nas áreas urbanas, devido ao crescente número de veículos automotivos e o tempo de percurso, em virtude do congestionamento viário. Os veículos produzem entre 80% e 90% do chumbo existente no meio ambiente, embora a gasolina sem chumbo já esteja disponível em muitos países há algum tempo (PNUMA, 2004). Desde a revolução industrial, a concentração de CO2, um dos principais gases de efeito estufa, na atmosfera aumentou de forma significativa, contribuindo para o efeito estufa, conhecido como aquecimento global. Esse aumento deve-se principalmente às emissões de CO2 pelo homem, provenientes da queima de combustíveis fósseis e, em um grau menor, a mudanças no uso da terra, à produção de cimento e à combustão de biomassa. As emissões desses gases destroem a camada de ozônio da Terra, que chegou a níveis recorde atualmente, principalmente na Antártida e, mais recentemente, também no Ártico. A proteção da camada de ozônio da Terra tem sido um dos maiores desafios nos últimos trinta anos, abrangendo as áreas de meio ambiente, comércio, cooperação internacional e desenvolvimento sustentável. Em setembro de 2000, o buraco da camada de ozônio sobre a Antártida cobria mais de 28 milhões de quilômetros quadrados. Os esforços contínuos da comunidade internacional resultaram em uma diminuição notável do consumo de substâncias que destroem a camada de ozônio. Prevê-se que a camada de ozônio começará a se recuperar em algumas décadas, mas somente se todos os países aderirem às medidas de controle dos protocolos à Convenção de Viena (PNUMA, 2004). Diversas regiões do planeta sofreram e sofrem enormes ondas de calor, inundações, secas e outros eventos climáticos extremos. Muitos especialistas associam essas tendências atuais com um aumento da temperatura média global. As temperaturas mundiais têm aumentado em quase 0,75ºC desde a virada do século e continuam aumentando. Os eventos climáticos extremos geram cada vez mais desastres. O número de pessoas afetadas por desastres aumentou de uma média de 147 milhões ao ano na década de 1980 para 211 milhões de pessoas ao ano na década de 1990. Embora o número de desastres geofísicos tenha permanecido bem constante, o número de desastres hidrometeorológicos, como secas, tempestades de vento e inundações, aumentou. Na década de 1990, mais de 90% das vítimas de desastres naturais morreram em eventos hidrometeorológicos (PNUMA, 2004). Em termos globais, cerca de 7% de todas as mortes e doenças se devem à água, ao saneamento e à higiene inadequados, e aproximadamente 5% são atribuídas à poluição do ar. A cada ano, os acidentes ambientais matam três milhões de crianças com até cinco anos de idade. 26 Estimativas sugerem que entre 40% e 60% dessas mortes se devem às infecções respiratórias agudas resultantes de fatores ambientais, particularmente emissões de partículas de combustível sólido (PNUMA, 2004). As diferentes concepções urbanísticas da atualidade também influenciam o meio ambiente, como por exemplo, a temperatura e o manejo da água. Ao passo que o subúrbio tradicional norte-americano alcança altos graus de permeabilidade devido aos seus gramados e jardins, mas sendo inviável do ponto de vista do transporte público e muito prejudicial ao ambiente natural por ocupar vastas áreas com densidades muito baixas, na maioria das cidades brasileiras acontece o oposto. Altas densidades são necessárias para cobrir o custo da infraestrutura e viabilizam a concentração de serviços, tornando possível melhores soluções de transporte público e conseqüentemente menor consumo de energia em geral. Porém, a taxa de ocupação é tão alta que são muito poucas as áreas permeáveis, para infiltração de água no solo. Isso causa sobre-aquecimento, devido à falta de evaporação, além de enchentes e inundações nas épocas de chuvas fortes. Na maior parte do sudeste do Brasil as chuvas giram em torno de 1500mm e estão concentradas nos meses de verão, dessa forma o excesso de chuva nessa época causa sérios problemas, além da falta de chuvas no inverno (informação verbal)9 . Para exemplificar, um lote de 12 x 30m em uma região onde chove 1600mm recebe aproximadamente 500.000 litros de águas pluviais por ano. Dado o consumo médio brasileiro de 150 litros por pessoa por dia, a quantidade de água pluvial em um único lote é o dobro do consumo médio de uma família de quatro pessoas. Essa água poderia ser usada pelo menos para usos não-potáveis, como descarga de sanitários, irrigação de jardins, lavagem de automóveis ou de pavimentos. Nesta mesma casa média de 100m2, a água coletada apenas pelo telhado (160.000 litros) seria bastante para o consumo de um ano inteiro em usos não-potáveis. Soluções de tratamento simples das águas pluviais, para evitar bactérias e fungos, custam bem menos que o valor da água tratada. A fim de reduzir ainda mais o volume das águas de chuva descarregado na rede pluvial, e aumentar a infiltração no solo, um único jardim, de 36m2 rebaixado 10cm do solo, pode coletar o volume inteiro de 10mm de chuva em poucas horas (80% dos dias de chuva anuais). Dado que a maioria dos solos no Brasil tem uma taxa de infiltração variável entre 10 a 25 mm por hora, um sistema simples de jardins ligeiramente rebaixados para receber as águas 9 Palestra ministrada pelo arquiteto e professor Fernando Lara no auditório da UNA, Campus Aimorés, dia 20 de agosto de 2007 sobre “Diversidade e sustentabilidade: dois desafios para a arquitetura do século XXI”. Fernando Lara é PhD e professor de Teoria e Prática de Projetos Arquitetônicos na graduação, mestrado e doutorado do Taubman College of Architecture, Universidade de Michigan, EUA. Dentre suas pesquisas recentes estão a análise da disseminação do movimento moderno e da homogeneidade das soluções habitacionais a nível global. 27 pluviais pode reduzir violentamente o volume de água que percorre as ruas e a rede publica, causando destruição e prejuízos nas áreas mais baixas (informação verbal)10 . No setor da construção civil os exemplos também são muitos, cerca de 80% da madeira amazônica é extraída ilegalmente, e a maior parte é consumida no Brasil na forma de móveis, forros, esquadrias, casas pré-fabricadas, entre outros. A construção civil no Brasil descarta 80% da madeira que usa, além de contribuir para emissão de substâncias altamente tóxicas à vida na Terra. A fabricação de PVC e materiais resistentes ao fogo, emite poluentes orgânicos persistentes (POPs) que contaminam o meio ambiente a longas distâncias. Já os materiais isolantes como, uréia-formaldeído, poliuretano, amianto, celulose, vermiculita e fibra de vidro sobre papel craft com adesivo asfáltico, emitem gases tóxicos que prejudicam o meio ambiente e seus habitantes, podendo inclusive causar câncer (GREENPEACE, [200-]). Muitos desses problemas, degradações e desastres continuarão ocorrendo por um bom tempo. Alguns tendem a aumentar, outros podem diminuir, porém grande parte do que acontecerá num futuro breve, já foi desencadeado por decisões e ações de políticas já adotadas. Forças descontroladas, tanto humanas como naturais, influirão no rumo dos acontecimentos, mas a tomada de decisões informada também tem um papel fundamental a ser desempenhado no processo de moldar o futuro (PNUMA, 2004). As opiniões diferem quanto ao rumo que o mundo está tomando. Dependendo de em quais indicadores o observador escolhe se basear, pode-se argumentar a favor de qualquer lado. Muitos argumentam que os casos de degradação já vistos em alguns sistemas sociais, ambientais e ecológicos anunciam colapsos futuros ainda mais fundamentais e generalizados. Esses mesmos grupos expressam uma preocupação particular com o fato de que não houve esforços para a criação de instituições que serão necessárias para lidar com essas situações desagradáveis. Outros enfatizam que pudemos lidar com a maior parte das crises que enfrentamos e que não há motivo para supor que não faremos o mesmo no futuro. A maior parte das pessoas permanece em suas rotinas diárias, deixando as questões de grande importância para os outros. Plus ça change, plus c’est la même chose; quanto mais as coisas mudam, mais continuam as mesmas (PNUMA, 2004, p. 357-358). 1.2 Justificativa [...] o meio ambiente ainda se encontra na periferia do desenvolvimento socioeconômico. A pobreza e o consumo excessivo, os dois males da humanidade que foram destacados nos dois relatórios anteriores do GEO, continuam a exercer uma pressão enorme sobre o meio ambiente. O resultado desastroso é que o desenvolvimento sustentável continua a se colocar como uma questão em grande parte teórica para a maioria da população mundial de mais de seis bilhões de pessoas. O nível de conscientização e ação não foi proporcional ao estado do meio ambiente global de hoje; ele continua a se deteriorar (PNUMA, 2004, p. XX). Nos últimos cem anos, o meio ambiente natural tem sofrido as pressões impostas pela quadruplicação da população humana, e por uma produção econômica mundial dezoito vezes 10 Para mais informações, ver site do arquiteto disponível em: . 28 maior (PNUMA, 2004). A humanidade, mesmo com a enorme variedade de tecnologias, recursos humanos, opções de políticas e informações técnicas e científicas à disposição, ainda não conseguiu romper de forma definitiva políticas e práticas insustentáveis e ambientalmente prejudiciais. A mobilização de diversos organismos, atores e instituições pela busca da conscientização da humanidade sobre as ações que os homens e seus padrões de produção e consumo causam no meio ambiente em que vivem, vem aumentando. As discussões, nas esferas políticas, sociais e econômicas, relativas à problemática do meio ambiente, vêm ganhando mais força. Porém, apesar de atualmente já existir um consenso sobre a necessidade da inserção, em todos os processos e áreas, do conceito de sustentabilidade, são poucas as atitudes e ações que correspondem ao discurso. As mudanças efetivas se desenrolam gradualmente, e na maioria das vezes de forma mais discreta. Muitas pessoas de vários lugares começam a abraçar a idéia de um ‘novo paradigma de sustentabilidade’. A informação é essencial, pessoas mal ou não informadas não se conscientizam e assim não agem, por isso é fundamental garantir o acesso adequado e eficiente às informações. Algumas iniciativas são altamente coordenadas e envolvem grande número de pessoas, outras estão em mãos de pequenos grupos, e podem ser formais ou não, e muitas iniciativas possuem abordagem voluntária. O importante é que “quanto mais pessoas e grupos se dedicam a iniciativas práticas, mais cresce a esperança de que é possível fazer mudanças significativas” (PNUMA, 2004, p. 12). Entende-se que, para alcançar as diversas metas que estão sendo estabelecidas, serão necessárias mudanças significativas nos sistemas social e econômico e que tais mudanças levarão muito tempo. Além disso, são necessárias ações em muitos âmbitos diferentes. “Ficou claro que um número cada vez maior de atores teria de lidar com as dimensões ambientais de atividades que anteriormente não eram vistas como tendo implicações ambientais [...]” (PNUMA, 2004, p. 12). O campo de arquitetura e urbanismo são dois desses âmbitos, envolvendo visões e abordagens, que acabam também interferindo em outras esferas, como por exemplo, a construção civil. Essas áreas sempre tiveram um papel importante nas questões físico-ambientais, econômicas, sociais e culturais do país e do mundo, porém nos últimos anos essas preocupações têm sido muito mais cobradas. O arquiteto não é, e nunca será, o único responsável pela sustentabilidade de uma edificação e seu entorno, mas possui papel fundamental na concepção dos princípios de sustentabilidade dos mesmos. Ele deve pensar, planejar, projetar, e influenciar sustentavelmente. 29 Deve ser educado desde o início a esse objetivo, ajudando a modificar toda a cadeia produtiva do ambiente construído, desde o projeto de arquitetura e a construção civil até o planejamento urbano. A formação do arquiteto-urbanista precisa ser sempre atual e eficaz, em todos os sentidos. Todas as questões referentes à melhoria e qualidade de vida do homem em integração com a natureza devem ser prioridade. No campo específico da arquitetura é imprescindível a discussão sobre a qualidade de vida das nossas cidades e sobre quais os paradigmas para o desenvolvimento de uma arquitetura adequada ao nosso clima, nossos recursos e tradições culturais. (BENETTI, 2003, p. 193) 1.3 Objetivos 1.3.1 Objetivo geral Verificar a atual situação e aplicação da sustentabilidade na formação do arquiteto e urbanista brasileiro. 1.3.2 Objetivos específicos Identificar origem e significados para aplicação na arquitetura dos conceitos relacionados a sustentabilidade, além de verificar o interesse e o grau de conhecimento dos estudantes de arquitetura e arquitetos da temática. Pretende-se, assim, identificar se e como este tema vem sendo abordado na formação do arquiteto-urbanista e avaliar o grau deste aprendizado, para discutir se seria necessário um maior embasamento teórico e técnico desse assunto. 1.4 Delimitações do trabalho Devido à abrangência e complexidade do tema em questão, foi necessário delimitar os aspectos a serem tratados e as variáveis trabalhadas. Assim, embora o conceito de sustentabilidade permeie questões ambientais, sociais, econômicas, culturais, físicas, políticas, religiosas, espirituais, entre outras, sua abrangência foi reduzida às cinco dimensões da sustentabilidade propostas por Sachs (1993): ecológica, social, econômica, cultural e espacial. A partir daí, pode-se dizer que foram focadas as questões ambientais, econômicas, sociais e culturais, além dos aspectos espaciais referenciados principalmente ao ambiente construído e à arquitetura. Além disso, o significado do conceito continua em desenvolvimento, portanto alguns autores serão citados para exemplificar a sustentabilidade no campo da arquitetura e urbanismo. Apesar da difícil conceituação e definição do termo, o interessante da amplitude do assunto é também sua discussão. 30 1.5 Procedimentos metodológicos Inicialmente, a metodologia adotada neste trabalho contou com uma revisão bibliográfica sobre o tema - a sustentabilidade - para se construir um referencial teórico. Em seguida, foi feito um levantamento de dados primários e secundários para uma posterior avaliação com base nos dados colhidos. 1.5.1 Etapas da pesquisa Parte I: Fundamentação teórica - Revisão bibliográfica e construção da base teórica sobre os conceitos de desenvolvimento sustentável e sustentabilidade; sua problemática e sua aplicação na arquitetura; - Construção de referencial teórico sobre tipos de educação, com um viés ambiental, e sobre a consciência ambiental; - Breve histórico sobre o ensino de arquitetura e urbanismo, para posterior análise das Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de graduação em arquitetura e urbanismo. Parte II: Coleta de dados - Levantamento de dados de alguns cursos de arquitetura e urbanismo, tanto na graduação, quanto na pós-graduação, extensão e pesquisa; - Pesquisa exploratória de opinião, qualitativa e quantitativa, constando de aplicação de questionário a 115 entrevistados, incluindo tanto estudantes de arquitetura quanto arquitetos, que serviu de base para a pesquisa específica posterior; - Pesquisa específica de opinião, qualitativa, com aplicação daquele questionário, agora revisado, a 50 jovens arquitetos, ganhadores do Opera Prima de 2001 a 2006. Parte III: Análise dos dados - Interpretação dos dados colhidos de alguns cursos de arquitetura e urbanismo; - Análise dos questionários das duas pesquisas separadamente; - Reunião das duas pesquisas totalizando 165 entrevistados. Parte IV: Apresentação dos resultados e conclusão da pesquisa 31 1.6 Organização do trabalho Esta dissertação de mestrado está organizada em cinco capítulos nos quais o desenvolvimento dos conteúdos objetivou possibilitar uma compreensão abrangente do tema e do trabalho desenvolvido. Após este capítulo introdutório, o segundo capítulo apresenta uma fundamentação teórica do conceito de sustentabilidade, com a revisão de literatura, como forma de dar sustentação ao que se pretende propor no trabalho. Os aspectos abordados no capítulo compreendem: a origem dos termos sustentabilidade, desenvolvimento sustentável e ecodesenvolvimento; os eventos internacionais do ambientalismo e sua importância na consolidação dos conceitos e ações ambientalistas; o ambientalismo no Brasil; as organizações não-governamentais; as normas e selos de qualidade; as áreas do pensamento ecológico; além da discussão sobre a problemática da sustentabilidade e o uso do conceito na arquitetura e urbanismo. Também serão mencionados alguns termos usados no âmbito da arquitetura e do urbanismo anteriormente à existência do conceito de sustentabilidade, tais como: organicismo, arquitetura orgânica, arquitetura bioclimática, arquitetura ecológica, entre outros. O terceiro capítulo intitulado Educação Ambiental e Sustentabilidade no Ensino de Arquitetura e Urbanismo analisa formas de educação com um viés ambiental, como a Educação Ambiental, e a Educação para a Sustentabilidade ou para o Desenvolvimento Sustentável (EDS), além de abordar a Alfabetização Ecológica e, por fim, a Consciência Ambiental, ingrediente essencial para o aprendizado nessa área. Em seguida, é descrito um breve histórico sobre o ensino de arquitetura, para que então sejam explicadas as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de graduação em Arquitetura e Urbanismo. Logo depois, é exposta uma breve pesquisa em algumas universidades dentro dos cursos de arquitetura e urbanismo, tanto na graduação, quanto na pós-graduação, extensão e pesquisa, para que seja possível ilustrar como anda a contribuição para um desempenho mais sustentável da arquitetura na formação dos estudantes brasileiros, buscando identificar se as exigências das novas Diretrizes Curriculares têm sido colocadas em prática. No capítulo quatro são analisados os questionários que foram primeiramente aplicados a 115 estudantes de arquitetura e arquitetos e, após sua revisão e adaptação, aplicados a 50 jovens arquitetos premiados pelo Concurso Opera Prima, no período de 2001 a 2006. Posteriormente, as duas pesquisas foram reunidas em uma terceira abordagem analítica. Buscouse, assim, verificar se os cursos de arquitetura vêm incorporando os novos conteúdos, práticas e técnicas identificadas nos capítulos 2 e 3, para finalmente concluir a análise crítica sobre a questão da sustentabilidade na formação atual do arquiteto e urbanista. 32 O capítulo cinco finaliza o trabalho apresentando as conclusões e recomendações finais. Referências e anexos são apresentados na seqüência. 33 O nosso maior desafio neste novo século é tornar uma idéia que parece abstrata – o Desenvolvimento Sustentável – numa realidade para todas as pessoas do mundo. Kofi Annan, Secretário Geral das Nações Unidas 2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA 2.1 A origem do termo É de fundamental importância discutir-se aqui o conceito de sustentabilidade, antes de qualquer proposta de método ou análise do seu desenvolvimento na arquitetura e urbanismo. “Embora os germes do discurso da sustentabilidade possam ser identificados em diversas falas e contextos históricos remotos, suas expressões mais recentes talvez possam ser observadas nos princípios da década de 70 do século passado”(LIMA, 2002, p. 2). Assim, partirmos da origem e evolução do termo nos eventos internacionais, onde os conceitos de ecodesenvolvimento, desenvolvimento sustentável e sustentabilidade nasceram. Como Sustentável é um adjetivo que qualifica o substantivo Desenvolvimento, segundo Bellia11 (1996), não é quantificável, pode-se admitir que cada um tem direito de emitir seu conceito próprio ou adaptá-lo conforme suas necessidades ou interesses. O conceito proposto pela ONU, pelos seus fóruns específicos, e mais tarde pela Conferência do Rio de Janeiro (Rio-92), é considerado um dos conceitos, mas não o único (SANTOS, 2005, p. 39). O caminho à frente não se encontra no desespero pelo fim dos tempos nem em um otimismo fácil resultante de sucessivas soluções tecnológicas. Ele se encontra na avaliação cuidadosa e imparcial dos ‘limites externos’, na busca conjunta por meios de alcançar os ‘limites internos’ dos direitos humanos fundamentais, na construção de estruturas sociais que expressem esses direitos e no trabalho paciente de elaborar técnicas e estilos de desenvolvimento que aprimorem e preservem o nosso patrimônio terrestre. Declaração de Cocoyok, 1974. 2.1.1 Os eventos internacionais do ambientalismo De acordo com Paula e Monte-Mór (2000, p.75) a descoberta, ou talvez redescoberta, da questão ambiental na década de setenta acontece juntamente com o fim da longa expansão, que seria o período pós-guerra até final da década de sessenta e início dos anos setenta, quando o capitalismo experimentou uma notória fase de crescimento, a Idade de Ouro. Este fim é marcado por diversas crises, como a crise monetária e financeira devido à 11 BELLIA, Vitor. Introdução à economia do meio ambiente. Brasília: Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, 1996. 34 desvalorização do dólar em 1971 e a crise das matérias-primas e energia devido à elevação dos preços do petróleo em 1973. Nesse ínterim surge, em 1968, o Clube de Roma, por iniciativa do empresário italiano Aurélio Peccei e pelo químico inglês Alexander King. Eles reuniram cientistas de vários países para discutir a problemática mundial, principalmente questões econômicas e ambientais (MOUSINHO, 2003). O Clube de Roma é uma organização não governamental internacional formada por um grupo de ilustres pessoas. Reúne cientistas, economistas, chefes de estado e líderes mundiais dos cinco continentes, como por exemplo, o atual presidente do Clube, Príncipe Hasan da Jordânia; Rigoberta Mench'u Tum, Prêmio Nobel da Paz; Sua Majestade Beatriz, Rainha da Holanda; Mikhail Gorbachov, premier soviético; Mario Soares, presidente de Portugal; Sua Majestade Juan Carlos I, Rei da Espanha; Enrique Iglesias, presidente do BID; Jay W. Forrester, professor do MIT; além de Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente do Brasil. Além do grupo de líderes mundiais, o Clube de Roma possui o Think Thank Thirty, um seleto grupo de 30 pessoas, todos na faixa de 30 anos, que participam de reuniões anuais e geram um documento próprio com sua análise das questões mundiais (CLUB OF ROME, [200-]). A missão do Clube é agir como um catalisador de mudanças globais, livre de quaisquer interesses políticos, econômicos, ou ideológicos. O grupo produziu uma série de relatórios de grande impacto social. Um deles, chamado Limits to growth - Limites do crescimento – publicado por Dennis Meadows com a ajuda de um grupo de técnicos do Massachussets Institute of Technology e pesquisadores do Clube de Roma, em 1972, tornou o Clube de Roma conhecido mundialmente. O relatório, que analisava cinco variáveis: tecnologia, população, nutrição, recursos naturais e meio ambiente, mostrou que a degradação ambiental decorre em grande parte do crescimento populacional descontrolado12 aliado à super exploração dos recursos naturais, e lançou subsídios para a idéia do desenvolvimento aliado à preservação ambiental. Introduziu um modelo inédito para a análise do que poderia acontecer caso a humanidade não mudasse seus métodos econômicos e políticos e relatava que mantidos os níveis de poluição, produção de alimentos e exploração dos recursos naturais, o limite de crescimento do planeta seria atingido em aproximadamente cem anos, provocando uma repentina diminuição da população mundial e da capacidade industrial. Este relatório provocou grande controvérsia e foi muito criticado, mas foi fundamental, pois tornou pública pela primeira vez a noção de 12 Desde então, o viés neo-malthusiano implícito nas conclusões do Clube de Roma foram rediscutidos e revistos no sentido de questionar a relação causal e hegemônica entre ‘crescimento populacional e degradação ambiental’. Questões como padrões de consumo, emissão de poluentes, formas de organização e produção do espaço e de proteção do ambiente, entre outras, ganharam proeminência no debate. 35 limites externos ao desenvolvimento, que deveria ser limitado pelo tamanho finito dos recursos terrestres (LAGO; PÁDUA, 1984; MOUSINHO, 2003; PNUMA, 2004; ROSETTO, 2003). Com base nos dados do Limites do crescimento, a revista The Ecologist publicou no mesmo ano o Blueprint for survival, Plano para sobrevivência, outro documento de grande destaque, que não apenas denunciava as conseqüências negativas, como também apresentava propostas para a solução dos problemas, uma nova tendência que marcou o movimento ecológico (LAGO; PÁDUA, 1984). A repercussão desses relatórios e as pressões exercidas pelos movimentos ambientalistas levaram a ONU a realizar em 1972, em Estocolmo, Suécia, a Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano, com a participação de 113 países, inclusive o Brasil, signatários da Declaração sobre o Ambiente Humano. Dessas nações, 90% pertenciam ao grupo dos países em desenvolvimento, e nessa época apenas 16 deles possuíam entidades de proteção ambiental. Além da Declaração sobre o Ambiente Humano, que introduziu na agenda política internacional a dimensão ambiental e reconheceu a importância da Educação Ambiental como o elemento crítico para o combate à crise ambiental no mundo, outros acontecimentos importantes marcaram esta Conferência. Foi criado o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA, com sede em Nairobi, capital do Quênia, e houve a recomendação para que fosse criado o Programa Internacional de Educação Ambiental – PIEA. Esses fatos levaram, anos depois, a UNESCO-PNUMA a promover a Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental, que influenciou a adoção dessa disciplina nas universidades brasileiras. É interessante mostrar que a Organização das Nações Unidas quando foi criada em 1945, destacava como prioridades a paz, os direitos humanos e o desenvolvimento eqüitativo, não sendo prioridade a questão ambiental. Somente a partir da Conferência de Estocolmo a preocupação ecológica passou a ser a quarta prioridade das Nações Unidas (SANTOS, 2005, p. 70). Um ano depois da Conferência de Estocolmo, em 1973, surgiu o conceito ecodesenvolvimento, empregado pelo canadense Maurice Strong, secretário-geral da Conferência. (ROSETTO, 2003, p. 31) Seus princípios foram formulados por Sachs13 (citado por MONTIBELLER-FILHO, 2001, p. 45), consultor das Nações Unidas para temas de meio ambiente e desenvolvimento, e significava o desenvolvimento de um país ou região, baseado em suas próprias potencialidades, sem criar dependência externa, com a finalidade de “responder à problemática da harmonização dos objetivos sociais e econômicos do desenvolvimento com uma 13 SACHS, Ignacy. Estratégias de transição para o século XXI: desenvolvimento e meio ambiente. São Paulo: Studio Nobel/ Fundap, 1993. 36 gestão ecologicamente prudente dos recursos e do meio”. Dessa forma, Montibeller-Filho (2001, p. 45) ressalta a posição fundamental inerente à definição que diz respeito “à melhoria da qualidade de vida de toda a população com o cuidado de preservar o meio ambiente e as possibilidades de reprodução da vida com qualidade para as gerações que sucederão”. 2.1.1.1 As Dimensões da Sustentabilidade Sachs (1993) elaborou as cinco dimensões de sustentabilidade do ecodesenvolvimento: a sustentabilidade social, a econômica, a ecológica, a espacial/ geográfica e a sustentabilidade cultural. Outro ponto importante foi um dos objetivos do ecodesenvolvimento de Sachs, um programa de educação que contemple a questão ambiental (PAULA; MONTEMÓR, 2000). Além dessas cinco sustentabilidades, Lerípio14 (citado por SANTOS, 2005) menciona a sustentabilidade temporal, ou seja, ao longo do tempo devem prevalecer todas as faces da sustentabilidade, pois qualquer uma delas sendo transgredida em sua essência, haveria o desequilíbrio, já que devem sempre estar em interdependência. O termo ecodesenvolvimento começou a ser utilizado em círculos internacionais relacionados ao assunto, e foi adotado oficialmente na Declaração de Cocoyok. Esta declaração resultou de um simpósio de especialistas, ocorrido em 1974 no México, presidido por Bárbara Ward, com a participação de Sachs, organizado pela Confederação das Nações Unidas Sobre o Comércio-Desenvolvimento (UNCTAD) e PNUMA. O simpósio identificou os fatores sociais e econômicos que levam à deterioração ambiental, e afirmava que uma das causas da explosão demográfica era a pobreza, que também gerava a destruição ambiental e que os países ricos contribuíam para esse quadro devido ao exagerado nível de consumo (PAULA; MONTE-MÓR, 2000; PNUMA, 2004; ROSETTO, 2003). De acordo com Sachs (1994), o termo ecodesenvolvimento não agradou o então chefe da diplomacia do governo norte-americano, Henry Kissinger, que enviou uma carta, alguns dias depois, ao presidente do PNUMA. Assim o termo foi vetado nos foros seguintes, mas esses debates abriram espaço ao conceito de desenvolvimento sustentável. O termo desenvolvimento sustentável foi utilizado primeiramente em 80 pela União Internacional pela Conservação da Natureza (IUCN) numa publicação em Gland, na Suíça – sustainable development – cuja tradução oficial francesa seria développement durable e foi traduzido para o português como desenvolvimento sustentável, apesar do equivalente ao francês 14 LERÍPIO, Alexandre A. GAIA: um método de gerenciamento de aspectos e impactos ambientais. 2001. Tese (Doutorado em Engenharia de Produção) –Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis 2001. 37 ser desenvolvimento durável. Em 1986, na Conferência Mundial sobre a Conservação e o Desenvolvimento da IUCN no Canadá, o termo foi colocado como um novo paradigma cujos princípios seriam (MONTIBELLER-FILHO, 2001; OLIVEIRA, 2006): - Integrar conservação da natureza com desenvolvimento; - Satisfazer as necessidades humanas fundamentais; - Perseguir equidade e justiça social; - Respeitar a diversidade cultural e buscar a autodeterminação social; - Preservar a integridade ecológica. Em 1983, a ONU criou a Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD), presidida por Gro Harlem Brundtland com o objetivo de formular propostas realistas para tratar das questões críticas ambientais e também propor formas de cooperação internacional nessa área para incentivar governos, institutos, empresas, organizações voluntárias e indivíduos a uma atuação maior. O resultado foi a criação de uma nova declaração universal, publicada em 1987, com o título Nosso Futuro Comum. O documento, também chamado de Relatório Brundtland, retomava o conceito e definia desenvolvimento sustentável como o “desenvolvimento que corresponde às necessidades do presente sem comprometer as possibilidades das gerações futuras de satisfazer as próprias necessidades”(MONTIBELLERFILHO, 2001, p. 48). Se pensarmos na tradução francesa, développement durable, que seria desenvolvimento durável ou durabilidade, pode-se vincular o desenvolvimento em si não só ao agora ou ao próximo, mas que dure por muito tempo, dessa forma, na dimensão ambiental, realmente seria preciso conservar a natureza e o meio ambiente suficientemente não só para o presente, mas também para o futuro, ou seja, para as “gerações futuras”. E aí o desenvolvimento seria durável, ou então, haveria durabilidade. Como diz Montibeller-Filho (2001, p.48), “é sustentável porque deve responder à equidade intrageracional e a intergeracional”. Após a publicação do Relatório de Brundtland, cresceram os eventos destinados a discutir os problemas ambientais. Entre eles a Toronto Conference on the Changing Atmosphere, no Canadá em 1988, primeira reunião entre governantes e cientistas sobre as mudanças climáticas, que descreveu seu impacto potencial inferior apenas ao de uma guerra nuclear. Em seguida o IPCC (Intergovernmental Panel on Climate Change), em Sundvall, Suécia 1990, primeiro informe com base na colaboração científica de nível internacional, onde os cientistas advertem que para estabilizar os crescentes níveis de dióxido de carbono na atmosfera, seria necessário reduzir as emissões de 1990 em 60% (GREENPEACE, [200-]). Nesse mesmo ano, o BID, Cepal e PNUD publicaram o documento Nuestra propia agenda sobre desarollo y medio 38 ambiente, uma boa síntese de uma agenda para a questão ambiental contemporânea do ponto de vista brasileiro. Seus pontos principais eram: a erradicação da pobreza, o aproveitamento sustentável dos recursos naturais, ordenamento do território, desenvolvimento tecnológico compatível com a realidade social e natural, nova estratégia econômico-social, organização e mobilização social, e reforma do estado (PAULA; MONTE-MÓR, 2000). Todas essas reuniões e documentos culminaram na famosa Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, conhecida como Eco-92 ou Rio-92 em junho de 1992 no Rio de Janeiro. O principal plano deste encontro, que reuniu 170 países, era introduzir e fortalecer a idéia do desenvolvimento sustentável, buscando meios de conciliar o desenvolvimento sócio-econômico e industrial com a preservação do meio ambiente. A Rio-92 teve como principais objetivos examinar a situação ambiental do mundo e as mudanças ocorridas depois da Conferência de Estocolmo; examinar estratégias de promoção de desenvolvimento sustentável e de eliminação da pobreza nos países em desenvolvimento; e identificar estratégias regionais e globais para ações referentes às principais questões ambientais. A Carta da Terra, documento oficial da Eco-92, elaborou convenções, declarações, e um dos principais resultados da conferência: a Agenda 21. É um documento que estabeleceu a importância de cada país em se comprometer localmente e globalmente, na chegada do século XXI. A Agenda 21 reúne o conjunto mais amplo de premissas e recomendações sobre como as nações devem agir para alterar seu vetor de desenvolvimento em favor de modelos sustentáveis e a iniciarem seus programas de sustentabilidade. Marina Silva, Ministra do Meio Ambiente. A Agenda 21 vem se constituindo em um instrumento de fundamental importância na construção dessa nova ecocidadania, num processo social no qual os atores vão pactuando paulatinamente novos consensos e montando uma Agenda possível rumo ao futuro que se deseja sustentável Gilney Viana, Secretário de Políticas para o Desenvolvimento Sustentável. 15 Também no início da década de 90 surgiu no Conselho Empresarial Mundial para o desenvolvimento Sustentável – WBCSD (World Business Coucil for Sustainable Development) o termo eco-eficiência, derivado de desenvolvimento sustentável. Esta palavra é a combinação de economia, ecologia e eficiência, e seu conceito pode ser entendido como a satisfação das necessidades humanas, buscando qualidade de vida, mas também reduzindo impactos ecológicos e a intensidade de recursos durante o ciclo de vida, para um equilíbrio da capacidade estimada da Terra (PINHEIRO, 2002). Posteriormente, em 1995, ocorreu a Reunião de Cúpula de Copenhague para o Desenvolvimento Social, reafirmando-se o conceito de desenvolvimento sustentável, 15 MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE, [200-]. 39 contemplando numa estratégia integrada, o desenvolvimento econômico, social, ambiental e cultural (MOISÉS, 1999). Nesse mesmo ano aconteceu o segundo informe do IPCC, que forneceu informações chave para a adoção do Protocolo de Kyoto em 1997. Discutido e negociado em 1997, em Kyoto no Japão, o protocolo foi aberto para assinaturas em 1998 e ratificado em 1999, entrando em vigor oficialmente somente em fevereiro de 2005. O protocolo estimula os países signatários a cooperarem entre si para reduzirem a emissão de gases poluentes através de algumas ações como: reforma nos setores de energia e transportes; utilização de fontes energéticas renováveis; proteção de florestas e outros sumidouros de carbono; etc. Exige que várias nações industrializadas reduzam suas emissões em 5,2%, em relação aos níveis de 1990, para o período de 2008- 2012 (GREENPEACE, [200-]). Ainda em 1997 ocorreu a sessão especial da Assembléia Geral das Nações Unidas em Nova Iorque, cinco anos após a Rio-92, chamada Rio +5. Reuniram-se 53 chefes de Estado para avaliar e discutir o avanço dos países e organizações internacionais em relação aos desafios da Conferência no Rio (MOUSINHO, 2003). A Declaração do Milênio das Nações Unidas, um resultado da chamada Cúpula ou Assembléia do Milênio das Nações Unidas, realizada em setembro de 2000 em Nova Iorque, que recebeu líderes mundiais de mais de 150 países, definiu uma lista dos principais componentes da agenda global do Século XXI (UNITED NATIONS EDUCATION, SCIENTIFIC AND CULTURAL ORGANIZATION - UNESCO, [200-]). Os Objetivos do Milênio das Nações Unidas são: 1. Erradicar a extrema pobreza e a fome; 2. Atingir o ensino básico universal; 3. Promover a igualdade entre os sexos e a autonomia das mulheres; 4. Reduzir a mortalidade infantil; 5. Melhorar a saúde materna; 6. Combater o HIV/AIDS, a malária e outras doenças; 7. Garantir a sustentabilidade ambiental; 8. Estabelecer uma parceria mundial para o desenvolvimento. Em 2002, dez anos depois do Rio 92, aconteceu o maior encontro internacional da história a tratar do futuro do planeta, com 21.000 participantes, a Cúpula Mundial sobre o Desenvolvimento Sustentável (WSSD) em Johanesburgo, também chamada de Rio+10. Nessa ocasião verificou-se que poucas mudanças práticas haviam ocorrido e, conforme foi estipulado na Agenda 21, poucas medidas foram implementadas. Assim, foram reafirmadas a urgência desta 40 necessidade, bem como os compromissos assumidos para este fim (MOUSINHO, 2003; UNITED NATIONS DEPARTMENT OF ECONOMIC AND SOCIAL AFFAIRS, 200[-]). O terceiro informe do Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática da ONU – IPCC – foi completado em 2001. Nele os cientistas consideravam apenas provável que a causa do aquecimento global era resultado das atividades humanas. No quarto informe, em fevereiro de 2007, em Paris, o primeiro de quatro volumes a serem liberados este ano pelo IPCC, foi confirmado que o grande aumento de concentrações atmosféricas dos gases do efeito estufa, o dióxido de carbono (CO2), o metano (CH4) e o óxido de nitrogênio (N2O), desde 1750 são resultado de atividades humanas. Ou seja, os principais especialistas mundiais em clima afirmaram que a humanidade é responsável pelo aquecimento global, alertando os governos sobre a necessidade de agir urgentemente para evitarem danos graves e irreversíveis (INTERGOVERNAMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE - IPCC, 2007). O sumário16 das conclusões do Painel destacou fatos assustadores, como o de que até 2100 não haverá mais gelo durante os verões no Ártico, e de que o aquecimento provavelmente já está tornando os ciclones tropicais mais intensos. O texto projeta um aumento de 18 a 59 centímetros no nível dos oceanos neste século, mas afirma que o valor pode ser ainda maior dependendo do derretimento do gelo sobre as terras da Antártida e Groenlândia. A subida dos mares pode representar o fim de várias cidades litorâneas. A melhor estimativa da comissão é um aumento da temperatura entre 1,8°C e 4,0°C ao longo deste século, sendo que ao longo do século XX as temperaturas subiram 0,74°C, e os dez anos mais quentes desde o início dos registros, em meados do século XIX, aconteceram todos a partir de 1994 (IPCC, 2007). Muitos grupos ambientais, agências da ONU e governos propuseram uma ampliação do Protocolo de Kyoto, que obriga 35 países industrializados a reduzirem suas emissões de carbono, mas ainda exclui os dois maiores poluidores do mundo, Estados Unidos e China. O governo dos Estados Unidos, país que mais emite carbono na atmosfera, abandonou o Protocolo de Kyoto porque defende uma política menos rígida de controle das emissões. Assim, diversos eventos, relacionados à questão ambiental, vêm ocorrido desde então. Dentre eles, por exemplo, o Fórum Urbano Mundial. Em junho de 2006 foi realizado em Vancouver, Canadá, o Terceiro Fórum Urbano Mundial. Dentre os principais temas estavam: o direito à moradia e o crescimento sustentável das cidades. Vários princípios foram, e continuam sendo firmados em fóruns e eventos internacionais, os quais formam a base do direito internacional ambiental e da legislação ambiental em vários países, inclusive o Brasil (MONTIBELLER-FILHO, 2001, p. 283.). Todas 16 O sumário encontra-se em inglês disponível em: . O relatório completo – “Climate Change 2007: The Physical Science Basis” – será publicado pelo Cambridge University Press. 41 essas conferências e convenções, debates, relatórios e documentos, podem até não gerar todos os resultados esperados, mas servem para impulsionar estas preocupações e procurar melhores soluções para a problemática ambiental. O movimento ambientalista está cada vez mais recrutando indivíduos, empresas e organizações. “Muito ainda depende do cidadão individualmente. Em numerosos problemas ambientais é a minoria que sustenta a luta conservacionista” (DASMANN, 1976, p. 55.). No início pensei que estava lutando para preservar as seringueiras, depois achei que estava lutando para preservar a floresta Amazônica. Agora, sei que estou lutando para a humanidade. Chico Mendes 2.1.2 O ambientalismo no Brasil Até a década de 50, não havia no Brasil uma concreta preocupação com os aspectos ambientais. As normas existentes limitavam-se aos aspectos relacionados principalmente com o saneamento e à solução de problemas provocados por secas e enchentes. Alguns instrumentos legais e órgãos públicos criados, que dialogavam com essas questões foram: o Departamento Nacional de Obras contra a Seca17 (DNOCS), criado sob o nome de Inspetoria de Obras Contra as Secas (IOCS) em 1909 e dez anos depois recebeu o nome de Inspetoria Federal de Obras Contra as Secas (IFOCS), antes de assumir sua denominação atual, que lhe foi conferida em 1945; o Código de Águas em 1934; o Serviço Especial de Saúde Pública (SESP) criado em 1942; e a Patrulha Costeira, criada em 1955 (IBAMA, 2007). Além disso, ocorreram algumas medidas de conservação e preservação do patrimônio natural, histórico e artístico, tais como: a criação de parques nacionais e de florestas protegidas nas regiões Nordeste, Sul e Sudeste; o estabelecimento de normas de proteção dos animais; a promulgação dos códigos de floresta, de águas e de minas; a organização do patrimônio histórico e artístico; a disposição sobre a proteção de depósitos fossilíferos, e a criação, em 1948, da Fundação Brasileira para a Conservação da Natureza. A partir da década de 60 o Governo brasileiro passou a se comprometer mais com a conservação e a preservação do meio ambiente principalmente devido a participações em convenções e reuniões internacionais, como por exemplo, a Conferência Internacional promovida pela UNESCO, em 1968, sobre a Utilização Racional e a Conservação dos Recursos da Biosfera. Neste evento foram definidas as bases para a criação de um programa internacional dedicado ao Homem e à Biosfera (MAB - Man and Biosphere), que foi efetivamente criado em 17 Para mais detalhes, ver DEPARTAMENTO NACIONAL DE OBRAS CONTRA AS SECAS – DNOCS. História. Disponível em: Acesso em: 12 fev. 2007. 42 1970, cujo objetivo era melhorar o relacionamento do homem com o meio ambiente. O Brasil, por ser membro das Nações Unidas, também assinou acordos e termos de responsabilidade entre países, no âmbito da Declaração de Soberania dos Recursos Naturais. A década de 70 foi marcada pela maior conscientização dos problemas ambientais devido ao seu agravamento mundialmente. Em 1971 foi realizado, em Brasília, o I Simpósio sobre Poluição Ambiental, por iniciativa da Comissão Especial sobre Poluição Ambiental da Câmara dos Deputados. Neste Simpósio participaram pesquisadores e técnicos brasileiros e estrangeiros, com o objetivo de colher subsídios para um estudo global do problema da poluição ambiental no Brasil. No entanto, somente após a participação da delegação brasileira na Conferência das Nações Unidas para o Ambiente Humano, realizada em 1972, em Estocolmo, é que medidas mais sérias foram tomadas com relação ao meio ambiente no Brasil. Os delegados dos países em desenvolvimento, liderados pela delegação brasileira, defendiam seu direito às oportunidades de crescimento econômico a qualquer custo. O delegado brasileiro fez uma declaração que a poluição foi um sinal de progresso e o ambientalismo era um luxo dos países desenvolvidos (HOGAN, 2000). Apesar disso, esses países conseguiram aprovar a declaração que atualmente o subdesenvolvimento é uma das mais freqüentes causas da poluição. Portanto, o controle da poluição ambiental deve ser considerado um subprograma de desenvolvimento, e a ação conjunta de todos os governos e organismos convergir para a erradicação da miséria no mundo. Ainda na década de 70, foi criada a Secretaria Especial do Meio Ambiente - SEMA, pelo Decreto nº 73.030, de 30 de outubro de 1973, que propunha discutir a questão ambiental junto à opinião pública para fazer com que as pessoas se preocupassem mais com o meio ambiente. No entanto, a SEMA não possuía nenhum poder policial para atuar na defesa do meio ambiente. Diversas medidas legais foram tomadas posteriormente para preservar e conservar os recursos ambientais e controlar as diversas formas de poluição. A SEMA dedicou-se principalmente ao controle da poluição ambiental, em especial a de caráter industrial, mais visível, e à proteção da natureza. Em 1981, o Governo Federal, através da SEMA, instituiu a Política Nacional do Meio Ambiente, pela qual foi criado o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) e instituído o Cadastro Técnico Federal de Atividades e Instrumentos de Defesa Ambiental. Com este Cadastro foram definidos os instrumentos para a implementação da Política Nacional, dentre os quais o Sistema Nacional de Informações sobre o Meio Ambiente (SINIMA). Também foi criado o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA). 