CRIME ORGANIZADO E A LAVAGEM DE DINHEIRO NA POLÍTICA
Por: anhangueramurilo • 17/11/2015 • Projeto de pesquisa • 2.085 Palavras (9 Páginas) • 362 Visualizações
Apesar de termos um sistema financeiro bem desenvolvido e de contarmos com uma legislação contra a lavagem de dinheiro considerada avançada (estava para ser implementada a de terceira geração, não sei se já foi), o crime organizado tem se fortalecido muito no Brasil. E o crime é “organizado” justamente por essa capacidade de lavar dinheiro originado de atividades criminosas como o tráfico de drogas e de armas, roubos de carga e assaltos a grandes empresas, ou seja, fazendo com que o dinheiro sujo circule por uma rede de negócios lícitos e também, parcialmente, pelo sistema financeiro, vindo a adquirir a aparência de dinheiro limpo.
Mas esses criminosos mais, digamos assim, “barra pesada”, não inventaram a lavagem de dinheiro. Esta já existia em atividades ilegais mais corriqueiras, às vezes consideradas como mera contravenção, como o jogo do bicho. O “caixa dois” talvez seja um dos ilícitos mais antigos que deram origem à lavagem de dinheiro. Originado de licitações e contratos de prestação de serviços fraudulentos com o setor público e também da sonegação de impostos, que é considerado um crime “leve” no Brasil (basta pagar o imposto e a multa, ninguém vai para a cadeia), o “caixa dois” é constituído de recursos que não transitam pela contabilidade, seja das pequenas, das médias ou das grandes empresas. Todos esses recursos de origem ilícita circulavam livremente pelo sistema financeiro até meados da década de 90. Foi só depois da descoberta do esquema de corrupção no governo Collor, do escândalo dos “anões” do orçamento e da adoção de leis anti-lavagem, que começaram os esquemas mais sofisticados de lavagem de dinheiro. Geralmente, os recursos do caixa dois acabam abastecendo campanhas políticas, o que não quer dizer que toda contribuição de empresa seja ilegal. Em vez de proibir as doações de empresas, melhor seria punir o agente público que aceita contribuições comprovadamente ilegais, com a perda do mandato e inelegibilidade por um bom período. Caso o candidato financiado com o caixa dois não tenha cargo público eletivo, deveria perder automaticamente o mandato, se eleito.
É importante distinguir o caixa dois oriundo de licitações e contratos fraudulentos daquele oriundo da sonegação de impostos. No primeiro caso, fica evidente que se trata de recursos públicos. Uma coisa curiosa é que há um artigo no Código Tributário Nacional (art. 43, II, parágrafo 1º) que diz que a incidência do imposto de renda independe, dentre outras coisas, da ORIGEM da receita ou do rendimento. Isso dá margem à especulação de que o resultado financeiro dos atos ilícitos deva ser também tributado pelo imposto de renda. Talvez seja por isso que alguns empresários corruptos ou corruptores, quando são pegos, apressam-se logo em dizer que sua situação com a Receita Federal está OK. O Marcos Valério, me lembro bem, foi um deles. É um absurdo advogar a tese de que se deva cobrar imposto sobre dinheiro público roubado; o certo seria devolver integralmente os recursos para sua verdadeira origem – os cofres públicos –, além da devida condenação do réu. Na sonegação de impostos, diferentemente, os recursos que não foram apresentados à tributação são privados e apenas uma parte deles (a parte que corresponde ao imposto sonegado) é que deixou de ir aos cofres públicos. No fim das contas, tanto num como noutro caso, quem sai perdendo é a sociedade (todos nós).
Outra distinção importante é com relação à sonegação e o planejamento fiscal. Muita gente pensa que tudo é sonegação, mas não é bem assim. Há planejamento fiscal dentro da lei e há outro tipo de “planejamento fiscal” bastante entre aspas. A lei algumas vezes pode deixar pontos obscuros sobre a base de cálculo ou sobre qual momento deve-se implementar uma mudança que afeta o imposto a ser recolhido, por exemplo; ou ainda, a existência de diversas legislações sobre ISS e ICMS leva as empresas a tomar decisões sobre a melhor maneira de alocar suas atividades. É legítimo que as empresas decidam planejar uma forma de pagar menos impostos, sem agredir a lei. Coisa completamente diferente é fazer um conjunto de operações combinadas, algumas delas fictícias ou simuladas, com o fim exclusivo de não pagar impostos ou pagar menos do que o devido. Alguns “planejamentos” não passam de uma forma grosseira de pura e simples omissão de receita.
