O INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Por: MARCELODINIZ • 23/9/2016 • Artigo • 4.527 Palavras (19 Páginas) • 527 Visualizações
O INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA NO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
Michel Ferro e Silva1
Resumo – O presente artigo se propõe a tratar do incidente de desconsideração da personalidade jurídica, previsto no novo Código de Processo Civil. Trata-se de inovação trazida pela nova lei e que representa modalidade provocada de intervenção de terceiros. Inicialmente, são feitas algumas considerações a respeito da responsabilidade patrimonial no sistema executivo brasileiro e, ainda, da teoria da desconsideração da personalidade jurídica. Na sequência, é feita a análise do incidente, destacando-se seus legitimados, o momento em que o mesmo pode ser instaurado e seus efeitos na hipótese de acolhimento. Ao final, chega-se a conclusão de que o incidente, desde que adequadamente utilizado, representa importante mecanismo para permitir a plena satisfação do credor e a busca de um processo de resultados.
Palavras-chave – Novo CPC – Incidente – Desconsideração – Personalidade Jurídica – Responsabilidade patrimonial – Sócio – Sociedade.
Sumário ∙ Introdução ∙ Noções gerais ∙ Do incidente de desconsideração da personalidade jurídica no NCPC ∙ Conclusão
Introdução
Uma das grandes novidades do novo Código de Processo Civil é a expressa previsão de um procedimento voltado à desconsideração da personalidade jurídica.
Com efeito, em que pese a desconsideração ter previsão na legislação de direito material, o antigo Código de Processo Civil não previa qualquer procedimento que regulamentasse a sua utilização, provocando, não raro, dúvidas e questionamentos a seu respeito.
A nova lei se propõe a regulamentar os aspectos procedimentais da desconsideração com a criação de um incidente processual a fim de que seja assegurado
1 Mestre em Direito do Estado (UNAMA). Especialista em Direito Processual (UNAMA). Professor de Teoria Geral do Processo e Direito Processual Civil do CESUPA – Centro Universitário do Pará (graduação e especialização) e de Direito Processual Civil e Jurisdição Constitucional da FAP – Faculdade Estácio do Pará. Membro do Instituto Brasileiro de Direito Processual – IBDP e da Associação Norte e Nordeste de Professores de Processo – ANNEP. Advogado em Belém/ PA.
o contraditório e a ampla defesa ao sócio ou à pessoa jurídica, cuja responsabilidade patrimonial se pretende estabelecer.
A iniciativa é muito bem vinda e o presente trabalho se propõe a fazer uma inicial análise do incidente que, acertadamente, foi incluído como modalidade de intervenção de terceiros.
1. Noções gerais
A responsabilidade patrimonial sempre foi um dos temas mais interessantes envolvendo a atividade jurisdicional executiva. Dentro dele, a possibilidade extraordinária da prática de atos de invasão no patrimônio dos sócios merece destaque.
Trata-se da utilização da chamada teoria da desconsideração da personalidade jurídica (Disregard Doctrine), que possui suas bases sedimentadas no direito norte-americano e europeu.2
Mediante a utilização da referida teoria se mostra possível atribuir ao(s) patrimônio(s) do(s) sócio(s) - ou da empresa na hipótese de grupo econômico - a responsabilidade pelo adimplemento de obrigações constituídas pela sociedade, em decorrência da evolução na noção de separação absoluta entre os mesmos.
O ordenamento jurídico brasileiro incorporou a teoria da desconsideração da personalidade jurídica, sendo diversos os dispositivos legais que a consagram. Dentre eles, merecem destaque o artigo 28, do Código de Defesa do Consumidor (CDC) e o artigo 50, do Código Civil (CC). A Lei n. 8.884/94 – Lei Antitruste – também a prevê.
2 Cf. KOURY, Suzy Elizabeth Cavalcante. A Desconsideração da Personalidade Jurídica: Disregard Doctrine e os grupos de empresas. Rio de Janeiro: Forense, 2011, p. 67. Conferir, também, MARINHO, Rodrigo Saraiva; SANTIAGO, Nestor Eduardo. Execução judicial, desconsideração da personalidade jurídica e dignidade da pessoa humana. In: DIDIER JR, Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; BASTOS, Antonio Adonias. Execução e Cautelar. Salvador: JusPODIVM, 2012, pp. 547-8.
Todavia, apesar de prevista no direito substancial, o antigo Código de Processo Civil não cuidava dos aspectos procedimentais a serem observados fazendo com que, muitas vezes, a teoria não pudesse ser utilizada ou utilizada de modo inadequado.
O NCPC se propõe a reparar citada omissão, tratando do incidente de desconsideração da personalidade jurídica nos artigos 133 a 137, considerando-o, como dito acima, uma modalidade de intervenção de terceiros.
Antes da análise dos aspectos procedimentais do incidente, objetivando uma melhor compreensão, optou-se pelo estabelecimento de considerações, ainda que superficiais, a respeito da Disregard Doctrine e, igualmente, da responsabilidade patrimonial executiva.
A atividade jurisdicional executiva nas obrigações de pagar quantia certa está toda alicerçada no princípio da responsabilidade patrimonial, ou seja, o patrimônio do devedor responderá pelas dívidas por ele assumidas caso não se dê a satisfação voluntária.3 Somente excepcionalmente a responsabilidade será pessoal, como acontece na hipótese de inadimplência de crédito de natureza alimentar.4
Conforme consolidado na doutrina, a responsabilidade patrimonial poderá ser primária ou secundária. No primeiro caso, os atos executivos incidirão sobre bens do próprio devedor obrigado,5 conforme previsto no art. 789, do NCPC.
3 No tocante às obrigações de fazer, não fazer e dar coisa, o princípio da responsabilidade patrimonial não exerce a mesma relevância. É que, nessas hipóteses, predomina o princípio da máxima efetividade, que assegura ao credor o direito de ver adimplida in natura a obrigação, somente convertendo-se, em último caso, no seu equivalente em dinheiro.
4 Nesse particular, em trabalho clássico, já se afirmou: “O objeto sobre o qual opera a sanção executiva não é a pessoa do devedor, mas são os bens que se encontram em seu patrimônio [...]. O órgão do Estado, usando do poder do qual é investido, pode tomar os bens do devedor e destiná-los à satisfação do credor, segundo as modalidades e com os efeitos estabelecidos pela lei” (LIEBMAN, Enrico Tulio. Manual de Direito Processual. V.1. Tocantins: Intelctos, 2003, p. 179).
5 Cf. ASSIS, Araken de. Manual do Processo de Execução. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 403.
Contudo há situações em
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