43 Nesse mesmo ano a SEMA propôs a primeira lei ambiental, no país, destinada à proteção da natureza: a Lei nº 6.902, de 1981. A partir daí o governo federal criou diversas unidades de conservação como parques nacionais, reservas biológicas, reservas ecológicas, estações ecológicas, áreas de proteção ambiental e áreas de relevante interesse ecológico. Nos estados e municípios, a preocupação centrou-se na proteção de mananciais e cinturões verdes em torno de zonas industriais. Apesar disso, em 1985, apenas 1,49% da área total do país era ocupada por unidades de conservação. A Constituição de 5 de outubro de 1988 foi um passo decisivo para a formulação da política ambiental brasileira. Pela primeira vez na história de uma nação, uma constituição dedicou um capítulo inteiro ao meio ambiente. A constituição dividiu a responsabilidade pela preservação e conservação do meio ambiente entre o governo e a sociedade. A partir daí, foi criado o programa Nossa Natureza, que estabeleceu diretrizes para a execução de uma ampla política de proteção ao meio ambiente. Fernando César Mesquita foi convidado para dirigir o Programa Nossa Natureza e após consultar técnicos de vários setores, sugeriu ao então presidente José Sarney a criação de um único órgão público para gerir as políticas relacionadas com a produção dos recursos naturais renováveis e seu uso, dentro da linha do desenvolvimento sustentável. Na ocasião foi então criado o IBAMA - Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis, pela Lei nº 7.735, de 22 de fevereiro de 1989, com a extinção de quatro entidades brasileiras que trabalhavam na área ambiental: Secretaria do Meio Ambiente – SEMA; Superintendência da Borracha – SUDHEVEA; Superintendência da Pesca – SUDEPE, e o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal – IBDF. De acordo com o primeiro presidente do IBAMA, Fernando César Mesquita, com exceção da SEMA, as demais agências fracassaram em seus objetivos, em meio a conflitos de interesses, corrupção e má gestão administrativa (MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA - MCT, 2005). Em 1990, foi criada a Secretaria do Meio Ambiente da Presidência da República – SEMAM, que tinha no IBAMA seu órgão gerenciador da questão ambiental, responsável por formular, coordenar, e executar a Política Nacional do Meio Ambiente e da preservação, conservação e uso racional, fiscalização, controle e fomento dos recursos naturais renováveis. Com a grande repercussão internacional da Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente, em 1992, no Rio de Janeiro, e com as pressões exercidas pela mesma na sociedade e no governo, em 16 outubro de 1992, foi criado o Ministério do Meio Ambiente - MMA, órgão de hierarquia superior, com o objetivo de estruturar a política ambiental no país. 44 Em 2000, incentivado pelo PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), o MMA elaborou o documento Cidades Sustentáveis, com quatro estratégias prioritárias para avançar em direção a uma maior sustentabilidade nas cidades brasileiras no período de dez anos. As estratégias são (OLIVEIRA, 2006): 1- Uso e ocupação do solo urbano: aperfeiçoar a regulamentação do uso e da ocupação do solo e promover o ordenamento do território, contribuindo para a melhoria das condições de vida da população, promovendo a eqüidade, eficiência e qualidade ambiental; 2- Promover o desenvolvimento institucional, e o fortalecimento da capacidade de planejamento e gestão democrática da cidade, incorporando ao processo a dimensão ambiental e assegurando a participação da sociedade; 3- Mudanças nos padrões de produção e consumo da cidade, reduzindo custos e desperdícios e estimulando o desenvolvimento de tecnologias urbanas sustentáveis; 4- Instrumentos econômicos, desenvolver e promover suas aplicações no gerenciamento dos recursos naturais, prevendo a cobrança pelos mesmos e criando incentivos econômicos e tributários como o ICMS ecológico. 2.1.3 As organizações não-governamentais (ONGs) Além dos diversos eventos como conferências e fóruns, milhares de associações, institutos, e sociedades promovem a conscientização e implementação dos princípios da sustentabilidade na sociedade e no mundo. Algumas se empenham na fiscalização e denúncias de abuso por parte de indústrias, pressionando a ação dos governos. Suas participações têm papel bastante especial na luta pelo meio ambiente e qualidade de vida. Atualmente existem milhares de ONGs, sem fins lucrativos, nacionais e locais, além de outras internacionais conhecidas mundialmente (PINHEIRO, 2002). A WWF (FIG. 1) é uma ONG que foi criada em 1961, e nas últimas décadas se consolidou como uma das mais respeitadas redes independentes de conservação da natureza. Quando foi fundada WWF significava "World Wildlife Fund" (Fundo Mundial dos Animais selvagens), entretanto a organização começou a expandir o trabalho de conservar o meio ambiente como um todo, ao invés de focar algumas espécies isoladas e a utilização das iniciais continuaram, mas o nome oficial passou a ser "World Wide Fund For Nature" (Fundo Mundial para a Natureza). Atualmente, para evitar confusão WWF é conhecida apenas como “WWF, the Global Environmental Conservation Organization", traduzida como Organização Ambiental Global de Conservação (WWF, 2006). 45 FIGURA 1 - Logo marca da WWF Fonte: WWF, 2006. Com sede na Suiça, a Rede WWF possui quase cinco milhões de associados, distribuídos em cinco continentes, sendo a maior organização do tipo no mundo, atuando em mais de cem países, nos quais desenvolve cerca de 2 mil projetos de conservação do meio ambiente. Hoje, a instituição afirma que teve um papel fundamental na evolução do movimento ambientalista mundial. Uma das características marcantes é o diálogo com todos os envolvidos na questão ambiental, desde comunidades como tribos de pigmeus Baka nas florestas tropicais da África Central, até instituições internacionais como o Banco Mundial e a Comissão Européia (WWF, 2006). Seu maior objetivo é a campanha mundial para deter a aceleração do processo de degradação da natureza no mundo e para ajudar cada ser humano a viver em harmonia com o meio ambiente. A WWF-Brasil foi fundada em Brasília no ano de 1996 e desenvolve projetos em todo o território nacional. (FIG. 2) É uma organização não governamental brasileira dedicada à conservação da natureza e ao uso sustentável dos recursos naturais (WWF-BRASIL, 2006). FIGURA 2 - WWF-Brasil no Rio de Janeiro Fonte: WWF-BRASIL, 2006. Outro grande exemplo, mundialmente conhecido, é o Greenpeace, que foi fundado em 1971 no Canadá. Em 1979, sete países já tinham escritórios Greenpeace, e foi necessário criar uma instância internacional de decisão e supervisão. Assim surgiu o Greenpeace Internacional (GPI), sediado em Amsterdã (GREENPEACE, [200-]). 46 "Greenpeace exists because this fragile earth deserves a voice. It needs solutions. It needs change. It needs action.”.18 O Greenpeace é uma organização não-governamental, sem fins lucrativos, com presença em quarenta países pela Europa, Américas, Ásia e Pacífico. Para manter sua independência não aceita doações de governos, corporações ou empresas, e recebe contribuições individuais. Não estabelece alianças com partidos e não toma posições políticas exceto no que diz respeito à proteção do meio ambiente e da paz. Focaliza nas ameaças cruciais da biodiversidade e do meio ambiente. Suas principais campanhas são: “pare a mudança de clima”, “proteja as florestas mais antigas”, “salve os oceanos”, “chega de caça às baleias” (FIG. 3), “Energia Renovável Já” (FIG. 4), “pare a ameaça nuclear”, “elimine produtos químicos tóxicos” e “incentive o comércio sustentável”. FIGURA 3 - “Chega de caça às baleias!” Fonte: GREENPEACE, [200-]. FIGURA 4 - Campanha “Energia Renovável Já!” Fonte: GREENPEACE, [200-]. 18 “O Greenpeace existe porque esta terra frágil merece uma voz. Ela precisa de soluções. Precisa de mudança. Precisa de ação” (tradução nossa). 47 Outra entidade internacional bastante conhecida é a Green Cross (FIG. 5), cujo lema é: “Give humanity a chance, give the Earth a future”19 . FIGURA 5 - Logo e Lema Green Cross Fonte: GREEN CROSS, [200-]. Em 1989 Mikhail Gorbachev, quando dirigia o Fórum Global de Sobrevivência da Humanidade, mencionou a idéia de uma organização que seria parecida com o modelo da Cruz vermelha como resposta às questões ecológicas, cujos problemas ambientais transcendem limites nacionais. Posteriormente foi fundada por Mikhail Gorbachev a Green Cross International em 1993, cuja constituição foi baseada na Conferência no Rio de Janeiro de 1992. Seu objetivo é “ajudar a garantir um justo, sustentável e seguro futuro para todos, pela adoção da mudança de valores e cultivo de um novo sentimento de interdependência global e de responsabilidade compartilhada no relacionamento da humanidade com a natureza” (GREEN CROSS BRASIL, 2004). Em abril de 2004, a Associação Green Cross Brasil (AGCB) foi criada oficialmente e qualificada como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). De acordo com Mikhail Gorbachev: We desperately need to recognize that we are the guests not the masters of nature and adopt a new paradigm for development, based on the costs and benefits to all people, and bound by the limits of nature herself rather than the limits of technology and consumerism.20 2.1.4 Normas e selos de qualidade O primeiro programa de rotulagem ambiental, chamado Blue Angel, foi criado pelo governo alemão em 1977 (FIG. 6). Desde então, inúmeros tipos de selos já foram lançados por entidades de normalização de diversos países, associações de classes ou setores empresariais (BLUE ANGEL, [200-]). FIGURA 6 - Certificação Blue Angel Fonte: BLUE ANGEL, [200-]. 19 “Dê uma chance para a humanidade, dê um futuro à Terra” (tradução nossa). 20 "Nós precisamos desesperadamente reconhecer que somos convidados e não donos da natureza e adotar um novo paradigma para o desenvolvimento, baseado nos custos e benefícios para todas as pessoas, e inclinado para os limites da natureza, mais do que para os limites da tecnologia e consumismo” (tradução nossa). 48 São inúmeras as normas e selos de qualidade, que se aplicam tanto a produtos, empresas, construções quanto aos trabalhadores. Todas têm como objetivo comprovar ao consumidor final sobre a qualidade e procedência de produtos, empresas e processos produtivos de acordo com normas pré-estabelecidas. Várias dessas normas e selos possuem características relacionadas à qualidade ambiental, alguns inclusive, são chamados de selos verdes. Em 1990 foi criado o primeiro sistema de certificação para obras sustentáveis, o BREEAM – Building Research Establishment Environmental Assessment Method – na Inglaterra, que garante o selo verde aos edifícios erguidos sem impacto ambiental (GUSTAVSEN, 2007). Um dos selos verdes mais conhecidos surgiu no Canadá em 1993, o FSC – Forest Stewardship Council (Conselho de Manejo Florestal). Presente em mais de 75 países, este selo certifica madeiras originárias de um processo produtivo manejado de forma ecologicamente correta e socialmente justa. No Brasil o selo nacional do FSC foi lançado em 2001 (GUSTAVSEN, 2007). O Conselho Nacional de Defesa Ambiental (2004) possui o Selo Verde CNDA, cujas primeiras certificações ocorreram em 2002. O conselho concede o Selo Verde (FIG. 7), como diferencial para produtos e serviços ambientalmente corretos. A sua outorga é efetuada após a entrega de laudos técnicos comprobatórios de que o produto e sua produção não agridem o meio ambiente. FIGURA 7 - Selo verde CNDA (Conselho Nacional de Defesa Ambiental) Fonte: CNDA, 2004. Em 2004 foi elaborado o sistema de certificação para avaliação de edifícios novos e usados na Austrália, o NABERS – National Australian Building Environmental Rating System – cujos níveis de classificação são revisados anualmente (GUSTAVSEN, 2007). Outros exemplos de normas e selos são: 2.1.4.1 Norma Regulamentadora (NR) A preocupação com o aumento da qualidade, produtividade e eficiência de uma obra se reflete em projetos bem elaborados, equipes bem treinadas, na redução de desperdícios, modelos de gestão coerentes e eficientes e também na saúde e qualidade de vida dos 49 funcionários. Assim uma norma bastante significativa é a NR-18, Norma Regulamentadora n° 18 criada pelo Ministério do Trabalho que objetiva a melhoria das condições e do ambiente de trabalho na indústria da construção, baseada no controle e sistemas de prevenção de acidentes e doenças ocupacionais, para que seja implantado um Sistema de Gestão da Segurança do Trabalho. As más condições de trabalho dos operários da construção civil podem gerar sérios problemas de saúde e até a morte. Dados fornecidos pelo INSS, em 1995, mostram que o setor de construção civil era responsável por 12,92% do total de 3,38 mil acidentes fatais e por mais de 13% dos casos de invalidez no país. Além disso, costumam gerar perda de qualidade e de produtividade do serviço. Com isso o canteiro de obras exerce grande influência na obra, devendo ser bem projetado, construído e bem mantido, pois é essencial na qualidade de vida dos funcionários, e assim na motivação de toda a equipe (PINHEIRO, 2002). A NR-9, Norma Regulamentadora n° 9 trata dos risco ambientais, como ruídos, poeira, fungos, entre muitos outros agentes que podem prejudicar a saúde dos trabalhadores. 2.1.4.2 International Organization for Standardization (ISO) Outras normas bastante conhecidas são as ISO, principalmente as da série ISO 9000, voltadas à qualidade. A série ISO 14000 tem como objetivo a padronização mundial no campo do gerenciamento ambiental. Pode ser aplicada a qualquer tipo e tamanho de empresa, visando benefícios comerciais aquelas que se adequarem a ela, principalmente relacionando-as à imagem de serem mais “ecologicamente corretas”. A aplicação dessas normas induz as indústrias a preocuparem-se desde a obtenção da matéria-prima, processo de produção, geração de resíduos até a destinação final do produto. Cada vez mais empresas procuram se adequar às normas para não perderem mercado e tornarem-se mais competitivas (PINHEIRO, 2002). A série ISO 14000 inclui padrões aplicáveis no nível organizacional, como por exemplo: a implantação do SGA (sistemas de gestão ambiental), ISO 14001 e 14004; condução de auditoria ambiental, ISO 14010, 14011 e 14012, substituídas pela ISO 19011; avaliação de desempenho ambiental, ISO 14031; padrões relativos a produtos e serviços de análise de ciclo de vida, ISO 14040; e de rotulagem, ISO 14020 (FIG.8), 14021 e 14024 (MOUSINHO, 2003). 50 FIGURA 8 - Selo verde – Programa de rotulagem ambiental ISO-14020 Fonte: CONPET, 2005. 2.1.4.3 Selo Procel O SELO PROCEL DE ECONOMIA DE ENERGIA ou simplesmente SELO PROCEL, instituído através de Decreto Presidencial de 08 de dezembro de 1993, é um produto desenvolvido e concedido pelo Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica – PROCEL. O SELO PROCEL (FIG. 9) tem por objetivo indicar os produtos que apresentam os melhores níveis de eficiência energética dentro de cada categoria. Assim, objetiva estimular a fabricação e a comercialização de produtos mais eficientes, contribuindo para o desenvolvimento tecnológico e a redução de impactos ambientais. A adesão das empresas ao SELO PROCEL é voluntária (PROCEL, 2007). Os equipamentos que atualmente recebem o selo são refrigeradores e freezers, condicionadores de ar, motores de indução trifásicos, coletor solar e reservatório térmico, lâmpadas fluorescentes compactas e circulares, entre outros. Já foram iniciados os trabalhos para estender a concessão do SELO PROCEL a mais equipamentos, tais como: painéis fotovoltaicos, bombas centrífugas, equipamento de geração eólica, fornos de microondas, máquinas de lavar roupa, lâmpadas à vapor de sódio, televisores, aquecedor de acumulação elétrico (boiler), ventiladores de teto, bombas de calor e outros. Além disso, está previsto para o ano 2008 o lançamento do selo de eficiência energética para edificações, pela Eletrobrás, como parte do Programa Nacional de Conservação de Energia Elétrica (PROCEL, 2007). FIGURA 9 - Selo Procel Fonte: PROCEL, 2007. 51 2.1.4.4 Leadership in Energy and Environmental Design (LEED) Desenvolvido pelo U.S. Green Building Council, (USGBC) uma organização nãogovernamental americana, o sistema de avaliação LEED foi criado em 1996 e é uma marca de nível nacional nos EUA, utilizada para o projeto, a construção, e a operação de edifícios. A primeira etapa da certificação LEED é registrar o projeto. Um projeto é um candidato viável para a certificação LEED se possuir todos os pré-requisitos e conseguir o número mínimo de pontos. Aos projetos são concedidos os níveis de certificação: certificado, bronze, prata, ouro, ou platina dependendo do número dos créditos que conseguem. O LEED tem como objetivo avaliar o desempenho sustentável das edificações através de cinco itens (U.S. GREEN BUILDING COUNCIL, 2007): 1- Localização e entorno: reutilizar locais existentes degradados, proteger áreas naturais e agrícolas, reduzir o uso de automóveis, etc. 2- Economia de água: reduzir o consumo de água no edifício, reaproveitar águas, etc. 3- Eficiência energética e atmosfera: diminuir consumo de energia, encorajar energias renováveis, apoiar protocolos de ozônio, etc. 4- Seleção e fonte dos materiais: reduzir quantidade e gastos com material, utilizar materiais com menor impacto ambiental, etc. 5- Qualidade ambiental interna: reduzir/ eliminar fontes de poluição interna, utilização de jardins, etc. 6- Projetos e processos inovadores: performance excepcional em qualquer um dos cinco itens. O conselho está sempre atento às constantes modificações para que o certificado não fique ultrapassado e, portanto está sempre sendo renovado. Um exemplo de edificação que recebeu certificação platina é a Escola Sidwell Friends Middle School situada em Washington DC, EUA, completada em setembro de 2006. Possui 54% de nova construção, e 46% de renovação, sendo um edifício de 1950, cuja última alteração havia sido em 1971 (FIG. 10). 52 FIGURA 10 - Sidwell Friends Middle School – certificação LEED Platina Fonte: U.S. GREEN BUILDING COUNCIL, 2007. Nos Estados Unidos, aproximadamente 5% dos projetos em construção fazem parte do sistema LEED de certificação. No Brasil já está sendo estudada a possibilidade de se implantar essa certificação. O Green Building Council Brasil estrutura suas atividades no Brasil com o apoio da Amcham – Câmara americana de comércio. 21 2.1.5 Movimento ambientalista: as áreas do pensamento ecológico Assim como em qualquer outro movimento social, o movimento ambientalista surge quando um grupo possui a mesma tomada de consciência e resolve se organizar para juntos lutarem por algum propósito em comum. Os movimentos, que possuem o foco central na preocupação com o meio ambiente, tanto são chamados de ambientalistas como ecológicos. Porém, alguns autores classificam e dividem esses movimentos, Leff 22 (citado por SANTOS, 2005), por exemplo, faz uma distinção entre os movimentos ambientalistas do Norte, ou dos países ricos, que chama de ecologistas, e os do Sul, ou dos países pobres, os ambientalistas. A diferença básica entre eles, é que os do Norte desejam salvar o planeta do desastre ecológico e recuperar o contato com a natureza, mas não questionam o modelo econômico dominante. Os movimentos ambientalistas dos países pobres, e/ou em desenvolvimento, entretanto, aliam à 21 Para mais informações ver Câmara Americana de comércio, disponível em: . 22 LEFF, H. Saber ambiental: sustentabilidad, racionalidad, complejidad, poder. México: Siglo XXI, 1998. 53 preocupação com o meio ambiente, a falta de condições mínimas de vida e de seus meios de produção. Devido à grande diversidade de movimentos, que refletem distintas práticas e visões, o ambientalismo possui também algumas vertentes. De acordo com Lago; Pádua (1984) existem pelo menos quatro grandes áreas no quadro do pensamento ecológico, Ecologia Natural, Ecologia Social, Conservacionismo e Ecologismo. Essas áreas foram surgindo de maneira informal à medida que a reflexão ecológica se desenvolvia historicamente, expandindo seu campo de alcance. Não são isoladas, mas sim se complementam mutuamente: a Ecologia Natural ensina sobre o funcionamento da natureza; a Ecologia Social sobre como as sociedades atuam sobre esse funcionamento; o Conservacionismo conduz à necessidade de proteger e conservar o meio ambiente natural como condição à sobrevivência humana; e o Ecologismo defende que essa sobrevivência implica na mudança nas bases da vida do homem. As duas primeiras são de caráter mais teórico-científico e as duas últimas voltadas para objetivos mais práticos de atuação social. A Ecologia Natural foi a primeira a surgir e é a área do pensamento ecológico que se dedica a estudar o funcionamento dos sistemas naturais. Procura entender as leis que regem a dinâmica de vida da natureza e está ligada principalmente ao campo da biologia, mas também da química, física, geologia, etc (LAGO; PÁDUA, 1984). A Ecologia Social, por outro lado, nasceu no momento em que o pensamento ecológico deixou de se ocupar apenas do estudo da natureza para contemplar também os diversos aspectos da relação entre os homens e o meio ambiente, especialmente a forma pela qual a ação humana costuma incidir destrutivamente sobre a natureza. Essa área do pensamento ecológico, portanto, se aproxima mais do campo das ciências sociais e humanas. Essa vertente aparece até mesmo em pensadores da Antiguidade, mas tornou-se mais importante a partir do maior impacto destrutivo do homem sobre a natureza através do desenvolvimento do industrialismo. A produção teórica sobre a Ecologia Social intensificou-se a partir da década de 1960, com o grande avanço internacional da produção industrial e da degradação ambiental observado após a Segunda Guerra Mundial (LAGO; PÁDUA, 1984). O Conservacionismo surgiu justamente da percepção da destrutividade ambiental da ação humana. É de caráter mais prático e engloba o conjunto de idéias e estratégias de ação voltadas para a luta em favor da conservação da natureza e da preservação dos recursos naturais. Esse tipo de preocupação deu origem aos inúmeros grupos e entidades que formam o amplo movimento existente hoje em dia em defesa do meio ambiente natural. Os motivos e grupos que fazem parte desta vertente são bastante diversos. Alguns lutam pela conservação da natureza e 54 pela conscientização de sua importância para o bem-estar e a sobrevivência da espécie humana, outros, por razões estéticas, científicas, e econômicas ou até afetivas (LAGO; PÁDUA, 1984). No século XIX foram observados alguns movimentos, mas foi no século XX que se intensificou essa vertente. Na década de 40 foi criada a União Internacional para a Conservação da Natureza e de seus Recursos (UICN) com sede em Morges na Suíça, cujo objetivo é incentivar o crescimento da preocupação internacional por esses problemas. Em relação ao ecologismo, sua idéia central, [...] é que a resolução da atual crise ecológica não poderá ser concretizada apenas com medidas parciais de conservação ambiental, mas sim através de uma ampla mudança na economia, na cultura e na própria maneira de os homens se relacionarem entre si e com a natureza (LAGO; PÁDUA, 1984, p. 36). Os grupos ligados ao Ecologismo são também Conservacionistas, mas não se limitam a desejar e lutar pela conservação dos ambientes naturais, pois penetram também no questionamento do sistema social como um todo. O Ecologismo tem como objetivo tanto a resolução da crise ambiental, como a da própria crise social. Baseia-se na premissa de que a crise ecológica não se deve a problemas pontuais e isolados, mas é conseqüência de um modelo de civilização insustentável do ponto de vista ecológico. O Ecologismo não é uma doutrina, mas sim uma atitude de vida. Uma busca construtiva de transformar para melhor a vida dos homens e o seu relacionamento com a natureza. [...] Este projeto não está sendo escrito por ninguém em especial, mas está nascendo da reflexão e da prática de inumeráveis grupos e pessoas em todo o mundo que percebem que estamos diante de uma crise única na civilização, que exige a invenção de um novo caminho. Esse projeto vai assumindo também uma realidade concreta, à medida que experiências vão sendo realizadas em inúmeros lugares para demonstrar a viabilidade prática dos seus princípios. Experiências com novas formas de tecnologia, de vida comunitária, de educação, de relações econômicas, etc (LAGO; PÁDUA, 1984, p. 38). Os ecologistas têm partido principalmente de uma reflexão sobre a situação presente da humanidade, porém procuram suas fontes de inspiração em diversos pensadores tanto do presente, quanto do passado. Existe, por exemplo, nas propostas atuais dos ecologistas, uma forte influência da corrente não violenta do pensamento anarquista; Pierre Proudhon, Pietor Kropotkin, Paul Goodman, Herbert Read, entre outros. O livro Campos, fábricas e oficinas, por exemplo, escrito em 1889 por Kropotkin, é um precursor impressionantemente atual do projeto ecologista. Outro tipo de influência marcante do pensamento ecologista é a da linha dos pensadores do pacifismo e da não-violência que passa por Thoureau, Ruskin, Tolstoi, Gandhi, Vinoba Bhave, Lanza Del Vasto, Martin Luther King, Dom Helder Câmara. Numa perspectiva semelhante existe também a clara influência de uma vertente de pensadores liberais e humanistas que se preocuparam em pensar globalmente o futuro da civilização: Albert Schweitzer, Martin Buber, Lewis Mumford, Konrad Lorenz, Josué de Castro, Robert Jungk, René Dubos, entre 55 outros. A esses podem ser somados alguns críticos radicais e independentes da sociedade industrial, como Ivan Illich e Vance Packard. Por fim, a influência marcante de diversos pensadores que em distintos campos da ciência e do conhecimento têm adotado perspectivas globalizantes voltadas para a libertação social e psicológica dos homens; Wilhelm Reich, Alan Watts, E. F. Schumacher, Ignacy Sachs, Herman Daly, Gary Snyder, Fritjof Capra, Theodore Roszak, Edgar Morin, René Dumont, Robin Clarke, Gregory Bateson, Paolo Soleri, entre outros. São educadores, artistas, engenheiros, físicos, filósofos, economistas, médicos, todos envolvidos na busca de novos caminhos, de novas estratégias de vida (LAGO; PÁDUA, 1984).23 O projeto ecologista não depende especialmente de nenhum desses pensadores, mas está sendo construído a partir de muitas das indicações fornecidas por pessoas como essas. O foco central de sua elaboração, contudo, são as milhares de pessoas comuns em todo o mundo que têm participado diretamente da elaboração e na implementação prática das alternativas. É importante considerar que as informações sobre a atual crise ecológica não são fantasias românticas e sim dados muito bem fundamentados. [...] A utopia hoje não está em acreditar que podemos seguir caminhos diferentes, mas sim em crer que poderemos seguir por muito mais tempo o atual caminho (LAGO; PÁDUA, 1984, p. 43). Esse é o tipo de desenvolvimento que proporciona melhorias reais na qualidade da vida humana e ao mesmo tempo conserva a vitalidade e diversidade da terra. O objetivo é um desenvolvimento que seja sustentável. Hoje isso pode parecer visionário, mas é um objetivo alcançável. Para um número cada vez maior de pessoas, essa também parece ser a única opção sensata. Estratégia de Conservação Mundial IUCN, UNEP e WWF, 1980. 2.2 A problemática da sustentabilidade O termo, inicialmente criado, desenvolvimento sustentável refere-se a todas as atividades de desenvolvimento, e implica em um desenvolvimento almejado por todas as sociedades. Com o decorrer dos anos, os índices de degradação ambiental estão em ascensão, bem como os padrões de consumo. Embora seu significado tenha sido proclamado pelo Relatório Brundtland, é bastante impreciso e muito abrangente. De acordo com Costa (2000, p. 62): Aparentemente, pode-se dizer que o conceito de desenvolvimento sustentável vem-se transformando num enorme “guarda-chuva”, capaz de abrigar uma variada gama de propostas/ abordagens inovadoras, progressistas, ou que, pelo menos, caminhem na direção de maior justiça social, melhoria da qualidade de vida da população, ambientes mais dignos e saudáveis, compromisso com o futuro. Tal abrangência, [...] ao evidenciar 23 Podemos ainda acrescentar Lester Brown, Rachel Carson, Georgescu Roegen, John Galtung, Gregory Bateson, Barry Commoner, Paul Ehrlich, Herbert Marcuse, Daniel Cohn Bendit, Barbara Ward, Donella Meadows, Jean Pierre Dupuy, Murray Bookchin, Arne Naess, São Francisco de Assis, Patrick Geddes, Frank Lloyd Wright, Ken Yeang, Bruno Stagno, entre tantos outros. 56 a imprecisão do conceito, tende a banalizá-lo, a transformá-lo em peça retórica e, portanto, insustentável por definição. É um dilema que no momento se busca superar. Por mais complexa que seja, a sustentabilidade vem sendo mais aceita e almejada, apesar de seu alcance de forma completa e universal ser claramente impossível. Até porque a: Sustentabilidade seja qual for o enfoque, não coexiste com desequilíbrios significativos. Se a pressuposição de desenvolvimento sustentável não pode ser aceita senão de forma universal, enquanto persistirem desigualdades colossais entre continentes, entre países e dentro de países entre regiões e municípios, em qualquer dos aspectos considerados pelo conceito, se torna distante a efetivação plena da sustentabilidade (ROSETTO, 2003, p. 35). Outro fator de grande relevância é a inexistência de uma fórmula ou guia de alcançar a sustentabilidade. De acordo com Cavalcanti (1995, p. 21), “na verdade não há uma economia da sustentabilidade, nem uma única forma de chegar aos predicados de uma vida sustentável. Inexiste tampouco uma teoria única do desenvolvimento ecologicamente equilibrado. O que há é uma multiplicidade de métodos de compreender e investigar a questão”. Por esse motivo muitos consideram a sustentabilidade bastante utópica. Apesar da dose de utopia, como acredita Santos (2005, p.13), A busca do desenvolvimento sustentável parece utópica, porém, as utopias são idéias para construção de algo que se sonha, e sonhar é gerar esperanças. É fazer do desejo abstrato uma realidade palpável, deixar de divagar para pisar em solo firme. Toda essa complexidade, e dificuldade de concreta definição, principalmente por tratar-se de disciplina em desenvolvimento, não invalidam os objetivos da sustentabilidade e do desenvolvimento sustentável. Se inicialmente o desenvolvimento sustentável pretendia ser abrangente ao englobar não apenas aspectos econômicos, mas também sociais e ambientais, hoje esta perspectiva é bastante mais ampla, e a noção de sustentabilidade adotada pela Agenda 21 Brasileira incorpora as dimensões ecológica, ambiental, social, política, econômica, demográfica, cultural, institucional e espacial. Trata-se de um conceito cuja definição suscita muitos conflitos e mal entendidos, refletindo as diferentes visões de mundo dos diversos atores envolvidos no debate. [...] Apesar de dar margem a múltiplas interpretações, o conceito de desenvolvimento sustentável tem se mantido em cena, e as disputas teóricas que provoca contribuem para ampliar e aprofundar a compreensão da questão mundial (MOUSINHO, 2003, p.348 - 349). O conceito de sustentabilidade, muitas vezes, é confundido com a questão ambiental, no seu sentido restrito. Mas está muito além disso. Para que o desenvolvimento possa ser considerado sustentável, são considerados, além do equilíbrio físico-ambiental, o crescimento econômico e a equidade social. A estes fatores, o aspecto cultural deve ser incluído. A sustentabilidade cultural está ligada à necessidade de se evitarem conflitos culturais, e deve ser buscada através da especificidade de soluções para cada local e cultura em particular. 57 A partir desses requisitos, ambiental, econômico, social e cultural, pode-se acrescentar o princípio de prover o melhor para as pessoas e para o meio ambiente, tanto no presente, quanto no futuro. De fato, um fator importante, comentado por Sachs24 (citado por MONTIBELLERFILHO, 2001, p.52) quando afirma que “o ideal será atingido quando, para expressar o novo paradigma, puder ser referido apenas desenvolvimento sem o adjetivo sustentável ou o prefixo eco”, até porque, pode-se dizer que “não há desenvolvimento que não seja sustentável”25 . Nesse contexto, conforme Costa (2000, p.62), “a noção de sustentabilidade ambiental corresponde a uma dimensão a ser incorporada à própria noção de desenvolvimento e não a um conceito fundamentalmente diferente do anterior.” Assim, no campo da arquitetura e do urbanismo, o ideal também será atingido quando pudermos expressar arquitetura, desenvolvimento urbano, planejamento urbano, ou urbanismo, sem precisar do adjetivo sustentável. Dessa forma, qualquer arquitetura ou planejamento urbano deveria ter intrínseco esse adjetivo e, assim seria possível afirmar que as dimensões ambiental, cultural, econômica e social estariam incorporadas à arquitetura e ao urbanismo. 2.3 A sustentabilidade: uso na arquitetura e urbanismo Alguns autores arriscam algumas definições do termo aplicado à arquitetura, como Edwards (2004, p. 1): ¿Qué significa que algo sea sostenible? [...] el concepto de sostenibilidad ha sido definido a lo largo de una serie de importantes congresos mundiales y engloba no sólo la construcción, sino toda la actividad humana. Para el arquitecto, el concepto de sostenabilidad también es complejo. Gran parte del diseño sostenible está relacionado con el ahorro energético mediante el uso de técnicas como el análisis del ciclo de vida, con el objetivo de mantener el equilibrio entre capital inicial invertido y el valor de los activos fijos a largo prazo. Sin embargo, diseñar de forma sostenible también significa crear espacios que sean saludables, viables económicamente y sensibles a las necesidades sociales. Por sí solo, un diseño responsable desde el punto de vista energético es de escaso valor.26 24 SACHS, Ignacy. Estratégias de transição para o século XXI: desenvolvimento e meio ambiente. São Paulo: Studio Nobel/ Fundap, 1993. 25 COSTA (2000, p. 62) diz que “Sem dúvida, após o debate desencadeado, em grande medida, pelos organismos internacionais, houve um avanço significativo ao se afirmar que não há desenvolvimento que não seja sustentável”. 26 “O que significa que algo seja sustentável? [...] o conceito de sustentabilidade tem sido definido ao longo de uma série de importantes congressos mundiais e engloba não só a construção, como toda a atividade humana. Para o arquiteto, o conceito de sustentabilidade também é complexo. Grande parte do projeto sustentável está relacionado com a economia energética mediante o uso de técnicas como a análise do ciclo de vida, com o objetivo de manter o equilíbrio entre capital inicial investido e o valor dos recursos fixos. Não obstante, projetar de forma sustentável também significa criar espaços que sejam saudáveis, viáveis economicamente e sensíveis às necessidades sociais. Por si só, um projeto sustentável do ponto de vista energético é de pouco valor” (tradução nossa). 58 McLennan27 (citado por OLIVEIRA, 2006, p. 33) descreve um “Edifício Vivo”, como o autor nomeia, com os seguintes princípios de funcionamento: obtém toda a água e energia necessárias no próprio local; está adaptado especificamente ao local e clima, evoluindo com as mudanças que se verifiquem nos mesmos; funciona sem poluição e não gera qualquer tipo de resíduo que não seja útil para outros processos do edifício ou do ambiente do entorno; promove a saúde e bem-estar de todos os usuários, assim como um ecossistema saudável; está comprometido com os sistemas integrados de maximização de eficiência e conforto; melhora a saúde e diversidade do ecossistema local mais em vez de degradá-lo; e é belo e inspira-nos a sonhar. Ou seja, o edifício utópico! Diante de tantos aspectos e limitações, uma arquitetura verdadeiramente sustentável torna-se praticamente impossível de existir. Alguns autores ainda acrescentam questões como: as oportunidades de trabalho que o empreendimento possa oferecer à comunidade durante e após o processo de construção; como o empreendimento atua sobre a vida social e econômica do entorno imediato e urbano; e o impacto sobre o sistema de transporte. Além disso, também se referem a este tema, no que diz respeito às etapas do ciclo de vida da edificação, sempre se preocupando com a continuidade dos baixos custos de manutenção e operação da construção, através da utilização de tecnologias ambientalmente corretas, como uma maior eficiência energética, redução do consumo de água e a durabilidade das construções (OLIVEIRA, 2006). A edificação em si deve ser projetada de forma que interaja com o meio em que se insere. O entorno é o começo de tudo. Respeitar a topografia e vegetação existente, desenvolver estudo de impacto ambiental, analisar a adequação a planos urbanísticos e verificar a infraestrutura existente (água, energia, transportes, coleta de lixo). Além disso, o projeto deve ser concebido utilizando sempre iluminação e ventilação naturais, com orientação da edificação bem planejada, assim como suas formas, com atenção para o uso correto de proteções solares e a especificação dos materiais, entre outros vários aspectos. Deve-se tirar o máximo proveito das condições climáticas da região para se obter maiores contribuições no uso eficiente e na racionalização da energia, sem esquecer de garantir o conforto dos usuários. A redução do consumo de energia é essencial, segundo o PROCEL, as economias podem chegar a 30% em edificações existentes e 50% nas projetadas dentro dos conceitos de eficiência energética. A eficiência energética nas edificações pode ser entendida como um baixo consumo de energia proporcionando as mesmas condições ambientais. Aproximadamente 50% da energia produzida no mundo é consumida nos edifícios, em processos de construção e de operação. O restante da energia é consumida por indústrias (25%) e pelo setor de transportes (25%). No Brasil verificou-se que de 20% a 30% da energia 27 MCLENNAN, Jason F. Living buildings. In: BROWN, D.; FOX, M.; PELLETIER, M. R. Sustainable architecture white papers. New York: Earth Pledge Foundation, 2000. 59 consumida seriam suficiente para o funcionamento da edificação, 30% a 50% da energia consumida são desperdiçados por falta de controles adequados da instalação, por falta de manutenção e também por mau uso, e 25 a 45% da energia são consumidos indevidamente por má orientação e por desenho de suas fachadas (OLIVEIRA, 2006). Além do projeto, também os materiais construtivos e tecnologias empregadas vão favorecer mais ou menos o bom aproveitamento dos recursos naturais e contribuir para a redução do consumo energético na edificação. Os materiais estão dentre as principais características para uma edificação ser mais sustentável do que outras. A seleção de materiais que tenham um menor impacto possível sobre o meio ambiente e a utilização de materiais procedentes de fontes renováveis ou reciclados são alguns dos principais pontos. Para isso é necessário conhecer o ciclo de vida de um material em todas as fases, desde os impactos provocados pela extração da matéria-prima, passando pelo transporte, aplicação final, desempenho, longevidade do material, capacidade de reutilização, reciclagem até a sua decomposição. Outra questão essencial é a toxidade do material para o homem e para o meio ambiente. Daí a grande importância do papel das normas e selos de qualidade dos materiais e equipamentos. No que diz respeito à industrialização e transporte do material, estes representam os mais prejudiciais processos ao meio ambiente, pois consomem muita energia, e são fontes de poluição ambiental, sonora e atmosférica. Assim, quanto mais natural e próximo do local for o material construtivo, melhor (OLIVEIRA, 2006). Outro importante ponto da construção urbana é a produção e disposição dos resíduos resultantes das transformações produzidas pelo homem no ambiente natural e construído. Um exemplo da dimensão do impacto causado pela construção civil sobre o meio ambiente, é que 20% dos resíduos sólidos produzidos nos Estados Unidos provém da construção civil e 40% das emissões atmosféricas são também produzidas na construção civil (PINHEIRO, 2002). Uma questão interessante é a conhecida como os três erres, reduzir, reutilizar e reciclar. A reciclagem é uma técnica importante e rentável, mas antes disso é preciso minimizar a geração de resíduos e depois tentar reutilizar. a sustentabilidade na arquitetura tem ampla relação com a forma como utiliza a energia e como relaciona-se ao ambiente natural. Constata-se também que os padrões de consumo e produção dessa arquitetura serão definidores do modo de vida de um determinado grupo humano; que definirá padrões de consumo de energia e de hábitos de utilização da energia; e que fará parte de um determinado contexto urbano que será modificado pela dinâmica da utilização da arquitetura que nele se insere (SOUZA, 2004, p. 4). Posteriormente um projeto e construção mais sustentáveis, se completam com uma manutenção e o uso adequados da edificação. 60 Segundo Montibeller-Filho (2001, p. 289-290) em seu livro “O mito do desenvolvimento sustentável”: Conclui-se, então, pela impossibilidade de que no mundo capitalista venha a atingir-se o desenvolvimento sustentável, com suas dimensões básicas de equidades intrageracional (garantia de qualidade de vida a todos os contemporâneos), intergeracional (igual garantia às pessoas das próximas gerações, mediante a preservação do meio ambiente) e equidade internacional (de todos os países, ou a todo indivíduo independentemente de sua localização geográfica). Assim, cremos haver demonstrado a validade da hipótese principal, a saber, que as proposições ambientalistas [...] constituem-se em contribuições relevantes para amenizar os efeitos da problemática socioambiental; mas que, todavia, não conseguem superar a contradição fundamental do sistema de tender a apropriar-se de forma degenerativa dos recursos naturais (esgotamento) e do meio ambiente (degradação) [...]. O desenvolvimento sustentável revela-se um mito [...]. Porém Montibeller-Filho (2001, p. 290-291) completa que isto não implica na impossibilidade de que: em casos individualizados e/ou a curto prazo possa verificar-se a efetividade de ações que visam a sustentabilidade. Estudos futuros neste sentido seriam relevantes [...] Finalmente, enfatiza-se a posição de que são fundamentais as ações que visam a processos de transformações das condições socioeconômicas e socioambientais. Para um maior entendimento da sustentabilidade aplicada na arquitetura e urbanismo, é interessante mencionar brevemente alguns termos usados anteriormente à existência desse conceito. Entre eles encontramos o organicismo, a arquitetura orgânica, a arquitetura bioclimática, arquitetura ecológica, entre outros. ...transmitiremos essa Cidade, não menor, porém maior, melhor e ainda mais bela do que nos foi transmitida. Patrick Geddes 2.3.1 Organicismo Na corrente organicista, ou do organicismo, destacam-se o biólogo Patrick Geddes e seus sucessores Lewis Mumford e Marcel Poète. A concepção orgânica de cidade de Geddes é pioneira na visão sistêmica do planejamento e da cidade. A cidade é considerada um organismo vivo. As visões históricas da cidade, elemento importante que dá a noção de simultaneidade de passado, presente e futuro, dar-se-iam tanto no estudo dos lugares dos cidadãos, isto é, suas cidades, quanto das outras cidades. É com a (re)leitura e o (re)conhecimento do passado que deve-se fazer uma melhor crítica do presente e desejar-designar um futuro melhor (GEDDES, 1915). Pode-se dizer que Geddes (citado por CARVALHO, 2004, p.10) foi pioneiro na idéia do compromisso inter-gerações do desenvolvimento sustentável quando acata o juramento da juventude ateniense “...transmitiremos essa Cidade, não menor, porém maior, melhor e ainda mais bela do que nos foi transmitida”. 61 Seu discípulo mais ilustre, Lewis Mumford28 (citado por CHOAY, 1979, p. 287) se dedicou à história da civilização. Ele dizia que: Devemos dar mais importância à função biológica dos espaços livres, hoje que a cidade está ameaçada pela poluição e que, dentro do perímetro dos centros urbanos, o ar formiga de substâncias cancerígenas. Mas não é tudo: aprendemos que os espaços livres também têm um papel social, freqüentemente negligenciado em benefício único de sua função higiênica. Mumford defendia a cidade como um lugar que serve de abrigo tanto a uma sociedade sempre crescente, e suas necessidades freqüentemente mutáveis, quanto à sua herança social acumulada (SOUZA, 2004, p.6). Outro fato bastante interessante da obra de Lewis Mumford (1956, [s.p.]) é grifado no texto abaixo, quando ele utiliza em 1956 o termo sustentabilidade: Probablemente, ninguna ciudad de la antigüedad alcanzó una población muy superior al millón de habitantes, ni siquiera Roma; y, excepto en China, no han existido otras Romas hasta el siglo XIX. Pero, mucho antes de alcanzar el millón de habitantes, la mayoría de las ciudades llegan a un punto crítico de su desarrollo. Esto sucede cuando la ciudad pierde su relación simbiótica con su entorno inmediato; cuando el crecimiento sobreexplora los recursos locales como el agua y pone en peligro su suministro; cuando, para proseguir su crecimiento, una ciudad se ve obligada a buscar agua, combustible o materias primas para su industria más allá de sus límites inmediatos; y, por encima de todo, cuando su tasa interna de nacimientos se hace insuficiente para mantener, si no aumentar, su población. Esta etapa se ha alcanzado en diferentes civilizaciones en diferentes periodos. Hasta este punto, cuando la ciudad alcanza los límites de sostenibilidad de su propio territorio, el crecimiento se produce a través de la colonización, igual que en un panal de abejas. Superada esta fase, el crecimiento tiene lugar, desafiando los límites naturales, a través de una ocupación intensiva del territorio y de una invasión de las áreas circundantes, sometiendo, por la ley o simplemente por la fuerza, a las ciudades rivales que compiten por los mismos recursos. (grifo nosso) A abordagem vitalista da cidade de Poète29 (citado por CHOAY, 1979, p. 282) se aproximou muito da de Geddes. Poete defendia que: A cidade é um ser sempre vivo, cujo passado temos de estudar para poder discernir seu grau de evolução; um ser que vive sobre a terra e da terra, o que significa que, aos dados geográficos, é preciso acrescentar os dados históricos, geológicos e econômicos. [...] E os traços econômicos do passado servem para explicar os traços sociais, assim como a estes estão ligados os traços políticos e administrativos. 