A teoria da perda de uma chance
Por: Denivaldo Rodrigues • 29/9/2018 • Artigo • 3.574 Palavras (15 Páginas) • 262 Visualizações
TEORIA DA PERDA DE UMA CHANCE
Denivaldo Rodrigues dos Santos[1]
José Alexandrino Costa Filho[2]
Resumo: O presente artigo tem por objetivo comentar a teoria da perda de uma chance a luz da responsabilidade civil. Tema recém admitido na nossa seara jurídica, cuja essência encontra guarida na doutrina e na jurisprudência pátria, e que vem se consolidando com sua aplicação através dos tribunais. A discussão visa entender o posicionamento do Magistrado quando da prolação da sentença, sob o olhar da possibilidade e probabilidade, entre outros fatores, para determinação do quantum debeatur nas ações de reparação de danos que versam sobre a perda de uma chance, também denominada, perda de oportunidade. Para tanto, o ponto de partida para a discussão proposta adotou por base o julgado referente ao Resp. Nº 788.459-BA que modificou, parcialmente, a sentença de piso.
Palavras-chave: Perda de uma chance, Responsabilidade civil; danos.
1. INTRODUÇÃO
O trabalho aqui apresentado pretende demonstrar ao acadêmico de direito e militantes dessa ciência as questões que gravitam em torno das pretensões levadas a jurisdição no que tange as ações de reparação de danos que versam sobre a teoria da perda de uma chance. Como preliminar, um breve histórico sobre a responsabilidade civil foi estruturado de forma resumida e clara, visto que o presente trabalho visa discorrer mais na questão da Teoria da perda de uma chance, com foco na sentença referente ao Recurso Especial nº 788.459-BA.
Após o breve histórico, o trabalho adentra no cerne da Teoria da perda de uma chance, buscando demonstrar sua historicidade e consequente adequação ao ordenamento jurídico através dos tribunais e da doutrina. Nessa parte, também tratamos dos aspectos da sentença do STJ com as narrativas dos fundamentos pelos os quais Magistrados proferiram suas decisões e em seguida uma análise crítica das motivações bem como a indagação sobre a sequência dos fundamentos para a decisão. Por fim, a conclusão, que em hipótese nenhuma, tem pretensão de esgotar o assunto, uma vez que nessa ciência a verdade não encontra abrigo absoluto.
2. RESPONSABILIDADE CIVIL – BREVE HISTÓRICO
É inegável que no contexto social a responsabilidade civil sempre existiu e o que se pode afirmar de tudo quanto a sua historicidade nos mostra é que embora necessária para validar o sentimento de justiça, encontrava-se, até determinado tempo, com fundamento normativo-jurídico jazendo em franca latência.
Seu processo evolutivo remete a análise dos primórdios da civilização primitiva, quando voltamos a período em que imperava a vingança coletiva, época em que a própria sociedade retribuía o dano causado das formas mais desproporcionais possíveis, sem qualquer limite ou regras, de tal forma que o resultado poderia ser até a morte de ofensor.
Posteriormente, a sociedade se ver envolvida na cultura da vingança privada caracterizada pela provocação do dano idêntico para o outro causador, ou seja, compensava-se um dano pelo outro com suspeito equilíbrio. Havia uma espécie de autotutela, amparada pela lei de Talião cujo jargão jurídico muito conhecido é “olho por olho, dente por dente” do qual já se percebe que o próprio individuo estava autorizado a pleitear, nos moldes daquela lei, a compensação pelo dano lhe causado diretamente do ofensor. Embora o poder público fosse presente, já naquela sociedade, este só interferia para declarar o momento e a forma de exercer aquele direito. Percebe-se nesse contexto a responsabilidade objetiva, porquanto, desprovida de nexo de causalidade ou verificação de culpa.
Na vereda dessa evolução e movida pela incontível transformação e mudanças de valores da sociedade, o indivíduo nela inserido começa a se dar conta de formas mais pacífica de solucionar seus conflitos. Nessas circunstâncias, a cultura da composição voluntária começa a ganhar espaço, na medida que o ofendido busca compor junto ao ofensor a reparação de dano mediante compensação fixada em dinheiro ou objeto, de maneira que o agente pudesse se remir.
Mais adiante o costume da reparação voluntária incorpora-se ao ordenamento jurídico, assim inibindo a autotutela na proporção que estimula e obriga a composição pelo Estado. Nesse período a Lei das XII tábuas determinava o valor da compensação ou da pena a ser imposta ao agente.
O grande marco da responsabilidade civil encontra guarida na Lei de Aquilia, cuja essência normativa visa regular a reparação do dano, trazendo a reboque o elemento subjetivo da culpa para configurar a obrigação de ressarcimento ao agente, em contraponto a responsabilidade objetiva unicamente percebida nos primórdios das civilizações. A referida lei foi o estágio inicial que viria a culminar no que se denomina de responsabilidade extracontratual, aquela que vai além da pacta sum servanda, desde que assentada em lei, para que seja possível a reparação do dano.
Com o passar do tempo várias foram as ideias que buscaram e aperfeiçoaram a teoria da Responsabilidade Aquiliana, sendo, inclusive, incorporada ao CC-1916, artigo 159, atualmente artigo 186 do CC 2002. O passar do tempo trouxe também outro instituto de grande relevância na verificação da responsabilidade civil que foi a Teoria do Risco, à luz do artigo 987 do CC atual que trata do dano provocado por ato ilícito e também do dano objetivo, enfim, todo o tipo de dano.
Vale destacar que responsabilidade vem do latim respondere, que é o fato de ter alguém se constituído garantidor de algo.
A responsabilidade civil consiste na obrigação de indenizar, reparar os danos causados a outrem no seu patrimônio, na sua honra e na sua integridade física, quando decorrentes de atos ilícitos. O referido conceito em confronto com o artigo 186 do CC 2002 suscita os pressupostos que iluminam a responsabilidade civil, a saber: ação, dano e o nexo de causalidade. A ação como conduta de fazer ou não fazer, de maneira voluntária; O dano, seja ele material, moral ou estético que são partes fundamentais para autenticar a responsabilidade civil. O nexo de causalidade é a relação que liga a conduta (ação) do agente ao dano, estabelecendo assim a sua culpa na responsabilidade civil.
O princípio que rege a responsabilidade aquiliana é aquele segundo o qual a ninguém é facultado causar prejuízo a outrem, denominado princípio do neminem laedere, o qual encontra se epigrafado no artigo 186, do Código Civil Brasileiro, o qual trata sobre o ato ilícito, sendo o mesmo a principal fonte da responsabilidade civil. (Ravenia, 2009).
Pois bem, superada a compreensão sobre a evolução da responsabilidade civil, pretende o presente artigo discorrer sobre a Teoria da perda de uma chance, tendo que esse recente instituto vem se consolidando no ordenamento jurídico, em razão de fortes correntes doutrinárias, inclusive, com farta jurisprudência.
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