Outro erro do público leigo é achar que a sonegação é mais comum em grandes empresas; ao contrário, é nas pequenas e médias empresas, cujas contabilidades não são auditadas e nem estão obrigadas à publicidade, que a sonegação é mais grave. Esta situação é agravada ainda pelo modelo organizacional dos órgãos de fiscalização e pelo corporativismo, que concentram muita gente especializada em atividades-meio em prejuízo das atividades-fim, de modo que os pequenos e médios, por serem muitíssimos, acabam não sendo fiscalizados. Esse é um problema que piorou na área federal com a chegada do PT ao poder: houve perda de autonomia e passou-se a mirar obcecadamente os “grandes contribuintes” (os grandes empreiteiros que trabalham para os governos petistas certamente ficam fora desta categoria). A sonegação é um problema crônico brasileiro, some-se a isso a economia informal, que praticamente não paga impostos, o resultado é uma baita sonegação. Mas este é um assunto que está fora de moda no Brasil, no momento. Em outros países, sonegação dá cadeia. É interessante observar que quando o PT era oposição este era um dos assuntos que eles gostavam de discutir e criticar no governo de então. O que será que aconteceu para perderem o “tesão” quando chegaram ao poder?
Parte do dinheiro da atividade criminosa circula também no sistema financeiro (bancos), por meio de uma grande rede de laranjas, em contas individuais que não apresentam grande movimentação para não chamar a atenção dos órgãos de controle. Há também uma outra forma de movimentar recursos de atividades ilícitas no sistema financeiro, mais engenhosa e mais eficiente, que é por meio das chamadas empresas de “factoring”, que não são consideradas agentes financeiros e não são sociedades anônimas, portanto não são controladas nem pelo Banco Central e nem pela CVM. Essas empresas movimentam uma enorme quantidade de recursos no sistema financeiro, acho que isso deveria ser olhado com mais atenção pelas autoridades. É claro que há empresas sérias no meio, mas acredito que muitas delas estão ligadas à pilantragem ou ao crime mesmo. Procurem no Mensalão I (já julgado) ou no Mensalão II (da Petrobrás, do doleiro Youssef), aposto que vão encontrar empresas de “factoring” no meio. E eu não ficaria surpreso se descobrirem que o PCC também opera com empresas desse tipo. É uma maneira de juntar numa única empresa (e, a partir daí, ter acesso ao sistema financeiro) as quantias pulverizadas entre inúmeros pequenos negócios.
A complexidade do crime organizado vai além dos mecanismos financeiros. Na economia real, a lavagem de dinheiro envolve um grande número de empresas e atividades: transporte de passageiros e de cargas, postos de gasolina, imobiliárias, revendedoras de veículos (geralmente usados), padarias, restaurantes, pizzarias etc. E, talvez, até algumas igrejas ditas evangélicas (lembram-se daquele “pastor” no Rio, ligado aos traficantes?). Na verdade, a “engenharia financeira” é uma consequência dessa diversificação dos negócios e, como o tráfico de drogas e armas é um crime internacional e movimenta imensas quantias, as operações financeiras também envolvem transações internacionais. Com o crescimento e a diversificação veio a necessidade de profissões especializadas; alguns advogados e contadores trabalham para o crime organizado. Às vezes é a própria organização criminosa que financia os estudos dos seus membros.
Realmente, é difícil investigar organizações criminosas por causa da sua complexidade – muitas empresas são de fachada. Tomemos como exemplo a empresa do Luiz Moura, a Happy Tour, aquela que ele disse que não tinha nem um carrinho de pipoca. Na verdade, o ativo fixo da empresa (as vans) está em nome de um monte de pessoas que são obrigadas a comprar ou financiar o veículo por sua própria conta, num esquema de cooperativa. A cooperativa (Happy Tour) controla todo o faturamento. Aparentemente, são todas pessoas de bem, que estão trabalhando numa atividade lícita. Mas se for investigar a fundo, com certeza vão encontrar muita gente que já fez tráfico de drogas ou já assaltou, mesmo que nunca tenham sido condenadas, ou então são parentes ou têm alguma amizade com gente do esquema criminoso. Em geral são pessoas que têm alguma dívida com a “organização”, por exemplo, receberam ajuda de advogados que trabalham para a organização criminosa quando estavam presos; daí porque não podem se desligar da “sociedade”, como em qualquer atividade normal; o abandono do emprego aí é considerado como traição e punido com pena de morte. Outros tipos de atividades usadas para lavar dinheiro devem adotar um esquema semelhante. A organização como um todo, por sua complexidade e por envolver um grande número de agentes atuando em atividades LEGAIS, é capaz de seguir funcionando mesmo quando seus chefões são presos.