28 MUMFORD, Lewis. The highway and the city. London: Secker & Warburg, 1964. 29 POÈTE, Marcel. Introduction à l`urbanisme. Paris: Boivin, 1929. 62 A natureza precisa ser cuidadosamente preservada, pois a arquitetura deve ser subordinada à ela, à qual deve constituir uma espécie de introdução. Françoise Choay 2.3.2 Arquitetura Orgânica A chamada arquitetura orgânica ou arquitetura organicista, foi uma escola da arquitetura moderna influenciada pelas idéias de Frank Lloyd Wright (1867 - 1959). O conceito do orgânico foi desenvolvido através das pesquisas de Frank Lloyd Wright, que acreditava que uma casa deve nascer para atender às necessidades das pessoas e do caráter do país como um organismo vivo. Sua convicção era de que os edifícios influenciam profundamente as pessoas que neles residem ou trabalham, e por esse motivo o arquiteto é um modelador de homens (FIG. 11). FIGURA 11 – Casa da Cascata, Pensilvânia, EUA, arquiteto Frank Lloyd Wright, 1936. Fonte: FRYSINGER, 2006. De uma forma geral, a arquitetura orgânica é considerada como um contraponto (e em certo sentido, uma reação) à arquitetura racionalista influenciada pelo Estilo Internacional de origem européia. Assim foi muito criticada pelos modernistas racionalistas. No livro de Bruno Zevi (1950, p.66) “Towards an organic architecture”, o autor questiona o que viria ser orgânico e especificamente arquitetura orgânica. Ele comenta sobre a opinião de William Edmond Lescaze, um dos arquitetos pioneiros do modernismo americano, mencionando que “William Lescaze maintains that organic means nothing at all: ´Organic is the Word which Frank Lloyd Wright uses to describe his own architecture`”30 . Zevi (1950, p.72) também diz que: “The architectural use of the Word organic is, as we said, of old standing and has given rise to a great deal of 30 “William Lescaze que dizia que não significava simplesmente nada, ´orgânico é a palavra que Frank Lloyd Wright usa para descrever sua própria arquitetura´ ” (tradução nossa). 63 confusion. But we do not pretend to give it an exact meaning; there is no word – and certainly no adjective – of which the meaning is not to some extent approximate.” Apesar da arquitetura orgânica ter surgido nos EUA, desenvolveu-se ao redor de todo o mundo. Um arquiteto europeu considerado orgânico e bastante conhecido mundialmente foi Alvar Aalto. Hugo Alvar Henrik Aalto (1898 - 1976), arquiteto finlandês de inspiração orgânica ou regional, em oposição aos construtivistas (Bauhaus) foi um dos primeiros e mais influentes arquitetos do movimento moderno escandinavo. Havia dentro dele um reformador social, o que trouxe pesadas responsabilidades à arquitetura; ele dizia que a arquitetura pode até não salvar o mundo, mas poderia agir como um bom exemplo. Aalto buscou incessantemente adaptar a casa à sua destinação, ao clima e à paisagem. Ele recusou-se a se submeter a um dogmatismo moderno depois de repudiar o antigo. A notoriedade internacional veio com os pavilhões finlandeses para as feiras de Paris (1937) e Nova Iorque (1939), exemplos supremos do respeito pelo material de construção adotado, a madeira. Um exemplo de arquiteto orgânico mais atual é Paolo Soleri (1919) que ao finalizar seus estudos universitários em Turim, Itália, viajou para o Arizona e integrou-se à comunidade de Taliesin com Frank Lloyd Wright (1947-48). Em 1956 emigrou aos Estados Unidos e instalou-se em Scottsdale, Phoenix, criando a Fundação Cosanti, um centro de estudos sobre construção, arquitetura, urbanismo e ecologia, e uma fundição de sinos de bronze que gera a base econômica essencial das pesquisas e edificações. Desde 1970 constrói no deserto a comunidade de Arcosanti, protótipo urbano que deveria alcançar uma população de sete mil habitantes (FIG. 12). Arcosanti se baseia no conceito criado por Soleri chamado “Arcology” que engloba a fusão de arquitetura e ecologia (ARCOSANTI, 2005). Figura 12 – Arcosanti, deserto do Arizona, EUA, arquiteto Paolo Soleri Fonte: ARCOSANTI, 2005. 64 The need for architects to design for sustainable future becomes a self-evident imperative. Ken Yeang 2.3.3 Arquitetura bioclimática Clima, do grego “klima”, que significa inclinação, ou seja, refere-se à inclinação do sol no horizonte. Chama-se arquitetura bioclimática uma arquitetura pensada em relação ao ambiente local, principalmente em relação ao seu clima. A expressão “projeto bioclimático” surge nos anos 60 com os irmãos Olgyay na aplicação de conceitos do estudo do clima na definição de parâmetros de conforto nas edificações. De acordo com Caldas31 (citado por OLIVEIRA, 2006) a arquitetura bioclimática é uma adaptação da produção arquitetônica às condições climáticas locais. O bioclimatismo seria um conjunto de recursos teóricos que buscam subsídios para o planejamento da edificação aproveitando os elementos do clima para satisfazer exigências de conforto térmico. A bioclimatologia é uma ciência antiga, baseada em estratégias de projetação, para vencer as adversidades climáticas (OLIVEIRA, 2006). Victor Olgyay formulou um método de quatro estratégias integradas para a construção de um edifício climaticamente equilibrado: clima, através da análise dos elementos climáticos e microclimáticos do local, tais como temperatura, umidade relativa do ar, radiação solar e efeitos do vento; biologia, compreensão das necessidades biológicas e conforto humano; tecnologia, através da combinação de soluções tecnológicas para solucionar problemas de conforto ambiental; e arquitetura, que representa a combinação de todas as soluções formalizando-se na edificação (OLIVEIRA, 2006). A idéia evolui ao longo dos anos 80 para a arquitetura verde, também chamada internacionalmente de greenbuilding. Entre os maiores defensores da arquitetura verde encontrase o arquiteto Ken Yeang (1994, p.15), bastante conhecido pelos seus arranha-céus bioclimáticos. Ele defende que “Integration with nature is a central issue.”32 E diferencia a arquitetura bioclimática, influenciada pelo clima, da arquitetura ecológica, influenciada pelo meio ambiente. Além disso, defende que o projeto ecológico se preocupa com a fonte dos materiais de construção, seus processos de fabricação e transporte e com a destinação e reuso dos produtos que o edifício gera, ou seja, se traduz em construir com um mínimo de impacto no meio ambiente. 31 CALDAS, S. A. Espaço construído no semi-árido alagoano: sustentabilidade e preservação ambiental em modelos residenciais. 2002. Dissertação (Mestrado em Desenvolvimento e Meio Ambiente) - PRODEMA, Universidade Federal de Alagoas, Maceió, 2002. 32 “Integração com a natureza é o ponto central” (tradução nossa). 65 Os exemplos de arquitetos que procuram sempre integrar natureza, arquitetura e clima vêm crescendo, tais como Renzo Piano, Paolo Soleri, Emílio Ambasz, Bruno Stagno, entre tantos outros (FIG. 13 e 14). Figura 13 – Fukuoka Prefectural Internacuional Hall – Edifício em Fukuoka, Japão, projetado por Emilio Ambasz e associados. Fonte: AMBASZ, 2001. Figura 14 – Pergola Building, Costa Rica, arquiteto Bruno Stagno, 2003. Fonte: STAGNO, [200-]. 66 Uma verdadeira viagem de descobrimento não é encontrar novas terras, mas ter um olhar novo. Marcel Proust 2.3.4 Arquitetura ecológica Uma forma bastante sustentável de se construir é chamada de construção ecológica, eco construção, eco casa, arquitetura regional, etc. A diferença para uma construção sustentável é que utiliza o máximo de matéria-prima local e materiais reciclados e o mínimo de materiais industrializados, buscando a máxima auto-suficiência de energia e água, reduzindo, reutilizando e reciclando, e principalmente aliando tecnologias modernas ecológicas às técnicas antigas (PINHEIRO, 2002). A arquitetura ecológica tem raízes na arquitetura vernacular do passado, cujo conhecimento intuitivo do meio ambiente e clima proporcionava resultados de conforto térmico e lumínico para determinada época e região (FIG. 15). Figura 15 – Construção circular da comunidade de Menter Y Felin Uchaf Fonte: UCHAF, 2005. A arquitetura sustentável parece agrupar as características da arquitetura bioclimática e da arquitetura ecológica, juntamente com os novos pensamentos surgidos com a idéia de sustentabilidade (FIG. 16). Uma outra mudança da arquitetura ecológica que pareceu evoluir para a sustentável seria que, além de se priorizar a utilização de recursos renováveis, surgem as edificações completamente autônomas energeticamente. De maneira geral, a arquitetura ecológica preconiza principalmente aspectos que introduzem em sua elaboração projetual, questões amplas envolvendo o meio ambiente (OLIVEIRA, 2005). 67 Figura 16 – Centro Cultural Jean-Marir Tjibau, Noumea, arquiteto Renzo Piano, 1998. Fonte: PIANO, [200-]. 2.4 Considerações sobre a sustentabilidade na arquitetura e no urbanismo A preocupação com o meio ambiente, com o clima, a perfeita adequação da construção com seu entorno, as tradições culturais, a disponibilidade de recursos e materiais, a conservação de energia, a redução de desperdícios, o bem estar do homem, deveriam ser sempre essenciais na elaboração e no desenvolvimento do projeto de arquitetura e no planejamento urbano. Até porque, “nenhum outro profissional tem a capacidade e o poder de intervir tão diretamente na cidade e na vida dos cidadãos como o arquiteto-urbanista” (GRUPO DE TRABALHO 1, 2003, p. 176). Assim, nosso papel e dever é o de projetar e construir de modo a melhorar as condições e qualidade de vida do homem, preservando e conservando o meio ambiente, produzindo espaços saudáveis, intervindo o mais sustentavelmente possível. É fato que seja impossível projetarmos e construirmos edificações e espaços que sejam totalmente sustentáveis, pois são milhares os quesitos necessários. O próprio conceito de sustentabilidade apresenta grande complexidade e dificuldade de concreta definição, principalmente por tratar-se de disciplina em desenvolvimento. Porém os objetivos da sustentabilidade e do desenvolvimento sustentável não se invalidam. Assim, pode-se dizer que tudo aquilo que estiver ao alcance do arquiteto-urbanista precisa ser colocado em prática. Sendo fundamental que o arquiteto pense, projete, além de procurar influenciar o cliente no sentido de compreender a importância de se buscar uma arquitetura (e um uso do espaço de vida) sustentável. Para que isso ocorra, é essencial que a educação e formação do arquiteto-urbanista seja sólida e transdisciplinar. A universidade, e assim suas diretrizes, disciplinas e professores, precisam oferecer todo o embasamento a este propósito. 68 Neste capítulo foi possível entendermos como, quando e onde surgiram os conceitos relacionados à sustentabilidade de forma geral e à sua aplicação na arquitetura. Sustentabilidade na arquitetura e urbanismo deve aqui, portanto, ser entendida como a interação das questões ambientais, sociais, culturais e econômicas aplicadas à arquitetura e no urbanismo. Para verificarmos adiante como estas questões estão sendo abordadas dentro dos cursos de arquitetura e urbanismo, no próximo capítulo serão discutidas a Educação Ambiental e a Sustentabilidade no Ensino de Arquitetura. Serão brevemente explicadas as formas de educação com um viés ambiental, como a educação ambiental e educação para a sustentabilidade, mas primeiramente será abordada a consciência ambiental, principal item desta fundamentação teórica. Em seguida o ensino de arquitetura será comentado com um breve histórico, assim como as Diretrizes Curriculares para os cursos de arquitetura e urbanismo, para posteriormente aprofundar a análise de alguns cursos de arquitetura e urbanismo, através do exame das disciplinas e dos cursos de extensão, aperfeiçoamento e extensão. 69 Quem planeja a curto prazo, deve cultivar cereais; a médio prazo, plantar árvores; a longo prazo, deve educar as pessoas. Kwantzu, China, a. C. 3 EDUCAÇÃO AMBIENTAL E SUSTENTABILIDADE NO ENSINO DE ARQUITETURA E URBANISMO Educar envolve receber uma informação, trabalhá-la, interpretá-la e agir em decorrência da interpretação a que se chegou. Há um envolvimento ativo dos indivíduos. Desejandose atingir um problema específico e ativar as pessoas, é necessário conhecer como fazê- lo, como passar a informação, da forma mais relacionada à vida, às atividades das pessoas, de tal forma que elas se sintam atingidas e conseqüentemente interessadas em pelo menos aprofundar o conhecimento a respeito. Atividades, demonstrações práticas, exemplos da vivência diária, são formas mais eficientes de se atingir o público-alvo. Envolvendo as pessoas em uma atividade prática, o alcance é ainda maior (SANTOS, 2005, p. 69). De acordo com a Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), a melhor maneira de tratar das questões ambientais é com a participação de todos os cidadãos interessados. Assim, a Educação Ambiental mostra-se, a longo prazo, como o melhor caminho de criar a consciência crítica na comunidade, a partir da análise dos problemas por ela vivenciados, e para, a partir disto, estabelecer efetivamente sua participação na solução destes mesmos problemas. “Por mais que ainda estejamos nos primórdios da reflexão sobre o quando, como, onde e por que da metodologia em educação ambiental tudo nos leva a crer no seu sucesso”(SANTOS, 2005, p. 68). A educação ambiental deve caminhar no sentido de avaliar tanto a ação antropocêntrica sobre a natureza, quanto a divisão de interesses que permeiam essa ação. É necessário estabelecer uma consciência ambiental que não possua um sentido restrito, mas que, de forma intensa, compreenda, investigue, e pesquise nos campos formal e informal da educação, as melhores condições para sua prática de ensino. Um objetivo fundamental da Educação Ambiental é permitir que os indivíduos participem do enfrentamento e da resolução das problemáticas ambientais que lhes atingem mais diretamente, sempre tendo como ponto central a compreensão da natureza complexa do meio ambiente natural e do meio ambiente construído criado pelo homem, resultante da integração de seus aspectos biológicos, físicos, sociais, econômicos e culturais (SANTOS, 2005). Além da Educação Ambiental, podemos citar a Educação para a Sustentabilidade ou para o Desenvolvimento Sustentável (EDS) e também a Alfabetização Ecológica como outras formas de educação com um viés ambiental. A Alfabetização Ecológica seria um dos primeiros passos para desenvolvermos uma vida mais sustentável, pois seria a compreensão dos princípios básicos da ecologia e como viver de acordo com eles (CAPRA, 2003). 70 A seguir, a Educação Ambiental e a EDS serão um pouco mais descritas, mas primeiramente será abordada a consciência ambiental, ingrediente essencial para qualquer forma de aprendizado dessa área. Em seguida verificaremos se o ensino de arquitetura tem se preocupado com a problemática ambiental, e como tem ocorrido esta evolução. Infelizmente, de acordo com Trigueiro (2003), a maioria dos brasileiros não se percebe como parte do meio ambiente, que tem sido entendido como algo de fora, que não nos inclui. A expansão da consciência ambiental acontece em função desta percepção, do entendimento de que meio ambiente começa dentro de cada um de nós, alcançando todo o nosso entorno e as relações que estabelecemos com o universo. O despertar da conscientização consiste em informar o público sobre a relevância de um fenômeno para suas vidas. Informar no sentido de educar. A participação ativa é ganha ao se oferecer uma oportunidade para expressar interesse em questões reais, especialmente quando o tema indica que a participação pode efetivamente influenciar um resultado. Yi-Fu Tuan, 1980 3.1 Consciência ambiental Investigações feitas em grandes centros metropolitanos europeus e norte-americanos constataram que um aumento de conhecimentos em relação à crise ecológica e diversos impactos ambientais no planeta não leva necessariamente a uma transformação nas atitudes e um maior respeito e cuidado com o meio ambiente. O essencial não é o saber, afirmam, mas sim o sentir. Quanto mais uma pessoa sofre, se indigna e se revolta com a degradação e destruição do meio ambiente, mais desenvolve atitudes de compaixão e enternecimento, de proteção à natureza (SANTOS, 2005). A mobilização das pessoas frente às questões ambientais, que é de fundamental importância, pode ser feita segundo Lerípio33 (citado por SANTOS, 2005, p. 64), com a técnica SCC, ou seja, sensibilização, conscientização e capacitação. De acordo com o autor: Embora muitos sejam os caminhos possíveis para a sustentabilidade, todos eles dependerão das pessoas e de sua efetiva participação nesse processo de transição. Como sensibilizar as pessoas? Como oportunizar que se conscientizem? De que forma capacitá-las para atingir e manter um nível de excelência na qualidade ambiental e em todas as suas repercussões? Para Lerípio, sensibilizar significa despertar para a existência de um problema e sua gravidade. A sensibilização costuma ocorrer “de fora para dentro”, ou seja, é induzida a partir de 33 LERIPIO, A. A.; SARAIVA, L.M.; POSSAMAI, O.; SELIG, P.M. O Sistema de abastecimento de água na perspectiva da emissão zero. Prêmio CASAN de Ecologia, Florianópolis: [s.n.], 1996. 20 p. 71 fatos, notícias, ou eventos. A conscientização normalmente acontece “de dentro para fora”, ou seja, ao ser sensibilizada a pessoa se conscientiza quando percebe suas relações com o problema, ou como vítima das conseqüências do problema, ou como agente causal. A partir daí, ela é capaz de receber informações de como deve agir. A percepção ambiental das pessoas precisa ser estimulada para poder contribuir com a efetividade da capacitação ambiental das mesmas. A capacitação das pessoas sensibilizadas e conscientizadas é muito mais efetiva do que aquela realizada de forma direta, que invariavelmente apresentam maiores dificuldades para compreender a necessidade daquela mudança de hábito proposta pela capacitação (SANTOS, 2005). A percepção inevitavelmente influencia o comportamento humano, mas, para manter um ambiente de qualidade, o comportamento precisa ser dirigido para atos específicos. Ademais, os atos específicos precisam ter precedência sobre outras possíveis ações que reflitam uma hierarquia diferente de valores. Os hábitos pessoais refletem as prioridades de valor de um indivíduo e o tratamento com consideração para com o ambiente requer a ênfase nos valores ambientais. A informação e a educação do público são indispensáveis, especialmente para desenvolver a atitude conhecida como ética ambiental (SANTOS, 2005 p. 67). 3.1.1 As linhas de pensamento: capitalistas selvagens x ambientalistas fanáticos Para simplificar a classificação tanto dos indivíduos, empresas, entidades, governos e/ou nações inteiras, quanto à posição frente à questão ambiental, poderíamos separá-la em três grandes linhas de pensamento. É claro que para cada uma existem diversos níveis e também várias situações para cada caso. O primeiro grupo seriam os defensores do meio ambiente. Existem várias nomenclaturas, tais como ambientalistas, ecologistas, o simples uso do adjetivo “verde”, por exemplo, cientistas verdes, partidos verdes, entre outros. No segundo grupo estariam aqueles que desconhecem, ou não acreditam que seja necessária tanta preocupação com o meio ambiente, ou que priorizam outras questões. O terceiro grupo, aqueles que se opõem à questão ambiental, normalmente quem, de alguma forma, se beneficia da exploração sem limites da natureza. Este último grupo, podemos denominar de vertente anti-ambiental ou até, em alguns casos, de “capitalistas selvagens”, e vem diminuindo à medida que leis e direitos ambientais vão dificultando essas ações. Para alguns a produção capitalista, por sua própria natureza, é anti-ambiental, mas vem sendo obrigada, pelas pressões dos movimentos ambientalistas, a se adaptar a um novo modelo de produção mais consciente e mais sustentável. Segundo Marx34 (citado por Montibeller-Filho, 2001), foi o surgimento da sociedade fundamentada na propriedade privada e na economia monetária que conduziu à exploração ilimitada do mundo natural. 34 MARX, Karl. Le capital. Paris: Garnier-Flammarion, 1969. 72 Pior não é a exclusão social, a desigualdade de renda, a falta de qualificação das pessoas, a fome. Pior não é a violência, a falta de justiça, a degradação ambiental. Pior é a convivência com tudo isso. Pior é o silêncio dos que sabem. Agenda 21 Catarinense 3.1.2 Defensores ambientais: consciência ambiental x mudança de atitude35 Sobre a primeira linha de pensamento, os defensores ambientais, são subdivididos em “ativos” e “passivos”. Os defensores “ativos”, além de possuírem consciência da problemática ambiental, participam ativamente agindo com o objetivo de ajudar a melhorar esta questão. Dentro deste grupo dos defensores “ativos”, pode-se dizer que encontram-se também os ambientalistas fanáticos, e que somente se preocupam com o meio ambiente, esquecendo o importante diálogo da questão ambiental com a questão espaço-cultural e principalmente a socioeconômica. Os defensores “passivos” possuem a consciência ambiental, e vontade de agir, mas não possuem ainda atitude suficiente para intervir. A formação da consciência ambiental ainda está em fase de concepção por toda a comunidade terrestre, onde, de uma população com mais de 6 bilhões de habitantes, apenas pequena parte está realmente consciente e tenta promover ações necessárias para o desenvolvimento sustentável e prepara-se para a formação de uma sociedade sustentável, outra parte tem consciência, porém não participa com atitudes de saneamento ambiental ou medidas preventivas ao problema, mas a grande parte não tem noção local e muito menos global do que se passa quanto a usurpação do planeta e ainda inconscientemente é subjugada sendo uma carga geradora do desequilíbrio ambiental moderno (SANTOS, 2005 p. 39). O maior objetivo, nesse caso, seria a transformação da consciência ambiental em movimento ativo. Para isso, não é suficiente mais informação, mas principalmente sentimento. Assim, é necessário compreender melhor as inter-relações do homem com o meio ambiente, tanto individual como comunitário. E para isso é fundamental o estudo dos processos mentais relacionados à percepção ambiental. “O indivíduo ou grupo enxerga, interpreta e age em relação ao meio ambiente de acordo com interesses, necessidades e desejos, recebendo influências, sobretudo dos conhecimentos anteriormente adquiridos, dos valores, das normas grupais, enfim, de um conjunto de elementos que compõe sua herança cultural” (DEL RIO; OLIVEIRA36 , citado por SANTOS, 2005, p. 61). 35 Subtítulo tirado de SANTOS, M. T. Consciência ambiental e mudanças de atitude. 2005. 36 DEL RIO, Vicente; OLIVEIRA, Lívia de. Apresentação. In: DEL RIO, Vicente; OLIVEIRA, Lívia de (Org.). Percepção ambiental: a experiência brasileira. São Carlos: UFSCar, 1996. 73 A luta para preservar o meio ambiente começa dentro de casa, continua no trabalho, nos acompanha na recreação e nas compras. Grande parte das agressões à natureza e à nossa saúde tem sua raiz no estilo de vida que adotamos. Por isso, pequenas mudanças nos hábitos do dia-a-dia são tão importantes quanto combater aqueles que exploram o planeta de modo insustentável. Greenpeace Brasil 3.1.3 A segunda linha de pensamento A segunda vertente relacionada à classificação quanto à posição dos indivíduos, empresas e/ou governos em relação às questões ambientais poderia ser dividida em três grupos. O primeiro seria formado por aqueles que desconhecem ou sabem muito pouco das informações referentes à problemática ambiental. Para se desenvolver a atitude conhecida como ética ambiental são necessárias a informação e educação do público, principalmente crianças e adolescentes, pois educando o jovem as chances de se obter um futuro melhor para todos são evidentemente maiores. A educação tem papel estratégico no processo de Gestão Ambiental, na formação de crianças e de jovens, incorporando valores humanos e ambientais, realçando o sentidos entre as práticas cotidianas com a teoria lançada em sala de aula, levando a uma cultura de sustentabilidade, uma cultura da convivência harmônica entre os seres humanos e entre estes e a natureza (SANTOS, 2005 p. 67). No segundo grupo, encontram-se aqueles que são informados da problemática ambiental, mas consideram um exagero tanta preocupação e tanta abordagem. Dessa forma, pode-se dizer que também lhes faltam informações, entendimento das mesmas e principalmente um sentimento e comprometimento maior. O terceiro grupo é informado da questão ambiental, e entende a sua problemática, mas considera que existem outras prioridades a serem primeiramente tratadas. Para muitas pessoas é mais importante tratar das questões mais urgentes como pobreza, fome e falta de moradia, deixando de lado ou adiando as questões ambientais propriamente ditas. O problema é que mais tarde, quando a problemática ambiental passar a receber mais prioridade, a mesma já estará muito maior e mais complexa do que agora. Para exemplificar este pensamento, podemos citar o cientista canadense e cético sobre a influência humana no aquecimento global, Tim Patterson, que diz que todo o dinheiro desperdiçado com o Tratado de Kyoto poderia ser usado para fornecer água potável à África (VEJA, 2007). O também cientista e estatístico dinamarquês, Bjorn Lomborg, considera a questão ambiental muito importante, mas dependendo da região ou nação, existem outras prioridades. O autor do livro, O ambientalista cético 37 , também critica, por exemplo, os custos estimados da implementação do Protocolo de Kyoto, que poderiam resolver muitas das 37 Para um maior aprofundamento ler LOMBORG, Bjorn. O ambientalista cético. [S.l.]: Ed. Campus, 2002. 576p. 74 necessidades elementares dos habitantes dos países subdesenvolvidos. Em entrevista à BBC Brasil em 2002, diz que: O problema é que existem questões mais urgentes. Os países em desenvolvimento precisam deixar claro que, enquanto muitos dos seus cidadãos não souberem se vão ter uma próxima refeição, eles não vão se importar tanto com o que vai acontecer com o ambiente em cinqüenta ou cem anos. [...] É preciso entender que, quando organizações ambientalistas do Primeiro Mundo apontam problemas no ambiente, isso pode ser correto em seus países, mas não necessariamente nos países em desenvolvimento.38 Assim, uma das conclusões do cientista é que o problema do meio ambiente é a pobreza. Na mesma entrevista à BBC Brasil, Lomborg diz que “a longo prazo, sim, há bons motivos para se pensar que o Brasil vai ficar mais rico e vai atingir um ponto em que a população vai se importar de verdade com o meio ambiente”. Dessa forma, o autor cita que é sempre mais fácil explorar a natureza hoje e deixar para pagar por isso mais tarde, o que foi feito nos países ricos, que agora se preocupam bastante com a questão ambiental. Uma outra questão defendida por Lomborg, uma das mais polêmicas de seus livros e artigos39 , é a existência de certo exagero na divulgação dos danos ao meio ambiente, principalmente para aumentar a audiência e chamar mais a atenção do público. Ele também relata que muitas vezes as boas notícias sobre os avanços do ambientalismo são omitidas. Isso levou alguns cientistas verdes, como Stephen Schneider, reagirem às grandes vendas do livro de Lomborg. Schneider publicou um texto na revista Scientific American, em janeiro de 2002, que além de questionar a veracidade das estatísticas do autor, defende a mídia: Não somos apenas cientistas, mas seres humanos também. E como a maioria das pessoas, gostaríamos que o mundo fosse um lugar melhor. Para fazer isso, precisamos de um suporte mais amplo, capturar a imaginação do público. Claro que isso significa conseguir muito apoio da mídia. Por isso, temos que oferecer cenários assustadores, fazer afirmações simplistas e dramáticas, e fazer pouca menção das dúvidas que possamos ter... Cada um de nós tem que decidir qual é o equilíbrio correto entre ser efetivo e ser honesto. Indiscutivelmente precisamos entender que a questão ambiental é de grande importância. Independente se os dados estatísticos são esses ou aqueles, até porque ninguém é capaz de avaliar com exatidão todas as mudanças que vêm ocorrendo, nem os perigos concretos que elas podem causar (DASMANN, 1976), a preservação ambiental é extremamente necessária em todas as atividades humanas. As intensidades que devem ser diferentes. Tanto nas atividades, quanto de acordo com as regiões, cidades e países. 38 Entrevista dada à BBC-Brasil em setembro de 2002. 39 Os artigos “Lutar contra aquecimento é jogar dinheiro fora”, “Reservas naturais: o fim não está próximo” e “Visão apocalíptica oculta progresso humano” foram publicados em O Estado de São Paulo, em 19, 20 e 21/08/2001, respectivamente. 75 Sempre que se degrada o meio ambiente em 1%, a pobreza aumenta em 0,26%. PNUMA 3.1.3.1 Pobreza x Meio ambiente Apesar das taxas de crescimento variarem consideravelmente de uma região para outra e de uma cidade para outra, na atualidade ocorre um crescimento mais acentuado em regiões mais pobres e nas que estão atravessando um processo rápido de crescimento econômico. Estas muitas vezes não possuem infra-estrutura suficiente para absorver o crescimento populacional e resolver os problemas da expansão descontrolada que se soma aos já existentes. Cada situação tem suas próprias e distintas implicações para o meio ambiente urbano (ROSETTO, 2003, p. 45). FIGURA 17 – Crianças separando resíduos em um aterro sanitário. Fonte: PNUMA, 2004, p, 9. Estima-se que um quarto da população urbana viva abaixo da linha de pobreza. A pobreza é um dos principais agentes da degradação ambiental urbana, e estas duas questões, estão sempre se influenciando. A pobreza atrapalha muito o desenvolvimento de políticas e investimentos ambientais mais rigorosos, assim como condições ambientais adversas e escassez de recursos normalmente afetam mais a população carente. Na verdade a problemática ambiental prejudica a todos, mas as populações mais carentes, principalmente em áreas urbanas, são as mais vulneráveis. Num mundo de desigualdades, nem o direito ao meio ambiente saudável é assegurado, de forma efetiva, a todos os cidadãos. Mais uma vez, aqueles que usufruem de melhor situação econômica, dispõem de saneamento básico, abastecimento de água potável, de energia elétrica e de acesso à saúde, educação e condições de moradia adequados (OLIVEIRA, 2006, p. 10). 76 FIGURA 18 – Moradias irregulares na cidade Fonte: PNUMA, 2004, p, 9. Alguns dizem que a grande responsável pela destruição do meio ambiente é a necessidade de moradia da população, de todas as classes sociais, já que não é possível decretar o fim da natalidade ou o acesso das pessoas à cidade. E assim o impacto ambiental referente à solução de suprir a grande carência de moradias nos grandes centros urbanos é irreversível (PINHEIRO, 2002). Os países pobres defendem suas necessidades de superação da crise social e de desenvolvimento como uma preocupação mais relevante que a preservação ambiental, enquanto os países ricos costumam priorizar a manutenção de seus níveis de crescimento econômico e padrões de consumo. E assim, os países pobres responsabilizam os ricos pela maior parte da degradação mundial, promovida por um modelo predatório de crescimento e consumo, e transferem para eles a obrigação de investimentos necessários à sustentabilidade. Em contrapartida, os países ricos, vêem o crescimento populacional e a poluição gerada pela pobreza como as causas principais do problema. A população mais pobre está diretamente ligada aos seus meios de subsistência, e os mais ricos podem se dar ao luxo de priorizar a sustentabilidade ambiental. Porém, o que a população mais pobre almeja é basicamente uma melhor qualidade de vida. Há então, a necessidade de evoluir para a prática de uma subsistência sustentável, permitindo diálogo entre o crescimento, a subsistência e o meio ambiente (OLIVEIRA, 2006). Assim, não se deve destacar e priorizar nenhuma dessas duas problemáticas, pobreza e meio ambiente, e sim uni-las para serem resolvidas simultaneamente. O diálogo dessas duas grandes questões depende muito da criatividade, de acordo com Barros40 (citado por SANTOS, 2005, p. 13) “o desenvolvimento sustentável elege como seu recurso básico a iniciativa criativa 40 BARROS, Marlene P. B. Aprendizagem ambiental: uma abordagem para a sustentabilidade. 2002. Dissertação (Mestrado em Engenharia de Produção) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002. 77 das pessoas e como objetivo fundamental o seu bem-estar material e espiritual. Em comunidades que funcionam bem, mesmo quando há pobreza, há também, estratégias engenhosas de sobrevivência”. Um dos maiores desafios é equilibrar a questão social com a ambiental. Daí a utilização do temido termo sustentabilidade, que juntamente com a dimensão cultural e econômica tenta contemplar de forma equilibrada todas essas dimensões, para melhorar as condições e qualidade de vida de todos os povos, minimizando o uso de recursos naturais e causando um mínimo de distúrbios ao ecossistema (MONTIBELLER-FILHO, 2001, p. 54). A educação ambiental deveria ser vista como uma questão inerente ao exercício da cidadania. CIMA 3.2 Educação Ambiental (EA) [...] propostas de Educação Ambiental pretendem aproximar a realidade ambiental das pessoas, conseguir que elas passem a perceber o ambiente como algo próximo e importante em suas vidas; é verificar ainda, que cada um tem um importante papel a cumprir na preservação e transformação do ambiente em que vivem (MEDINA41 , citado por PINHEIRO, 2002, p. 128). A expressão Educação Ambiental foi usada em 1965, na Conferência de Educação realizada na Universidade de Keele, na Inglaterra, com a recomendação de que a educação ambiental deveria se tornar uma parte essencial da Educação de todos os cidadãos. Foi apenas o ponto inicial deste movimento. Na Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano em Estocolmo em 1972 dois importantes fatos aconteceram: a criação do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente – PNUMA, com sede em Nairobi, capital do Quênia e a recomendação para que se criasse o Programa Internacional de Educação Ambiental – PIEA. Em 1975, 65 países se reuniram em Belgrado (ex-Iugoslávia, atual Sérvia), para formular os princípios orientadores do PIEA. O grande marco da educação ambiental ocorreu em 1977 na cidade de Tbilise (antiga URSS), na primeira Conferência Intergovernamental sobre Educação Ambiental realizada pela parceria UNESCO e PNUMA. Ali, foi finalizada a primeira fase do Programa Internacional de Educação Ambiental, cujos princípios e definições servem como base e referência para a moderna educação ambiental (DUSI, 2006). 41 MEDINA, Nana. Os desafios da formação de formadores para a educação ambiental. In: PHIPIPPI JR, Arlindo; PELICIONI, Maria Cecília Focesi (Org.). Educação ambiental: desenvolvimento de cursos e projetos. São Paulo: Signus, 2000. p. 9-27. 78 A educação ambiental é um processo em que se busca despertar a preocupação individual e coletiva para a questão ambiental, possibilitando o acesso a conhecimentos e habilidades, bem como a formação de atitudes e desenvolvimento de uma consciência crítica que se transformam em práticas de cidadania, estimulando o enfrentamento das questões ambientais e sociais, para garantir uma sociedade mais sustentável (MOUSINHO, 2003; PINHEIRO, 2002). A educação ambiental encontra-se na Constituição como incumbência do poder público, juntamente com a conscientização social para a defesa do meio ambiente. Leis federais, decretos, constituições estaduais, leis municipais e normas abrigam dispositivos que determinam a obrigatoriedade da educação ambiental, mas a efetividade desses mecanismos topa com problemas estruturais e carência da educação formal no país (CIMA, 1991). A partir de 1975 começaram a surgir no país os primeiros projetos de educação ambiental, mas ainda nas escolas fundamentais e, somente mais tarde, nos ciclos universitários de graduação e pós-graduação. Esse processo pode ter sido lento devido à falta de qualificação do corpo docente; daí, a adoção de programas de treinamento em escala ainda em andamento. Para que a educação ambiental possa introduzir o caráter transdisciplinar imposto pela problemática ambiental, é necessária a construção de novas metodologias capazes de superar os obstáculos da utilização sustentável do meio. Dessa forma, é preciso que o ensino universitário também incorpore a educação ambiental em cada área de conhecimento com um determinado foco. Assim, o curso de arquitetura e urbanismo deve oferecer, em sua base teórica e prática, as diretrizes da educação ambiental, com o objetivo de introduzir ou aumentar a consciência ambiental dos estudantes. A ecologia é um campo disciplinar de grande importância tanto para o conhecimento como específico da formação do arquiteto. Visto como aquele que pensa e interfere no ambiente, o profissional de arquitetura deve ter os subsídios necessários que o permitam fazê-lo com a consciência ecológica e de compreensão do mundo que o cerca. Questões amplas que envolvem a visão da cidade como um ecossistema, não podem deixar de compor o quadro teórico e referencial do arquiteto. [...] A compreensão dos problemas ambientais do presente, ao nível da cidade ou planeta, é fundamental para a base de formação de um profissional consciente da importância e conseqüência do seu trabalho nas diversas escalas de atuação (FARAH, 2003, p. 107-108). O tratamento da questão ambiental, além de reduzir o meio ambiente somente à idéia de proteção da natureza, tem sido tratado de forma genérica e fragmentada e desvinculada da prática social concreta. Por isso, muitos autores, como Capra (2003) defendem que ensinar o saber ecológico deveria ser o papel mais importante da educação do século 21, sendo uma preocupação central da educação em todos os níveis, tanto no ensino fundamental e médio, quanto principalmente no ensino universitário. Infelizmente, muitos projetos de educação ambiental não obtêm resultados satisfatórios ou não atingem os objetivos propostos. Isso porque normalmente não se direcionam 79 aos problemas reais de uma determinada comunidade ou região, ou então a maneira como o projeto é desenvolvido não está de acordo com a realidade e interesses da população em questão. É imprescindível que se conheça o público alvo, para ser possível definir e implementar um projeto de educação ambiental. É necessário investigar sobre a população, seus interesses e valores; suas características sócio-econômicas e educacionais; seu conhecimento e nível de informação sobre a problemática ambiental e interpretação, verificados através de estudo de percepção ambiental; e as características ambientais da área que habitam. Dessa forma, o primeiro passo para dar início a um projeto de educação ambiental, é conhecer o perfil do grupo onde ele será instituído, diagnosticando as características da população, suas necessidades, interesses, valores e maneira que enxergam o ambiente (SANTOS, 2005). A educação é o agente principal da transformação para o Desenvolvimento Sustentável, aumentando a capacidade das pessoas para transformar as suas visões para a sociedade numa realidade. UNESCO 3.3 Educação para o Desenvolvimento Sustentável (EDS) ou Educação para a Sustentabilidade O termo EDS nasceu da Agenda 21, do capítulo 36, na Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento no Rio de Janeiro em 1992. Neste capítulo da declaração final da Conferência, todos os países presentes assumiram que a educação, o treinamento e a conscientização do público são chaves no alcance do Desenvolvimento Sustentável e comprometeram-se a desenvolver e implementar uma estratégia de educação para o Desenvolvimento Sustentável até 2002 (PAAS, 2004). Em 2002, na Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Sustentável, verificando-se que pouco havia sido feito para cumprir esse compromisso, a importância da educação para o desenvolvimento sustentável foi reafirmada como um investimento para o futuro no seu Plano de Implementação de Johanesburgo (JPOI). Para agilizar este processo, a JPOI recomendou a implementação de uma “Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável”, onde cada país, independente do seu nível de desenvolvimento, terá de renovar seus esforços para completar e implantar seus planos de EDS (PAAS, 2004). O período de janeiro de 2005 a dezembro de 2014 foi decretado pela ONU como a “Década da Educação para o Desenvolvimento Sustentável”. Para desenvolver estratégias inovadoras para a Educação do Desenvolvimento Sustentável – EDS e realizar os objetivos dessa década, a UNESCO convocou governos, educadores e pesquisadores do mundo inteiro, para 80 refletir e formular caminhos efetivos neste sentido, requerendo propostas e estudos acadêmicos (PAAS, 2004). A EDS representa um esforço internacional massivo e talvez um dos maiores na história do mundo, que tem como plano efetivar mudanças importantes nas práticas, no conteúdo e também no próprio conceito da educação em um período de tempo relativamente curto. A intenção é reeducar os professores e a população em geral, mas principalmente uma mudança no sistema educacional, transformando as técnicas, tecnologias e conteúdos normalmente utilizados para se encaixarem nessa nova visão de desenvolvimento. Assim, a EDS busca mudanças de atitudes e comportamentos principalmente individuais em detrimento de mudanças que envolvem somente processos políticos e econômicos (PAAS, 2004). Muitos autores que analisam a proposta de uma Educação para o Desenvolvimento Sustentável ou para a Sustentabilidade concordam que ela surgiu como uma tentativa de superar alguns problemas apresentados pela educação ambiental praticada nas escolas de diversos países. A EDS deve ser entendida como uma solução para aplicar essa nova perspectiva de desenvolvimento baseada nos valores de sustentabilidade. Pois não é suficiente apenas corrigir os problemas de uma sociedade insustentável, é preciso enxergar como encontrar a chave de todo o problema. E a educação é a chave para se criar um futuro mais sustentável, pois é através dela que é possível alterar atitudes e comportamentos. A definição atual, mais específica, vem da UNESCO DEDS42 (citada por PAAS, 2004, p. 66): [A EDS é] uma visão que ajuda as pessoas de todas as idades a entender melhor o mundo no qual vivem, que aborda a complexidade dos problemas como a pobreza, o consumo irresponsável, a degradação ambiental, a deterioração urbana, o crescimento da população, a doença, o conflito e a violação de direitos humanos que ameaçam o nosso futuro. Esta visão enfatiza uma abordagem holística e interdisciplinar para desenvolver o conhecimento e as habilidades necessárias para um futuro sustentável e também as mudanças em valores, comportamento e estilos de vida. Pode-se entender melhor o espírito da EDS examinando suas bases, que foram definidas ao longo das últimas três décadas, em conjunto com o conceito do Desenvolvimento Sustentável. Durante este período, os proponentes mais fortes para educação voltada a sustentabilidade vieram da área de educação ambiental. Assim a EDS é entendida por muitos como sinônimo de educação ambiental, inclusive pelo Ministério da Educação do Brasil. Porém, diversas pessoas e organizações defendem que a EDS é uma extensão da educação ambiental, com maior foco nas questões políticas e sociais. Esta visão é promovida pela World Conservation Union e pela UNESCO que entendem a EDS como uma prática com bases em 42 UNESCO DEDS - Decade of Education for Sustainable Development. Framework for a draft international implementation scheme.[S.l.]: UNESCO, 2003. 81 diversas disciplinas, não somente nas ciências ambientais, mas também em educação para o desenvolvimento, a paz e a cidadania global (PAAS, 2004). Embora no Brasil a EDS não esteja estruturada como uma linha específica de Educação Ambiental, a expressão é bastante utilizada. Durante a apresentação da UNESCO, nas Jornadas ASPEA, uma educadora francesa, declarou que como ainda existe a indefinição do termo 'Desenvolvimento Sustentável (DS), esta década também serviria para definirmos melhor o que seja DS, sem reconhecer os riscos e armadilhas presentes em orientar a educação para algo sem definição. Por um certo ponto de vista a Educação para a Sustentabilidade, parece possuir uma abordagem educacional que limita ao invés de ampliar a visão do aluno. Pode ser entendida como uma educação para algo e não uma educação geral capacitando o aluno a debater e entender sobre o todo. Por outro lado a Educação para a Sustentabilidade, nada mais é que abordar todas as dimensões do discurso, econômica, social, ambiental e cultural, e assim não deixa de ensinar sobre o todo. Em seguida veremos se e como essas questões têm sido abordadas na evolução do ensino de arquitetura no Brasil. É sinal de arrogância superestimar o impacto do homem na devastação do planeta: tecnologia e ciência são capazes de destruição [...] O patrimônio ambiental e o cultural não são eternos, [...] importa manter condições de salubridade, limpeza, beleza, além da sustentabilidade. [...] Aí se encontra a tarefa do [...] arquiteto [...] Maurício Andrés Ribeiro 3.4 Ensino de arquitetura: breve histórico A profissão de arquiteto é conhecida desde a Antiguidade, nas civilizações egípcia, grega e romana. Origina-se do grego, Arkhitekton, que significa “mestre-construtor” e, ao longo do tempo, o termo arquiteto veio sendo utilizado para se referir ao profissional que concebe e conduz as obras monumentais. Mas a formação do arquiteto, em relação à educação escolarizada, existe somente há três séculos. A criação da Academie Royale d´Architecture em 1671 na França, iniciou a institucionalização do ensino de arquitetura, pois até então o conhecimento técnico era passado de mestre a aprendiz (LEITE, 1998). No Brasil não havia ensino superior até a chegada da Família Real em 1808, quando criaram-se os primeiros estabelecimentos isolados públicos, com os cursos profissionais de Medicina, Engenharia, Artes e Direito. 