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AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS E A CRISE DO ESTADO LIBERAL BURGUÊS

Por:   •  30/6/2015  •  Monografia  •  15.137 Palavras (61 Páginas)  •  242 Visualizações

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Universidade Presidente Antônio Carlos - UNIPAC

Pós-Graduação - Lato Sensu

INTRODUÇÃO

A presente pesquisa se ocupará do fenômeno que tem sido denominado “constitucionalização dos direitos”, buscando alcançar seus eventuais reflexos no âmbito do direito privado, originando o chamado direito civil constitucional.

O objetivo do presente trabalho monográfico se liga à procura dos limites impostos pela chamada constitucionalização dos direitos à liberdade individual, dentro do contexto juscivilista.

Importante notar que se trata de pensar as novas tendências hodiernas que buscam limitar a liberdade individual, no âmbito geral das relações privadas, repensando os contornos do antigo conceito de autonomia da vontade, cuja centralidade, em tempos outros, era inegável para o direito civil.

Sabidamente, a reformulação do conceito de autonomia da vontade, desembocando em novos tratamentos das relações jus-privatísticas, introduz a discussão sobre a formação de um novo conceito de autonomia privada, em que a liberdade individual se vê mais amplamente limitada, em benefício do resguardo de interesses meta-individuais e da função social das relações jurídicas.

Portanto, em suma, estudar esta nova formulação conceitual que cerca, hodiernamente, a autonomia da vontade, entendendo-a no círculo mais amplo da constitucionalização dos direitos, é a principal temática do presente trabalho.

Deste modo, assim fica delimitado o tema da presente pesquisa: partindo da chamada constitucionalização dos direitos, pensar seus reflexos para o direito privado, sobretudo atendendo à reformulação necessária do conceito de autonomia da vontade, reformulação esta que se faz com o intuito de atender às novas exigências históricas que se abatem sobre as relações privadas.

        Devemos iniciar por uma tentativa de compreender o fenômeno que tem sido chamado de “constitucionalização dos direitos”, apontando seus reflexos para o direito civil, em geral.

        Em seguida, buscaremos os contornos da formação do conceito de autonomia da vontade, apontando os elementos que, atualmente, indicam sua reformulação.

        Por fim, admitindo-se que o instituto do negócio jurídico é o “locus” em que mais se fazem sentir os efeitos dos novos contornos assumidos pelo direito privado, com o advento da constitucionalização, tentaremos apontar, suscintamente, em que medida o conceito daquele vetusto instituto deveria se revitalizar para fazer jus às novas demandas doutrinárias atuais.

Assim, em geral, nos ocuparemos de verificar se, a partir da constitucionalização dos direitos, deve sobreviver, tal como a tradição o fixou, aquele conceito de autonomia da vontade, ou se deve este ser reformulado à luz das novas limitações que, neste novo contexto, lhe são impostas.

Procuraremos, ainda, identificar em que medida sobrevive na dogmática juscivilista a noção de liberdade individual, tendo em vista os novos contextos em que se formam as relações privadas.  Trata-se de identificar os novos contornos históricos que circunscrevem a atividade privada nas sociedades pós-modernas.

Justifica-se a pesquisa, antes de tudo, porque a chamada constitucionalização dos direitos tem provocado crises nos mais variados segmentos da dogmática jurídica, não sendo exceção a doutrina juscivilista.

Assim, compreender o fenômeno da constitucionalização e seus reflexos para o direito privado é ponto de partida necessário para que a doutrina privatística se legitime, não se tornando ultrapassada e a-histórica, mas produzindo-se em acordo com as novas exigências de seu tempo.

CAPÍTULO  I  

AS TRANSFORMAÇÕES SOCIAIS E A CRISE DO ESTADO LIBERAL BURGUÊS: raízes do direito civil-constitucional.

1. Pós-modernismo, sociedade e direito.

Sabidamente, vivemos em uma sociedade de consumo, sendo que nesta, seguramente, para atender mesmo às demandas históricas que este tipo de sociedade comporta, houve considerável modificação do papel do Estado, ampliando este sua atuação buscando regulamentar e gerenciar a autonomia da vontade, amplamente defendida no Estado Liberal  burguês, em favor da defesa de um Estado Social de Direito, cujo fim seria, dentre outros, a criação de um novo espaço de ação dos indivíduos na vida privada.

Pode-se, neste contexto, falar de uma limitação da autonomia da vontade no âmbito de atuação dos indivíduos regulada pelo direito privado. Fala-se, então, de uma publicização do direito privado.

Quanto ao equívoco caráter novidadeiro, manifestado por muitos ao falar da constitucionalização do direito  civil, com apoio em Gaston Morin, ressaltando que este movimento faz parte de um contexto mais amplo de publicização do direito privado, preleciona INOCËNCIO MÁRTIRES COELHO, in verbis:

o tema da constitucionalização do direito civil, muito embora tenha adquirido ênfase nos últimos tempos – no Brasil, pelo menos, as obras de maior relevo são de publicações relativamente recente – em verdade é um assunto que, de certa forma, pode-se considerar velho de alguns anos. Quando mais não seja, parece correto dizer-se que essa problemática se fez presente aos juristas de maior expressão desde a primeira metade do século passado, o contexto da chamada publicização do direito privado, um fenômeno de maior amplitude que o civilista Gaston Morin, com rara felicidade, batizou com a frase que se tornou célebre – a revolta dos fatos contra o Código – para realçar a crescente desarmonia que, àquela época, já se evidenciava entre o Código de Napoleão e as necessidades de um mundo que se transformava em ritmo acelerado, provocando problemas que o texto codificado não tinha condições de resolver a contento. [1] 

Antes, contudo, de contemplarmos o fenômeno da ruptura das fronteiras dicotômicas entre o direito privado e o público, dicotomia tão celebrada no Estado Liberal, lancemos um olhar às transformações sociais que o provocaram.

Na década de 70 do século passado, ERICH FROMM descrevia com precisão a chamada sociedade de consumo, afirmando que "a ambição humana, tendo por freguês o mundo inteiro, torna-se ilimitada, e o homem se enche de desgosto com a futilidade da busca interminável". Prosseguia o autor afirmando que "a sociedade se torna um pó desorganizado de indivíduos" e "as comunidades industrializadas negligenciam os próprios objetivos pelos quais se torna justificável a aquisição de riqueza, em sua preocupação com os meios pelos quais essa riqueza pode ser adquirida"[2]

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