O crime organizado tem sido o maior beneficiário das agendas pautadas pelos esquerdistas chiques do eixo Morumbi-Leblon (descriminalização das drogas, desmilitarização das polícias), pelas organizações internacionais que vivem dando conselhos ou até mesmo apoio material para os outros, mas que são insensíveis ao drama humano causado pelas drogas dentro dos seus próprios países, tudo isso com a colaboração dos deslumbrados do miolo-mole do meio artístico e das universidades. Estamos vivendo a era da soberania do consumidor de drogas. Por outro lado, as organizações criminosas tratam de se inserir cada vez mais na sociedade, seja concedendo “benefícios” às populações carentes, seja empregando cada vez mais pessoas em atividades lícitas, ou até mesmo adotando um visual mais “leve”, mais “descolado”. Quem vê aquele jovem de classe média, bem vestido, circulando com um bom carro, morando numa bela casa (tudo em nome de terceiros), é capaz de pensar que ele enfim abandonou a vida do crime. Ledo engano!
À medida que se expande, o crime organizado vai fincando raízes na sociedade, primeiro buscando o reconhecimento social e, em seguida, tentando infiltrar sua gente na política e no poder judiciário. E existe partido melhor do que o PT para fazer o batismo político do crime organizado? Quantos serão os políticos do PT que já receberam contribuições do PCC? A relação do PT com o crime não é de agora; todos aqui sabem da história nebulosa da “Tattolândia” e da rede criminosa envolvida na morte do Celso Daniel. De lá para cá a coisa andou bem! A que ponto chegamos?! Um deputado do PT ligadíssimo ao PCC, organização criminosa que já praticou atentados em São Paulo matando diversos policiais, em ano eleitoral, e que também já fez ameaças de morte ao governador de São Paulo; um petista candidato a governador de São Paulo muito íntimo do deputado petista ligadíssimo ao PCC. Se fizermos um mapa da atuação do PCC na capital de São Paulo, podemos observar que eles atuam em áreas da periferia limítrofes a municípios onde o PT governa – principalmente zona norte, zona leste e zona sul. Teoria conspiratória? Não, apenas fatos.
O fato é que o crime está cada vez mais organizado e poderoso no Brasil. Por que chegamos a esse ponto? Certamente, a resposta não é a complexidade das organizações criminosas, em si mesma. Se temos leis, se temos um sistema financeiro onde pode ser rastreado parte do dinheiro do crime que por ali transita, então o que falta é investigação, falta sintonia entre os vários órgãos de fiscalização e investigação, e talvez falte decisão política. Mas não é só isso, também é um fato inquestionável que somos uma sociedade tolerante com o crime. Prova disso é que “bicheiro”, empresário corrupto que fornece bens e serviços ao setor público e sonegador de impostos sempre foram figuras aceitas socialmente, sempre contribuíram para a caixinha dos políticos. Agora chegou a vez dos “barra pesada”. Eles estão se esforçando para serem aceitos socialmente há muito tempo, agora estão naquela fase que já foi percorrida por outros delinquentes – a fase da participação política. Acho que no fundo, no fundo, Gilmar Mendes deve estar preocupado com outra coisa talvez até mais grave – a possibilidade dessa gente estar infiltrada no poder judiciário (sei não, essa liminar que autorizou o “cappo” sair do RDD antes do tempo, sei não…). Cabe a nós decidirmos o país que queremos ser, se um país com uma economia e um sistema político corrompidos, como a Rússia, ou a Venezuela, ou um país alinhado com o mundo desenvolvido e democrático. Acho que o PSDB quando esteve no governo federal errou feio, não deu a devida atenção a este problema gravíssimo. Há muito trabalho pela frente para colocar este país em ordem, ou em níveis mais aceitáveis de civilização.
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