82 POLITÉCNICA: Em 1810, a Real Academia de Artilharia, Fortificação e Desenho, criada em 1792 foi transformada em Academia Militar. Em 1858 passa a chamar-se Academia Central e em 1874, tem mudança de nome para Escola Politécnica do Rio de Janeiro, inspirada na École Polytechnique de Paris. BELAS ARTES: Em 1800, foi também criada a aula prática de desenho e figura na cidade do Rio de Janeiro. Foi a primeira medida concreta para a difusão da arte. O sistema de ensino teve também origem francesa, na Academie Royale d´Architecture. Em 1816, foi criada a Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios que implementou no Brasil a educação artística oficialmente formalizando o ensino da Beaux Arts. A instalação da Academia Imperial das Belas Artes se deu em definitivo em 1826, quando finalmente começou a ser ensinada a arquitetura, mas não como curso exclusivo para esta área, mas somente enquanto belas artes. Mesmo assim, muitos de seus alunos formados foram responsáveis pelos principais projetos de arquitetura dessa época. Em 1890 a Academia Imperial das Belas Artes transformou-se na Escola Nacional de Belas Artes, ENBA, um símbolo do ensino de arquitetura de caráter Beaux Arts, o modelo institucional até a década de 1930. A reforma de Carlos Maximiliano em 1915 autorizou o governo a reunir as escolas existentes no Rio de Janeiro, em universidades. Dessa forma, em 1920, surgiu a primeira universidade no Brasil - a Universidade do Rio de Janeiro, agregando três faculdades já existentes: Direito, Medicina e a Politécnica, que mais tarde passou a ser chamada Universidade do Brasil, hoje Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em 1920, foi criada a Universidade de Minas Gerais, a primeira universidade que de fato mereceu este nome, de acordo com Fernando de Azevedo. Ao final da década de 1920, o ensino de arquitetura ainda era constituído dos dois modelos distintos: Polytechnique, adotado pela escola Politécnica de São Paulo, que formava engenheiros-arquitetos, e apresentava caráter tecnicista, e o modelo das Beaux Arts, com instituição original na Escola Nacional de Belas Artes, ENBA, no Rio de Janeiro, que apresentava caráter artístico e humanista, formando e designando arquitetos. E já em suas origens o ensino de Arquitetura apresentava um caráter artístico em detrimento ao caráter técnico, sem muita integração entre ambos. Somente em 1930 foi criada a primeira escola de arquitetura no país autônoma em relação às escolas de Belas Artes e de Engenharia: a Escola de Arquitetura de Belo Horizonte, cujo ensino apresentava disciplinas técnicas, ou da engenharia, e artísticas, ou das Belas Artes. Embora essa escola fosse independente dos dois modelos, e apresentasse disciplinas de ambos, a integração das disciplinas técnicas com as artísticas continuava sendo complicada, de acordo com relatos dos estudantes. 83 A Escola de Arquitetura de Belo Horizonte foi incorporada à Universidade de Minas Gerais em 1946 e, três anos depois, a UMG transformou-se em instituição federal passando a chamar-se Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG (SOARES, 2005). Em 1945 foi fundada a Faculdade Nacional de Arquitetura, FNA, da Universidade do Brasil, UNB, no Rio de Janeiro, futura Universidade Federal do Rio de Janeiro, que significou um avanço no processo de emancipação da arquitetura do caráter das Beaux Arts (SOARES, 2005). Em 1960 foi inaugurada a nova capital federal, Brasília. Esse acontecimento deu ao movimento moderno na arquitetura um destaque que seria fundamental na constituição do novo ensino de arquitetura e urbanismo. Um ano depois foi criada a Universidade de Brasília, UnB, a primeira universidade do país que não aconteceu a partir da agregação de faculdades já existentes e isso permitiu que fossem feitas experiências na sua estrutura organizacional e didática pelos seus fundadores, Anísio Teixeira e Darcy Ribeiro, que foram fundamentais para o novo modelo universitário (SOARES, 2005). Esses fatos foram decisivos para dar a partida a quase uma década de campanha pela reforma universitária em nível nacional, a fim de contemplar as novas demandas da sociedade brasileira. 3.4.1 Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de graduação em Arquitetura e Urbanismo Até o ano de 1961, procurou-se unificar o ensino, sendo considerado como modelo o da Universidade do Brasil, UNB, futura UFRJ. Isso criou condições para se estabelecer um padrão de ensino superior no país inteiro, além de compensar a frustrada tentativa de uma única universidade. Iniciava-se aí o período do currículo padrão da Universidade do Brasil. Em 1961 foram outorgadas as primeiras Leis de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, 1a LDBEN. Ela concedeu expressiva autoridade ao Conselho Federal de Educação, com poder para autorizar e fiscalizar novos cursos de graduação e deliberar sobre o currículo mínimo de cada curso superior, fortalecendo a centralização do sistema de educação superior. A 1 a LDBEN foi o primeiro grande passo para a discussão da grande reforma que se concretizaria em 1969. Com a UnB, Universidade de Brasília, e a gradual implementação de um novo modelo acadêmico aos moldes do sistema norte-americano, observou-se um progressivo desmantelamento do sistema de cátedra, passando a ser substituído na UnB pelos departamentos, além da adoção do currículo mínimo, rompendo com o antigo modelo curricular da antiga UNB, no Rio de Janeiro (SOARES, 2005). 84 O novo currículo mínimo para os cursos de arquitetura foi homologado a partir do parecer nº 384 de 1969, do Conselho Federal de Educação, e apresentava como principal diferença ao currículo até então em andamento, a separação do currículo com dois tipos de matéria, as básicas ou fundamentais e as profissionais. As matérias nada mais eram que conteúdos essenciais que garantem a uniformidade básica para os cursos de graduação em Arquitetura e Urbanismo. Em dezembro de 1994 o então ministro Murilo Hingel assinou a Portaria 1.770, estabelecendo as Diretrizes Curriculares e o Conteúdo Mínimo para os 72 cursos de arquitetura e urbanismo no Brasil na época. Foram 25 anos para superar e avançar em relação ao Currículo Mínimo de 1969. As modificações foram grandes, novidades eram introduzidas, tais como Disciplina de Conforto Ambiental e Informática, e experiências bem sucedidas praticadas apenas em alguns cursos foram consolidadas como padrão nacional, como, por exemplo, o Trabalho Final de Graduação (ABEA, 2005). É interessante comparar as matérias do currículo mínimo de 1969 com as de 1994, que sofreram mais alterações que as de 2006 (QUADRO 1). 85 QUADRO 1 Comparação entre matérias do currículo mínimo de 1969 e de 1994 CURRÍCULO DE 1969 CURRÍCULO DE 1994 MATÉRIAS DE FUNDAMENTAÇÃO MATÉRIAS DE FUNDAMENTAÇÃO Estética, História das Artes e da arquitetura Estética, História das Artes Matemática Física Estudos Sociais Estudos Sociais e Ambientais Desenho e meios de Representação e Expressão Plástica Desenho e meios de Representação e Expressão MATÉRIAS PROFISSIONAIS MATÉRIAS PROFISSIONAIS Teoria da Arquitetura; Arquitetura brasileira História e Teoria da Arquitetura e Urbanismo Resistência dos materiais e estabilidade das construções Materiais de construção, detalhes e técnicas de construção Instalações e equipamentos Higiene da habitação Tecnologia da Construção Sistemas estruturais Sistemas Estruturais Planejamento Arquitetônico Projeto de Arquitetura, de Urbanismo e de Paisagismo Informática Aplicada à Arquitetura e Urbanismo Planejamento Urbano e Regional Conforto Ambiental Topografia Técnicas Retrospectivas TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO Fonte: Elaborado pela autora com base em CEAU, 1994. As matérias Matemática e Física passam a ter seus conteúdos inseridos em outras disciplinas. Os Estudos Sociais tiveram o aspecto ambiental incorporado; os Estudos Sociais e Ambientais objetivam analisar o desenvolvimento econômico, social e político do País, nos aspectos vinculados à Arquitetura e Urbanismo, e despertar a atenção crítica para as questões ambientais. Na Tecnologia da Construção foram incluídos os estudos relativos aos materiais e técnicas construtivas, instalações e equipamentos prediais e a infra-estrutura urbana. Ao Planejamento arquitetônico foram acrescentados o urbanismo e paisagismo. Em Conforto Ambiental está compreendido o estudo das condições térmicas, acústicas, lumínicas e energéticas 86 e os fenômenos físicos a elas associados, como um dos condicionantes da forma e da organização do espaço. A matéria Topografia consiste no estudo da topografia propriamente dita, com o uso de recursos de aerofotogrametria, topologia e foto-interpretação, aplicados à arquitetura e urbanismo. O Planejamento Urbano e Regional constitui a atividade de estudos, análises e intervenções no espaço urbano, metropolitano e regional. Houve a inserção do Trabalho Final de Graduação como disciplina obrigatória. Como vimos no quadro acima, as alterações nas matérias dos últimos currículos mínimos relacionadas à questão ambiental foram Estudos Sociais e Ambientais e Conforto Ambiental. De acordo com as primeiras análises, vem sendo observado que essas matérias não têm sido integradas às várias disciplinas, apenas desenvolvidas isoladamente. Na arquitetura, não apenas se estuda o ambiente, mas projeta-se o ambiente construído, os ecossistemas urbanos nos quais vive a maior parte da população. Durante longo tempo, a educação em arquitetura inspirou-se em padrões de outras sociedades e ambientes, produzindo como resultado e construções pouco funcionais. [...] disciplinas como a de Conforto Ambiental incorporam os valores da arquitetura bioclimática e propõem que se projete com o clima e com os recursos e materiais locais, mas ensinavam até recentemente, apenas a dimensionar equipamentos mecânicos de ar condicionado (RIBEIRO, 1998, p. 292). Percebe-se que as diretrizes curriculares de 1994 também não retrataram com a importância devida esse assunto, e muito menos abordando a sustentabilidade. Porém na proposta de Diretrizes Curriculares, datada de 1999, que resultou nas Diretrizes Curriculares de 2006 podem-se observar diversos pontos que estão estreitamente vinculados com a intenção deste trabalho (ver ANEXO). As novas Diretrizes citam que o ensino de graduação em Arquitetura e Urbanismo têm por objetivo a capacitação profissional em habilitação única e é ministrado em observância dos princípios da qualidade de vida dos habitantes dos assentamentos humanos e a qualidade material do ambiente construído e sua durabilidade; o uso da tecnologia em respeito às necessidades sociais, culturais, estéticas e econômicas das comunidades; o equilíbrio ecológico e o desenvolvimento sustentável do ambiente natural e construído; e a valorização e preservação da arquitetura, do urbanismo e da paisagem como patrimônio e responsabilidade coletiva. Outro fator muito interessante na nova resolução é a exigência que a instituição forme profissionais que compreendam e traduzam as necessidades dos indivíduos e comunidades, mas abrangendo a proteção do equilíbrio do ambiente natural e utilização racional dos recursos disponíveis. Além disso, a educação do arquiteto e urbanista deve garantir uma estreita relação entre teoria e prática e dotar o profissional de conhecimentos e habilidades requeridos para o exercício profissional, tais como: a compreensão das questões que informam as ações de 87 preservação da paisagem e de avaliação dos impactos no meio ambiente, com vistas ao equilíbrio ecológico e ao desenvolvimento sustentável; o entendimento das condições climáticas, acústicas, lumínicas e energéticas e o domínio das técnicas apropriadas a elas associadas; as habilidades necessárias para conceber projetos de arquitetura, urbanismo e paisagismo e para realizar construções, considerando os fatores de custo, de durabilidade, de manutenção e de especificações, bem como os regulamentos legais, e de modo a satisfazer as exigências culturais, econômicas, estéticas, técnicas, ambientais e de acessibilidade dos usuários; entre outras. Em relação às matérias essenciais, nas últimas Diretrizes ocorreu apenas uma mudança nas matérias de fundamentação: Estudos Sociais e Ambientais são dissolvidos e divididos em Estudos Sociais e Econômicos e Estudos Ambientais. Percebe-se que ao longo de todos esses anos o currículo mínimo tem sofrido alterações com o objetivo de maior adaptação aos tempos atuais. Um exemplo disso é a inclusão no currículo mínimo de 1994 da matéria Informática aplicada à Arquitetura e Urbanismo, fato esse inevitável, e que seria mais cedo ou mais tarde implantado e obrigatório em todos os cursos de arquitetura. Apesar dessas mudanças no ensino de arquitetura, pouco se avançou na vertente ambiental. São necessárias novas transformações e atualizações no currículo mínimo e principalmente na prática e na técnica, assim como nas discussões teóricas. De acordo com Ribeiro (1998, p.54) A arquitetura e o urbanismo deverão se nortear, conscientes da crise ecológica, climática e energética, bem como das potencialidades oferecidas pelas novas tecnologias de informação, pelos edifícios e cidades inteligentes e que conservam energia, ajudando a preservar os recursos naturais. [...] A prática e o ensino de arquitetura deverão ser transformados, incorporando, com ênfase cada vez maior, esses aspectos. A seguir será descrita uma sucinta pesquisa em algumas universidades, dentro de alguns cursos de arquitetura e urbanismo no Brasil, tanto na graduação quanto na pós-graduação, extensão e pesquisa, com o objetivo de ilustrar como tem sido pensada a contribuição para a formação dos estudantes brasileiros visando um desempenho mais sustentável da arquitetura, e como as exigências das novas Diretrizes Curriculares têm sido colocadas em prática. Essa pesquisa sucinta não tem caráter sistemático nem pretende cobrir o universo do ensino da arquitetura e urbanismo no país. A amostra de cursos e programas visa apenas colocar a questão em perspectiva para orientar as pesquisas que se seguiram, dirigidas diretamente aos estudantes e profissionais da arquitetura. 88 3.4.2 Graduação, cursos de capacitação, projetos de extensão e pesquisas Foi feita uma breve análise das ementas das disciplinas ofertadas por algumas universidades brasileiras, como ponto de partida para verificar o quanto se está tratando e discutindo as questões ambiental, cultural e social no ensino de arquitetura. Esta pesquisa foi feita através das páginas na Internet das universidades, e procurou-se diversificar a amostra por regiões brasileiras. Pesquisou-se a presença de disciplinas isoladas sobre o tema, obrigatórias ou optativas, e também a existência deste assunto em questão nos programas. Também se procurou identificar projetos e pesquisas de extensão, bem como cursos de capacitação específicos voltados para a temática ambiental e de sustentabilidade. Assim, foram identificados alguns cursos e programas onde as atenções ao tema são mais presentes: · Atualmente, no 5o período do curso de arquitetura da UFRJ, existe a disciplina Urbanismo e Meio Ambiente - UMA: Ementa: Conceito de Meio Ambiente. A evolução do pensamento ecológico. A crítica ecológica. Meio ambiente e desenvolvimento – o desafio urbano, a degradação ambiental e a sustentabilidade. Meio ambiente e planejamento. A política municipal de meio ambiente. O Plano Diretor. A qualidade ambiental nas cidades. Meio ambiente e desenho urbano (UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO -UFRJ, [200-]). Essa disciplina, que anteriormente era optativa, foi inserida no currículo da FAU/UFRJ como obrigatória a partir de 1997. O professor Luiz Manoel Cavalcanti Gazzaneo defende que os alunos têm o primeiro contato com a apropriação do espaço urbano e adquirem conhecimentos sobre meio ambiente, além de noções genéricas sobre urbanismo. A metodologia adotada abrange um trabalho prático em equipe, de pesquisa de uma área (um bairro) conhecida pelos alunos. A disciplina se divide neste trabalho prático, na apresentação ao aluno da morfologia da cidade do Rio de Janeiro, de informações genéricas sobre o meio ambiente e sobre a estruturação do espaço urbano. Para o professor, de uma maneira geral, o resultado tem apresentado resultados positivos, principalmente no despertar do alunato à pesquisa (GAZZANEO, 1998). Apesar de atualmente essa disciplina ser obrigatória, tanto por opinião particular (pois cursei esta disciplina em 1998), quanto de outros estudantes e arquitetos formados na UFRJ, parece não ser suficiente, colaborando apenas com o interesse em pesquisa, sendo superficial e sem integração às outras matérias. Outra disciplina optativa que trata do tema, no curso de arquitetura da FAU/UFRJ é Arquitetura e Sustentabilidade, do Departamento de História e Teoria. Ementa: O conceito de desenvolvimento sustentável e sua relação com a arquitetura. A sustentabilidade no ambiente construído e as conseqüências para a linguagem arquitetônica. O belo nos dias de hoje, a provável estética do sustentável. Arquitetura vernacular (UFRJ, [200-]). 89 No geral, é interessante ressaltar, como o faz o professor Paulo Afonso Rheingantz (2003, p. 148); “As bases teóricas para a ação educadora - formadora da FAU/ UFRJ, deve buscar incessantemente o aprimoramento das relações entre as suas diversas disciplinas, que devem estar voltadas para conceitos de sustentabilidade, democracia e compromisso social.” Porém ainda não são satisfatórias, nem as relações entre as disciplinas, nem a inserção de um discurso ambiental, social e cultural nas mesmas. · Na FAU/USP, no departamento de Projeto, há atualmente uma disciplina optativa: Ambiente Construído e Desenvolvimento Sustentável – Moradia Social. Ementa: A disciplina articula intervenção urbanística aos processos de gestão da cidade, visando melhoria da qualidade de vida urbana. Dá sequência à parceria já estabelecida com o Ministério Público com objetivo de criar referências e soluções urbanísticas adequadas para situações de irregularidade ou de conflito urbano onde interesses difusos da sociedade são afetados. Trabalha sobre casos concretos, visando formular propostas e alternativas que propiciem qualidade ambiental e soluções de legalização e inclusão social. Organizando-se em parte teórica e exercício prático, a disciplina discutirá conceitos de conflito urbano, de inclusão social e de desenvolvimento sustentável. Trabalhará sobre um caso concreto de núcleo residencial ilegal, já consolidado, em Área de Proteção aos Mananciais. Deverá elaborar soluções paradigmáticas que auxiliem a fixação de padrões compatíveis à demanda social (habitacional) e à questão ambiental, propiciando qualidade ambiental e soluções de legalização e inclusão social (UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO - USP, 2006). · O curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade FUMEC, em Belo Horizonte, de acordo com seus organizadores, adota formação voltada às questões sociais, culturais, ambientais e fundamentalmente éticas, para o desenvolvimento crítico de temas pertinentes à area, não prescindindo do debate sobre o valor estético. Dentre eles, destacam-se a concepção e a organização do espaço - condensado no plano do edifício ou da cidade, nos âmbitos privado e público; a preservação do patrimônio ambiental e cultural, estabelecendo o debate entre o desenvolvimento sustentável e a geração de novos espaços; bem como a utilização racional dos recursos do ambiente como base para a definição projetual em todos os níveis (UNIVERSIDADE FUMEC, [200-]). Dentre das disciplinas obrigatórias atualmente encontra-se no 8º período, Arquitetura e Sustentabilidade Ambiental. A universidade também possui cursos de pós-graduação lato sensu, tais como: Planejamento Urbano-Ambiental; e Meio Ambiente - Gestão Ambiental. · Também em Belo Horizonte, o curso de arquitetura da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, PUC-Minas, tem como principais temas que norteiam as atividades desenvolvidas nos âmbitos do ensino, da extensão e da pesquisa, a Arquitetura e Inclusão, Arquitetura e Sustentabilidade e Arquitetura e Tecnologia. Para seus organizadores, há uma estreita relação entre esses três temas, pois a busca de um espaço inclusivo somente pode ser realizada através de uma arquitetura que transforme a realidade a partir de seu próprio potencial, e esta é a arquitetura 90 que efetivamente constrói. (PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS - PUC MINAS, [200-]) Sobre Arquitetura e Inclusão, esse primeiro tema vem de encontro à necessidade, cada vez mais premente, de se combaterem os mecanismos excludentes que marcam a dinâmica da sociedade brasileira, mecanismos estes responsáveis pela perpetuação de uma desigualdade que vem dramaticamente se manifestando nas condições de acesso aos direitos mais básicos do cidadão. Trata-se, então, de delinear ao mesmo tempo as possibilidades e as estratégias de atuação do profissional da Arquitetura e do Urbanismo no sentido de reverter ou dirimir essa desigualdade também manifesta nas condições de acesso à habitação e à cidade. Isto significa que as atividades desenvolvidas no Curso de Arquitetura e Urbanismo da PUC-Minas deverão ser orientadas para a busca e a experimentação de soluções para a coletivização dos direitos à habitação e à cidade, sendo seus objetos prioritários o espaço urbano, o espaço público, os equipamentos de uso coletivo, a habitação popular (PUC MINAS, 200[-]). Sobre o tema Arquitetura e Sustentabilidade, vem de encontro à necessidade de se conterem os avanços da arquitetura praticada como uma ‘forma degradada de exploração do solo’. É esta a arquitetura, que, desconsiderando a um só tempo o ambiente natural e o ambiente construído, concorre sempre para a sua destruição. Trata-se, pois, de insistir na prática de uma outra arquitetura, que, considerando o patrimônio natural e o patrimônio construído, concorra sempre para potencializá-los. O desenvolvimento sustentável é aqui compreendido, então, como aquele desenvolvimento em que a utilização racional dos recursos – naturais e culturais – sobrepõe-se à sua exploração e ao seu conseqüente aniquilamento. É fundamento desse conceito, portanto, não a degradação, mas a transformação do ambiente a partir do seu próprio potencial. Nesse sentido, cabe incorporar às atividades desenvolvidas no Curso de Arquitetura e Urbanismo da PUC Minas a preocupação em formar arquitetos capazes não só de reconhecer o valor do patrimônio natural e do patrimônio construído, mas também de revalorizá-los através de suas proposições (PUC MINAS, [200-]). Analisando a grade de disciplinas e suas ementas não foi possível encontrar disciplinas isoladas sobre os assuntos em questão. Resta verificarmos adiante, através das próprias opiniões dos estudantes, se realmente estes temas estão sendo implantados nas aulas e palestras. · Na área de pesquisa, em Belo Horizonte destaca-se a UFMG, que em 2005 desenvolveu jogos para ensinar a construir, no qual foram criados “games didáticos” para auxiliar na produção de moradias populares. Os jogos do Canteiro, da Marcação e da Fundação surgiram para permitir que o mutirante pudesse participar de decisões técnicas sobre a obra de sua casa (MALARD, 2006). Atualmente, esta universidade desenvolve uma nova pesquisa envolvendo a criação de novas interfaces digitais e de ambientes imersivos direcionados a auxiliar o projeto arquitetônico participativo. O objetivo é permitir que o futuro morador de empreendimentos populares participe, além da construção, do planejamento de sua casa. Entre as novidades está 91 uma alternativa de baixo custo às sofisticadas e caras CAVEs (Cave Automatic Virtual Environments). Apesar da idéia de usar a imagem projetada como forma de reproduzir ambientes não ser nova, o trabalho da UFMG é pioneiro por desenvolver tecnologia para uso social. O trabalho vem sendo desenvolvido junto ao Laboratório Estúdio Virtual de Arquitetura (EVA), coordenado pela professora Maria Lucia Malard, e integrado por arquitetos que estão fazendo pós-graduação, além de estudantes de graduação com bolsas de iniciação científica. O laboratório foi montado pelo Departamento de Projetos da Escola de Arquitetura da UFMG, com o objetivo de desenvolver pesquisas que façam avançar o processo de criação na arquitetura com o apoio do computador (HABITARE, 2007). · A Universidade de Brasília, UnB, possui características interessantes na graduação e pesquisa, um dos exemplos é o estudo de novos materiais para construções, realizado pelo projeto Canteiro oficina de arquitetura (Cantoar). De acordo com o professor Jaime Almeida, coordenador do projeto, os alunos estudam a aplicação de fibras naturais, especialmente o bambu, na construção de projetos arquitetônicos. O trabalho envolve vários universitários e vai além do currículo convencional, pois é sempre solicitado por alguma comunidade. Um dos projetos mais expressivos, segundo Almeida, foi a construção de uma escola de bambu e palha na aldeia Kapèy dos índios Krahô, localizada no Tocantins, em 2000. Oito alunos participaram do projeto monitorado pelo professor. Outro bom exemplo, foi um grupo de estudantes apoiado pela professora Marta Romero, que em 2002 criou o escritório-modelo Centro de Ação Social em Arquitetura e Urbanismo Sustentável (Casas). Os estudantes atendem a associações de moradores, sindicatos, ONGs e outras instituições sem fins lucrativos que necessitam do trabalho de arquitetos e não têm condições de pagar os profissionais (UIVERSIDADE DE BRASÍLIA - UNB, [200-]). Ainda na graduação, o aluno da UnB pode participar de programas de intercâmbio entre universidades do Brasil e do exterior. O Consórcio Bilateral em Projeto Comunitário de Arquitetura e Urbanismo Sustentável (CBPS) permite, desde 2003, que graduandos façam intercâmbio na Universidade Federal de Rio Grande do Sul (UFRGS), na Penn State University (PSU) e na State University of New York at Syracuse (SUNY). A cada ano, a UnB envia dois alunos para os Estados Unidos e recebe outros dois. Analisando as ementas das disciplinas do curso, encontrou-se a disciplina obrigatória Estudos Ambientais- Bioclimatismo na Arquitetura e Urbanismo. 92 “Ementa: Bioclimatologia humana e percepção ambiental do ambiente higrotérmico, luminoso, sonoro e da qualidade do ar, métodos e técnicas de coleta e tratamento dos dados climáticos visando o projeto” (UNB, [200-]). CONTEÚDOS PROGRAMÁTICOS: UNIDADE 1- Bioclimatismo 1.- Conhecer a arquitetura bioclimática e seus princípios. Adequação ao lugar e ao clima. 2.- Exemplos vernáculos e contemporâneos. Percepção sensorial / ambiental integrada. 3.- Conhecer recursos, técnicas e dispositivos bioclimáticos. 4.- Aplicação de recursos, técnicas e dispositivos bioclimáticos visando o projeto adequado ao lugar. UNIDADE 2.- Clima 1.- Fatores climáticos globais: radiação solar, altitude, latitude, ventos, massa de água e terra. 2.- Fatores climáticos locais: topografia, vegetação, superfície do solo. 3.- Elementos do clima: temperatura, umidade do ar, precipitações, movimento do ar. 4.- Elementos do clima a serem controlados. Clima urbano, ilha de calor, poluição ambiental. 5.- Zoneamento Bioclimático do Brasil. Carta Bioclimática de Brasília. UNIDADE 3.- Sustentabilidade 1.- Noções de sustentabilidade. Princípios, dinâmicas, diretrizes, vetores. 2.- Dimensões do ecodesenvolvimento. Sustentabilidade ampliada e progressiva. 3.- Urbanismo Sustentável. Cidades sustentáveis. Agenda 21 Brasileira (UNB, [200-]). Um exemplo de uma disciplina optativa também sobre assunto seria Ateliê de Projeto de Arquitetura e Urbanismo Sustentável. Ementa: Exercícios de projeto do espaço urbano. Ênfase na definição de variáveis projetuais, processos de projeção e soluções físicas que criem e mantenham a sustentabilidade das comunidades de Vizinhança e trabalho urbanas. Aplicação de métodos e técnicas que contemplem, orientem e estimulem a participação social do usuário e a geração de padrões de intervenção que reforcem a dimensão social da arquitetura e do urbanismo (UNB, [200-]). · A Universidade Federal do Paraná, UFPR, possui projetos de extensão, como o Projeto Rondon, no qual estudantes universitários prestam serviços a comunidades carentes. O projeto, que teve sua primeira edição em 1967, foi retomado pelo governo federal a pedido da União Nacional dos Estudantes (UNE) em 2005 com um grupo de 200 pessoas. O projeto é voltado aos estudantes das áreas de Artes, Ciências Sociais Aplicadas, Exatas e da Terra, Agrárias, Biológicas, Humanas, Engenharia, Letras, Lingüística e Saúde, e formado por professores e universitários, que desenvolvem ações de reconhecimento das principais carências das populações de treze municípios da Amazônia Ocidental. Ao todo são quarenta universidades envolvidas no projeto, que compreende duas fases. A primeira fase consiste na coleta de dados e na análise das reais necessidades da comunidade. A segunda é a intervenção de universitários e professores especializados nos problemas constatados. Duas equipes de universidades do Paraná foram aceitas para atuar na primeira fase do Projeto Rondon, uma delas da UFPR (UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ - UFPR, [200-]). 93 Dentre as disciplinas optativas do curso de arquitetura da UFPR encontram-se: Arquitetura Popular; Cidade, Meio-Ambiente e Políticas Públicas; Sinergia - energia e Ambiente; Ecologia e Sociologia (UFPR, [200-]). · Também localizada em Curitiba, A UNILIVRE, Universidade livre do meio ambiente, é uma organização não-governamental, não sendo de ensino formal, oferecendo apenas cursos de capacitação. Foi inaugurada em 1991 pelo então prefeito e arquiteto Jaime Lerner, como uma unidade da prefeitura de Curitiba com o objetivo de disseminar conhecimentos e experiências relacionadas às questões ambientais, principalmente os problemas e soluções relacionados ao crescimento desordenado das cidades. Em 1992 a universidade foi transferida à responsabilidade do CEAU, Centro de Estudos Ambientais e Urbanos. Em 2002, a UNILIVRE tornou-se uma entidade do terceiro Setor, qualificada pelo Ministério da Justiça como uma OSCIP – Organização Social Civil Interesse Público, voltada para o desenvolvimento sustentável urbano e melhoria da qualidade de vida das pessoas e cidades (UNIVERSIDADE LIVRE DO MEIO AMBIENTE - UNILIVRE, [200-]). Dentre os cursos que a UNILIVRE oferece, encontram-se: Práticas para uma Sociedade Sustentável; A Cidade e o Meio Ambiente; e Bioarquitetura, que aborda aspectos de projetos e planejamento ecológico por meio de temas específicos e exemplos de obras arquitetônicas que contemplam os conceitos, avançando nas discussões ambientais de conservação, sustentabilidade e desenvolvimento tecnológico (UNILIVRE, [200-]). · Na Universidade Federal de Santa Catarina, UFSC (2006), uma interessante disciplina optativa foi criada pelo professor Roberto Gonçalves da Silva, em 1993, no Departamento de Arquitetura e Urbanismo, chamada Arquitetura e Sociedade - sem negligenciar a natureza. Para o professor Silva (2004, p.1), que também leciona nas disciplinas Urbanismo I e Urbanismo V na mesma faculdade, Arquitetura é toda e qualquer edificação cuja finalidade seja o abrigo da vida cotidiana - ou partes dela - adaptando-a ao lugar em que ela acontece. Enquanto produção material e simbólica, ela é o resultado de processos que articulam permanente e indissoluvelmente dois termos: natureza e cultura. Em decorrência deste entendimento - que recoloca a arquitetura como o centro das atenções dos estudantes de arquitetura - oriento os meus alunos a estudar os abrigos existentes na Ilha de Santa Catarina sem restringi-los ao formalismo decorrente do culto das formas da moda e das suas representações bidimensionais. O professor discute sobre a etnoarquitetura, conceito criado por ele em sua tese de doutorado em Geografia na USP. As referências fundamentais para se entender o conceito seriam: a primeira, a metáfora da ostra, utilizada por Henry Lefebvre em Introdução à 94 Modernidade, em que o espaço humano é apresentado tal como uma ostra, como resultado da relação permanente e indissolúvel mantida entre o molusco e sua casca. A segunda é a definição que Milton Santos introduz em Metamorfoses do Espaço Habitado, em que o espaço é formado por dois componentes que interagem continuamente: a configuração territorial, isto é, o conjunto de dados naturais, mais ou menos modificados pela ação consciente do homem através dos sucessivos “sistemas de engenharia”; e a dinâmica social ou o conjunto de relações que definem uma sociedade num dado momento. A terceira são os critérios que Marcus Vitruvius Polio faz constar em Los diez Libros de Arquitectura para a escolha de locais salubres em territórios desconhecidos, como condição fundamental para a boa arquitetura. Para ele, basta identificar essas áreas através da observação de como e onde vive a sua população nativa ou, na sua inexistência, eviscerar os animais capturados no sítio. Dessa forma, etnoarquitetura seria: o conjunto, material e simbólico, das estruturas espaciais que cada grupo social edifica para abrigar a sua vida cotidiana (ou partes dela), adaptando-a sucessiva e crescentemente ao território em que ele escolheu viver. Situada no universo da cultura, o conjunto de elementos materiais que a compõe (localizações, materiais, estruturas e formas historicamente utilizadas) é articulado pela inteligência e pelo habitus, para abrigar fisicamente a existência do grupo. Por constituir-se também no seu universo simbólico e identitário, possibilita/constrange a vida cotidiana do grupo bem como a de cada um dos indivíduos que o integram. Sendo uma síntese adaptativa da vida de cada grupo humano a cada lugar, esta diversidade cultural permaneceu encoberta, em decorrência da utilização generalizada do conceito de habitat - seu equivalente biológico. Entretanto a diferenciação contrastiva entre os dois conceitos permite evidenciar que a etnoarquitetura é elaboração espacial da inteligência humana (observação, experiência e memória) enquanto o habitat é decorrência de um padrão biológico inscrito no genoma de cada espécie viva (SILVA, 2004, p.12). Assim, Silva (2004, p.10-11) defende uma boa arquitetura, baseada principalmente na atenção e preocupação com a natureza e a cultura. Ele ainda afirma que: a moda moderna de arquitetar afirma-se pela desqualificação das realizações arquitetônicas anteriores, impondo-se global e soberanamente, destruindo em nome do progresso todas as realizações humanas anteriores. Estas sim, fruto da inteligência orientada pela busca permanente empreendida cumulativamente por cada grupo, de adaptar a sua vida cotidiana ao lugar em que ele escolheu viver. A conseqüência é a subordinação de todos, independentemente do lugar em que se encontrem, ao consumo impositivo de materiais, equipamentos e, principalmente, ao uso perdulário de energia . Através desta breve análise das ementas das disciplinas ofertadas por algumas universidades brasileiras, é possível percebermos algumas apresentações pontuais do tema em questão. Infelizmente muitas outras universidades foram pesquisadas, mas não relatadas aqui, por não apresentarem nenhum foco evidente para o tema central sobre preocupações ambientais, culturais e sociais aplicadas na arquitetura, sendo aqui descrito por sustentabilidade na arquitetura. 95 Para essas apresentações pontuais sobre o assunto em questão, pode-se dizer que em sua maioria são disciplinas optativas na graduação, e quando obrigatórias dificilmente interagem com as outras disciplinas, e assim passam despercebidas e são rapidamente esquecidas pelos alunos no decorrer do curso. Em algumas universidades foram encontrados apenas resumos feitos pelos organizadores das universidades para dar ênfase ao tema, mas sem realmente colocá-lo em prática. Esses fatos, aparentemente negativos, serão no próximo capítulo, comprovados através da pesquisa extensa com estudantes de arquitetura. 3.4.3 Pós-graduação em arquitetura e urbanismo Apesar do foco do nosso trabalho, em se tratando da formação do arquiteto e urbanista, ser a graduação, foi feita uma breve análise em algumas universidades brasileiras através de suas páginas na internet, sobre o quanto se está tratando e discutindo as questões ambiental, cultural e social na pós-graduação de arquitetura. Pesquisou-se principalmente a presença de especializações e mestrados na área. · A pós-graduação da FAU-UFRJ se divide em dois programas, o Proarq - Programa de Pósgraduação em Arquitetura e o Prourb – Programa de Pós-graduação em Urbanismo. O Proarq iniciou sua primeira turma de mestrado em 1987 e dentre suas oito linhas de pesquisa, destacase: Sustentabilidade, Conforto Ambiental e Eficiência Energética; as demais são: Ambientes de Saúde; Cultura, Paisagem e Ambiente Construído; Ensino de Arquitetura; Habitação e Assentamentos Humanos; Restauração e Gestão do Patrimônio; e Teoria, História e Crítica (PROARQ, [200-]). O Prourb oferece o curso de Mestrado desde 1994 com duas áreas de concentração: Projeto Urbano - atividade projetual para o aprimoramento do ambiente urbano; e Teoria e História do Urbanismo - análise crítica dos processos de transformação das cidades e estudo das teorias urbanísticas. O curso de doutorado do Prourb foi iniciado em 2002 e do Proarq em 2003 (PROURB, 2007). · O curso de mestrado da faculdade de arquitetura e urbanismo da Universidade de São Paulo, FAU/USP, foi criado em 1972 e o curso de doutorado em 1980, permanecendo como único doutorado no país até 1998. Este programa reunia os três departamentos da FAU em com uma única área de concentração: Estruturas Ambientais Urbanas, com sete sub-áreas de pesquisa, uma das quais Paisagem e Ambiente (USP, 2006). 96 Em 1999 a Comissão de Pós-Graduação iniciou os estudos para a reformulação do Programa, implantando uma nova estrutura centrada na realidade atual das possibilidades e demandas de desenvolvimento de pesquisas, criando novas Áreas de Concentração. Essa estrutura está implantada desde 2003. O Programa de Pós-Graduação, reúne os três departamentos da escola e conta, atualmente, oito áreas de concentração; Projeto da Arquitetura; História e Fundamentos da Arquitetura e Urbanismo; Planejamento Urbano e Regional; Design e Arquitetura; Projeto, Espaço e Cultura; Tecnologia da Arquitetura; Habitat; e Paisagem e Ambiente. Dentre eles, destacam-se (USP, 2006): Habitat: Tem como objetivo: Criar um campo de investigação e experimentação crítica sobre os assentamentos humanos dando prioridade à formação de um novo tipo de agente (pesquisador, professor e profissional inovador) apto a enfrentar os atuais problemas da construção da cidade e da gestão urbana de forma participativa e capaz de desenvolver a qualidade ambiental, os valores democráticos e os direitos sociais. Assim, esse campo deverá privilegiar a análise e proposição de produtos e práticas efetivas que compõem a "cidade real" (USP, 2006). Para esta área de Concentração existem quatro linhas de pesquisa: Indicadores e fundamentos sociais do habitat; Participação social e políticas públicas a produção e gestão do habitat; Custos de edificações, urbanização e infra-estrutura; e Questões fundiárias e imobiliárias, moradia social e meio ambiente. Paisagem e Ambiente: Foram criadas para esta Área de Concentração três linhas de pesquisa: 1. Paisagem e Ambiente: Projeto e Planejamento Sustentável: Esta linha pauta-se pelas investigações dos aspectos tecnológicos e ecológicos das bases biofísicas e construídas que condicionam e permitem a sustentação das paisagens. 2. Paisagem e Ambiente: Projeto, Apropriação e Políticas Públicas: Esta linha se caracteriza pelo estudo das diferentes formas de concepção dos espaços livres urbanos, suas formas de apropriação social e processos de transformação e os instrumentos de ação do poder público e da sociedade. 3. Paisagem e Ambiente: Base Documental e Sistemas Interpretativos: Tem por objetivo desenvolver pesquisas que contribuam para estabelecer interfaces entre o conhecimento histórico e geográfico, a questão urbana e a criação artística a partir de estudos de profundidade e de estudos integrativos e relacionais do campo da arquitetura da paisagem com modos de entendimento da arte, da cultura, da natureza e da cidade (USP, 2006). Tecnologia da Arquitetura: Após debates em função da necessidade premente de reestruturação da área de concentração “Tecnologia da Arquitetura”, os docentes credenciados apresentaram para o biênio 2006-2007, nova proposta visando definir com maior clareza a identidade da área de Concentração. As nove linhas de pesquisa foram reorganizadas e resumidas em outras três: Tecnologia da Construção; Conforto, Eficiência Energética e Ergonomia; e Processo de Produção da Arquitetura e do Urbanismo/Representações: 97 Tecnologia da Construção: Os trabalhos desenvolvidos nessa Linha buscam integrar o conhecimento vernacular e o contemporâneo de várias áreas do conhecimento humano ao estudo das atividades envolvidas no projeto, construção e uso de edificações. A inegável natureza física-concreta dos edifícios requer o equilíbrio entre as explorações dos campos estético, formal, social e cultural da arquitetura, bem como a reflexão sobre o potencial tectônico da obra arquitetônica. Aliada à adequação técnicoconstrutiva dos edifícios, a questão da qualidade dos edifícios assume um papel de destaque em razão da necessidade de garantir que o edifício cumpra as funções para as quais ele foi projetado e atenda às expectativas dos usuários (USP, 2006). Os principais temas são: 1. Avaliação Pós-Ocupação do ambiente construído; 2. Materiais e componentes de construção; 3. Consumo sustentável na arquitetura; Essa linha visa o aprimoramento e desenvolvimento de tecnologias construtivas para a produção, uso e manutenção de edificações e infra-estrutura urbana, nas quais devem ser priorizados: o consumo racional dos recursos naturais e o reuso/reaproveitamento/reciclagem de resíduos industriais, domésticos e urbanos. A análise do ciclo de vida de materiais e produtos de construção também é objeto de estudos no âmbito deste tema (USP, 2006). 4. Análise de desempenho técnico-construtivo e da qualidade de edifícios; Esse tema de pesquisa foca a importância da difusão e da prática da metodologia de análise sistêmica de projetos de arquitetura orientados ao desempenho do edifício como um todo, conscientizando o projetista dos impactos que as soluções de projeto têm sobre as etapas de execução, uso e manutenção durante a vida útil do edifício. Esta abordagem é complementar àquela da engenharia civil porque o método da avaliação de desempenho não é aplicado apenas sob a perspectiva da racionalização, da eficiência e da qualidade técnica mas ainda considera, com a sua devida ênfase, fundamentos da arquitetura que dizem respeito à estética, forma e função, questões sociais e culturais (USP, 2006). 5. Projeto e Obra - Introdução e Gerenciamento; O foco desta linha de pesquisa está no estudo de métodos que aproximem o profissional arquiteto do processo de produção do espaço construído. Entendendo que a atuação do arquiteto interfere no processo produtivo da edificação como um todo, torna-se importante estudar as formas de tornar as atividades da interface projeto-obra mais eficazes. O resultado de todo esse esforço naturalmente se reflete na redução do desperdício e das perdas durante a construção e na fase de uso; no melhor desempenho da edificação e na qualidade do gerenciamento da obra (USP, 2006). 6. Arquitetura para a segurança do ambiente construído: Trata-se de um tema de pesquisa dividido em duas vertentes: Segurança contra incêndio em edificações e no meio urbano; e Segurança de uso, segurança patrimonial e acessibilidade em edificações. Eficiência Energética e Ergonomia: Esta linha de pesquisa envolve as questões de conforto ambiental, térmico, acústico e luminoso, ergonomia e eficiência energética relativas às edificações e aos espaços urbanos. O tema eficiência energética trata das questões relativas ao consumo de energia elétrica nas edificações e sua correlação com o projeto arquitetônico e o desempenho dos materiais e componentes empregados na construção. Inclui também temas 98 relativos às fontes alternativas de energia, como sol, vento, geotermia, entre outros. A área Tecnologia Ambiental Urbana tem como objetivo analisar e propor estruturas e redes técnicas no sentido de se produzirem espaços urbanos mais adequados em relação tanto à sociosustentabilidade como à eco-sustentabilidade. Processo de Produção da Arquitetura e do Urbanismo/ Representações: As atividades voltadas para a produção da Arquitetura e do Urbanismo ocupam um espaço sócio-econômico no campo da sociedade civil, nos setores da Indústria, da Construção Civil e do Mercado Imobiliário. Essas atividades são responsabilidade profissional do arquiteto que, através do projeto, organiza a produção do espaço. Os condicionantes sócio-econômicos do projeto: quem solicita o serviço, a quem serve o projeto, quem o realiza e como, quem constrói e quanto isso envolve em termos de custos sociais, econômicos e ambientais, são questões de interesse da linha de pesquisa e constituem seu objeto. Considera-se que esse processo de produção do espaço constituiu historicamente um sistema de representações que, na sociedade industrial, caracteriza: a prática e ética profissional do arquiteto na sociedade; a legislação profissional, edilícia, urbana e ambiental; a cidadania; as representações sociais; o Mercado Imobiliário e a Economia da Construção Civil. Considera-se ainda que todos esses aspectos que condicionam o processo do projeto e incidem na configuração do espaço construído são geradores de representações que instrumentalizam e situam o arquiteto enquanto organizador da produção do espaço. O privilégio do exercício profissional do arquiteto é concedido pelo Estado aos cidadãos, mediante formação específica. Essa formação é também uma outra atribuição concedida ao arquiteto e, assim sendo, a elaboração pedagógica e a reflexão sobre a metodologia de ensino voltada para o exercício da formação superior do arquiteto se inserem nesse campo de interesse da linha de pesquisa aqui delineado (USP, 2006). Os principais temas são: 1. A produção da Arquitetura pelo desenho e o testemunho do espaço construído através do vídeo; 2. Prática Profissional do Arquiteto; 3. Tecnologia da Cor no Projeto Arquitetônico: visualização, representação e codificação; 4. Política Imobiliária Urbana; 5. Sustentabilidade na construção civil: O desenvolvimento tecnológico voltado para a produção do espaço, assume na contemporaneidade, a tarefa de investigar os aspectos voltados para a preservação do meio ambiente e a sustentabilidade dos meios de produção e matéria-prima empregados (USP, 2006). 6. Legislação Edilícia, urbana e ambiental e a organização do espaço; 7. As representações da arquitetura no processo produtivo e a Indústria da Construção Civil (mídia, canteiro, clientela); 8. Documentação e memória da Arquitetura e do Urbanismo e os meios de representação 9. Ensino de desenho e produção do espaço; 10. Dos custos do projeto para o projeto dos custos. 99 · A Universidade de Brasília, UnB, além de possuir mestrado e doutorado em Arquitetura e Urbanismo, possui o Centro de Desenvolvimento Sustentável, CDS. O CDS-UnB é um espaço acadêmico que visa formar competências, produzir conhecimentos e disseminá-los. A sua missão é promover a ética da sustentabilidade por meio do diálogo entre os saberes. Criado em 1996, o Programa de Pós-Graduação stricto sensu em Desenvolvimento Sustentável é pioneiro em sua área de atuação. Divide-se em Doutorado em Política e Gestão Ambiental, e Mestrado em Desenvolvimento Sustentável, com as áreas de concentração: Política e Gestão Ambiental, em funcionamento desde 1998, e Política e Gestão de Ciência e Tecnologia, em funcionamento desde 1999. O Mestrado pode ser opção acadêmica ou profissionalizante (CENTRO DE DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL DA UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA – CDS-UNB, 2006). O Mestrado Opção Acadêmica tem o objetivo de colaborar com a estruturação dos sistemas de pensamento existentes, buscando criar um conjunto de princípios e grandes linhas de reflexão que representem o pensamento acadêmico no debate sobre o balizamento das ações públicas e da sociedade em geral, no que diz respeito à questão ambiental. O Mestrado Opção Profissionalizante pretende capacitar recursos humanos altamente qualificados para a tomada de decisão em políticas públicas, capazes de desenvolver conhecimentos teóricos e técnicos para a proteção do meio ambiente e o desenvolvimento sustentável. As linhas de pesquisa são: Ciência e Tecnologia e Desenvolvimento Sustentável; Modelos Alternativos para o Desenvolvimento Sustentável; Políticas Públicas e Desenvolvimento Sustentável; Sociedade, Economia e Biodiversidade; e Educação Ambiental e Sustentabilidade (CDS-UNB, 2006). · Atualmente o Curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Paraná, UFPR (2006), disponibiliza o curso de pós-graduação lato sensu - Cidade, meio-ambiente e políticas públicas, cujo objetivo é viabilizar um intercâmbio de conhecimento teórico-prático em políticas públicas de desenvolvimento urbano na perspectiva ambiental com ênfase na produção da arquitetura, urbanismo e planejamento urbano. Seus organizadores dizem que a temática do meio ambiente apenas recentemente tem passado a integrar de forma mais efetiva a atuação profissional de técnicos da administração pública. Portanto, o curso busca atender a essa demanda, propiciando as bases para a implantação nos municípios de elementos concretos de uma política ambiental urbana no enfoque multidisciplinar. 100 · O PRODEMA, Programa Regional de Pós-graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente, é uma associação espontânea de algumas universidades nordestinas – Federais do Ceará, Paraíba, Alagoas, Piauí, Sergipe e Estaduais do Rio Grande do Norte, Paraíba,e de Santa Cruz (BA). O objetivo é a construção coletiva de um programa de pós-graduação regional que incorpora a questão ambiental, enquanto dimensão do desenvolvimento, nos seus cinco mestrados oferecidos. Das dezoito Instituições Universitárias que assinaram inicialmente o protocolo, aderiram e prosseguiram com a realização da idéia seis universidades: UFAL, UFPB, UFS, UFC, UEPB e UERN. Posteriormente, associaram-se à Rede as Universidades: Universidade Estadual Santa Cruz - UESC (Ilhéus-BA), Universidade Federal do Piauí -UFPI, e Universidade Federal Rio Grande do Norte - UFRN (PRODEMA/UFAL, 2005; PRODEMA/UFPB, 2006). A implantação do PRODEMA é resultado de um esforço de cinco anos de discussões, a partir de uma proposta encaminhada pela Universidade Federal de Alagoas, UFAL, que assumiu a coordenação da etapa de maturação do projeto até o momento de sua recomendação pela CAPES. A idéia de criar o programa surgiu na segunda metade dos anos 80, durante as atividades desenvolvidas pelo Núcleo de Estudos sobre Ecodesenvolvimento, mecanismo de integração interdisciplinar. A Área de concentração do programa do PRODEMA na UFAL é o Desenvolvimento Sustentável, com Sub-Área de Concentração Estratégias de Desenvolvimento Sustentável. As Linhas de Pesquisa são as seguintes (PRODEMA/UFAL, 2005): Linha de pesquisa I – Sócio economia do desenvolvimento sustentável: Tem como objetivo enfatizar as dimensões econômica e social do desenvolvimento sustentável, como objeto de ensino e de pesquisa. Procede ao tratamento dos seus fundamentos, conceitos e das relações críticas com a própria economia neoclássica, o meio ambiente, o rural e a agricultura, a energia, a tecnologia e a competitividade, objetivando a ampliação da racionalidade econômica através da incorporação das dimensões socioambientais, em novo paradigma de desenvolvimento. Sem desconhecer a escala universal da ciência, prioriza o contexto regional - Nordeste do Brasil. São disciplinas decorrentes: Fundamentos do Desenvolvimento Sustentável; Economia e Meio Ambiente; Energia e Meio Ambiente; Sustentabilidade do Desenvolvimento Rural e Agrícola; Tecnologia, Desenvolvimento e Meio Ambiente; e Economia do Desenvolvimento. Linha de pesquisa II – Cultura e política do desenvolvimento sustentável: Elege como objetivo o estudo e a pesquisa de um instrumental de análise das questões complexas referentes ao desenvolvimento e meio ambiente, acentuando a sociedade, a cultura, a política, o poder e a gestão. As analises se dão segundo as relações do local ao global, o saber e a modernidade, a articulação entre atores sociais, a ordem jurídica, a construção de novos paradigmas e estratégias gestionárias correspondentes: Relação Estado-Sociedade, expressão da Sociedade Civil, inovações e novos paradigmas organizacionais. Considera a afirmação das diferenças culturais e a multidimensionalidade do desenvolvimento abordando a herança cultural do Nordeste e os desafios para a sustentabilidade. Discute ainda, instrumentos teóricos e práticos, qualitativos e quantitativos para a construção e desenvolvimento do projeto de pesquisa. Tem como disciplinas: Globalidade, Centralidade e Poder Local; Ordem Jurídica e Meio Ambiente; Civilização e Cultura Local no Desenvolvimento Sustentável; Tópicos 101 Especiais I; Seminário de Metodologia em Pesquisa; Tópicos Especiais II - Enfoques Interdisciplinares; e Políticas Públicas e Sociedade Civil. Linha de pesquisa III – Espaço e meio ambiente do desenvolvimento sustentável: Tem como objetivo estudar elementos e configurações de sustentabilidade e insustentabilidade, tanto espacial - em micro, meso e macro escala (da habitação à cidade e região), quanto ambiental - estrutura e dinâmica, indicadores e instrumentos de aferição, planejamento e gestão, relações espaciais - enquanto estratégia de desenvolvimento sustentável, prioritariamente no contexto da identidade regional e local. São disciplinas agrupadas: Configurações Espaciais Urbano-Rurais; Avaliação de Impactos Ambientais; Geoprocessamento Aplicado ao Planejamento Ambiental; Sustentabilidade do Espaço Construído; Paisagem e Identidade; Espaço e Gestão: Indicadores e Instrumentos; e Estrutura e Dinâmica da Natureza. · A Universidade Federal da Paraíba, UFPB, e a estadual, UEPB, também participantes do PRODEMA, possuem a Área de Concentração Habitat Humano e Meio Ambiente, com três Sub- Áreas de Concentração: Gerenciamento Ambiental; Saneamento Ambiental Urbano; e Habitat Urbano e Meio Ambiente (PRODEMA/UFPB, 2006). Sendo que esta última apresenta as seguintes linhas de pesquisa: Linha de pesquisa I – Ocupação do Espaço Regional, Redes Urbanas e Impacto Ambiental Linha de pesquisa II – Qualidade do Ambiente de trabalho e Segurança Linha de pesquisa III – Arquitetura Bioclimática · O NPGAU - Núcleo de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo da UFMG foi criado em 1994, congregando Mestrado e cursos de Especialização. Em 2006, realizou-se uma reestruturação curricular do programa, prevendo a criação do doutorado e ampliando e diversificando a oferta de disciplinas optativas de modo a potencializar as competências e pesquisas específicas do corpo docente, bem como os interesses dos mestrandos. O Mestrado em Arquitetura e Urbanismo desde seu início optou por privilegiar a pesquisa como forma principal de estruturação (mestrado por pesquisa) e por manter uma estrutura abrangente, distanciando-se do modelo compartimentado adotado na UFRJ e aproximando-se mais do modelo integrado, como na USP, onde um único programa abrange várias linhas de pesquisa. O mestrado do NPGAU possui hoje a área de concentração Teoria, Produção e Experiência do Espaço, cujas linhas de pesquisa são (NÚCLEO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO - NPGAU, 2007): Planejamento e dinâmicas sócio-territoriais: Aborda a problemática da produção do espaço urbano e metropolitano, a atuação dos diversos agentes produtores desse espaço e suas interfaces, bem como as estruturas socioespaciais resultantes. Esta leitura é feita sob diversas abordagens: evolução urbana, papel do Estado, gestão urbana e ambiental, entre outras. Produção, projeto e experiência do espaço e suas relações com as tecnologias digitais: Aborda os problemas teóricos e práticos da produção do espaço construído, incluindo os processos de projeto, construção e interação espaço-usuários, com ênfase na aplicação de tecnologias digitais nesses processos. 102 Teoria e História da Arquitetura e do Urbanismo e suas relações com outras artes e ciências: Trata os problemas teóricos, históricos, analíticos e críticos da Arquitetura e do Urbanismo, numa perspectiva multidisciplinar, com ênfase em suas conexões com outros campos de saberes, notadamente as ciências sociais, as ciências humanas e as artes. Recentemente, a UFMG criou outro mestrado na área de arquitetura, Mestrado em Ambiente Construído e Patrimônio Sustentável. Um dos seus objetivos descritos é desenvolver e/ou aprofundar as interfaces entre áreas como ciências sociais aplicadas, artes e engenharias, e construir ferramentas metodológicas e educacionais no enfoque do ambiente construído enquanto patrimônio humano e suas condições de sustentabilidade. Possui uma área de concentração em Bens Culturais, Tecnologia e Território com três linhas de pesquisa: Conservação de Bens Culturais, Gestão do Patrimônio no Ambiente Construído e Tecnologia do Ambiente Construído. As Linhas de Pesquisa estão estruturadas para abordar as várias escalas, desde os objetos e acervos culturais até o edifício e as áreas urbanizadas, contando com o aporte transversal da tecnologia do ambiente construído, que perpassa todas as escalas consideradas (MESTRADO EM AMBIENTE CONSTRUÍDO E PATRIMONIO SUSTENTÁVEL DA UFMG, 2007). Através dessa breve pesquisa em busca das questões sobre sustentabilidade na arquitetura e urbanismo nas pós-graduações espalhadas pelo Brasil, foi possível observar a presença de focos tanto bastante específicos, quanto mais gerais sobre o tema. É interessante ressaltar que a produção acadêmica em torno do assunto vem aumentando com o decorrer dos anos. Porém a sustentabilidade vem sendo mais estudada em cursos de especialização ou mestrado específicos, e pouco tem sido abordada nos cursos de mestrado gerais sobre arquitetura e urbanismo. Particularmente, posso relatar que esta dissertação de mestrado, iniciada em 2005 e desenvolvida no NPGAU, da Universidade Federal de Minas Gerais, UFMG, antes da reestruturação curricular do seu programa de mestrado, partiu de vontade e desejo próprios expressos no projeto de pesquisa proposto quando do processo de seleção, mas sem se inserir em linhas de pesquisa específica e, tampouco, sem que houvesse disciplinas obrigatórias ou optativas que abordassem o tema de modo suficiente. 3.4.4 Considerações sobre a sustentabilidade no ensino de arquitetura Foi possível, com uma sucinta análise de algumas universidades brasileiras, verificar a presença, nos cursos de graduação, extensão e de pós-graduação, de apresentações pontuais sobre a sustentabilidade. De fato, muitas outras universidades brasileiras foram pesquisadas, mas não relatadas aqui, por não apresentarem qualquer foco evidente para o tema em questão. 103 Na graduação, como relatado acima, nesses exemplos pontuais sobre o tema, a maioria das disciplinas é optativa, e quando obrigatórias, dificilmente interagem com as outras disciplinas e assim passam despercebidas e são rapidamente esquecidas pelos alunos no decorrer do curso. Em algumas universidades foram encontrados apenas resumos feitos pelos seus organizadores, talvez preocupados em seguir as novas Diretrizes Curriculares, mas sem realmente incluírem na prática a sustentabilidade na formação dos arquitetos e urbanistas. Essas conclusões preliminares serão, no próximo capítulo, ampliadas e comprovadas através da pesquisa extensa com estudantes de arquitetura. Na verdade, as disciplinas dentro do ensino de arquitetura apresentam reduzida integração. Os departamentos pouco interagem. É quase uma repetição do que acontece no ensino médio cujas disciplinas, como matemática, biologia, português, geografia, entre outras, são ensinadas com pouca ligação entre si. Porém, as disciplinas de arquitetura, especialmente, não podem acontecer isoladamente, todas precisam estabelecer um freqüente diálogo, estendendo-se inclusive a outras formações teóricas e profissionais em áreas técnicas, humanas e sociais. É o que podemos chamar de interdisciplinariedade. Na atual resolução das Diretrizes Curriculares, datada de fevereiro de 2006 (ver ANEXO), é exigido no Art. 3º, que o currículo pleno deve contemplar “formas de realização da interdisciplinaridade”, bem como “modos de integração entre teoria e prática”. Assim como é essencial a interdisciplinariedade, especial atenção deve receber a transdisciplinaridade, que pode ser entendida como sugere o prefixo trans, que transmite a idéia de através, de passar por, de passagem, transição. Sugere também a idéia de movimento, da freqüentação das disciplinas e da quebra de barreiras e, nesse sentido, a transdisciplinaridade permite o cruzamento de especialidades, a migração de um conceito de um campo de saber para outro (DOMINGUES, 1999). Pode-se dizer que a transdisciplinaridade é também uma característica marcante da sustentabilidade. Para que uma construção seja sustentável, é necessário que conhecimentos fragmentados sejam integrados. A questão ambiental deve ser tão importante quanto os aspectos técnicos e econômicos, assim como o contexto cultural, a estética e também o conforto e qualidade de vida dos moradores. Ou seja, a arquitetura deve ser transdisciplinar e interdisciplinar para de fato incorporar a sustentabilidade. De acordo com a carta da UNESCO/ UIA sobre a educação dos arquitetos, de abril de 1996 (ABEA, 2006): We, the architects, concerned by the future development of architecture in a fast changing world, believe that everything, influencing the way in which the built environment is made, used, furnished, landscaped and maintained, belongs to the domain of the architects. We, being responsible for the improvement of the education of 104 future architects to enable them to work for a sustainable development in every cultural heritage, declare: I. GENERAL CONSIDERATIONS 0. That the new era will bring with it grave and complex challenges with respect to social and functional degradation of many human settlements, characterized by a shortage of housing and urban services for millions of inhabitants and by the increasing exclusion of the designer from projects with a social content. This makes it essential for projects and research conducted in academic institutions to formulate new solutions for the present and the future. 1. That architecture, the quality of buildings, the way they relate to their surroundings, the respect for the natural and built environment as well as the collective and individual cultural heritage are matters of public concern. 2. That there is, consequently, public interest to ensure that architects are able to understand and to give practical expression to the needs of individuals, social groups and communities, regarding spatial planning, design organization, construction of buildings as well as conservation and enhancement of the built heritage, the protection of the natural balance and rational utilization of available resources. […] 7. That the vision of the future world, cultivated in architectural schools, should include the following goals: - a decent quality of life for all the inhabitants of human settlements - a technological application which respects the people' social, cultural and aesthetic needs of people - an ecologically balanced and sustainable development of the built environment - an architecture which is valued as the property and responsibility of everyone. Assim, podemos notar que as intenções são boas e os discursos vêm agregando mais as preocupações com o meio ambiente e sua inserção na arquitetura. O que falta realmente é que esse discurso seja colocado em prática dentro de todas as universidades, inserindo-o em todas as disciplinas acadêmicas, sejam elas teóricas, ou práticas. Além disso, é fundamental a integração entre as mesmas, para que este assunto, bem como todos os outros, possam se desenvolver naturalmente inter-relacionados. E assim, o estudante, ao se tornar um profissional, consiga lidar com os problemas atuais, conscientemente, oferecendo ao público cada vez mais soluções harmoniosas, sustentáveis e muito bem pensadas em todos os aspectos. Conclui-se que são necessárias mudanças profundas no “fazer arquitetônico”, e isso implica o ensino de arquitetura. Essa discussão, para alcançar toda a prática de arquitetura, deveria ser colocada no âmbito acadêmico. A intenção é suscitar a discussão da sustentabilidade dentro das universidades, para que o “pensar arquitetônico” se torne também um “pensar sustentável”. A sustentabilidade deve ser entendida, não como fator de subordinação da arquitetura a alguma disciplina ecológica ou ambiental, mas como um paradigma a ser incorporado ao ‘fazer arquitetônico’. E, no Brasil, este novo paradigma deveria estar sendo aprendido pelos aproximadamente 40.000 estudantes de arquitetura, e executados por cerca de 4.000 profissionais arquitetos e urbanistas que ingressam, por ano, no diversificado mercado de 105 trabalho brasileiro. Segundo Richard Rogers (2001, p. 68); “A profissão também deve definir sua dimensão ética. A exigência de que a arquitetura contribua para uma cidade sustentável em seus âmbitos social e ambiental cobra agora responsabilidade dos arquitetos.” A realidade está em constante transformação, e assim, não só o ensino de arquitetura, mas todas as áreas de conhecimento devem estar preparadas para enfrentar os problemas atuais. Cada profissão pode ser ecologizada43 , da arquitetura às artes, da economia à medicina, das engenharias à psicologia. Cada profissional tem responsabilidade pelos efeitos e impactos ambientais que sua atividade provoca. [...] Ao ecologizar a educação, tais valores são transmitidos a cada disciplina que compõe setorialmente o currículo escolar, sintonizando cada campo especializado do conhecimento com a visão holística e ecológica (RIBEIRO, 1998, p. 24 - 25). Como foi visto anteriormente nos tópicos sobre Consciência Ambiental, Educação Ambiental e Educação para o Desenvolvimento Sustentável ou Educação para a Sustentabilidade, a maioria dos brasileiros não se percebe como parte do meio ambiente, que tem sido entendido como algo de fora, que não nos inclui. A expansão da consciência ambiental acontece em função dessa percepção, do entendimento de que meio ambiente começa dentro de cada um de nós, alcançando todo o nosso entorno e as relações que estabelecemos com o universo. O ensino de arquitetura, bem como todas as demais áreas de conhecimento, universitárias ou não, necessitam urgentemente de um acréscimo nesse sentido. Não basta ser exigido que esta consciência ambiental venha de berço, aprendida em casa e nas escolas primárias. Enquanto isto não acontece, e apenas lentamente ocorrerá, a universidade precisa dar esse apoio. A Arquitetura precisa ter também essa base. Disciplinas de educação ambiental e educação para a sustentabilidade devem ser acrescentadas nos primeiros períodos, além da inserção em todos os demais períodos de disciplinas sobre consciência ambiental e desenvolvimento sustentável. No próximo capítulo será verificado com os próprios estudantes e arquitetos, através da pesquisa feita com questionários, se e como os cursos de arquitetura e urbanismo vêm implantando e utilizando as questões ambientais, sociais e culturais. Assim, será possível confirmarmos se as disciplinas, obrigatórias ou optativas, encontradas em alguns cursos de graduação anteriormente, tem sido suficientes, e principalmente se as questões essenciais ligadas à sustentabilidade estão inseridas nas diversas disciplinas, nos seminários e palestras e nos próprios discursos e conversas dentro das salas de aula com os professores . 43 “Ecologizar, verbo que ainda não existe no dicionário, expressa a ação de introduzir a dimensão ecológica nos vários campos da vida e da sociedade” (RIBEIRO, 1998, p.23). 106 Os problemas importantes que temos de encarar não podem ser resolvidos no mesmo nível de pensamento em que estávamos quando os criamos. Albert Einstein 4 A PESQUISA E O OPERA PRIMA O presente estudo classifica-se como uma pesquisa aplicada. A pesquisa aplicada caracteriza-se por seu interesse prático, busca gerar conhecimentos dirigidos à solução de problemas específicos, envolvendo verdades e interesses locais (LAKATOS; MARCONI, 1999). Seu objetivo é primeiramente confirmar a existência de um problema identificado na formação do arquiteto e urbanista, para então sugerir soluções para este problema. Essa pesquisa, em relação à forma de abordagem do problema, trabalha sob dois enfoques: quantitativo e qualitativo. Nas primeiras etapas a análise foi predominantemente quantitativa, posteriormente o trabalho foi aplicado de forma qualitativa. A pesquisa quantitativa é traduzida em números, opiniões e informações, empregando um instrumental estatístico para classificá-los e analisá-los. Procura entender e explicar fenômenos de forma estruturada, procurando eximir os resultados de motivos, crenças, valores, comportamentos e percepções individuais (ROSETTO, 2003). Já a pesquisa qualitativa, considera o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal instrumento, os dados coletados são predominantemente descritivos, a preocupação com o processo é tão importante quanto o produto e a análise dos dados tende a seguir um processo indutivo. Esta abordagem é descrita como um “guarda-chuva” cobrindo técnicas interpretativas que buscam descrever, decodificar, traduzir e dar significado aos termos de certos fenômenos que ocorrem naturalmente no mundo social. Nas ciências sociais e humanas esta abordagem é utilizada em alternativa à intensa aplicação de métodos quantitativos de base positivista (ROSETTO, 2003). O que diferencia a abordagem qualitativa é a crença de que o ambiente no qual as pessoas encontram-se tem uma grande relevância sobre o que elas pensam e como elas agem. Assim, as ações devem ser interpretadas dentro destes contextos, com a clara convicção de que as ações humanas são sensíveis ao mesmo (ROSETTO, 2003). A utilização das duas abordagens, simultaneamente, tem o objetivo de preencher as lacunas que seriam deixadas caso fossem aplicadas isoladamente, tendo em vista que o fenômeno a ser observado, a formação do arquiteto e urbanista, é por demais complexo para ser estudado, senão a partir de uma ótica diversificada. Em relação aos objetivos, essa pesquisa pode ser classificada como exploratória e analítica. Exploratória, pois, a fim de responder às perguntas norteadoras da pesquisa, é 107 necessário levantar dados sobre o objeto do estudo, o contexto do estudo, as dimensões e variáveis envolvidas. Esta abordagem é recomendada quando há pouco conhecimento sobre o problema estudado, como é o caso da sustentabilidade na formação do arquiteto. Entretanto, por ser uma pesquisa aplicada, não basta explicitar o problema, é também preciso propor soluções, exemplificá-las e descrevê-las (ROSETTO, 2003). A pesquisa analítica observa, registra, analisa e correlaciona fatos e variáveis e procura descobrir, a freqüência, as relações, as conexões de fenômenos, sua natureza e características. Na aplicação do sistema proposto, ao descrever detalhadamente suas características, analisando os resultados obtidos e as relações entre as variáveis envolvidas, o estudo também se caracterizou como uma pesquisa analítica (ROSETTO, 2003). Depois de identificado o caráter da pesquisa, vários procedimentos foram definidos a fim de ordenar as ações necessárias ao andamento do trabalho e responder ao problema proposto. Foi escolhida a observação direta extensiva através de questionário, que de acordo com Lakatos e Marconi (1999) é um instrumento de coleta de dados constituído por uma série ordenada de perguntas respondidas por escrito sem a presença do entrevistador. As vantagens da utilização do questionário como instrumento de coleta de dados são que os entrevistados se sentem mais à vontade para responder as questões e expor seu ponto de vista, podem responder o questionário na hora escolhida, atinge um maior número de pessoas ao mesmo tempo, há menor risco de interferência do pesquisador nas respostas, entre outras. A principal desvantagem é que o entrevistado tem maior tempo de elaborar as respostas, e então nem sempre são espontâneas (MARCONI; LAKATOS, 1996). As questões podem ser abertas, permitindo que o respondente escreva livremente, mas dificulta a interpretação dos dados apesar de possuir um resultado mais rico de informações; fechadas, com apenas duas alternativas de resposta; ou de múltipla escolha, com várias opções de resposta, ambas facilitando a análise dos dados. Nesta pesquisa optou-se por usar questões abertas e de múltipla escolha, de acordo com o que se pretendia em cada pergunta. As etapas da pesquisa foram: a especificação dos objetivos, a operacionalização dos conceitos e variáveis, a elaboração do instrumento de coleta de dados, o pré-teste do instrumento, a seleção da amostra, a coleta e verificação dos dados, a análise e interpretação dos dados e finalmente a apresentação dos resultados. Para elaboração do questionário definitivo, foi realizado um pré-teste, através de entrevista com nove estudantes de arquitetura da UFMG. A partir da revisão desse pré-teste, para corrigir possíveis induções de respostas, extenso questionamento, perguntas desnecessárias, 108 ordem correta das questões e falta de vontade do respondente, foi desenvolvido um questionário aberto para estudantes de arquitetura, e outro para arquitetos. Os questionários foram enviados pela Internet, via e-mail, para arquitetos e estudantes do Rio de Janeiro, Minas Gerais, São Paulo, Brasília e Paraná e, através de terceiros, para outros estados brasileiros, Rio Grande do Sul, Amazonas e Ceará, como também outros países, como EUA, Colômbia, Chile, Itália e Índia. No total foram recebidos 115 questionários respondidos. Todos eles foram analisados e interpretados, com os dados reunidos em gráficos, e em seguida descritos os resultados. Posteriormente, essa pesquisa quantitativa teve seu questionário aberto revisado e alterado para um questionário misto – questões abertas e questões de múltipla escolha - com o objetivo de ser aplicado de forma qualitativa entre os premiados do Concurso Opera Prima. Depois de iniciada a pesquisa, foi encontrado um interessante exemplo de pesquisa semelhante, realizada por Gustavo Focesi Pinheiro, da Faculdade de Engenharia Civil, Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP, para sua dissertação de mestrado em Engenharia Civil, na área de concentração de Edificações, intitulada O gerenciamento da construção civil e o desenvolvimento sustentável: um enfoque sobre os profissionais da área de edificações e defendida em junho de 2002. Pinheiro (2002) aplicou questionários entre engenheiros e arquitetos para verificar se os mesmos estão preparados para reduzir o impacto das edificações sobre o meio ambiente. Para o autor (2002, p. 127) “a conscientização dos profissionais e o incentivo ao estudo e aplicação de práticas que aproximem a construção civil do desenvolvimento sustentável e do ambiente, é possível e indispensável, pois, as cidades com suas edificações são um dos maiores instrumentos de transformação do meio”. Pinheiro complementa que, de acordo com Coelho, Cesarini e Brito44 (citado por PINHEIRO, 2002, p.102) o arquiteto “como inventor no espaço urbano construído, tem grande responsabilidade na geração de qualidade de vida dos habitantes das cidades”; o processo de intervenção “tem um enorme custo que recai sobre a sociedade e que, ao longo do tempo, vem perdendo suas referências do que seja coletivo e do que seja qualidade de vida”. Os autores acham que é fundamental repensar a formação dos arquitetos para que compreendam as conseqüências “dos seus atos a médio e longo prazos”. 44 COELHO, Silvio C.; CESARINI, Cláudio J.; BRITO, Ivana R. C. Cidades saudáveis: percepção e qualidade de vida no meio ambiente construído. In: PHIPIPPI JR, Arlindo; PELICIONI, Maria Cecília Focesi (Org.). Educação Ambiental: desenvolvimento de cursos e projetos. São Paulo: Signus, 2000. p. 223-231. 109 Em sua pesquisa, o resultado mostrou que a maioria dos profissionais tem pouco conhecimento sobre o conceito de sustentabilidade, apesar de reconhecerem os diversos impactos das edificações sobre o meio ambiente. Além disso, tem interesse em aprender para então tentar diminuir estes impactos. Pinheiro distribuiu 370 questionários e 89 foram respondidos, entre eles engenheiros e arquitetos, a maioria atuando na área de projeto e obra. A primeira questão da pesquisa era sobre o conhecimento do entrevistado quanto ao conceito de “desenvolvimento sustentável”. Isso porque Pinheiro (2002, p. 112) defende que: Somente quando os profissionais têm total conhecimento e consciência sobre o conceito e sua importância é que podem efetivamente mudar sua conduta e atuar em prol da sustentabilidade em sua área de trabalho, escolhendo, desenvolvendo e aplicando técnicas que poderão obter êxito e se disseminar no mercado, seja no gerenciamento de projetos ou da obra. E neste ponto, a educação ambiental pode auxiliar muito, tanto os profissionais já formados, quanto e principalmente com os em formação, pois, pode ser incorporada aos cursos como uma disciplina complementar. Do total, 22,47% das pessoas responderam que não ouviram falar do conceito. Para quem respondia “sim”, era necessário escrever sobre o significado. O autor classificou as respostas em corretas, parcialmente corretas, erradas e em branco, e utilizou para resposta correta a definição da Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD). Pinheiro definiu por parcialmente correta quando a resposta era incompleta, só enfocava alguns aspectos ou quando iam além de seu significado. A maioria dos arquitetos respondeu incorretamente, e dos engenheiros, em branco, e apenas 9,42% dos entrevistados acertaram a resposta. (TAB. 1). TABELA 1 Questão sobre a definição de desenvolvimento sustentável (avaliação das respostas por profissão) Correção das respostas Arquiteto (%) Engenheiro (%) Total (%) Erradas 47,22 20,41 31,76 Parcialmente corretas 36,11 30,61 32,94 Corretas 8,33 10,20 9,42 Em branco 8,33 38,78 25,88 TOTAL 100 100 100 Fonte: PINHEIRO, 2002, p. 113. Foi perguntado por quais meios de comunicação o respondente teve acesso aos conceitos de sustentabilidade aplicados na construção civil, e a maioria respondeu em revistas/magazines, conversas com profissionais, e pesquisa e leitura de revistas técnico- 110 científicas. Numa outra pesquisa, dos autores Argollo Ferrão e Pinheiro, mais da metade dos entrevistados declara que teve acesso aos conceitos referentes à sustentabilidade e eco-eficiência pela mídia, revistas, jornais, Internet e televisão, e a outra parte por programas de informação como palestras, conferências, congressos, cursos de extensão e pós-graduações (PINHEIRO, 2002). Outra questão de Pinheiro foi em relação ao conhecimento sobre os conceitos e técnicas que conduzam a uma maior integração entre construção civil e meio ambiente, maior economia nas edificações quanto à energia elétrica e água e outros assuntos relacionados à sustentabilidade aplicado às edificações, e o interesse dos mesmos em se aprofundar. A maioria disse conhecer, e ter interesse em se aprofundar, porém muitas pessoas disseram não conhecer sobre o assunto, apesar de também terem interesse (TAB. 2). TABELA 2 Conhecimento e interesse Interesse pelo assunto Total (%) Não conhece e tem interesse 29,21 Não tem interesse 3,38 Conhece e tem interesse em se aprofundar 66,29 Não respondeu 1,12 Total 100 Fonte: PINHEIRO, 2002, p. 121. Em seguida foi questionado quanto aos impactos das atividades de construção de edificações sobre o meio ambiente e assim é possível avaliar o grau de percepção e conscientização dos entrevistados. A grande maioria considera afirmativos os impactos ocorridos (TAB. 3). TABELA 3 Impacto das edificações Atividades produzem impacto? Total (%) Não 4,60 Sim 95,40 Total 100 Fonte: PINHEIRO, 2002, p. 122. 111 As justificativas citadas pelos entrevistados foram poluição e entulho, alterações no meio ambiente, impermeabilização do solo e destruição de mananciais, consumo de recursos, falta de planejamento e conscientização, impacto visual e desperdício. O autor concluiu que a maioria dos profissionais sabe pouco sobre o conceito de desenvolvimento sustentável, conhece alguma coisa da sustentabilidade na construção civil principalmente através da mídia, e tem grande interesse em se aprimorar nessa área para aplicar as técnicas. Pinheiro (2002, p. 132-133) acredita que é grande a conscientização da necessidade de se alterar o atual estágio de ocupação e intervenção no meio, e defende que: A capacitação profissional, a educação continuada, a educação ambiental e a melhor informação dos profissionais da área já formados, assim como, a melhor formação com relação a este tema dos alunos de graduação, é de suma importância para possibilitar que haja uma mudança efetiva da postura dos profissionais e da área em geral, em relação ao desenvolvimento sustentável e às atividades de construção civil. 4.1 Pesquisa quantitativa A segunda etapa desse estudo constou da realização de uma pesquisa quantitativa através de questionário, com perguntas abertas, enviados a estudantes de arquitetura e arquitetos para verificar se a sustentabilidade vem sendo abordada suficientemente nas universidades. Inicialmente foi realizado um pré-teste, através de entrevista com nove estudantes de arquitetura da UFMG, em outubro de 2005. A partir daí, o questionário foi revisado e distribuído durante um ano entre diversos arquitetos e estudantes de distintas universidades brasileiras e uma pequena quantidade de estudantes universitários de outros países. Posteriormente, o questionário foi melhorado e aplicado de forma qualitativa, com perguntas abertas e de múltipla escolha, entre os premiados do Concurso Opera Prima de 2001 a 2006. Esses questionários foram enviados pela Internet, via e-mail, em junho de 2006, e recebidos entre julho de 2006 e abril de 2007. Na primeira pesquisa, utilizou-se uma abordagem quantitativa, cujo público foi de estudantes de arquitetura e arquitetos de várias regiões e estados brasileiros, a saber: Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Brasília, Amazonas, Ceará, Rio Grande do Sul, e Paraná. Além disso, esses questionários, enviados pela Internet via e-mail, foram repassados para alguns arquitetos originados do Chile, Colômbia, Índia e EUA, que no ano de 2006 estavam cursando mestrado em arquitetura na University of Southern Califórnia - USC, em Los Angeles, Estados Unidos. O questionário também foi enviado para alguns estudantes do Istituto Europero di Design – IED Milano, na Itália. Foram aplicados dois questionários distintos para estudantes e arquitetos (ver APÊNDICE A e B), no total de 115 questionários respondidos, sendo 67 estudantes e 48 arquitetos. Todas as questões foram discursivas. Antes das perguntas, o questionário solicitava o 112 preenchimento de alguns dados para caracterizar a população quanto ao sexo, idade, formação e trabalho que desempenha. Devido à pouca variabilidade das respostas em função da universidade cursada, sexo, idade e atuação profissional, essas variáveis não foram consideradas na análise do questionário. Para melhor interpretação dos dados, os respondentes foram classificados em quatro níveis, quanto ao ano de formatura dos arquitetos, ou período cursado dos universitários. O primeiro nível é de estudantes cursando do 1º ao 5º período na graduação, o segundo nível, do 6º ao 10º período. O terceiro grupo é de arquitetos formados entre 1999 e 2005 e o último é de arquitetos formados entre 1980 e 1998 (GRAF. 1). Como os questionários foram recebidos entre outubro de 2005 e outubro de 2006, cada estudante assinalou o período que estava cursando na época que respondeu ao questionário. CLASSIFICAÇÃO DOS ENTREVISTADOS 41% 31% 11% 17% estudante 1º-5º estudante 6º-10º arquiteto 1999-2005 arquiteto 1980-1998 GRÁFICO 1 - Classificação dos 115 entrevistados, por período na graduação ou ano de formado. Fonte: Elaborado pela autora. A primeira pergunta foi: O que vem a ser para você o conceito de sustentabilidade aplicado na arquitetura e urbanismo? Ou seja, o que seria ´arquitetura sustentável` e ´planejamento urbano sustentável`? Esta questão foi feita com a intenção de posicionar o entrevistado para as questões seguintes, e principalmente observar o nível de conhecimento dos entrevistados sobre o tema. É interessante também ressaltar que a continuação dessa primeira pergunta (ou seja, o que seria ‘arquitetura sustentável’?), foi pensada, a princípio, para ser utilizada somente no questionário para estudantes, porém logo se percebeu que alguns arquitetos sentiram dificuldade em entender a questão, optando-se assim por manter a segunda parte da pergunta (GRAF. 2). Todas as respostas obtidas foram então organizadas em algumas categorias em função das respostas em comum, analisadas e interpretadas. 113 1 1 1 2 1 2 3 1 1 2 2 2 1 1 2 2 2 4 2 1 1 1 2 8 4 11 4 9 4 12 5 20 0 5 10 15 20 25 30 35 40 A B C D E F G H I J K CONCEITO DE SUSTENTABILIDADE NA ARQUITETURA arquiteto 1980-1998 arquiteto 1999-2006 estudante. 6º-10º estudante 1º-5º GRÁFICO 2 – Conhecimento sobre o conceito de sustentabilidade na arquitetura e urbanismo, por grupamentos de período na graduação e ano de formatura (Total de 115 entrevistados). A - Geração de lucro suficiente para se manter economicamente sem recursos externos. B - Independe de materiais e mão de obra industrializada C - Viabilidade econômica, utilizando artifícios e recursos disponíveis, e evitando desperdícios D - Durabilidade: Que se mantenha um bom tempo sem deteriorar E - Eficiência energética: minimizar gastos de energia F - Adequada à realidade local, social, ambiental, econômica e cultural G - Auto-suficiente: geração de energia, reciclagem de resíduos,etc H - Uso adequado dos materiais, tecnologias e sistemas I - Não sei J - Uso adequado e inteligente dos recursos naturais K - Preocupação/ Equilíbrio com o meio ambiente: Minimizar impactos ambientais Fonte: Elaborado pela autora. Através dos GRAF. 2 e 3 vemos que do total de 115, 10% (12 pessoas) não souberam responder à pergunta, sendo 10 estudantes e 2 arquitetos. A maioria dos estudantes e arquitetos, no total de 36% (41 pessoas), respondeu preocupação com o meio ambiente, sendo 25 estudantes e 16 arquitetos. Seguiram-se 28 pessoas (24%) que responderam uso adequado e inteligente dos recursos naturais, sendo 13 estudantes e 15 arquitetos. As demais respostas foram variadas e houve dispersão dos grupamentos de período de graduação e ano de formatura. 114 CONCEITO DE SUSTENTABILIDADE NA ARQUITETURA 22% 24% 10% 36% 8% OUTRAS RESPOSTAS VARIADAS USO ADEQUADO DOS MATERIAIS, TECNOLOGIAS E SISTEMAS NÃO SEI USO ADEQUADO E INTELIGENTE DOS RECURSOS NATURAIS PREOCUPAÇÃO COM O MEIO AMBIENTE: MINIMIZAR IMPACTOS NATURAIS GRÁFICO 3 – Conhecimento sobre o conceito de sustentabilidade na arquitetura e urbanismo, por % de respondentes em cada item. Fonte: Elaborado pela autora. A questão seguinte perguntava se o conceito de sustentabilidade foi tratado na graduação. Metade dos respondentes considera que não houve abordagem do assunto em sua graduação, e 26% responderam que houve pouca abordagem do tema (GRAF. 4). O ASSUNTO É / FOI DISCUTIDO NA GRADUAÇÃO? 1% 50% 26% 23% SIM EM UMA DISCIPLINA/ OU ALGUMAS DISCIPLINAS POUCO NÃO GRÁFICO 4 – Abordagem do assunto na graduação, por % de respondentes em cada item. Fonte: Elaborado pela autora. De forma geral os estudantes consideram que o tema vem sendo tratado superficialmente. A maioria dos recém formados acha que o conceito de sustentabilidade só aparece na disciplina de conforto ambiental. Os arquitetos formados há mais tempo disseram não ter sido tratado o assunto na sua graduação (GRAF. 5). 115 1 1 2 2 2 11 2 1 3 1 9 1 10 10 10 10 10 5 33 0 10 20 30 40 50 60 A B C D E F G H I O ASSUNTO É / FOI DISCUTIDO NA SUA GRADUAÇÃO? estudante 1º-5º estudante 6º-10º arquiteto 1999-2006 arquiteto 1980-1998 GRÁFICO 5 – Abordagem do assunto na graduação, por grupamentos de período na graduação e ano de formatura. A - Sim, alguns professores têm essa preocupação B - Disciplina de História da Arquitetura, mas muito pouco C - Disciplina de UMA (Urbanismo e Meio Ambiente) D - Disciplina de Urbanismo E - Restrita ao departamento de tecnologia F - Algumas disciplinas G - Disciplina de Conforto H - Pouco I - Não Fonte: Elaborado pela autora. Muitos respondentes disseram que é grande a falta de integração entre as disciplinas, e principalmente entre departamentos. Isso dificulta a disseminação do conceito de sustentabilidade, que deve ser visto como parte de um todo, dentro do ensino, e também da prática de arquitetura e urbanismo. O que muito acontece é que o assunto costuma ater-se apenas às disciplinas relacionadas com a área tecnológica, criando uma segregação entre teoria e projeto de arquitetura e técnica, áreas do ensino de arquitetura que deveriam estar completamente integradas. Posteriormente a essa questão, foi perguntado se, na opinião do entrevistado, era necessária uma menor ou maior abordagem da sustentabilidade dentro da faculdade ou se era suficiente a sua discussão. Em seguida, caso não fosse suficiente, como melhorar a discussão da sustentabilidade dentro da graduação. Das 115 pessoas, quase a totalidade (113 pessoas) responderam que era muito necessário um grande aumento de atenção a este tema. Apenas duas pessoas disseram que estavam suficientes a abordagem e discussão da sustentabilidade, que o tema deve se deter aos aspectos bioclimáticos, pois a sustentabilidade não é um problema da arquitetura. 116 A maioria dos entrevistados, 30% (35 pessoas), considera que é preciso incorporar o conceito de sustentabilidade em todas as disciplinas da graduação. Em seguida, 12% (14 pessoas), responderam que, incorporando o tema em todas as aulas de projeto, provavelmente a melhora aconteceria; a mesma quantidade disse que seria através de palestras, seminários e debates, sendo 12 estudantes e 2 arquitetos (GRAF. 6 e 7). 1 1 1 1 1 1 1 3 1 1 4 2 1 4 2 3 2 3 2 4 2 2 9 2 2 10 1 7 2 4 6 11 6 12 0 5 10 15 20 25 30 35 A B C D E F G H I J K COMO MELHORAR A DISCUSSÃO SOBRE SUSTENTABILIDADE NA FACULDADE DE ARQUITETURA? estudante 1º-5º estudante 6º-10º arquiteto 1999-2006 arquiteto 1980-1998 GRÁFICO 6 – Como melhorar a discussão sobre sustentabilidade e arquitetura/urbanismo na graduação, por grupamentos de período na graduação e ano de formatura. A - Se deter nos aspectos bioclimáticos, a sustentabilidade não é um problema da arquitetura. B - Implementando projetos de alunos nas comunidades necessitadas C - Maior integração entre os departamentos D - Um tema de projeto sobre o assunto E - Uma disciplina sobre sustentabilidade aplicada à arquitetura e urbanismo F - Os professores devem conhecer mais o assunto e conscientizar os alunos de sua importância G - Interdisciplinaridade dentro do curso e também multidisciplinaridade com outros cursos H - Através de palestras, seminários e debates I - Incorporando o conceito em todas as disciplinas e criando uma disciplina sobre sustentabilidade J - Incorporando o conceito em todas as aulas de projeto K- Incorporando o conceito em todas as disciplinas Fonte: Elaborado pela autora. COMO MELHORAR A DISCUSSÃO DA SUSTENTABILIDADE NA FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO? 12% 12% 30% 9% 9% 9% 11% 7% A-D E F G H I J K GRÁFICO 7 – Como melhorar a discussão sobre sustentabilidade e arquitetura/urbanismo na graduação, por % de respondentes em cada item. Fonte: Elaborado pela autora. 117 Através dos questionários obtidos foi possível confirmar várias hipóteses sobre o conceito de sustentabilidade aplicado na arquitetura e urbanismo, e realmente tornar a dissertação relevante e de grande importância para o ensino de arquitetura. Algumas respostas das questões são citadas abaixo, com a descrição do estabelecimento de graduação e ano de formatura ou período cursado à época que o questionário foi respondido: Pelo que entendo de sustentabilidade, não vejo esse tema sendo abordado, motivo até da minha incerteza quanto ao real significado. UFRJ, 5º período. Acho que a arquitetura sustentável já não é mais uma opção ou assunto de interesse especial, e sim uma grande necessidade mundial. Universidade Santa Úrsula, 1981. Arquitetura e planejamento urbano sustentável são os únicos futuros que temos. Não podemos continuar envenenando nosso mundo, projetando e construindo edifícios que nos adoecem e destroem o meio ambiente. IED Milano, 2005. Infelizmente não creio que este assunto tem recebido a atenção que merece. Não foi tratado durante minha formação como arquiteta. Universidade Santa Úrsula, 1981. Eu acredito que tem sido abordado cada vez mais, mas ainda não é suficiente. UFRJ, 2001. É um assunto não tão novo, mas muito discutido no cenário da arquitetura e urbanismo em escalas profissionais e em termos de especializações e pós-graduação. Infelizmente, na área de graduação há uma carência de enfoque e abordagem deste tema, tanto na forma, quanto na qualidade da abordagem, sendo que quase ignoradas nas ementas curriculares de arquitetura e urbanismo. UFRJ, 2003 Na minha opinião as discussões devem ser abarcadas por cadeiras como projeto e planejamento urbano, e não deveriam ser deslocadas para um determinado campo de conhecimento estanque. Somente com uma visão holística do problema um aluno pode desenvolver potencial crítico para questionar a posição de uma “arquitetura sustentável”, e também na escala do urbano. UNIFENAS – Universidade de Alfenas , 1996 Apesar do discurso da interdisciplinaridade ser repetido há pelo menos três décadas, efetivamente estamos formando arquitetos e engenheiros que ao projetarem um edifício sequer têm noção da escala do impacto na qualidade da circulação urbana e na infraestrutura de transporte, por exemplo. Hoje esse tema ainda está restrito a raríssimos grupos de pesquisa que atuam na pós-graduação. UFF, 1988. Palestras sobre o assunto e inserção do mesmo nos nossos projetos seria legal. Tem que haver uma ligação entre as matérias teóricas (que abordariam este assunto) com as matérias práticas de projeto. Nesta faculdade os departamentos não se comunicam, não há uma conexão entre os campos, e isso dificulta nosso aprendizado, que acaba ficando muito solto no ar. UFRJ, 4º período. Para mim, sustentabilidade, é uma necessidade do nosso tempo e época, devido a todos os problemas de poluição, depredação de recursos não-renováveis, e desmatamento em 118 grande escala.[...] Nós, como arquitetos, deveríamos incorporar vários métodos mais sustentáveis de construção e projeto no nosso trabalho. [...] Eu acho que deveria ser dada maior importância nas escolas de arquitetura.[...] Finalmente eu acho que os estudantes deveriam ser encorajados a usar projeto sustentável nos ateliers, além de ter pelo menos uma disciplina obrigatória sobre sustentabilidade. (tradução nossa) Arvindbhai Patel Institute of Environmental Design (Índia), 2000. O fundamental é assumir o lugar da arquitetura do discurso mais geral de sustentabilidade. Aceitar que, mesmo com implicações diretas sobre a arquitetura, não é um problema arquitetônico, mas sim industrial e logístico (como foi o desenvolvimento do concreto armado para a arquitetura moderna ou da estrutura metálica para os arranha-céus americanos). E se deter seriamente sobre os aspectos bioclimáticos, hoje tratados mais facilmente desde que aceitemos a irrelevância de se desenhar máscaras solares e dimensionar graficamente brises em tempos de softwares de simulação de desempenho térmico. Esta é a ferramenta fundamental para o trabalho do arquiteto. UFMG, 1999. A formação do arquiteto e urbanista é bastante deficitária quanto ao assunto, pois insistem em tratá-lo como exclusividade do departamento de tecnologia, com pouca interface com os departamentos de crítica e história da arquitetura e quase nenhuma com o planejamento urbano. PUC-MG, 2003. 4.2 Pesquisa qualitativa: Opera Prima Para realizar uma pesquisa qualitativa sobre a sustentabilidade na formação atual do arquiteto e urbanista, foram selecionados os ganhadores do concurso Opera Prima dos últimos seis anos, no período de 2001 a 2006. A pesquisa teve como objetivo eleger uma amostra de excelência. Essa seleção foi feita principalmente em função dos trabalhos premiados serem primeiramente escolhidos internamente pelas próprias instituições de ensino de arquitetura e urbanismo, dentre os melhores trabalhos finais de graduação de seus formandos, e posteriormente pela Comissão Julgadora do concurso Opera Prima. Isso nos permite sugerir que a maioria dos alunos premiados está dentre os melhores de suas escolas de arquitetura. Além disso, todos os trabalhos selecionados são divididos por regiões do Brasil, permitindo que esta amostragem qualitativa seja também bastante diversificada. Os anos selecionados, de 2001 a 2006, foram devido à opção de analisar a formação atual do arquiteto e urbanista, e assim não se estendeu aos anos anteriores. Desses seis concursos, foram enviados questionários (ver APÊNDICE C) pela Internet, via e-mail, em junho de 2006, a todos os cinco premiados de cada ano, e dos vinte ganhadores de menção honrosa de cada ano, foram selecionados os que mais poderiam ter abordado o conceito de sustentabilidade, totalizando 69 questionários. Foram recebidos 50 questionários respondidos, entre julho de 2006 e abril de 2007. O questionário, que na pesquisa quantitativa feita anteriormente, possuía somente perguntas abertas, foi melhorado e aplicado com questões abertas e de múltipla escolha. Assim 119 como na pesquisa anterior, antes das perguntas, o questionário possuía o preenchimento de alguns dados para caracterizar a população quanto à idade, ano de formatura, universidade cursada e se o arquiteto possuía curso de aperfeiçoamento, especialização, mestrado e/ou doutorado. Além disso, o respondente preenchia o título de seu trabalho final de graduação e nome do orientador (ver APÊNDICE C). Devido à pouca variabilidade das respostas em função da universidade cursada e idade, essas variáveis não foram consideradas. A classificação foi feita apenas pelo ano do concurso, sendo o ano anterior o de formatura do arquiteto. Após a coleta e verificação dos questionários, foi solicitado a alguns respondentes que enviassem resumos, memoriais e imagens sobre seus trabalhos finais de graduação. Esta seleção foi feita baseada na resposta à questão sobre se seu trabalho final de graduação havia abordado a sustentabilidade. Depois de analisados os materiais recebidos, foram escolhidos até dois trabalhos que mais se destacaram em cada ano para serem descritos e ilustrados na atual dissertação. A seguir, é apresentado um breve histórico do concurso Opera Prima, para posteriormente serem descritos os seis concursos e seus participantes e, finalmente, seus questionários e trabalhos possam ser analisados e interpretados. 4.2.1 Concurso Opera Prima - Concurso Nacional de Trabalhos Finais de Graduação em Arquitetura e Urbanismo O concurso é realizado há dezoito anos, já se tornou uma referência para escolas, professores e, principalmente, formandos em arquitetura e urbanismo. Foi lançado em 1988, por iniciativa da Revista PROJETO DESIGN, com o então editor Vicente Wissenbach, devido à grande procura de formandos interessados em publicar seus trabalhos de conclusão de curso. A idéia de organizar um concurso nacional com a participação das faculdades de arquitetura e urbanismo foi apresentada à ABEA e apoiada pelo então presidente, arquiteto Carlos Fayet. A empresa Fademac, fabricante do piso vinílico Paviflex, apoiou e se tornou patrocinadora do evento. Naquele ano, existiam 48 escolas de ensino superior de arquitetura e 37 participaram do concurso com 156 trabalhos escritos. Naquela época, o concurso era chamado de Opera Prima, e a premiação, de Prêmio Paviflex (PRÊMIO OPERA PRIMA, 2003). Posteriormente, entre o 8° Prêmio Paviflex, no ano de 1996, até o 14° Prêmio Paviflex, em 2002, o nome Opera Prima parou de ser utilizado e a revista divulgadora passou a ser a AU. 120 A partir de 2001 o IAB passou a integrar oficialmente a iniciativa, em conjunto com a Abea. Em 2003, o concurso voltou a ser chamado de Opera Prima, a divulgação com a revista PROJETO DESIGN e a empresa Joy Eventos, com o patrocínio da Brasken. No ano seguinte, a Brasken acrescentou uma nova categoria de premiação, Projetando com PVC, para os projetos baseados neste material. Cada instituição seleciona internamente, dentre os melhores trabalhos finais de graduação de seus formandos, no máximo um trabalho para cada dez alunos (ou fração) que tenham desenvolvido seus trabalhos finais de graduação. Em relação ao Prêmio Projetando com PVC, podem participar todos os trabalhos inscritos na premiação Opera Prima, cabendo ainda às instituições de ensino, se existirem projetos que se destacarem apenas quanto ao uso do PVC, a possibilidade de selecionar mais trabalhos que concorrerão exclusivamente ao Prêmio Projetando com PVC, limitados ao número máximo dos selecionados e permitidos para o Opera Prima.45 Até o Concurso Opera Prima de 2005, numa primeira etapa a Comissão Julgadora selecionava por região o número de trabalhos correspondente ao número de cursos da região que efetivamente participaram da edição do concurso. A partir de 2006, o número de trabalhos selecionados passou a ser cem. Numa segunda etapa são selecionados os vinte e cinco trabalhos finalistas sendo que destes, cinco recebem prêmios e outros vinte, recebem menções honrosas. Para fins de organização e composição da Comissão Julgadora são consideradas as seguintes regiões em função do número de escolas: Região 1 - Paraná, Rio Grande do Sul e Santa Catarina Região 2 - São Paulo Região 3 - Rio de Janeiro e Espírito Santo Região 4 - Alagoas, Bahia, Ceará, Maranhão, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Norte e Sergipe Região 5 - Amazonas, Brasília, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Pará e Tocantins No concurso de 2006, foram recebidos 476 trabalhos, selecionados dentre mais de quatro mil trabalhos de alunos formados no ano anterior, pelas próprias universidades. Ao todo, foram 107 escolas de arquitetura de todo o Brasil. Cem trabalhos foram selecionados regionalmente para a fase final, dentre os quais se destacaram 25 projetos: cinco premiações e 20 menções honrosas. Para a categoria especial, Projetando com PVC, foram classificados cinco trabalhos, dos quais dois receberam prêmio oferecido pela Braskem. 45 Para mais informações ver página na Internet do Concurso Opera Prima, disponível em . 121 A seguir serão apresentados os ganhadores e alguns premiados com menções honrosas no concurso Opera Prima de cada ano, entre 2001 e 2006, com o título do trabalho final de graduação e universidade correspondente. Em seguida algumas citações dos questionários respondidos pelos premiados serão expostas, para posteriormente alguns dos trabalhos serem descritos, ilustrados e brevemente analisados. 4.2.2 Opera Prima 2001 Ganhadores: Ana Holck - Centro de Arte Contemporânea – UFRJ Ártemis dos Santos Teles - Circo Oficina - USP Carlos Paiva C. Perles - Centro de Exposições São Paulo - FAAP Rodrigo Cabral de Vasconcelos - Percursos e Permanências em Mangue Seco - UFPE Wagner Barboza Rufino - Museu de Cultura Finlandesa de Penedo – UFJF Menções honrosas: Clebiana Aparecida da Silva - Planejamento Urbano do Bairro Boa Vista - UnB Thais Inês Krambeck - Ecoturismo: Parque Rota das Cachoeiras – UFSC Foi perguntado sobre como os autores consideram a discussão e abordagem da sustentabilidade na formação do arquiteto e urbanista e todos os sete responderam que é pouca e superficial. Algumas citações, a respeito da definição de sustentabilidade na arquitetura e urbanismo e como esses autores acreditam que essa discussão poderia melhorar, seguem abaixo. Arquitetura sustentável seria aquela que entende a edificação como algo autônomo, que utiliza e consome o que pode produzir ou obter sem impactos ambientais. Uma arquitetura totalmente sustentável não é atingível, mas sim uma arquitetura de menor impacto ambiental, que deve buscar a utilização adequada dos recursos disponíveis em todo o ciclo de vida da edificação (projeto, construção, utilização, demolição e reutilização). Isto pode ser conseguido através de, por exemplo, adoção de materiais construtivos locais e com baixo índice de energia embutida; adoção de sistemas construtivos racionalizados; redução do consumo de energia elétrica através de painéis fotovoltaicos, iluminação e ventilação naturais; redução do consumo de água potável através do armazenamento e utilização de água da chuva e reutilização de águas cinzas, entre outros. Thais Krambeck, UFSC, 2001 Entre os anos 1995 e 2000, período em que freqüentei a FAU da Universidade de Brasília, praticamente não se ouvia falar em sustentabilidade nas disciplinas oferecidas pelo curso. O interesse devia partir do aluno para que esses conceitos fossem esclarecidos. Existem disciplinas dentro do curso de Arquitetura e Urbanismo que poderiam abordar esse assunto, porém, quando citado, é de forma bastante superficial. Infelizmente as disciplinas voltadas para o urbanismo, que poderiam enfatizar os conceitos de sustentabilidade tanto na arquitetura quanto no próprio urbanismo, não são de grande importância na FAU-UnB. Para melhorar a abordagem desse assunto é imprescindível que os mestres tenham conhecimento do conceito e da importância do desenvolvimento sustentável e que forcem discussões sobre o assunto para que ele possa ser integrado às disciplinas. Clebiana Silva, UnB, 2001. 122 Vejo a sustentabilidade como um conceito único, que não se diferencia seja ele usado para a arquitetura, seja para o urbanismo ou para qualquer outra disciplina. Claro que a forma de abordagem e a sua aplicação vão mudar dependendo da área do conhecimento em que ele esteja sendo usado, mas seu conceito - o seu princípio - é o mesmo. Ouvi uma história a respeito dos índios americanos em que eles, antes de tomar uma decisão mais importante, de âmbito tribal ou coletivo, vamos dizer assim, consideravam seu impacto nas próximas sete gerações. Vejo a sustentabilidade assim. É uma maneira de pensar e agir que leva em conta o coletivo. E perceba a abrangência deste coletivo a que me refiro. É o coletivo social, econômico e natural, pensado ainda com o condicionante tempo. É você tornar-se responsável por absolutamente tudo que está ao seu redor ao longo de toda sua vida. Cada pensamento e ação deve ser neste sentido. Na arquitetura ou urbanismo é preciso planejar nossas intervenções de uma maneira que ela atenda da melhor maneira o seu usuário, mas que seu impacto seja positivo dentro desse conjunto sócio-econômico-natural agora e sempre. Ou seja é preciso ser responsável por tudo que está envolvido com a obra e suas conseqüências, desde a madeira que você indica (ela é de reflorestamento ou é ilegal?) até o seu projeto (como está a eficiência energética de sua solução, você reutiliza a água da chuva por exemplo?); e mais: o operário que trabalha em sua obra? como é sua condição de vida, educação, consciência ecológica? Ele mora nas redondezas onde sua construção está de alguma maneira interferindo? Ou mora em outro município e não tem vínculo nenhum com o local? E a construtora que contratada como trabalha? Está atenta a minimização de perdas de materiais no canteiro? E por aí vai... Quando fiz o curso na UFPE o conceito de sustentabilidade estava presente mas não de maneira sistematizada nas cadeiras. Era um assunto presente em conversas, em palestras, etc. Porém só me deparei realmente com ele durante a elaboração do meu TG (Trabalho de Graduação) por conta do tema que escolhi e tive um bom acessoramento de sustentabilidade por parte de minha orientadora. Nas conversas com ela percebi inclusive a impossibilidade de mergulhar e trazer de forma mais efetiva este tema ao meu trabalho por conta da complexidade que envolve o conceito e a limitação de tempo e estrutura de pesquisa que se dispõe para se fazer uma monografia de conclusão de curso. Acredito q só é possível abordar este tema em sua abrangência e complexidade, de maneira convincente e que se consiga percebê-lo presente nas decisões de projeto em um mestrado ou doutorado. Precisamos ser rápidos. Rápidos e eficazes nessa introdução do tema nas cadeiras (em todas!) de ensino da arquitetura. Apesar de todos os alertas ainda vivemos a ilusão da abundância e da infinitude (quero dizer que é infinito) dos recursos naturais. Rodrigo Cabral, 2001. Dos sete trabalhos analisados, dois autores responderam que não abordaram a sustentabilidade em seus trabalhos finais de graduação, pois o mesmo não estava voltado para o assunto; três pessoas disseram que algumas questões foram abordadas e duas disseram que o trabalho estava muito voltado para a sustentabilidade. Destes dois trabalhos, se destacou o de Thais Inês Krambeck. 4.2.2.1 Ecoturismo: Parque Rota das Cachoeiras - Thais Inês Krambeck, UFSC O trabalho apresentado foi uma intervenção no Parque Ecológico E. F. Battistella, parque existente em Corupá, Santa Catarina, com o principal objetivo de utilização de áreas naturais respeitando a proteção e preservação do meio ambiente natural. Foram planejadas instalações de apoio, tais como centro de educação ambiental, administração e pesquisa, estufa e 123 feira de produtos locais, que incorporam espaços para atividades desenvolvidas no parque e atendimento aos visitantes com utilização de madeira cultivada e outros materiais naturais. A autora propôs também soluções para os impactos gerados com a excessiva visitação, tais como: legalização da área como Reserva Particular do Patrimônio Natural com apoio do IBAMA; estratégias de controle de visitação, tais como alterações físicas, orientação do visitante quanto a seu comportamento, cobrança de taxas, diminuição da intensidade de uso e proibição de determinadas atividades; além do zoneamento do parque (áreas de uso restrito, extensivo e intensivo) como forma de administrar diferentes limites de impacto para proteger os recursos naturais e proporcionar a diversificação das experiências disponíveis aos visitantes. O trabalho teve como objetivo geral tratar o ecoturismo como uma das faces do desenvolvimento sustentável, mostrando-se como é possível usufruir o ambiente onde vivemos sem esgotar as possibilidades de gerações futuras e sem deixar de lado necessidades humanas presentes. Para isso adotou-se como referencial teórico os conceitos de sustentabilidade e ecoturismo. De acordo com The Ecotourism Society, “Ecoturismo é a viagem responsável a áreas naturais, visando preservar o meio-ambiente e promover o bem-estar da população local”. No Brasil, o Grupo de Trabalho Interministerial em Ecoturismo chegou à seguinte conceituação: “Ecoturismo é um segmento da atividade turística que utiliza, de forma sustentável, o patrimônio cultural e natural, incentiva sua conservação e busca a formação de uma consciência ambientalista através da interpretação do ambiente, promovendo o bem-estar das populações envolvidas”. Desta forma, vê-se que inerente ao conceito de ecoturismo está o de sustentabilidade, isto é, usufruir o ambiente onde vivemos sem comprometer a possibilidade de gerações futuras de satisfazer suas necessidades, suprindo aos anseios presentes através da utilização racional dos recursos naturais. Entretanto, apesar de o ecoturismo ser visto hoje como um dos meios de se alcançar o desenvolvimento sustentável de comunidades, sabe-se que isto só é possível considerando-se as necessidades econômicas locais e integrando as comunidades locais e seus interesses ao processo de planejamento e gestão de áreas com potencial para ecoturismo. O objeto de estudo deste trabalho foi uma área de mata atlântica situada no domínio da Serra do mar, no município de Corupá-SC, com grande potencial turístico principalmente devido a seus recursos hídricos. É de propriedade do grupo empresarial Battistella e é designada como Parque Ecológico Emílio Fiorentino Battistella. O parque foi aberto à visitação em junho de 1989, e desde então têm recebido um número cada vez maior de visitantes. No entanto, até hoje não foram implantados meios de controlar e monitorar a visitação e seus impactos, sendo que nem mesmo a situação legal do parque ecológico, assim chamado erroneamente, está definida, uma vez que não se encontra ligado ao Sistema Nacional de Unidades de Conservação. O objetivo específico do trabalho voltou-se para a área do Parque Ecológico E. F. Battistella e consistiu em trabalhar a conciliação da visitação com a preservação dos recursos naturais, através de atividades e nível de visitação, adequados à área, da criação de uma consciência ecológica entre visitantes e comunidade e de intervenções físicas com o fim de reduzir o impacto da visitação e ao mesmo tempo dar mais segurança aos visitantes. Entretanto, para que o trabalho fosse realmente alicerçado nos princípios do ecoturismo, foi necessário voltar-se para uma escala mais ampla, a da comunidade sob influência da atividade turística no parque e das áreas de nascentes de rios que formam a microbacia em questão. Desta forma, indicaram-se direções a se seguir quanto ao uso do solo destas áreas, considerando-se a forma de ocupação das comunidades, suas necessidades econômicas, o potencial para o turismo rural e ecológico e a preservação dos recursos naturais. 46 46 Texto enviado por e-mail por Thaís Inês Krambeck. 124 FIGURA 19 - Parque Rota das Cachoeiras: Implantação/ Cobertura Fonte: Arquivo de Thais Inês Krambeck. FIGURA 20 - Parque Rota das Cachoeiras: Vista Frontal - Centro de Educação Ambiental Fonte: Arquivo de Thais Inês Krambeck. Percebe-se que houve grande preocupação, principalmente, com as questões ambiental e cultural. A autora conseguiu, por meio da utilização dos conceitos de sustentabilidade e de ecoturismo, preservar o meio ambiente, disponibilizando soluções para resolver os problemas existentes no parque. Além disso, os materiais, técnicas e formas arquitetônicas apresentadas para os estabelecimentos de apoio ao parque são bastante compatíveis tanto com o entorno quanto com o discurso que fundamenta a intervenção proposta. É interessante enfatizar a preocupação de Thais Krambeck com a orientação do comportamento do visitante, fato que possui uma estreita relação com a questão da Educação Ambiental, motivando e justificando a criação do Centro de Educação Ambiental dentro do empreendimento. 4.2.3 Opera Prima 2002 Ganhadores: Ailton Cabral Moraes – Ginásio Poliesportivo – UnB 125 Albenise Laverde – Indústria Moveleira em Estrutura e Madeira Laminada Colada – UEL Danielle de Cássia Spadotto – Núcleo de Cidadania e Habitação – Universidade Presbiteriana Mackenzie Fernanda Figueiredo Guimarães – Centro Comunitário Morro das Pedras – UFMG Marila Braga Filartiga – Transporte Hidroviário para Barra da Tijuca – UFRJ Menções honrosas: Fábio Pietrani Toffano – Arquitetura x Meio Ambiente – UFF Helena de Cerqueira Cesar Radesca – Avenida Sumaré: Reciclando Espaços Públicos – USP Juliana Iwashita – Torre Bioclimática: Conservação de Energia e Fontes Alternativas – USP Viviane Caroline Abe – Reabilitação Tecnológica de Edifício de Escritórios – USP Dos nove arquitetos, oito responderam que consideram a discussão e abordagem da sustentabilidade na formação do arquiteto, pouca e superficial, e um respondeu que não existe tal abordagem. Algumas citações a respeito da definição de sustentabilidade na arquitetura e urbanismo e como eles acham que poderia melhorar esta discussão seguem abaixo. Arquitetura sustentável é a arquitetura responsável. A arquitetura integrada ao meio onde está inserida, sem agredir o meio ambiente. A arquitetura sustentável está comprometida com os impactos no meio ambiente, e tem por meta, exatamente, a redução desses impactos, seja na fase de construção (diminuição de desperdícios no canteiro de obra), seja durante a vida útil da edificação (reuso de águas pluviais, aproveitamento de energia solar, etc.), seja através da reabilitação da edificação (que pode ser facilitada pela flexibilidade do projeto e pelos materiais empregados inicialmente). O planejamento urbano sustentável, da mesma maneira, deve estar comprometido com o meio e com os impactos que as modificações causarão nesse meio a curto, médio e longo prazo. Viviane Abe, USP, 2002. A meu ver, a medida mais eficiente para melhoria deste problema seria o investimento por parte das instituições de ensino em cursos de atualização oferecidos aos professores ou a contratação de novos professores com formação específica neste campo de conhecimento. Outra medida interessante, mas que a meu ver seria menos eficiente, seria a apresentação de palestras e seminários ministrados por convidados estudiosos do assunto. Ailton Moraes, UnB, 2002. Dos nove trabalhos analisados, cinco autores disseram que algumas questões relacionadas à sustentabilidade foram abordadas em seus trabalhos finais de graduação, e quatro disseram que o trabalho estava muito voltado para este assunto. Destes, dois destacaram-se: o trabalho de Fabio Toffano e o de Juliana Iwashita. 4.2.3.1 Arquitetura x Meio Ambiente - Fabio Toffano, UFF O projeto de Fabio Toffano foi uma edificação residencial multifamiliar em um terreno situado na única rua do bairro de São Francisco, Niterói, RJ, passível de construções 126 acima de dois pavimentos. O terreno escolhido possuía orientação, forma, e imposições legais e de mercado peculiares, e assim as soluções inevitavelmente esbarravam nas questões de conforto. Dessa forma o autor empregou soluções alternativas que buscassem o conforto térmico adequado ao clima da cidade, aliado à eficiência energética e hídrica da edificação. Sistemas como aquecimento da água por energia solar; exaustão eólica do ar interno; iluminação e ventilação natural explorada ao máximo; sistemas artificiais de iluminação mais econômicos; isolamento térmico da edificação; aberturas adaptadas às condições locais de favorecimento ao conforto; concepção de forma, função e estrutura, criando os espaços fluidos otimizando a circulação do ar; reuso da água pluvial para fins não potáveis; soluções que permitissem maior controle de vazamentos; medição do consumo de água individualizada; aparelhos sanitários eficientes, como a bacia de descarga reduzida e dispositivos controladores de vazão e pressão. Uma crise anunciada. É como especialistas em energia analisam a atual situação. A ausência de investimentos nos últimos anos provocou o grave estado em que se encontra o setor elétrico. As grandes estatais foram impedidas pelo governo de fazer expansões, e o setor privado não correspondeu às expectativas. As grandes hidrelétricas, planejadas para ciclos de seca de cinco anos, operam sob elevados riscos com ciclos de um. A ausência de chuvas rebaixou os reservatórios a níveis nunca antes registrados, e a exploração de outras matrizes energéticas não surtiu o efeito desejado. Como resultado, enfrentamos uma situação crítica, com racionamentos impostos a todos os segmentos da sociedade, com reflexos na economia e na vida das pessoas. Por outro lado, em muitas regiões do Brasil a falta de água potável para a população já é realidade. Municípios já não sabem onde captar água para suprir o aumento da demanda, afastando inclusive indústrias e provocando o fornecimento irregular às áreas de abastecimento. Ao mesmo tempo, se sabe que aproximadamente a metade de toda a água captada, é perdida sob a forma de perdas ou desperdícios. Diante dessas situações, ao analisarmos os problemas por que passamos, cabe a pergunta. Qual seria o papel do arquiteto, como técnico responsável pelo crescimento das cidades e de suas edificações? Essa pergunta soa mais preocupante, quando constatamos que substituir um modelo de crescimento errôneo pode demorar muito tempo. Sobretudo, quando ele ainda é largamente utilizado até pelos arquitetos e urbanistas. Refletindo sobre estas questões, o projeto foi elaborado de maneira a incorporar desde o início, idéias baseadas nos conceitos da Arquitetura Bioclimática. O objetivo foi harmonizar o habitat humano a natureza que o envolve, retirando dela o máximo de recursos com um mínimo de impacto. Para isso foram consideradas todas as tecnologias disponíveis atualmente, sem perder de vista a questão de viabilidade relacionada às decisões arquitetônicas. A área de estudo, o bairro de São Francisco em Niterói, vem sofrendo pressões da indústria de construção civil para seu crescimento. Ao mesmo tempo, enfrenta a resistência da opinião pública, temerosa pelo impacto na qualidade de vida da população residente. Estudar uma forma viável de se expandir às cidades, sem causar maiores problemas com a natureza e os recursos naturais disponíveis, se tornou uma imposição de projeto. [...] O objetivo do projeto é mostrar ao arquiteto, a preocupação do entendimento de cada um dos conceitos de Conforto Ambiental, Eficiência Energética e racionalização do uso de Recursos Naturais. Não adotando um como prioritário, mas intercambiando informações entre todos eles. A necessidade de especialistas nestas áreas é inquestionável, tanto quanto maior for a complexidade da obra arquitetônica. O que se quer reafirmar é, a necessidade do arquiteto ser apto a filtrar e traduzir as soluções 127 discutidas e sugeridas pelos profissionais de cada área, em propostas arquitetônicas objetivas e de qualidade. Dentro desta visão a Eficiência Ambiental e Energética, é tão importante quanto o conceito estético, formal, funcional, econômico ou social. O objetivo é fornecer premissas básicas para qualquer projeto arquitetônico, a serem consideradas desde o princípio do estudo. Um bom projeto de arquitetura deve assistir a um programa e análise climática de forma a responder simultaneamente à eficiência energética e as condições de conforto. [...] Desde o início, o projeto buscou nas idéias e conceitos da Arquitetura Bioclimática, métodos que levassem a soluções simples e eficientes, tal qual a natureza, em que busca inspiração. Não só a natureza como imaginamos, com seus elementos terra, água e ar, influenciadores do clima, dos materiais e do homem. Mas também a natureza humana, inerente à alma, presente no conhecimento e na ciência. Por isso procurei utilizar com sabedoria e inteligência humana, os elementos e recursos disponíveis na natureza. Tentei enxergar a economia da água ou de energia não só como números ou cifras, mas como um desafio a nossa própria racionalidade. Busquei a superação não só daquilo que é mais evidente, que são os problemas aqui apresentados. Mas sim, o desafio de testar até que ponto, o estágio da inteligência humana, seria capaz, não de domar a natureza, mas de cooperar com ela. Talvez tenha sido movido pelo desejo de tornar a arquitetura, habitat humano, assim como ele, um elemento natural, em equilíbrio.47 FIGURA 21 - Arquitetura x Meio Ambiente: Perspectiva do edifício. Fonte: Arquivo de Fabio Toffano O autor elaborou seu projeto baseado nos princípios da Arquitetura Bioclimática, em conceitos de Conforto Ambiental, Eficiência Energética e hídrica, racionalização do uso de Recursos Naturais, produzindo o mínimo possível de impacto ao meio ambiente e utilizando tecnologias disponíveis atualmente, sem desconsiderar a viabilidade econômica. Ele se preocupou com a especificação e utilização de materiais, formas, sistemas e técnicas que aliassem todos estes fatores. Além disso, Fabio Toffano procurou sempre ressaltar o dever e papel do arquiteto frente às questões ambientais e econômicas, assumindo que o arquiteto é um dos técnicos responsáveis pelo crescimento das cidades e de suas edificações. O autor se baseia no conceito de sustentabilidade, com grande destaque às questões ambientais e econômicas. 47 Texto enviado por e-mail por Fabio Toffano. 128 4.2.3.2 Torre Bioclimática: Conservação de Energia e Fontes Alternativas - Juliana Iwashita, USP O projeto da autora foi um edifício vertical de escritórios na cidade de São Paulo, com 219m de altura, localizado numa zona nobre de comércio e de serviços da Chácara Santo Antonio junto à Marginal Pinheiros. Possui área construída de 128.000m2 com 35 pavimentos tipo, 3 subsolos, 2 pavimentos intermediários de convívio social e embasamento com comércio e serviços. A concepção arquitetônica do edifício primou pela adequação ao microclima local, otimizando o uso de estratégias passivas de ventilação e iluminação natural com soluções energeticamente eficientes; preservação de recursos naturais e ambientais, através do uso racional, reutilização e reciclagem de materiais e resíduos; aproveitamento de águas pluviais e coleta seletiva de lixo; e estratégias de geração de energia limpa através de aerogeradores. Diante da crise energética, a arquitetura passiva tornou-se um requisito cada vez mais relevante e necessário. Partidos arquitetônicos que visem a eficiência energética e a sustentabilidade serão premissas indispensáveis para futuros projetos. Desta forma, o trabalho apresenta o projeto de uma Torre Bioclimática de Escritórios, de baixo impacto ambiental e de estratégias passivas para redução do consumo energético e sustentabilidade do edifício. O projeto aborda desde questões climáticas para estudo de orientação, configuração espacial e fachadas para melhor aproveitamento da iluminação e ventilação natural, até estratégias para sustentabilidade do edifício como geração de energia limpa através de aerogeradores, reutilização de águas pluviais e coleta seletiva de lixo. Foram elaboradas soluções arquitetônicas para redução do consumo de energia para as principais cargas instaladas em edifícios comerciais: ar condicionado, iluminação e elevadores, através de escolha de materiais de construção apropriados, desenhos que propiciassem ventilação das fachadas, utilização de light pipe, espelhos e prateleiras de luz para otimizar a iluminação natural e estudo de tráfego vertical explorando-se a segregação de grupos de elevadores e uso de rampas e escadas. O projeto primou pela conservação de energia e utilização de fontes alternativas de energia. O edifício explora o potencial dos ventos em São Paulo, criando condições para que este seja utilizado para gerar energia através de aerogeradores nas fachadas e no topo do edifício. O sistema apresenta potencial de geração de 120,70 MWh/mês, aproximadamente 15% do consumo total do edifício.48 48 Texto enviado por e-mail por Juliana Iwashita. 129 FIGURA 22 - Torre Bioclimática: Perspectiva aérea Fonte: Arquivo de Juliana Iwashita Observa-se grande preocupação da autora com a utilização de tecnologias que adequem os conceitos de eficiência energética, conforto ambiental e arquitetura bioclimática, além da questão dos resíduos e desperdícios, em uma edificação vertical de grande proporção e com grande potencial de impactos urbanos e ambientais. Um grande destaque da edificação é a característica de auto-suficiência em função da geração de energia eólica como fonte alternativa de energia, evidenciando assim uma grande preocupação com as questões de sustentabilidade. 4.2.4 Opera Prima 2003 Ganhadores: Adão Antonio Ribeiro Junior – Arché- Signo à Cidade: Museu - Universidade Católica de Santos Adriene Pereira Cobra Costa Souza – O Bambu na Habitação de Baixo Custo – PUC Minas Cristian Maurício Riveros Illanes – Base de Operações de Ong – UFRGS Luciano Lerner Basso – Cantina e Casa Noturna: Il Vecchio Mulino – PUC RS Maria Branca Rabelo de Moraes – Museu de Arte Lygia Clark - UFRJ Menção honrosa: Kim Ribeiro Ruschel - Usina de Tratamento de Resíduos Sólidos – Centro Universitário Belas Artes de São Paulo Destes seis premiados (cinco ganhadores e uma menção honrosa) apenas um questionário não foi respondido, o de Adriene Pereira Souza. Em relação à questão feita aos 130 respondentes sobre como consideram a discussão e abordagem da sustentabilidade na formação do arquiteto, três responderam que não existe e dois disseram que é pouca e superficial a sustentabilidade na formação do arquiteto e urbanista. Seguem abaixo algumas citações dos arquitetos sobre a sustentabilidade na formação do arquiteto. [a discussão e abordagem da sustentabilidade na formação do arquiteto e urbanista é] Muito pouca abordada, ou não existe, pois este ramo de atividade como disciplina é relativamente jovem e as universidades brasileiras são demasiadamente jurássicas e pouco conceitualmente renováveis. Em termos práticos de planejamento, as ações de preservação e utilização de recursos, bem como a sustentabilidade estão a cargo de uma minoria ativistas, organizações não governamentais e pessoas esclarecidas, porém o discurso ainda é retórico, com pouca aplicabilidade à necessária prática política, salvo raríssimas exceções. Adão Ribeiro, Universidade Católica de Santos, 2003. Com mais informação e discussão, creio que muitas vezes os conceitos de sustentabilidade não são melhores aplicados pelos arquitetos por falta de informação e não por falta de interesse. Luciano Lerner, PUC-RS, 2003 Acho que a discussão da sustentabilidade deveria estar presente em todas as disciplinas do curso de Arquitetura e não ser dada à parte como matéria isolada. A discussão deve começar na concepção de um projeto, passar por todas as etapas de desenvolvimento, execução da obra e continuar com todos aqueles que usufruirão do espaço construído. Maria Branca Rabelo, UFRJ, 2003. Dos seis trabalhos analisados, um autor respondeu que não abordou a sustentabilidade, pois seu trabalho não estava voltado para o assunto; um ressaltou que algumas questões foram abordadas e quatro disseram que o trabalho estava muito voltado para a sustentabilidade na arquitetura e urbanismo. Desses, dois trabalhos destacaram-se: o de Luciano Lerner Basso e o de Kim Ribeiro Ruschel. 4.2.4.1 Cantina e Casa Noturna: Il Vecchio Mulino - Luciano Lerner Basso, PUC RS A proposta do autor é tornar o velho moinho Germani, em Caxias do Sul, RS, através de restauro, revitalização e refuncionalização da área tombada, um foco regional de turismo, cultura e lazer. Em meio à vegetação nativa e aos parreirais, Luciano Basso cria um parque com trilhas, locais de descanso e contemplação, e um mirante. Na área tombada foi proposta a implantação de cantina, bar de degustação, restaurante italiano, pub e boate. O projeto da Cantina e Casa Noturna Il Vecchio Mulino tem o objetivo de revitalizar uma edificação tombada, de importante valor cultural para a cidade de Caxias do Sul, resgatando a memória e a tradição da cidade e revitalizando o entorno. Não basta propor um restauro e alguma nova edificação para obter-se um bom resultado. É preciso ir ao fundo da memória da população e fazer uma intervenção não só com estética arquitetônica, é necessário basear o projeto na cultura do seu povo. 131 Caxias do Sul está voltando as costas para as suas origens, assim como muitas outras cidades brasileiras, a arquitetura que tem sido feita na região é uma arquitetura "importada e sem vínculos culturais com a cidade". O projeto Il Vecchio Mulino busca reconhecer os valores regionais, resgatar a memória da cidade e promover questionamentos sobre a importância da arquitetura e sua influência como um paradigma cultural. Também não basta apenas restaurar, mesmo que isso seja feito da melhor forma possível. É necessário criar um programa que promova o uso e a diversidade. O prédio restaurado não deve tornar-se uma peça de museu a céu aberto, ele deve ser amplamente utilizado e agregar valor a cidade, para assim restaurar não apenas a obra edificada, mas sim a sua importância. O programa elaborado para o Il Vecchio Mulino visa exatamente isso. Ele é ao mesmo tempo um foco turístico, um ponto de encontro e lazer para Caxias do Sul e um parque da uva e do vinho, permitindo-se a apropriação por várias faixas etárias e tipos de pessoas com os mais diversos interesses. Com isso o conjunto será utilizado durante todos os turnos e valorizado por toda a população. O objetivo não é criar uma boate, um restaurante italiano e tão pouco apenas uma cantina ou um parque, o objetivo é tornar afim atividades distintas e criar um conjunto diversificado que tenha força para revitalizar a vida. O programa e composto por uma cantina, um restaurante, bares e uma boate. Durante o dia há a produção de vinho; as visitações turísticas e educacionais à cantina e ao parque dos parreirais; o restaurante; a degustação de queijos e vinhos e o café colonial. Durante a noite o Il Vecchio Mulino continua ativo, ele se tranforma em um complexo de lazer composto por restaurante, pub, bar temático e boate. O prédio que abrigava o velho moinho Germani abriga a recepção no térreo, um restaurante em seu porão e um wine pub no pavimento superior. Porém esses espaços possuem contato visual permanente. O prédio, construído em 1905, possui estrutura interna em madeira, hoje condenada. É proposta uma nova estrutura, respeitando os níveis dos pavimentos e utilizando materiais que harmonizem com o conjunto sem criar a confusão do que é novo e do que é antigo. Essa nova estrutura é mista, em aço e madeira laminada colada. Houve o cuidado de não encostar a nova estrutura no prédio existente e onde é inevitável foram criadas interfaces em aço ou vidro, usando negativos e transparências. [...] A boate merece uma atenção especial devido ao seu inusitado sistema de fechamento e ao que ele gera. O prédio da boate é praticamente um cubo de basalto inserido na encosta e cercado de densa vegetação. Rotacionado em relação aos outros prédios para adaptar-se ao terreno, ele está implantado paralelamente às curvas de nível e também semi-enterrado.49 FIGURA 23 - Cantina e Casa Noturna: Foto da maquete do projeto Fonte: Arquivo de Luciano Lerner Basso 49 Texto enviado por e-mail por Luciano Lerner Basso. 132 FIGURA 24 - Cantina e Casa Noturna: Vista do interior Fonte: Arquivo de Luciano Lerner Basso Observa-se que a questão cultural, aliada à questão ambiental, foi primordial neste trabalho. O autor afirma que a sustentabilidade foi abordada na escolha de materiais de baixo impacto ambiental e em grande quantidade na região, assim como na preocupação em preservar a vegetação nativa, topografia e características gerais do terreno. Além disso, o projeto baseouse nos princípios de conforto ambiental, térmico e lumínico, naturais. 4.2.4.2 Usina de Tratamento de Resíduos Sólidos - Kim Ribeiro Ruschel, Centro Universitário Belas Artes de São Paulo Localizada em Paraty, RJ, a usina modelo de beneficiamento de lixo reciclável separa e recicla o lixo não-orgânico produzido pela população urbana. Também foi proposta a criação de centros comunitários para fazerem a interface entre a usina de responsabilidade estatal e a população como um todo. Os centros comunitários forneceriam assistência na organização da comunidade e ajuda na conscientização das pessoas com a questão do lixo. Antes de discutirmos o problema dos resíduos produzidos pelo homem devemos observar como a natureza trata a mesma questão. No universo não existe lixo, existe a reciclagem, “nada se perde tudo se transforma”. Nosso planeta só existe porque quando o sol se formou, ele deixou para trás “sobras” em forma de poeira estelar, esse lixo estelar se reciclou e formou os planetas, corpos celestes que orbitam o sol. No princípio não havia vida na terra, ela só se fez possível porque átomos de diferentes elementos químicos se recombinaram formando cadeias de aminoácidos que por sua vez formaram os primeiros seres unicelulares, estes evoluíram até se transformarem no ser humano. Cada átomo que existe dentro do nosso corpo foi forjado dentro de nossa estrela mãe: o sol. Através da reciclagem natural e a transformação dos átomos, seres mais complexos como bactérias, plantas ou animais podem existir. A manutenção da vida na terra esta ligada a vários fatores, sendo um deles a boa conservação dos recursos hídricos, que por sua vez, está diretamente conectado ao correto tratamento dos resíduos sólidos. Com a crescente preocupação sobre o futuro da água potável no planeta, cresce a necessidade de estudos sobre o meio ambiente e o tratamento de seus resíduos. 133 Assim como o universo recicla seu lixo estelar, aqui na Terra não aprendemos ainda a reciclar devidamente nosso lixo. Com o esgotamento dos aterros sanitários, se faz cada vez mais necessários projetos que resolvam este crescente problema mundial. Esta tese propõe uma usina modelo de beneficiamento de lixo reciclável, localizada em Paraty-RJ. Paraty foi escolhida como patrimônio da humanidade, situada a beira do mar, entre as margens de dois rios principais: Mateus Nunes e Perêque-Assú. Paraty foi utilizada como laboratório devido a sua importante relação com o mar, seus rios, e sua bacia hidrográfica. O projeto propõe também a criação de centros comunitários que farão a interface entre a usina de responsabilidade estatal e a população comum. Os centros comunitários fornecerão assistência na organização da comunidade e ajuda na conscientização das pessoas para com o problema do lixo. Sem informação não pode haver uma mudança no comportamento das pessoas. O tratamento adequado do lixo deve começar em casa. Com uma idéia simples e de fácil execução este projeto pretende separar e reciclar o lixo produzido pela cidade, contribuindo assim para a boa conservação do nosso planeta.50 FIGURA 25 - Usina de Tratamento de Resíduos Sólidos: Perspectiva Fonte: Arquivo de Kim Ribeiro Ruschel O trabalho aborda tema de elevada prioridade para a salubridade urbana e a saúde pública: o tratamento adequado do lixo não-orgânico produzido pela população. Utiliza solução de alta tecnologia e arquitetura de grande simplicidade. Além disso, a usina seria auto-suficinte, pois geraria sua própria energia utilizando painéis solares e também energia gerada pela corrente do rio. Uma questão de grande importância é informar a população, assim a sustentabilidade não está só presente na preocupação ambiental e tratamento dos resíduos sólidos, mas na participação da comunidade nesse propósito, através dos centros comunitários. Assim são observadas, principalmente, preocupações com as questões ambientais, sociais e econômicas. 4.2.5 Opera Prima 2004 Ganhadores: 50 Texto enviado por e-mail por Kim Ribeiro Ruschel. 134 Fernanda Kleemann Spinicci – Requalificação urbana Largo 13 de maio: espaço cívico e institucional - Universidade Presbiteriana Mackenzie Leonardo Piccinini Colucci – F. A. C. Fundação Amilcar de Castro – UFMG Lucas Filpecki Martins – Expor. Refletir. Compartilhar. Galeria de arte contemporânea Estocolmo/Skeppsholmen – UFRJ Nina Carla Segatto Cabeleira Bitelo – Museu de fotografia - Gravataí/Rs – UNISINOS Pedro Engel – Casa da palavra: nova sede do Instituto Estadual do livro – UFRGS Menções honrosas: Gustavo Conte Moojen – Núcleo Base de Monitoramento e Pesquisa dos Areais – UNIRITTER Izabel Torres Cordeiro – Escola Náutica: intervenção na orla do lago Paranoá – UnB Mara Oliveira Eskinazi – Centro de Referência Ambiental Lobo-Guará – UFRGS Destes oito premiados (cinco ganhadores e três menções honrosas) apenas um questionário não foi respondido, o de Nina Carla Bitelo. Sobre a questão feita aos premiados em relação à discussão e abordagem da sustentabilidade em sua formação, cinco autores responderam que é pouca e superficial, e dois que é nula. Algumas citações sobre a sustentabilidade na formação do arquiteto seguem abaixo. Sustentabilidade é um conceito inatingível. Tudo é finito, nada se sustenta pra sempre. Nada. Então pra que serve o conceito de sustentabilidade? Não existe o conceito de boa arquitetura independente deste. Arquitetura sustentável nada mais é do que uma obra que não necessite apelar pra força de equipamentos modernos, desde iluminação, aquecimento, ventilação..., visando com isso superar uma deficiência de projeto. Esse conceito nasce com a arquitetura. Gustavo Moojen, UNIRITTER, 2004. Primeiramente, este assunto deve estar na pauta de conteúdos considerados pertinentes aos processos didáticos em arquitetura por aqueles que idealizam o ensino. Na minha opinião a sua pertinência dependerá sempre de valores em jogo na discussão arquitetônica, que muitas vezes é alheia a valores externos à disciplina. Veja, eu diria que a sustentabilidade não é fundamental para o ensino da arquitetura (e por isso não talvez figure como deveria nas escolas), embora ela possa (e na minha opinião, deva) compor um rol de valores presentes em uma discussão ética sobre que arquitetura deve ser praticada e ensinada. Um bom caminho para que passe a figurar na arquitetura pode estar justamente na fomentação da discussão sobre valores éticos na arquitetura, já que uma discussão sobre a difinição disciplinar me parece já um pouco estéril. Discutir a ética em arquitetura teria boa força “problematizante”, mas não é nenhuma novidade como proposta. Lembre que a inflexão no pensamento depois do Movimento Moderno contou com esse tipo de discussão. Em segundo lugar, creio que a sustentabilidade só possa figurar no ensino com o devido respaldo técnico. Não é algo que se limite a uma simples intenção de projeto ou que possa ser sustentado apenas como discurso. Sua presença como valor deve efetivamente alterar a produção projetual e também a maneira de se projetar. Este respaldo técnico deve ter, evidentemente, coerência didática e não ser reduzido a diretrizes normativas como as NBR da vida. Finalmente, acho que este valor não deva introduzir conteúdos e critérios às custas da exclusão de outros conteúdos e critérios importantes para o fazer arquitetônico. Não creio que a sustentabilidade se baste como um valor em si. Sendo mais claro, um edifício que vise a sustentabilidade não se exime de ser bem proporcionado, se esteticamente interessante, garantir a usabilidade do seu espaço, escutar o seu contexto, etc. Se fosse assim, voltaríamos a uma redução semelhante a um 135 funcionalismo xiita que há quase um século se mostrou equivocado. Ao contrário, penso que só será possível levar adiante a presença da sustentabilidade como valor no ensino se ela for inserida em uma cultura arquitetônica já existente. Esta cultura, é claro, será modificada pela sua presença. Com isso será necessário que se repense os processos criativos do projeto e os processos de ensino. E esta necessidade também não é novidade, já que se hoje alguns clamam pela sustentabilidade no ensino, já se clamou pelo conforto ambiental, pela história da arquitetura, pela preservação do patrimônio, por noções de técnica construtiva, por um olhar para a cidade, pela expressão formal, etc. Pedro Engel, UFRGS, 2004. Dos sete questionários recebidos, quatro disseram que em seus trabalhos algumas questões sobre sustentabilidade foram abordadas, um respondeu que não abordou, e dois disseram que o trabalho estava muito voltado para a sustentabilidade na arquitetura, o de Mara Eskinazi e o de Izabel Torres Cordeiro. 4.2.5.1 Centro de Referência Ambiental Lobo-Guará - Mara Oliveira Eskinazi, UFRGS A proposta abriga dois núcleos de atividades, um diretamente relacionado com turismo ecológico, lazer e cultura, e o outro relacionado com atividades de educação e gestão ambiental. Outra característica foi proporcionar ao projeto Lobo-Guará, programa pioneiro na região em cursos de ecologia, educação ambiental e passeios ecológicos, uma nova sede com infra-estrutura mais adequada para o desenvolvimento de suas atividades. O projeto objetiva o desenvolvimento de uma edificação que sirva de referência para atividades de cunho ambiental na paisagem da Serra Gaúcha. A temática desenvolvida baseia-se, entre outros aspectos, na carência de projetos desta natureza na região, e tem em mente a crescente necessidade de conscientizar e esclarecer a população sobre os mais variados temas relacionados com a ecologia, a sustentabilidade e o meio-ambiente. O terreno trabalhado localiza-se a aproximadamente 7 km do centro do município de Canela, no estado do Rio Grande do Sul, e a cerca de 500m do Parque Estadual do Caracol – local de natureza exuberante e de extrema importância para o turismo na região. A área possui em torno de 25.000m2 e está compreendida dentro do Parque da Floresta Encantada, onde atualmente existe uma pequena infra-estrutura voltada para o turismo, com lancheria, lojas de artesanato local, mirantes e um teleférico que constitui o principal equipamento do parque, cujo percurso está voltado diretamente para a Cascata do Caracol. A área abrangida pela intervenção apresenta geometria bastante irregular, e foi delimitada pela linha a partir da qual a mata nativa se densifica fortemente. [...] A edificação abriga basicamente dois núcleos de atividades, sendo um deles diretamente relacionado com turismo ecológico, lazer e cultura através do cultivo de plantas em estufas e em jardins, e o outro relacionado com atividades de educação e gestão ambiental. O objetivo do primeiro núcleo é o de reproduzir artificialmente, em uma grande estufa constituída sob uma estrutura envidraçada, cinco dos mais importantes e típicos ecossistemas existentes no estado do Rio Grande do Sul com suas vegetações características, de forma a proporcionar aos turistas e visitantes do complexo um panorama da paisagem Gaúcha. [...] Além disso, o projeto conta também com jardins ao ar livre de plantas típicas dos ecossistemas da região, que não necessitam de uma cultura artificial para se adaptarem e se reproduzirem, uma vez que estão no seu habitat natural. Já o núcleo de atividades relacionado com educação e gestão ambiental procura proporcionar ao projeto Loboguará, programa pioneiro na região em cursos de ecologia, educação ambiental e passeios ecológicos orientados em parques, cuja sede se localiza 136 atualmente em uma pequena residência de madeira no interior do Parque Estadual do Caracol, uma nova sede com infra-estrutura mais adequada para o desenvolvimento de suas atividades. Este núcleo conta, portanto, com salas de aula e pesquisa, auditório para cursos, palestras e pequenas montagens teatrais, biblioteca especializada em ecologia, botânica e meio-ambiente, além de uma área para cultivo e trabalho com mudas. De um modo geral, pode-se dizer que a síntese de qualquer sistema projetado implica, inevitavelmente, algum impacto ambiental sobre o ecossistema, assim como também uma certa utilização e redistribuição dos recursos naturais existentes. Portanto, os principais objetivos da proposta estão relacionados com a busca por um projeto que esteja engajado em uma arquitetura mais preocupada com as questões ambientais, respeitando ao máximo o contexto da paisagem onde a edificação está inserida e valorizando as visuais do terreno para a Cascata do Caracol e para o Vale da Lageana, e destes para o objeto integrado à paisagem do seu entorno. Assim, o projeto para o Centro de Referência Ambiental Loboguará procura, fazendo com que os visitantes tenham contato direto com a natureza do local, relacionar as atividades humanas com os ecossistemas do modo mais vantajoso e compatível com as limitações inerentes ao meio-ambiente, buscando uma relação respeitosa com a paisagem, sem estabelecer com a mesma uma competição. Portanto, a busca por uma solução volumétrica que, ao mesmo tempo em que reagisse à topografia do terreno, interferisse o mínimo possível na paisagem da região foi o mais importante princípio que norteou a concepção do projeto, tanto com relação à edificação, quanto ao projeto do espaço aberto, uma vez que o seu desenho foi concebido baseando-se nos condicionantes naturais do terreno e de sua topografia. [...]51 FIGURA 26 - Centro de Referência Ambiental Lobo-Guará: Foto da maquete Fonte: Arquivo de Mara Oliveira Eskinazi Pode-se dizer que este projeto busca uma relação mais estreita entre as pessoas e a natureza, tanto por ser inserido em uma enorme área verde de grande importância para a cidade de Canela quanto, principalmente, pelo fato de possuir um local para o ensino e a prática de atividades voltadas para a educação ambiental, incluindo uma estufa de plantas reproduzindo os cinco principais ecossistemas do estado do Rio Grande do Sul e suas vegetações nativas. Além disso, a autora afirmou ter buscado utilizar técnicas e critérios amparados nos conceitos de 51 Texto enviado por e-mail por Mara Eskinazi. 137 sustentabilidade, como captação de águas das chuvas, proteções solares nas fachadas, muito pouca movimentação de terra já que o edifício se acomoda no terreno naturalmente adaptando-se à topografia acidentada e preservando a vegetação existente, entre outros. O projeto integra as questões ambientais, culturais, econômicas e sociais, com grande destaque para a preocupação com a questão ambiental. Ressalta-se também a atenção especial ao programa de ensino e prática de atividades voltadas para a educação ambiental. 4.2.5.2 Escola Náutica: intervenção na orla do lago Paranoá - Izabel Torres Cordeiro, UnB A área de intervenção escolhida foi o Parque Ecológico das Garças, situado na orla do lago Paranoá, em Brasília. Essa região não possui grande dimensão e sua vegetação nativa estava em fase de degradação, não sendo assim uma área rigorosamente de preservação. Dessa forma foi proposto um caráter de conservação e uso de múltiplo para o Parque. Para principal edificação projetou-se uma escola de esportes náuticos, para incentivar a convivência e o uso cotidiano deste espaço pelos moradores da região. Desde os primeiros estudos para a implantação da cidade, o Lago Paranoá participa como elemento fundamental do cenário paisagístico e urbano do Plano Piloto de Brasília. Proporciona aos moradores e visitantes da cidade, em cerca de 87 quilômetros de orla, belíssimas visuais, ainda que em processo crescente de desfiguração. É certo que este processo não é mais nenhuma novidade para os habitantes de Brasília. Todos temos acompanhado, nos últimos anos, uma série de intervenções negativas nessa área, como a incorporação de áreas públicas ao domínio privado e a proliferação de loteamentos irregulares, causando impacto, direto ou indireto sobre o Lago Paranoá. [...] Brasília ainda não privilegiou o acesso público ao lago, e apenas recentemente, vem tornando seus espaços atrativos a comunidade. De fato, é expressivo o potencial do Lago Paranoá para as práticas relacionadas, principalmente, às atividades recreativas, turísticas e econômicas. O usufruto desse potencial, entretanto, deve ser pautado na sensibilidade ambiental para evitar uma intensificação de uso acima da capacidade do corpo hídrico. Aproveitou-se como objeto de intervenção, a área conhecida como Pontão do Lago Norte e destinada, recentemente, a implantação do Parque Ecológico das Garças, a pedido da associação dos moradores. Esta área, de localização privilegiada e enorme potencial para o uso público em atividades relacionadas, principalmente, à prática de esportes e lazer, encontra-se abandonada, sujeita à ação de invasores e conseqüente desfiguração da paisagem natural, com forte impacto sobre a flora e fauna nativa. Compreende-se que o estímulo ao uso, mediante o acesso público e democrático de suas margens, é uma ação indispensável para sua conservação, tanto do ponto de vista cultural como ambiental. Atualmente, os amantes do lago, que não são sócios dos clubes existentes e que insistem em freqüentá-lo, deparam-se com uma orla privatizada, com falta de informação, dificuldade de transporte coletivo, e alguns poucos espaços públicos completamente desqualificados, sem qualquer tipo de conforto ou segurança para o usuário. O resultado do uso popular dos espaços sem infra-estrutura é a degradação do meio ambiente, com os carros fazendo trilhas no cerrado e o lixo espalhado por toda parte.[...] A proposta de uma escola de esportes náuticos, dentro do parque, busca incentivar o uso cotidiano deste espaço pelos moradores da região e a socialização através do culto ao esporte. Complementando o projeto, o parque será contemplado com diversas áreas de lazer, com espaços voltados para as variadas faixas etárias, sempre a reverenciar o cenário paisagístico configurado pelo Lago Paranoá. Será agregada à área de intervenção, a faixa lindeira ao canteiro central, próxima à QL 15, formando um prolongamento paisagístico, de modo a integrar harmoniosamente o parque ao conjunto de residências. 138 As áreas de lazer serão divididas em duas categorias: lazer esportivo e entretenimento. Voltados para a utilização cotidiana, equipamentos como ciclovias, circuito de caminhadas integrado ao calçamento da EPPN (Estrada Parque Península Norte), quadras de areia, pista de patinação e skate, parque infantil e espaços para oficinas ao ar livre compõem a primeira categoria. A segunda busca aproveitar o potencial turístico e cenográfico da região, compreendendo, assim, um restaurante, um mirante, uma praça para eventuais feiras-livres e um anfiteatro. Os diversos usos do parque estão articulados por um passeio. Este, nostalgicamente pretende ser um calçadão, que em dias de maior vitalidade, aguarda aquelas manifestações desordenadas desenvolvidas por capoeiristas, músicos e artesãos. Fluindo paisagem com arquitetura, brinca-se com os planos e as rampas aplicando sobre faces dos taludes ou como muros de contenção, diferentes texturas. Tanto naturais, como grama e outras forrações, quanto sintéticas, como azulejos, murais em grafite ou chapas inteiras de aço corten. Os materiais selecionados apresentam maior durabilidade e demandam poucos esforços em sua manutenção.[...] O partido paisagístico adotado nesta intervenção propõe recuperar a paisagem natural degradada com a utilização exclusiva de espécies nativas. Isso diminuiria expressivamente os custos de manutenção, considerando o caráter público do espaço. Além disso, estar-se-ia promovendo o encontro dos usuários com elementos representativos da natureza local, valorizando o potencial plástico da vegetação típica do cerrado.52 FIGURA 27 - Escola Náutica: Foto da maquete Fonte: Arquivo de Izabel Torres Cordeiro A intervenção proposta para o Parque Ecológico das Garças, na orla do lago Paranoá, busca a conservação e revitalização do meio ambiente aliando atividades recreativas, turísticas e econômicas. Possui implantação adequada à identidade da arquitetura da cidade bem como ao entorno e topografia local. Os materiais utilizados foram selecionados por apresentarem maior durabilidade e demandarem pouca manutenção. Percebe-se neste trabalho a preocupação, principalmente, com as questões ambientais, culturais e econômicas. 4.2.6 Opera Prima 2005 Ganhadores: Akemi Tahara – Abrigo - Origami - Contêiner – UFBA Fabiana Colares Casali – Museu da Casa Brasileira - Brasília – UnB Gustavo Oliveira Policarpo da Luz – Requalificação urbana em áreas centrais - Polo Luz – Universidade Presbiteriana Mackenzie Ricardo Alexandre Packer – Núcleo de Difusão Cultural – Universidade Regional de Blumenau 52 Texto enviado por e-mail por Izabel Torres Cordeiro. 139 Taís Lie Okano – Centro Cultural Sacomã – Universidade Presbiteriana Mackenzie Menções honrosas: Fernando José Andrade dos Santos – Uma biblioteca pública para Belém – UFPA Gabriel Velloso da Rocha Pereira – Módulos de ocupação temporária – PUC MG Pablo Iglesias – Casa De Caranguejo Caminho Butantã / Zona Noroeste / Santos - USP Rafael de A. Assiz – Museu Metropolitano De São Paulo – Universidade Presbiteriana Mackenzie Dos nove premiados (cinco ganhadores e quatro menções honrosas) apenas um questionário não foi respondido, o de Gustavo Policarpo da Luz. Foi perguntado aos arquitetos sobre suas opiniões na discussão e abordagem da sustentabilidade na formação do arquiteto. Cinco autores disseram que é pouca e superficial, um disse que não existe, um alegou que é suficiente, e outro que a sustentabilidade é abordada até em um nível razoável, mas sem a devida relevância. Algumas citações sobre se a sustentabilidade na formação do arquiteto seguem abaixo. Interessante colocar que durante o curso senti o interesse de alguns professores no assunto, porém sempre de forma superficial e sem consistência. Parecia que o assunto deveria ser citado, porém nunca era aprofundado. Fabiana Casali, UnB, 2005. Na minha opinião a discussão é levada apenas para o lado do “ecochatismo” ao invés de tratar este tema como parte do programa do projeto. A sustentabilidade deve ser avaliada de acordo com o programa do projeto, para termos um caminho onde possamos avaliar, e quantificar estas medidas sustentáveis que tomaremos para o projeto. Gabriel Velloso, PUC-Minas, 2005. Acredito que hoje o mercado imobiliário não vende ainda o conceito de sustentabilidade, e como o consumidor final não participa do desenvolvimento dos projetos para qualquer fim, o arquiteto não vê como impor soluções sustentáveis em quase nenhum projeto hoje no Brasil. Seria preciso mais divulgação do assunto pois enquanto este conceito pertencer ao universo dos arquitetos somente, não teremos nada significativo no Brasil envolvendo sustentabilidade. Rafael Assiz, Universidade Mackenzie, 2006. Dos oito questionários recebidos, apenas um arquiteto respondeu que não abordou a sustentabilidade, pois seu trabalho não estava voltado para o assunto; três disseram que algumas questões foram abordadas, três que estava muito voltado para o tema em questão, e um autor alegou que na boa arquitetura já está intrínseco o conceito de sustentabilidade. Destes trabalhos, dois destacaram-se: o de Pablo Iglesias e o de Ricardo Alexandre Packer. 4.2.6.1 Casa de Caranguejo Caminho Butantã / Zona Noroeste / Santos - Pablo Iglesias, USP 140 A proposta consiste em um projeto de habitação para a área do Caminho Butantã, tendo como premissa principal a relação direta com a água. O espaço proposto contempla um caráter de transformação e apropriação contínua do morador. O autor também se preocupa em associar este projeto de habitação a programas de geração de emprego e de renda, de forma educativa e cooperativa. Assim, ele propôs uma oficina-escola de carpintaria naval, uma cooperativa dos pescadores, um centro de estudos do mangue, uma usina do lixo, entre outros. O lixo é uma grande preocupação do autor que propõe um centro de triagem, de primeiro beneficiamento e de transbordo de materiais recicláveis para reinserção na cadeia de reprodução e consumo urbanas. Em relação aos resíduos orgânicos, estes passam por processo de compostagem em galões para composição de adubo, estabelecendo uma parceria com o Jardim Botânico e utilizados em hortas comunitárias, pomares públicos e canteiros em geral. Este trabalho pretende re-estabelecer a relação do homem com a água (elemento de alegria, entretenimento e paz), de forma não predatória, mas sim harmônica, baseado na fruição e contemplação, no aproveitamento pleno de suas potencialidades, com caráter fortemente educativo para todas as partes envolvidas: este que no momento escreve, o homem-caranguejo habitante do mangue, e todos os que participam deste processo. Consiste num projeto de habitação para a área do Caminho Butantã, tendo como premissa a relação direta com a água. Um projeto sobre-dentro-na água, que contempla a criação de novas paisagens urbanas com relações mais elásticas entre dois meios opostos. A terra, onde tudo é parcelado e a água, onde o conceito de propriedade não existe, essencialmente coisa pública, e por isso o seu acesso deve ser garantido, em todos os sentidos. Reforçando esse caráter natural, propõe-se o direito de usufruto para as unidades habitacionais, como nas cooperativas de viviendas uruguaias e nas HLM (habitation à loyer minimum) francesas. Inexiste a propriedade, mas sim esse direito que não pode ser vendido, ele é simplesmente transferido ao outro por diferentes critérios de seleção que o da compra e venda do mercado imobiliário. A água é tratada como elemento construtivo-educativo, descrevendo um ciclo: a água da chuva armazenada na cobertura, reutilizada na habitação e para culturas experimentais; a água servida captada e transferida pela passarela esgoto-duto por gravidade à micro estação de tratamento, incrustada no morro do Ilhéu e voltada para o terreiro como uma seção didática de seu funcionamento. Desta, ela é devolvida ao canais, tanques, piscinas e finalmente rio-mar, recriando o uso e completando o circuito. Este projeto considera as particularidades, espacialidades e estéticas da favela e as circunstâncias que a produziram. Na favela “os materiais são encontrados em fragmentos heterogêneos; a construção, feita com pedaços encontrados aqui e ali, é forçosamente fragmentada no aspecto formal. A casa continua evoluindo. Os barracos são fragmentários porque se transformam continuamente” (Estética da ginga, Paola Berenstein Jaqcues). [...] Pretende-se, devido a presente conjuntura político-econômica a que se encontram submetidos os homens-caranguejo, criar meios potenciais de alteração da própria situação que os escraviza, através da subversão das relações de trabalho dominantes. Nesse sentido, são propostas outras duas cadeias produtivas relacionadas a um saber e fazer local: – oficina-escola de carpintaria naval: consiste em um micro estaleiro cooperativado, de modo a reinserir a prática tradicional da construção e manutenção de barcos de pesca, canoas de uso geral e outras formas possíveis de embarcações, associado a formação de novos mestres no oficio. – cooperativa dos pescadores: prática que vem perdendo espaço, pelo baixo preço do produto da pesca em natura, deve ser associada a um beneficiamento agregando valor para posterior comercialização do fruto do mar-rio-mangue. Também deve estar relacionada, em conjunto com o centro de estudos do mangue, a uma parte de pesquisa e produção (aqüicultura e maricultura). 141 Assumido como mais uma cadeia produtiva, de geração de emprego e renda é proposta a usina do lixo, um centro de triagem, primeiro beneficiamento e transbordo de materiais recicláveis para reinserção na cadeia de reprodução e consumo urbanas. A usina situa-se em área estratégica, servindo-se de diversos meios de transporte (canal, ferrovia e a via Anchieta) para a chegada e saída de insumos. Os coletores de lixo, que usam a tradicional carroça, podem também fazê-lo por canoa, voadeira ou flutuante.53 FIGURA 28 – Casa de Caranguejo Caminho Butantã: Centro de estudos do mangue Fonte: Arquivo de Pablo Iglesias FIGURA 29 – Casa de Caranguejo Caminho Butantã: Elevação grelha estrutural em pré-fabricados de concreto preenchida por containers expropriados Fonte: Arquivo de Pablo Iglesias O autor incorpora em sua proposta algumas soluções da própria comunidade, resgatando heranças culturais e utilizando uma arquitetura vernacular com edificações sobre palafitas e longas passarelas sobre o mangue. A água é um elemento primordial neste trabalho, tratada como elemento construtivo e educativo, enquanto a água da chuva armazenada na cobertura é reutilizada na habitação. Há também a preocupação com o lixo que é tratado na usina do lixo, um dos geradores de renda do programa. Assim, Pablo Iglesias reúne as questões ambiental, cultural, econômica e social neste projeto. 4.2.6.2 Núcleo de Difusão Cultural - Ricardo Alexandre Packer, Universidade Regional de Blumenau O abrangente programa cultural foi desmembrado em uma série de pequenos e grandes blocos edificados, nesta proposta de revitalização de área urbana situada às margens do rio Itajaí-Açu, em Blumenau, SC. O autor uniu diversas atividades e usos neste Núcleo, como 53 Texto enviado por e-mail por Pablo Iglesias. 142 transporte (acessos, circulação), cultura, lazer e atividades em geral como comércio e prestadores de serviços. Alguns exemplos são: cinema; academia de ginástica; áreas que abrigam biblioteca, salas de curso e ateliês; salas comerciais; auditório e áreas expositivas. Este trabalho apresenta uma proposta de revitalização da área encontrada no entorno da Indústria Gaitas Hering. Localizada no bairro Itoupava seca, que é conhecido como um dos principais acessos à Blumenau. A área em questão foi de extrema importância para o desenvolvimento econômico e cultural de Blumenau na década de XX. Foram observadas as necessidades relacionadas ao transporte (acessos, circulação) cultura, lazer e atividades em geral como comércio e prestadores de serviços. Gerando assim um conceito denominado “liberdade construída” com o qual o projeto tomou forma, explorando o potencial dos diferentes campos visuais, criando uma paisagem articulada pelos eixos de acesso gerando uma nova fluidez espacial. A massa construída representa o complexo de lazer configurado pela organização estrutural. A Diversidade de atividades definidas a partir das características vocacionais do lugar tem como função caracterizar a ligação “cidade – rio” colocando o rio no cotidiano do cidadão. Tendo assim com a proximidade da universidade o suporte humano, presença "humana” necessária ao conjunto a borda do rio, tornando-o sustentável.54 FIGURA 30 - Núcleo De Difusão Cultural: Perspectiva geral Fonte: Arquivo de Ricardo Alexandre Packer Este trabalho enfatizou a questão cultural e a preocupação em reunir diversos usos, observando primeiramente as necessidades locais. Um dos pontos enfatizados, que chama bastante atenção, foi a intenção do autor de tornar o empreendimento “vivo”. Esta intenção pode ser remetida à corrente organicista, ou organicismo, de Patrick Geddes, que priorizava uma concepção orgânica da cidade, ou seja, a cidade deveria ser considerada um organismo vivo. O autor afirma no questionário que seu trabalho estava muito voltado para o conceito de sustentabilidade: Muitos textos sobre o tema sustentabilidade focam em sua síntese a ecologia e o meio ambiente, como o consumo energético na produção dos materiais necessários para a 54 Texto enviado por e-mail por Ricardo Alexandre Packer. 143 construção civil. O arquiteto não pode se ater somente a esses itens de extrema importância como também deve responder as prioridades dos seres humanos criando lhes espaços que proporcionem condições para que o local a ser ocupado por pessoas, tenha vida e conseqüentemente essa vida produza mais vida, tornando o espaço a ser usado não só ecologicamente correto mas também nutrido de calor humano, essa condição que o espaço proporciona é que vai torná-lo sustentável. [...] Como já caracterizei sustentabilidade em sua essência como “a capacidade que um espaço tem de gerar vida” meu trabalho teve como premissa esse conceito de tornar o local em questão “SUSTENTAVEL” gerando vida, e explorando a diversidade de atividades inserindo essas atividades no cotidiano do cidadão usuário.55 4.2.7 Opera Prima 2006 Ganhadores: André de Giacomo – Complexo Hospitalar Montável para Situações Emergenciais e Preventivas – UNOPAR Danielle Barros de Moura Bendicto – Reconstruir a Casa e Alegrar a vida: Reconstrução do "Cortiço 27" e da Cidadania em Niterói – UFF Igor Macedo de Araújo – Cenares - Centro de Artes Espontâneas – UFMG Lorena Faria Lima – Cirque de Voyage: Arquitetura para um Circo Itinerante – UFPE Marta Floriani Volkmer – Requalificação da Pedreira do Morro Santana – UNIRITTER Menções honrosas: Camila Fernandes Malito – Centro de Treinamento Olímpico Adaptado a Deficientes – Universidade Presbiteriana Mackenzie Cervantes Gonçalves Ayres Filho – Sistema Construtivo M80H – UFPR Clariane Menegusso Nogueira – Núcleo de Educação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável – UFMS Cristiano Felipe Borba do Nascimento – Por uma Indústria Arquitetônica: O Caso Vinibrasil – UFPE Eduardo Oliveira França – Memorial Franz Weissman – UFMG Estela Cristina Somensi – Habitação Social em Madeira Industrializada – UFSC Gabriel Arruda Bicudo – Habitação Coletiva: Um Ensaio Projetual – Universidade Presbiteriana Mackenzie Gabriel Castilho Paranhos – Santuário Mãe de Deus – UNIRITTER Igor Freire de Vetyemy – Cidade do Sexo - Centro de estudos, pesquisa, comércio, memória e medicina ligados ao sexo – UFRJ Mônica Rizzi – Centro de Gastronomia Italiana – UNISINOS 55 Respostas tiradas do questionário enviado por Ricardo Alexandre Packer. 144 Priscilla Gazzana Reis – Centro da Cultura Alemã - Revitalização da Antiga Sede do Colégio São José – UNISINOS Rendell Torres Laureano – Memorial de Fortaleza – UNIFOR Neste último concurso ao invés de selecionar os premiados de menção honrosa que aparentemente mais poderiam ter abordado a sustentabilidade, optou-se por enviar o questionário para todos os 20 ganhadores de menção, além dos 5 premiados e 3 da categoria Projetando com PVC, totalizando 28. Foram respondidos 14 questionários. Ao perguntar aos respondentes sobre sua opinião na discussão e abordagem da sustentabilidade na formação do arquiteto, onze pessoas disseram que é pouca e superficial, duas que é suficiente, e outra disse que vem aumentando gradativamente, e na sua opinião, no futuro todo projeto deve levar em conta a abordagem sustentável. Algumas citações sobre sustentabilidade seguem abaixo. Entendo por sustentabilidade na arquitetura, a maneira como são tratadas as questões ambientais como renovação de energia, reciclagem de resíduos, a disposição do edifício em relação aos ventos e incidência solar tirando proveito dessas energias. O uso de materiais renováveis e que não geram entulho. O planejamento do canteiro visando o reaproveitamento de resíduos. Prever áreas verdes e de contenção de água de chuvas nos edifícios e ruas, contribuindo com a renovação do ar das cidades e a diminuição de enchentes. São interferências que usadas em conjunto, melhoram as condições de vida do homem na cidade e fora dela.[...] Imagino que essa discussão deve acontecer desde o ensino básico. Formando uma sociedade com mentalidade de preservar o meio em que vive. Já na arquitetura e urbanismo deve se iniciar desde os primeiros projetos desenvolvidos na universidade. A sustentabilidade é um conceito fundamental que deve ser levado em conta em todo projeto, seja ele arquitetônico ou urbano. Tem tanta ou mais importância que as questões que envolvem linhas e escolas arquitetônicas. Pois, na minha opinião, antes um edifício que não agrade muito aos olhos, mas que seja sustentavelmente eficiente, do que um lindo edifício que não funcione sustentavelmente. Gabriel Bicudo, Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2006. Achei muito difícil de responder o seu questionário, porque sinceramente sobre arquitetura sustentável, estou por fora... No meu curso de graduação praticamente não houve ênfase nenhuma nesse assunto [...] Então não sei o que posso ajudar já que no meu projeto final não houve preocupação minha com isso , talvez inconscientemente até tenha pensado em alguns aspectos por esse lado...mas não sei não! Gabriel Paranhos, UNIRITTER, 2006. A abordagem é suficiente, mas a aplicação dos conceitos é superficial. Há disciplinas que tratam da sustentabilidade, mas elas acabam sendo acessórias, já que os conceitos não são cobrados nas disciplinas práticas onde, afinal, eles deveriam ser transformados em projetos mais conscientes.[...] Na minha opinião, há um grande equívoco na aplicação do termo “sustentável” por parte da população. Isso resulta, como em muitas outras áreas da ciência, da perda considerável de significado pela qual o conceito passa, quando da sua apropriação pelo senso comum. “Sustentabilidade” é um conceito que se refere a um pensamento holístico a respeito de um sistema. Um sistema sustentável realiza transformações sem prejuízo à regulação dos demais sistemas aos quais está interligado. Quando aplicado no âmbito de um produto ou processo isolado, ao invés de um sistema e suas interligações, o termo “sustentável” acaba se tornando mais um rótulo do que um conceito. Esse é o mal-entendido geralmente observado na aplicação do termo “arquitetura sustentável” por arquitetos e leigos. Por ser uma emanação cultural indissociável do seu ambiente físico e social, a arquitetura só será sustentável quando 145 surgir o “modo de produção e consumo sustentável”. Ou seja, a “humanidade sustentável” criará o “habitat sustentável”. Por outro lado, mesmo dentro das limitações da sua atuação social, há várias ações que o projetista pode adotar no sentido de contribuir para a redução da depredação ambiental e aumento da qualidade das habitações e cidades. Essas ações são amplamente abordadas pela literatura arquitetônica e é consenso que a reflexão sobre as implicações técnicas e sócio-ambientais das escolhas projetuais é o fator que geralmente diferencia um bom projeto de um aceitável, e conseqüentemente gera edifícios melhores. Isso não se faz, obviamente, apenas adotando alguns conceitos pré- estabelecidos de conforto ambiental, ou adotando-se um sistema construtivo anunciado como “sustentável”. Escolhas conscientes durante o projeto supõem um estudo mais elaborado do que o simples desenho das formas, mas não considero que isso seja fazer “arquitetura sustentável”. Está mais para arquitetura “ambiental e socialmente responsável”, o que no fundo, já está contido na própria definição de arquitetura. Cervantes Ayres, UFPR, 2006. São necessárias mudanças na base do curso. A abordagem é fraca porque os professores não tiveram essa formação e não dominam o assunto para difundi-lo de melhor maneira. Porém vejo que isso logo vai mudar, pois apesar da sustentabilidade ser uma área meio obscura e indefinida até nos núcleos de pós-graduação, muitos estão se interessando e há atualmente muitos arquitetos pesquisando essa área em seus mestrados e doutorados. Acredito que a partir dessa nova geração, aos poucos a noção de sustentabilidade vai ser inserida nas FAUs por meio de novas matérias na grade curricular e professores mais bem preparados, e conseqüentemente a coisa vai se disseminar mais naturalmente. Já a prática é uma outra história... Clariane Nogueira, UFMS, 2006. A arquitetura é uma das áreas onde melhor se pode aplicar esse conceito tão em voga de sustentabilidade. Justamente por ser uma das maiores interferências que o ser humano faz no meio ambiente [...]. Igor de Vetyemy, UFRJ, 2006. Acredito que a abordagem nas Universidades é suficiente, porém a aplicação prática ainda é limitada, muitas vezes pelo custo, outras pela tecnologia ainda distante. Mônica Rizzi, UNISINOS, 2006. No caso da minha Universidade, que não tem nenhuma disciplina específica e incentiva o uso deste tipo de recurso em apenas uma das disciplinas de projeto (habitação popular), acredito que a inclusão de uma disciplina no início do curso levaria os próprios alunos a se conscientizarem e buscarem por eles mesmos informações sobre o assunto. Priscilla Gazzana Reis, UNISINOS, 2006. [a sustentabilidade é] essencial, porém deve ser vista como algo inerente ao arquiteto desde a antiguidade, não como uma questão atual/contemporânea. A contemporaneidade está somente na terminologia utilizada (sustentabilidade), antes tida como os princípios de uma boa arquitetura. Camila Fernandes Malito, Universidade Presbiteriana Mackenzie, 2006. O conceito de sustentabilidade é muito vago para mim, sei que faço de alguma forma mais não sei como definir uma vez que a sustentabilidade pode estar associada a técnicas, materiais e até mesmo atitudes. Estabelecer aqui um conceito específico seria bem difícil. Aliás, estão ainda hoje tentando definir esse conceito, que tem sido abarcado até mesmo pela economia. No entanto, o que posso dizer é que a sustentabilidade deve garantir a qualidade de vida, a garantia dos bons espaços de vida do cotidiano. A arquitetura pode minimizar bastante os efeitos perversos da modernidade, basta ter como diretriz a garantia da qualidade de vida dos cidadãos de hoje, mas também das gerações futuras. Reconhecendo que a arquitetura e o urbanismo são produtores de adversidades, e situações de escassez e diferença, neste sentido deve ser produzida e pensada de forma consciente. Danielle Barros Benedicto, UFF, 2006. 146 Dos 14 trabalhos analisados, uma pessoa respondeu que não abordou a sustentabilidade, pois o trabalho não estava voltado para o assunto; cinco pessoas disseram que algumas questões foram abordadas e seis disseram que o trabalho estava muito voltado para o tema em questão. Além dessas respostas, uma pessoa respondeu que acredita que todo bom projeto aborda, mesmo de que forma não declarada, a sustentabilidade. Assim, ao iniciar um projeto, estão naturalmente embutidas as premissas básicas da arquitetura sustentável. Uma outra pessoa disse que embora todo o ciclo da edificação proposta tenha sido estudado, o número de pressupostos adotados não permitiria chamar o resultado obtido de “arquitetura sustentável”. Desses, dois trabalhos destacaram-se: o de Clariane Nogueira e o de Estela Somensi. 4.2.7.1 Núcleo de Educação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável - Clariane Menegusso Nogueira, UFMS O trabalho situa-se em Campo Grande, MS, numa região conhecida pela sua importância ambiental. O terreno selecionado encontra-se em uma área da periferia classificada como parque ecológico, com importantes formações vegetais e com alto grau de degradação. A edificação abriga o Núcleo de Educação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável em total harmonia com o entorno imediato e o meio ambiente. Procurando desenvolver uma arquitetura que auxilie o desenvolvimento sustentável do mundo e dissemine o conceito de sustentabilidade em seus três pilares (economia, meio ambiente e sociedade), este trabalho propõe um núcleo de educação ambiental e desenvolvimento sustentável capaz de difundir idéias tais como: ética e princípios, proteção da terra e da natureza, cultura e educação, saúde e tecnologia, abrigado por um ambiente construído resultante de uma arquitetura de princípios também coerentes com a função do núcleo. Para isso, o desenvolvimento desta proposta encontra-se na cidade de Campo Grande, no estado de Mato Grosso do Sul, região conhecida pela sua importância ambiental. Na escolha do terreno para o projeto, foi escolhida uma área da periferia classificada como parque ecológico, de mata ciliar, alagável, com importantes formações vegetais e com alto grau de degradação. Vendo na educação a principal estratégia para alcançar a conscientização ambiental e social da sociedade local, o tema permite que o projeto de arquitetura vá além da função primordial de “abrigo”, mas que atue ativamente como exemplar educativo disseminador de uma arquitetura relevante, porém, preocupada com meio ambiente, economia e sociedade, tentando mostrar novas alternativas arquitetônicas que encontram-se ao alcance de todos. A proposta apóia-se em novas tecnologias e práticas que visam uma construção civil menos impactante ao meio ambiente, alternativas para uma arquitetura mais econômica e que ainda promova o bem estar e melhorias na vida do usuário e no meio que ele vive. Os indivíduos que entrarem em contato com o conteúdo deste núcleo e conseqüentemente se beneficiarem, tornam-se indivíduos mais conscientes a cada dia e por conseqüência, tornam-se eles mesmos pequenos núcleos difusores capazes de disseminar novas idéias e práticas sustentáveis aos que estão a sua volta, por conseqüência disso, aos poucos vai se adquirindo uma sociedade mais consciente e preparada, fator básico para o desenvolvimento sustentável que tem como objetivo principal um ambiente mais verde, mais humano e com menos desigualdades.56 56 Texto enviado por e-mail por Clariane Menegusso Nogueira. 147 FIGURA 31 - Núcleo de Educação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável Fonte: Arquivo de Clariane Menegusso Nogueira A autora afirma que o trabalho foi absolutamente concebido a partir do conceito de sustentabilidade. A intenção foi unir a arquitetura à educação ambiental, projetando um núcleo disseminador de desenvolvimento sustentável na comunidade e conseqüentemente na cidade. Cada uma das escolhas e idéias de projeto se baseou nos princípios da sustentabilidade, desde a escolha da localização, a implantação da edificação dentro do parque, a utilização conhecimentos de conforto ambiental e eficiência energética, até a escolha dos materiais alternativos em harmonia com o meio ambiente. O grande destaque deste trabalho é a grande preocupação da autora em criar um espaço para atividades de elevada importância para a sociedade, um Núcleo de Educação Ambiental e Desenvolvimento Sustentável. 4.2.7.2 Habitação Social em Madeira Industrializada - Estela Cristina Somensi, UFSC A autora projetou um protótipo pré-fabricado modular de madeira com o objetivo de associar a flexibilidade com o baixo custo. A escolha do material foi pensada como uma alternativa ecologicamente correta. Neste trabalho foi idealizado um protótipo pré-fabricado modular de madeira plantada com chapas de OSB, que visa integrar a grande flexibilidade encontrada nas casas pré- fabricadas personalizadas de alto padrão, com o baixo custo das habitações estandardizadas de baixo padrão. Para tanto, foram criados elementos pré-fabricados, que unidos geram ambientes de uma habitação. Articulando-os de forma horizontal e vertical, é possível criar uma inesgotável gama de habitações de diferentes tamanhos, articulações e formas espaciais, associados a um alto grau de industrialização. O protótipo visa utilizar a madeira como uma alternativa ecologicamente correta para contribuir com os esforços de abrandar o problema da carência de moradias no Brasil, resolvendo questões de flexibilidade e baixo custo de forma esteticamente diferenciada dos modelos tradicionais. Propõe-se com isso amenizar os problemas da padronização excessiva encontrados nos projetos habituais, evitar as modificações da habitação de 148 forma desordenada e combater a questão de famílias vivendo de forma insalubre em habitações inacabadas.57 FIGURA 32 - Habitação Social em Madeira Industrializada Fonte: Arquivo de Estela Cristina Somensi O destaque deste trabalho encontra-se na preocupação com a questão social e econômica, através da busca por um sistema flexível e versátil utilizando material regional e ecologicamente correto, resultando em um sistema construtivo eficiente e economicamente viável. Assim, pode-se dizer que a autora integrou as quatro questões da sustentabilidade: ambiental, social, econômica e cultural. 4.2.8 Análise e interpretação dos dados / apresentação dos resultados As questões da primeira pesquisa foram analisadas e melhoradas, algumas foram transformadas em múltipla escolha para facilitar a resposta do arquiteto e a própria interpretação dos dados posteriormente. A primeira pergunta permaneceu discursiva, sendo perguntado aos arquitetos premiados, sobre o que significa para eles a sustentabilidade aplicada à arquitetura e ao urbanismo. Não foram oferecidas opções de resposta, para que não influenciasse o respondente. De qualquer maneira, o conceito não possui um significado bem definido e concreto, portanto a questão foi feita para, além de verificar a validação das respostas seguintes, confirmar se as respostas teriam fundamento. As respostas foram bem variadas, mas a maioria respondeu sobre a preocupação com o meio ambiente, e/ou uso adequado dos recursos naturais, e/ou que leva em consideração não só as necessidades presentes como também as de gerações futuras, e/ou arquitetura responsável, saudável, maior qualidade de vida, e/ou que se preocupa 57 Texto enviado por e-mail por Estela Cristina Somensi. 149 com as dimensões técnica, econômica, ambiental, política, e social. Das 50 pessoas entrevistadas, apenas uma pessoa respondeu que não sabia seu significado. A pesquisa foi dividida por concurso, apesar de ter sido muito pouca a variabilidade das respostas quanto ao ano de formação (GRAF. 8). CLASSIFICAÇÃO DOS ENTREVISTADOS 14% 10% 14% 16% 28% 18% concurso 2001 concurso 2002 concurso 2003 concurso 2004 concurso 2005 concurso 2006 GRÁFICO 8 – Classificação dos 50 entrevistados quanto ao ano do concurso. Fonte: Elaborado pela autora. Na pergunta seguinte foi questionado sobre se o conceito foi tratado na graduação do arquiteto. Mais da metade dos respondentes (54%) considera pouca e superficial a abordagem do tema, ninguém respondeu que foi tratada em quase todas ou todas as disciplinas, e 8% disseram que a sustentabilidade não foi discutida na graduação (GRAF. 9). O ASSUNTO FOI TRATADO NA GRADUAÇÃO? 2% 8% 22% 4% 10% 54% NÃO POUCO/ SUPERFICIALMENTE SIM, NAS PALESTRAS E SEMINÁRIOS SIM, EM UMA OU DUAS DISCIPLINAS SIM, PALESTRAS E UMA OU DUAS DISCIPLINAS SIM, EM QUASE TODAS/ TODAS AS DISCIPLINAS OUTRAS RESPOSTAS GRÁFICO 9 – Abordagem do assunto na graduação, por % de respondentes em cada item. Fonte: Elaborado pela autora. De 2001 a 2006 não houve uma grande diferenciação das respostas. Apenas pode-se dizer que nos anos de 2004 e 2005 o tema parece ter sido um pouco mais tratado que nos demais anos, pois ninguém respondeu “não”, e pode-se dizer que pouco mais da metade disse que foi abordada em uma ou duas disciplinas e/ou nas palestras e seminários, sendo que pouco menos da metade respondeu que foi pouca ou superficial a abordagem da sustentabilidade na graduação (GRAF. 10). 150 1 1 1 1 4 7 1 3 3 9 11 1 3 4 3 1 1 1 1 1 1 0 5 10 15 20 25 30 A B C D E F G OASSUNTOFOI TRATADONAGRADUAÇÃO? 2006 2005 2004 2003 2002 2001 GRÁFICO 10 – Abordagem do assunto na graduação, por concurso. A – Não B – Pouco/ Superficialmente C – Sim, nas palestras e seminários D – Sim, em uma ou duas disciplinas E – Sim, nas palestras e seminários e em uma ou duas disciplinas F – Sim, em quase todas/ todas as disciplinas G – Outra resposta Fonte: Elaborado pela autora. Posteriormente perguntava-se se, caso o arquiteto tenha feito algum curso de aperfeiçoamento, atualização, especialização ou mestrado, o mesmo abordou a sustentabilidade. O que se percebeu foi que apenas os cursos que se relacionam com este tema tiveram uma abordagem mais clara como, por exemplo, o mestrado no PROPAR, na UFRGS, em Eficiência Bioclimática da Arquitetura Vernacular Gaúcha; EESC na USP em Tecnologia da Arquitetura; UFSC em Projeto e Tecnologia do Ambiente Construído; Yokohama National University, curso de Eficiência Energética em Edifícios de Escritórios; École Polytechnique Fédérale de Lausanne na Suíça em Construções e Estruturas de Madeira; Institute for Housing and Urban Development Studies (IHS-Rotterdam, The Netherlands)& Lincoln Institute of Land Policy (LILP) em Urbanismo, habitação e mercado de terra. Alguns arquitetos responderam que foi tratado superficialmente, como por exemplo; mestrado do PROURB na UFRJ em Planejamento Urbano e Regional; Poli-USP em Engenharia; PROPAR/ UFRGS em Teoria, História e Crítica da Arquitetura; Universidad Politécnica de Catalunya em Barcelona em Estructuras Arquitectónicas; Escola de Design Unisinos | Politecnico Di Milano em Master em Design Estratégico; e University of Manitoba, curso em Urban Design. Outros disseram que foi abordado em palestras e seminários, como mestrado em Desenvolvimento Urbano/ Estudos do Ambiente Construído da UFPE; POLI-USP no Departamento de Engenharia de Construção Civil mestrado em Sistemas de Suporte ao Projeto; 151 POLI-USP Elétrica em Energia e Automação. Muitos arquitetos consideraram que não foi abordado como, por exemplo, o mestrado do PROARQ da UFRJ em Ensino de projeto; o mestrado em Arquitetura e Urbanismo Universidade Presbiteriana Mackenzie,; o curso de Marketing da FAU-Bennet; o MBA em Gestão Empresarial da ESPM/ RS; a pós-graduação em História da Arquitetura da University of Oxford; e a pós-graduação em Design Gráfico da Accademia Cappielo / Firenze. Em seguida foi perguntado sobre se o trabalho final de graduação do arquiteto abordou a sustentabilidade. Como dos seis anos trabalhados incluem-se os cinco ganhadores de cada ano, e alguns premiados com menções honrosas, que foram selecionados por apresentarem um trabalho que possivelmente estava vinculado ao assunto em questão, a maioria das pessoas que respondeu positivamente (letra C) estava incluída nesse caso. As respostas dadas como letra D foram todas relacionadas à idéia de que um projeto bem pensado e bem feito sempre deve abordar as premissas de uma arquitetura sustentável, mesmo que de forma não declarada (GRAF. 11). 2 1 1 1 1 3 4 1 4 2 5 2 5 3 2 3 6 2 2 0 5 10 15 20 25 A B C D SEU TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO ABORDOU A SUSTENTABILIDADE? 2006 2005 2004 2003 2002 2001 GRÁFICO 11 – Abordagem do assunto no trabalho final, por concurso. A – Não, não estava relacionado com o assunto B – Sim, em algumas questões C – Sim, estava muito voltado para o assunto D – Outras respostas Fonte: Elaborado pela autora. A fim de desconsiderar os trabalhos que foram pré-selecionados dentre os 20 de cada ano que receberam menção honrosa e os da categoria projetando com PVC, foram analisados somente os ganhadores do Opera Prima, totalizando 25 questionários respondidos. Mais da metade dos trabalhos abordou a sustentabilidade em algumas questões, e 20% disseram que estava muito voltado para o assunto. É surpreendente vermos que também 20% responderam que 152 não abordaram a sustentabilidade. Apenas 8% declararam que uma boa arquitetura já inclui características sustentáveis, apesar de não ser explicitado o termo (GRAF. 12). SEU TRABALHO FINAL DE GRADUAÇÃO ABORDOU A SUSTENTABILIDADE? 20% 8% 20% 52% NÃO, não estava relacionado com o assunto SIM, em algumas questões SIM, estava muito voltado para o assunto Outras respostas GRÁFICO 12 – Abordagem do assunto no trabalho final, por % de respondentes em cada item. (Total de 25 respondentes) Fonte: Elaborado pela autora. A questão seguinte era sobre como o respondente considera a discussão e abordagem da sustentabilidade na formação atual do arquiteto e urbanista. A grande maioria confirmou que é pouca e superficial, e somando com os que consideram muito pouca são 90%. Apenas 6% consideram ser suficiente a abordagem da sustentabilidade na formação do arquiteto-urbanista, sendo todos dos anos de 2005 e 2006. Nesses mesmos anos, uma pessoa disse que vem aumentando gradativamente e acha que no futuro todo projeto levará em conta a abordagem sustentável; outro respondeu que é tratada até em um nível razoável, mas sem a devida relevância. Até 2004 inclusive, todos os arquitetos responderam é pouca ou muito pouca essa discussão (GRAFs. 13 e 14). DISCUSSÃO E ABORDAGEM DA SUSTENTABILIDADE NA FORMAÇÃO ATUAL DO ARQUITETO E URBANISTA 14% 6% 4% 76% Muito pouco abordada/ ou não existe Pouco/ Superficial Suficiente Muito abordada, recebe impostância além do necessário Outra resposta GRÁFICO 13 – Opinião sobre abordagem da sustentabilidade na formação atual do arquiteto, por % de respondentes em cada item. Fonte: Elaborado pela autora. 153 1 3 2 1 7 8 2 5 5 11 1 2 1 1 0 10 20 30 40 A B C D E ABORDAGEM DO ASSUNTO NA FORMAÇÃO DO ARQUITETO 2006 2005 2004 2003 2002 2001 GRÁFICO 14 – Abordagem do assunto na graduação, por concurso. A - Muito pouco abordada/ ou não existe B - Pouco/ Superficial C - Suficiente D - Muito abordada, inclusive recebe importância além do necessário E - Outra resposta Fonte: Elaborado pela autora. Na última questão, foi perguntado se caso a resposta anterior não fosse letra C, ou seja, que considera suficiente a abordagem na formação atual do arquiteto, qual a opinião do arquiteto sobre como melhorar esta abordagem na graduação. A questão era discursiva e a maioria (42%) respondeu que o tema deve ser inserido na grade curricular desde o primeiro período em todas as disciplinas. Em seguida, 22% responderam que os professores precisam de atualização quanto ao tema, para que conhecendo bem sobre o mesmo, possam ensinar e conscientizar os alunos de sua importância. Do total, 12% dos respondentes acham necessário pelo menos uma disciplina sobre sustentabilidade aplicada na arquitetura e urbanismo, e apenas 2% responderam através de palestras, seminários e debates. COMO MELHORAR A DISCUSSÃO DA SUSTENTABILIDADE NA FACULDADE DE ARQUITETURA E URBANISMO? 42% 8% 6% 8% 22% 2% 12% A B C D E F G GRÁFICO 15 – Como melhorar a discussão sobre sustentabilidade na graduação de arquitetura/urbanismo, por % de respondentes em cada item. A - Não respondeu B - Uma disciplina sobre sustentabilidade aplicada à arquitetura e urbanismo C - Atualização dos professores para conhecerem bem o assunto e conscientizar os alunos de sua importância D - Interdisciplinaridade no curso c/ maior integração entre os departamentos e multidisciplinaridade com outros cursos 154 E - Através de palestras, seminários e debates F - Incorporando o conceito em todas as aulas de projeto G - Inserir na grade curricular desde o 1o período em todas as disciplinas Fonte: Elaborado pela autora. 4.3 Análise das duas pesquisas Foram somadas as respostas das duas pesquisas feitas, a primeira de abordagem quantitativa entre 115 estudantes e arquitetos, e a segunda qualitativa, entre 50 arquitetos premiados no Opera Prima, totalizando 165 respondentes. Quando perguntados sobre a opinião do respondente em relação à abordagem atual da sustentabilidade na formação do arquiteto-urbanista, 80% consideraram pouca ou nenhuma, e apenas 2% acham suficiente (GRAF. 16). DISCUSSÃO E ABORDAGEM DA SUSTENTABILIDADE NA FORMAÇÃO ATUAL DO ARQUITETO E URBANISTA 39% 16% 2% 4% 41% Não Pouco Sim, Suficiente Em uma / duas disciplinas Outra resposta GRÁFICO 16 – Opinião sobre abordagem da sustentabilidade na formação atual do arquiteto, por % de respondentes em cada item. (Total de 165 questionários) Fonte: Elaborado pela autora. 4.4 Considerações finais da pesquisa Através dessa pesquisa foi confirmada a hipótese de que o conceito de sustentabilidade não vem sido ensinado e tratado de forma suficiente nos cursos de arquitetura. É espantoso confirmarmos que ainda existem arquitetos que não sabem o significado do conceito de sustentabilidade e também surpreendente que 20% dos autores dos trabalhos premiados no Opera Prima tenham dito que não abordaram a sustentabilidade. A grande maioria das pessoas disse que acha necessário alguma mudança no sistema de ensino de arquitetura, por considerar essencial a abordagem deste tema. Assim, vários respondentes consideram de grande importância que o tema seja inserido na grade curricular, em todas as disciplinas, e não como uma disciplina isolada, que muitas vezes termina mesmo como uma optativa. Muitos também disseram que é necessária uma atualização dos atuais professores para que possam ensinar e conscientizar os alunos sobre o assunto. Pouquíssimas pessoas responderam que atualmente é suficiente o que é ensinado e praticado nas faculdades em se tratando da sustentabilidade na arquitetura e urbanismo. Vale relembrar que houve pouca 155 variabilidade das respostas em função da universidade cursada, sexo, idade e atuação profissional. Também foi observado que não ocorreu distinção entre regiões do país e nem mesmo com os respondentes de outros países. A maior variação encontrada refere-se à pesquisa dos premiados do Opera Prima, na questão sobre se a sustentabilidade foi tratada na graduação, nos anos de 2004 e 2005. O tema parece ter sido um pouco mais tratado que nos demais anos, pois ninguém respondeu “não”. Pouco mais da metade disse que foi abordada em uma ou duas disciplinas e/ou nas palestras e seminários, e pouco menos da metade respondeu que foi pouca ou superficial a abordagem da sustentabilidade na graduação. Essa pesquisa também confirmou os dados levantados no capítulo anterior, onde uma análise foi feita sobre alguns cursos de graduação em arquitetura e urbanismo. No capítulo três, algumas universidades brasileiras foram rapidamente estudadas com o objetivo de mapear sobre a existência de disciplinas, específicas ou não, que tratassem sobre a sustentabilidade na arquitetura e urbanismo. As disciplinas obrigatórias e optativas oferecidas por algumas universidades brasileiras que abordam o assunto, como “Urbanismo e Meio Ambiente- UMA” e “Arquitetura e sustentabilidade” na UFRJ, e “Arquitetura e Sustentabilidade Ambiental” na FUMEC, sozinhas não são suficientes no curso de arquitetura. Este fato foi comprovado pelas próprias opiniões dos estudantes. É necessário tratar as questões ambientais, culturais, sociais e econômicas, aqui tomadas como questões sustentáveis, de forma mais intensa e efetiva na graduação. Para conseguirmos avançar nesse objetivo, é também essencial que os departamentos tenham maior integração entre si. O que se aprende em disciplinas técnicas e teóricas, deve ser aplicado nas disciplinas práticas, e é fundamental que haja um freqüente diálogo entre departamentos e disciplinas. Também foi possível verificar e confirmar algumas hipóteses sobre os cursos de pósgraduação. Apesar de ser significativa a quantidade de cursos nessa área, a sustentabilidade tem sido realmente abordada apenas em especializações ou mestrados específicos. É muito pouca a abordagem deste tema em cursos de mestrado em arquitetura e urbanismo de caráter mais geral. Essa constatação foi sugerida anteriormente no capítulo três e confirmada com a recente pesquisa. Além disso, esta dissertação também pode ser incluída num exemplo de curso de Mestrado em Arquitetura e Urbanismo da UFMG que, além de não incluir na época linhas de pesquisa na área, não possuía disciplinas obrigatórias ou optativas que mencionassem explicitamente o tema. 156 Como solução para o atual problema, os entrevistados em sua maioria sugeriram o que já era colocado como a melhor hipótese, isto é, que a questão precisa urgentemente ser inserida em todas as disciplinas, sejam elas teóricas, técnicas ou práticas, em níveis maiores ou menores, sendo essencial que haja integração entre elas. Além disso, muitos dos entrevistados, além de acharem necessária esta inclusão geral, comentam sobre a possibilidade de também se criar uma disciplina obrigatória específica que possa tratar mais aberta e detalhadamente do assunto. Podemos também ressaltar a necessidade preliminar de disciplinas sobre educação ambiental e educação para a sustentabilidade, que possam conscientizar ambientalmente todos aqueles que não tiveram esse tipo de educação e consciência anteriormente. É também importante a presença constante de palestras e seminários que abordem a sustentabilidade na arquitetura e urbanismo. Um ponto de grande importância na pesquisa, diz respeito ao fato de que, quando perguntados sobre como melhorar a abordagem da sustentabilidade na graduação, os entrevistados responderam também que, para que sejam de fato aplicadas todas as soluções, não há como evitar uma ênfase no maior conhecimento dos professores sobre o assunto. É preciso uma atualização dos mesmos para que possam trazer para suas aulas e debates a questão da sustentabilidade na arquitetura e urbanismo. A boa arquitetura deve abranger todos os critérios e requisitos denominados sustentáveis, que nada mais são que aspectos ambientais, sociais, econômicos e culturais articulados em uma visão abrangente e holística. Na verdade qualquer arquitetura precisa levar em conta todos esses princípios. É preciso integrá-los ao processo, não só de construção, mas principalmente de concepção do projeto. Devemos agregar um novo valor a esse processo, que em hipótese alguma perderá qualidade arquitetônica e, ao contrário, só terá a ganhar. 157 As pessoas não se satisfazem mais apenas com declarações. Elas exigem ações firmes e resultados concretos. Esperam que, ao identificar um problema, as nações do mundo tenham vitalidade para agir. Primeiro-ministro sueco Olof Palme, cujo país sediou a Conferência de Estocolmo, 1972 5 CONCLUSÃO Hoje, e cada dia mais, temos a consciência clara de que o homem se relaciona com o meio em que vive de forma inadequada, consumindo recursos naturais em excesso, produzindo demasiados resíduos e poluição, aumentando cada vez mais a exclusão e segregação social. Seu habitat de moradia e trabalho, as edificações, são grandes fontes de consumo e também de desperdício de recursos tais como matéria-prima, água e energia. Os edifícios consomem aproximadamente metade da energia produzida no mundo. A problemática da realidade mundial contemporânea assume proporções assustadoras, e piora na medida em que se propagam os problemas ambientais e sociais na grande maioria das cidades. Todas essas questões tornam de fundamental importância identificar e construir estratégias e atitudes menos agressivas ao meio natural e ao próprio homem que o habita. Estratégias que sejam mais sustentáveis. Apesar dos conceitos e práticas de sustentabilidade e de desenvolvimento sustentável apresentarem grande complexidade e dificuldade de concreta definição, principalmente por tratarem de temáticas em desenvolvimento, seus objetivos não são invalidados. A arquitetura e o urbanismo já fazem parte deste paradigma, mas ainda não de modo suficientemente amplo e efetivo. Sustentabilidade na arquitetura e urbanismo deve, aqui, ser entendida como a interação entre as questões ambientais, sociais, culturais e econômicas. Neste sentido, esta dissertação teve como objetivo pesquisar como essa questão entra na atual formação do arquiteto e urbanista, para então verificar e comprovar a hipótese de que o conceito de sustentabilidade não vem sendo suficientemente discutido e ensinado nos cursos de graduação de arquitetura e urbanismo. Também objetivou estimular a solução para o atual problema, buscando respostas e recursos com os próprios estudantes e arquitetos entrevistados, que podem e devem ser colocados em prática. O arquiteto urbanista não é, e nunca será, o único responsável pela sustentabilidade de uma edificação e seu entorno. Além disso, é impossível projetar e construir edificações e espaços que sejam totalmente sustentáveis, devido aos inúmeros quesitos necessários. Porém, o arquiteto urbanista possui papel fundamental na concepção dos princípios de sustentabilidade a serem empregados no planejamento, na construção e mesmo na apropriação das edificações. Ele 158 deve pensar, planejar, projetar, e influenciar produtores e usuários do ambiente construído para um processo construtivo e de apropriação e uso sustentáveis. Deve ser educado desde o início de sua formação para buscar esse objetivo, ajudando a modificar toda cadeia produtiva, do projeto de arquitetura e construção civil ao planejamento urbano. Para que isso ocorra, é essencial que a educação e formação do arquiteto-urbanista seja sólida e transdisciplinar. A universidade, e assim suas diretrizes, disciplinas e professores, precisam oferecer o embasamento para este propósito. A formação do arquiteto-urbanista precisa ser atual e eficaz, em diversos sentidos. As questões referentes à melhoria e qualidade de vida do homem, em integração com a natureza, devem ser priorizadas. A preocupação com o meio ambiente, o clima, a adequação da construção com seu entorno, as tradições culturais, a conservação de energia, a disponibilidade de recursos e materiais e a redução de desperdícios devem ser essenciais na elaboração e no desenvolvimento do projeto de arquitetura, bem como no planejamento urbano, produzindo espaços saudáveis, intervindo no território e na cidade da forma mais sustentavelmente possível. Através de uma análise da presença da temática na formação dos arquitetos em algumas universidades brasileiras verificou-se, nos cursos de graduação, extensão e de pósgraduação, a existência de apresentações pontuais sobre a sustentabilidade. Na graduação, a maioria das disciplinas sobre o tema é optativa e, quando obrigatórias, dificilmente interagem com as outras disciplinas, e assim passam despercebidas e são rapidamente esquecidas pelos alunos no decorrer do curso. Em algumas universidades, foram encontrados apenas resumos feitos pelos organizadores das mesmas, provavelmente preocupados principalmente em seguir as novas Diretrizes Curriculares, mas sem realmente implicarem uma inserção efetiva da temática da sustentabilidade na prática do ensino. A pesquisa quantitativa, com estudantes e arquitetos, e a pesquisa qualitativa, entre os premiados do concurso Opera Prima, além de confirmarem a hipótese de que o conceito de sustentabilidade não vem sido ensinado e tratado de forma suficiente nos cursos de arquitetura de modo a contribuir efetivamente para a incorporação da problemática ambiental nos projetos, mostrou também que ainda existem arquitetos e estudantes de arquitetura que nem mesmo sabem o significado do conceito de sustentabilidade. Foi também surpreendente verificar que 20% dos autores dos trabalhos premiados no Opera Prima entre 2001 e 2006 disseram não terem considerado sustentabilidade de forma alguma em seus projetos, incluídos entre os melhores do país. Por outro lado, a grande maioria dos arquitetos, estudantes e autores dos trabalhos premiados, que foram entrevistados nessa pesquisa, considera fundamental uma maior discussão 159 da questão da sustentabilidade e sua inclusão mais efetiva no ensino da arquitetura e urbanismo, principalmente na graduação, confirmando assim ser necessária alguma mudança substantiva no sistema de ensino ora em vigência. É, todavia, interessante registrar que houve pouca variabilidade das respostas em função da universidade cursada, como também em função do sexo, da idade e da atuação profissional. Foi também observado que não houve diferenças entre as regiões do país e nem mesmo com os respondentes de outros países, evidenciando que o problema da falta de atenção ao tema é recorrente e generalizado na formação do arquiteto. É também quase unânime a opinião, independente dessas variáveis, de que várias mudanças são necessárias e de que é preciso tratar as questões ambientais, culturais, sociais e econômicas, aqui vistas como questões sustentáveis, de forma mais intensa e inter-relacionada na formação do arquiteto urbanista. São muitas as boas intenções, e os discursos contemporâneos de fato vêm agregando cada vez mais as preocupações com o ambiente e sua inserção na arquitetura. No entanto, falta ainda muito para que esses discursos sejam colocados em prática dentro das universidades, inserindo-os em todas as disciplinas acadêmicas. Para conseguirmos avançar neste objetivo, é essencial que os departamentos tenham maior integração entre si, assim como as disciplinas. Apenas assim o estudante de arquitetura, ao se tornar um profissional, conseguirá lidar de forma consciente com os atuais problemas ambientais prementes e oferecer ao público, soluções mais harmoniosas e sustentáveis. Conclui-se que são necessárias mudanças profundas no “fazer arquitetônico”, e isso implica mudanças críticas no ensino de arquitetura. Essa discussão, para alcançar toda a prática de arquitetura, há que ser trazida para o âmbito acadêmico. A intenção é suscitar a discussão da sustentabilidade dentro das universidades, para que o “pensar arquitetônico” se torne também um “pensar sustentável”. A sustentabilidade deve ser entendida, não como fator de subordinação da arquitetura a alguma disciplina ecológica ou ambiental, mas como um paradigma atual a ser realmente incorporado no centro da formação profissional em arquitetura e urbanismo. Sendo assim apresentado a todos os aproximadamente 40.000 estudantes de arquitetura existentes no país e incorporado na prática profissional dos cerca de 4.000 profissionais arquitetos e urbanistas que ingressam, por ano, no diversificado mercado de trabalho brasileiro. Um grande problema, de caráter cultural, que transcende a arquitetura, mas dificulta a inserção deste paradigma no fazer e pensar arquitetônico é que o meio ambiente é muitas vezes entendido como algo de fora, que não nos inclui. É neste aspecto que a expansão da consciência ambiental se faz necessária, a fim de modificar esta percepção, construindo o entendimento de 160 que a questão ambiental começa dentro de cada um de nós, envolvendo todo o nosso entorno e as relações que estabelecemos com o universo. O ensino de arquitetura, bem como de todas as demais áreas de conhecimento, universitárias ou não, necessitam urgentemente de um fortalecimento nesse sentido. Não basta exigir que a consciência ambiental seja aprendida em casa e nas escolas primárias. Ainda que isto esteja acontecendo com as novas gerações, particularmente envolvendo as escolas do ensino fundamental, seu efeito sobre os profissionais se dará em médio prazo e cabe à universidade dar seu apoio e desenvolvimento à teoria e prática da arquitetura. Disciplinas de educação ambiental e educação para a sustentabilidade devem ser acrescentadas nos cursos de arquitetura, assim como a inserção em todas as disciplinas existentes de consciência ambiental e sustentável. Para concluir, seguem algumas sugestões para a inserção da sustentabilidade nos cursos de graduação em arquitetura e urbanismo: - inserção do conceito de sustentabilidade na arquitetura e urbanismo e da consciência ambiental e sustentável em todas as disciplinas, sejam elas teóricas, técnicas ou práticas, em níveis maiores ou menores; - uma disciplina obrigatória específica que trate mais abertamente e detalhadamente da sustentabilidade na arquitetura e urbanismo; - disciplinas de educação ambiental e de educação para a sustentabilidade acrescentadas nos primeiros períodos dos cursos de arquitetura; - palestras e seminários que abordem o conceito de sustentabilidade na arquitetura e urbanismo; - atualização dos professores para melhor abordar e desenvolver o assunto. 161 REFERÊNCIAS ACSELRAD, Henri (Org.). A duração das cidades: sustentabilidade e risco nas políticas urbanas. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. AMBASZ, Emilio. Portfolio. 2001. Disponível em: . Acesso em: 10 set. 2007. 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Ou seja, o que seria “arquitetura sustentável” e “planejamento urbano sustentável”? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 2. Como tem sido tratado esse assunto dentro da faculdade? As aulas vêm abordando a sustentabilidade? Como? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 3. Na sua opinião a discussão e abordagem da sustentabilidade no curso de arquitetura e urbanismo é pouca, suficiente, ou muita? Por que? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 4. Caso sua resposta na pergunta anterior não tenha sido suficiente, como, na sua opinião, a discussão e abordagem desse assunto no curso de arquitetura e urbanismo poderia ser melhorada? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 170 APÊNDICE B Questionário aplicado com arquitetos. 171 QUESTIONÁRIO: Sexo: F / M Idade:___ Graduação: Universidade -______________ Ano de formatura-_____ Curso de aperfeiçoamento: S / N Estabelecimento:________ Área:_____________Ano:_____ Especialização: S / N Estabelecimento:________ Área:______________________ Ano:_____ Mestrado: S / N Estabelecimento:_________ Área:_________________________ Ano:_____ 1. O que vem a ser para você o conceito de sustentabilidade aplicado na arquitetura e urbanismo? Ou seja, o que seria “arquitetura sustentável” e “planejamento urbano sustentável”? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 2. O seu curso de graduação abordou a sustentabilidade? Como? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 3. Caso tenha feito algum curso de aperfeiçoamento, atualização, especialização ou mestrado, ele abordou a sustentabilidade? Como? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 4. Na sua opinião a discussão e abordagem da sustentabilidade na formação do arquiteto e urbanista é pouca, suficiente, ou muita? Por que? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 5. Caso sua resposta na pergunta anterior não tenha sido suficiente, como, na sua opinião, a discussão e abordagem desse assunto na formação do arquiteto e urbanista poderia ser melhorada? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 172 APÊNDICE C Questionário aplicado com os premiados do Concurso Opera Prima. 173 QUESTIONÁRIO: Nome: _____________Idade:__Graduação: Universidade _____________ Ano de formatura___ Trabalho de graduação:_______________________________ Orientador:_________________ Curso de aperfeiçoamento: S / N Estabelecimento:_________ Área:____________Ano:_____ Especialização: S / N Estabelecimento:___________ Área:___________________ Ano:_____ Mestrado: S / N Estabelecimento:_____________ Área:_____________________ Ano:_____ 1. O que vem a ser para você o conceito de sustentabilidade aplicado na arquitetura e no urbanismo? Ou seja, o que seria “arquitetura sustentável” e “planejamento urbano sustentável”? _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________ 2. O seu curso de graduação abordou a sustentabilidade na arquitetura/urbanismo? Como? a. Não b. Superficialmente c. Sim, nas palestras e seminários d. Sim, na(s) disciplina(s) de ____________________________________________________ e. Sim, em todas as disciplinas f. Outra resposta:_____________________________________________________________ 3. Caso tenha feito algum curso de aperfeiçoamento, atualização, especialização ou mestrado, ele abordou a sustentabilidade? Como? a. Não b. Superficialmente c. Sim, nas palestras e seminários d. Sim, na(s) disciplina(s) de ____________________________________________________ e. Sim, em todas as disciplinas f. Outra resposta:______________________________________________________________ 4. O seu trabalho final de graduação abordou a sustentabilidade? Se abordou, como? a. Não, não estava relacionado com esse assunto b. Em algumas questões, como por exemplo no(a)____________________________________ c. Sim, estava muito voltado para esse assunto d. Outra resposta:______________________________________________________________ 5. Na sua opinião a discussão e abordagem da sustentabilidade na formação do arquiteto e urbanista é : a. Muito pouca abordada, ou não existe b. Pouca, superficial c. Suficiente d. Muito abordada, inclusive recebe importância além do necessário e. Outra resposta:______________________________________________________________ Caso sua resposta não tenha sido letra C, na sua opinião como poderia melhorar a abordagem desse assunto? __________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________ __________________________________________________________________________ 174 ANEXO Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de graduação em Arquitetura e Urbanismo de 2006. Para melhor consulta do leitor, os itens que dizem respeito às questões comentadas nesse trabalho foram grifados. 175 MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO CÂMARA DE EDUCAÇÃO SUPERIOR RESOLUÇÃO Nº 6, DE 2 DE FEVEREIRO DE 20061 Institui as Diretrizes Curriculares Nacionais do curso de graduação em Arquitetura e Urbanismo e dá outras providências. O Presidente da Câmara de Educação Superior do Conselho Nacional de Educação, no uso de suas atribuições legais, conferidas no art. 9º, § 2º, alínea “c”, da Lei nº 4.024, de 20 de dezembro de 1961, com a redação dada pela Lei nº 9.131, de 25 de novembro de 1995, tendo em vista as diretrizes e princípios fixados pelos Pareceres CES/CNE nos 776/1997, 583/2001, e 67/2003, e considerando o que consta do Parecer CNE/CES nº 112/2005, homologado pelo Senhor Ministro de Estado da Educação em 6/6/2005, resolve: Art. 1º A presente Resolução institui Diretrizes Curriculares Nacionais para o curso de Arquitetura e Urbanismo, bacharelado, a serem observadas pelas Instituições de Educação Superior. Art. 2º A organização de cursos de graduação em Arquitetura e Urbanismo deverá ser elaborada com claro estabelecimento de componentes curriculares, os quais abrangerão: projeto pedagógico, descrição de competências, habilidades e perfil desejado para o futuro profissional, conteúdos curriculares, estágio curricular supervisionado, acompanhamento e avaliação, atividades complementares e trabalho de curso sem prejuízo de outros aspectos que tornem consistente o projeto pedagógico. Art. 3º O projeto pedagógico do curso de graduação em Arquitetura e Urbanismo, além da clara concepção do curso, com suas peculiaridades, seu currículo pleno e sua operacionalização, deverá contemplar, sem prejuízos de outros, os seguintes aspectos: I - objetivos gerais do curso, contextualizado às suas inserções institucional, política, geográfica e social; II - condições objetivas de oferta e a vocação do curso; III - formas de realização da interdisciplinaridade; IV - modos de integração entre teoria e prática; V - formas de avaliação do ensino e da aprendizagem; VI - modos da integração entre graduação e pós-graduação, quando houver; VII - incentivo à pesquisa, como necessário prolongamento da atividade de ensino e como instrumento para a iniciação científica; VIII - regulamentação das atividades relacionadas com o trabalho de curso, em diferentes modalidades, atendendo às normas da instituição; IX - concepção e composição das atividades de estágio curricular supervisionado em diferentes formas e condições de realização, observados seus respectivos regulamentos; e 1 Publicada no DOU de 03/02/2006, Seção I, pág. 36-37. 176 X - concepção e composição das atividades complementares. § 1º A proposta pedagógica para os cursos de graduação em Arquitetura e Urbanismo deverá assegurar a formação de profissionais generalistas, capazes de compreender e traduzir as necessidades de indivíduos, grupos sociais e comunidade, com relação à concepção, à organização e à construção do espaço interior e exterior, abrangendo o urbanismo, a edificação, o paisagismo, bem como a conservação e a valorização do patrimônio construído, a proteção do equilíbrio do ambiente natural e a utilização racional dos recursos disponíveis. § 2º O curso deverá estabelecer ações pedagógicas visando ao desenvolvimento de condutas e atitudes com responsabilidade técnica e social e terá por princípios: a) a qualidade de vida dos habitantes dos assentamentos humanos e a qualidade material do ambiente construído e sua durabilidade; b) o uso da tecnologia em respeito às necessidades sociais, culturais, estéticas e econômicas das comunidades; c) o equilíbrio ecológico e o desenvolvimento sustentável do ambiente natural e construído; d) a valorização e a preservação da arquitetura, do urbanismo e da paisagem como patrimônio e responsabilidade coletiva. § 3º Com base no princípio de educação continuada, as IES poderão incluir, no Projeto Pedagógico do curso, a oferta de cursos de pós-graduação lato sensu, de acordo com as efetivas demandas do desempenho profissional. Art. 4º O curso de Arquitetura e Urbanismo deverá ensejar condições para o que futuro arquiteto e urbanista tenha como perfil: a) sólida formação de profissional generalista; b) aptidão de compreender e traduzir as necessidades de indivíduos, grupos sociais e comunidade, com relação à concepção, organização e construção do espaço interior e exterior, abrangendo o urbanismo, a edificação, e o paisagismo; c) conservação e valorização do patrimônio construído; d) proteção do equilíbrio do ambiente natural e utilização racional dos recursos disponíveis. Art. 5º O curso de Arquitetura e Urbanismo deverá possibilitar formação profissional que revele, pelo menos, as seguintes competências e habilidades: a) o conhecimento dos aspectos antropológicos, sociológicos e econômicos relevantes e de todo o espectro de necessidades, aspirações e expectativas individuais e coletivas quanto ao ambiente construído; b) a compreensão das questões que informam as ações de preservação da paisagem e de avaliação dos impactos no meio ambiente, com vistas ao equilíbrio ecológico e ao desenvolvimento sustentável; c) as habilidades necessárias para conceber projetos de arquitetura, urbanismo e paisagismo e para realizar construções, considerando os fatores de custo, de durabilidade, de manutenção e de especificações, bem como os regulamentos legais, e de modo a satisfazer as exigências culturais, econômicas, estéticas, técnicas, ambientais e de acessibilidade dos usuários; d) o conhecimento da história das artes e da estética, suscetível de influenciar a qualidade da concepção e da prática de arquitetura, urbanismo e paisagismo; e) os conhecimentos de teoria e de história da arquitetura, do urbanismo e do paisagismo, considerando sua produção no contexto social, cultural, político e econômico e tendo como objetivo a reflexão crítica e a pesquisa; f) o domínio de técnicas e metodologias de pesquisa em planejamento urbano e regional, urbanismo e desenho urbano, bem como a compreensão dos sistemas de infra-estrutura e de 177 trânsito, necessários para a concepção de estudos, análises e planos de intervenção no espaço urbano, metropolitano e regional; g) os conhecimentos especializados para o emprego adequado e econômico dos materiais de construção e das técnicas e sistemas construtivos, para a definição de instalações e equipamentos prediais, para a organização de obras e canteiros e para a implantação de infraestrutura urbana; h) a compreensão dos sistemas estruturais e o domínio da concepção e do projeto estrutural, tendo por fundamento os estudos de resistência dos materiais, estabilidade das construções e fundações; i) o entendimento das condições climáticas, acústicas, lumínicas e energéticas e o domínio das técnicas apropriadas a elas associadas; j) as práticas projetuais e as soluções tecnológicas para a preservação, conservação, restauração, reconstrução, reabilitação e reutilização de edificações, conjuntos e cidades; k) as habilidades de desenho e o domínio da geometria, de suas aplicações e de outros meios de expressão e representação, tais como perspectiva, modelagem, maquetes, modelos e imagens virtuais; l) o conhecimento dos instrumentais de informática para tratamento de informações e representação aplicada à arquitetura, ao urbanismo, ao paisagismo e ao planejamento urbano e regional; m) a habilidade na elaboração e instrumental na feitura e interpretação de levantamentos topográficos, com a utilização de aero-fotogrametria, foto-interpretação e sensoriamento remoto, necessários na realização de projetos de arquitetura, urbanismo e paisagismo e no planejamento urbano e regional. Parágrafo único. O projeto pedagógico deverá demonstrar claramente como o conjunto das atividades previstas garantirá o desenvolvimento das competências e habilidades esperadas, tendo em vista o perfil desejado, e garantindo a coexistência de relações entre teoria e prática, como forma de fortalecer o conjunto dos elementos fundamentais para a aquisição de conhecimentos e habilidades necessários à concepção e à prática do arquiteto e urbanista. Art. 6º Os conteúdos curriculares do curso de graduação em Arquitetura e Urbanismo deverão estar distribuídos em dois núcleos, e um trabalho de curso, recomendando-se sua interpenetrabilidade: I - Núcleo de Conhecimentos de Fundamentação; II - Núcleo de Conhecimentos Profissionais; III - Trabalho de Curso. § 1º O núcleo de conhecimentos de fundamentação será composto por campos de saber que forneçam o embasamento teórico necessário para que o futuro profissional possa desenvolver seu aprendizado e será integrado por: Estética e História das Artes; Estudos Sociais e Econômicos; Estudos Ambientais; Desenho e Meios de Representação e Expressão. § 2º O núcleo de conhecimentos profissionais será composto por campos de saber destinados à caracterização da identidade profissional do arquiteto e urbanista e será constituído por: Teoria e História da Arquitetura, do Urbanismo e do Paisagismo; Projeto de Arquitetura, de Urbanismo e de Paisagismo; Planejamento Urbano e Regional; Tecnologia da Construção; Sistemas Estruturais; Conforto Ambiental; Técnicas Retrospectivas; Informática Aplicada à Arquitetura e Urbanismo; Topografia. § 3º O trabalho de curso será supervisionado por um docente, de modo que envolva todos os procedimentos de uma investigação técnico-científica, a serem desenvolvidos pelo acadêmico ao longo da realização do último ano do curso. 178 § 4º O núcleo de conteúdos profissionais deverá ser inserido no contexto do projeto pedagógico do curso, visando a contribuir para o aperfeiçoamento da qualificação profissional do formando. § 5º Os núcleos de conteúdos poderão ser dispostos, em termos de carga horária e de planos de estudo, em atividades práticas e teóricas, individuais ou em equipe, tais como: a) aulas teóricas, complementadas por conferências e palestras previamente programadas como parte do trabalho didático regular; b) produção em atelier, experimentação em laboratórios, elaboração de modelos, utilização de computadores, consulta a bibliotecas e a bancos de dados; c) viagens de estudos para o conhecimento de obras arquitetônicas, de conjuntos históricos, de cidades e regiões que ofereçam soluções de interesse e de unidades de conservação do patrimônio natural; d) visitas a canteiros de obras, levantamento de campo em edificações e bairros, consultas a arquivos e a instituições, contatos com autoridades de gestão urbana; e) pesquisas temáticas, bibliográficas e iconográficas, documentação de arquitetura, urbanismo e paisagismo e produção de inventários e bancos de dados; projetos de pesquisa e extensão; emprego de fotografia e vídeo; escritórios-modelo de arquitetura e urbanismo; núcleos de serviços à comunidade; f) participação em atividades extracurriculares, como encontros, exposições, concursos, premiações, seminários internos ou externos à instituição, bem como sua organização. Art. 7º O Estágio Curricular Supervisionado deverá ser concebido como conteúdo curricular obrigatório, cabendo à Instituição de Educação Superior, por seus colegiados acadêmicos, aprovar o correspondente regulamento, contemplando diferentes modalidades de operacionalização. § 1º Os estágios supervisionados são conjuntos de atividades de formação, programados e diretamente supervisionados por membros do corpo docente da instituição formadora e procurar assegurar a consolidação e a articulação das competências estabelecidas. § 2º Os estágios supervisionados visam a assegurar o contato do formando com situações, contextos e instituições, permitindo que conhecimentos, habilidades e atitudes se concretizem em ações profissionais, sendo recomendável que suas atividades sejam distribuídas ao longo do curso. § 3º A instituição poderá reconhecer e aproveitar atividades realizadas pelo aluno em instituições, desde que contribuam para o desenvolvimento das habilidades e competências previstas no projeto de curso. Art. 8º As atividades complementares são componentes curriculares enriquecedores e implementadores do próprio perfil do formando e deverão possibilitar o desenvolvimento de habilidades, conhecimentos, competências e atitudes do aluno, inclusive as adquiridas fora do ambiente acadêmico, que serão reconhecidas mediante processo de avaliação. § 1º As atividades complementares podem incluir projetos de pesquisa, monitoria, iniciação científica, projetos de extensão, módulos temáticos, seminários, simpósios, congressos, conferências, até disciplinas oferecidas por outras instituições de educação. § 2º As atividades complementares não poderão ser confundidas com o estágio supervisionado. 179 Art. 9º O Trabalho de Curso é componente curricular obrigatório e realizado ao longo do último ano de estudos, centrado em determinada área teórico-prática ou de formação profissional, como atividade de síntese e integração de conhecimento, e consolidação das técnicas de pesquisa e observará os seguintes preceitos: a) trabalho individual, com tema de livre escolha do aluno, obrigatoriamente relacionado com as atribuições profissionais; b) desenvolvimento sob a supervisão de professores orientadores, escolhidos pelo estudante entre os docentes arquitetos e urbanistas do curso; c) avaliação por uma comissão que inclui, obrigatoriamente, a participação de arquiteto (s) e urbanista(s) não pertencente(s) à própria instituição de ensino, cabendo ao examinando a defesa do mesmo perante essa comissão. Parágrafo único. A instituição deverá emitir regulamentação própria, aprovada pelo seu Conselho Superior Acadêmico, contendo, obrigatoriamente, critérios, procedimentos e mecanismo de avaliação, além das diretrizes e técnicas relacionadas com sua elaboração. Art. 10. A carga horária dos cursos de graduação será estabelecida em Resolução específica da Câmara de Educação Superior. Art. 11. As Diretrizes Curriculares Nacionais desta Resolução deverão ser implantadas pelas Instituições de Educação Superior, obrigatoriamente, no prazo máximo de dois anos, aos alunos ingressantes, a partir da publicação desta. Parágrafo único. As IES poderão optar pela aplicação das DCN, aos demais alunos do período ou ano subseqüente à publicação desta. Art. 12. Esta Resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogando-se a Portaria Ministerial nº 1.770, de 21 de dezembro de 1994. EDSON DE OLIVEIRA NUNES Presidente da Câmara de Educação Superior

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