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O PARECER JURÍDICO

Por:   •  18/11/2020  •  Trabalho acadêmico  •  1.220 Palavras (5 Páginas)  •  146 Visualizações

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PARECER JURÍDICO

ASSUNTO

Consulta sobre qual ente federado possui competência para adotar medidas de restrição à população para contenção do avanço do coronavírus, preservando a saúde pública.

CONSULENTE: Sr.X

EMENTA

MEDIDAS DE RESTRIÇÃO PARA ENFRENTAMENTO DO CORONAVIRUS/PRESTAÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO DE SAÚDE - COMPETÊNCIA MATERIAL COMUM ENTRE UNIÃO ESTADOS E MUNICÍPIOS E COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE - COMPETÊNCIA PARA LEGISLAR SOBRE RESTRIÇÕES AO TRANSPORTE INTERMUNICIPAL E INTERNACIONAL- PRIVATIVA DA UNIÃO

RELATÓRIO

A União editou a Lei nº 13.979, de 06 de fevereiro de 2020, que autorizou as “autoridades competentes” a adotar importantes medidas como a quarentena, o isolamento social e a realização compulsória de exames e tratamentos médicos. As referidas medidas recaíam sobre pessoas infectadas, suspeitas e população de risco (idosos, portadores de doenças etc.), não se aplicando às demais pessoas. Trata-se do assim chamado “isolamento vertical”. 

Cuidando-se de conjunto de normas que se destina a enfrentar o coronavírus, a matéria central é a saúde pública. No plano administrativo, a competência para prestar o serviço público de saúde é comum entre a União, estados e municípios (art. 23, II, da CF/88).

No plano legislativo, a competência é concorrente entre estes entes federativos (art. 24, XII c/c art. 30, I e II, da CF/88).  O modo de desempenho das competências legislativas concorrentes é regulamentado pelos parágrafos do art. 24 da CF/88: cabe à União editar normas gerais, e aos estados e municípios normas suplementares. Assim, o constituinte compôs um cenário em que devem existir diretrizes gerais de aplicabilidade nacional, e normas específicas estaduais e municipais que atendam às particularidades regionais e locais.

Há situações excepcionais em que os estados possuirão competência legislativa plena sobre essas matérias: quando a União não tiver editado normas gerais (a chamada competência supletiva estadual, prevista no § 3º do art. 24), ou quando a norma federal sobre a matéria for inconstitucional, como, por exemplo, na hipótese de não promover proteção eficiente ao direito fundamental em questão.  As normas de suspensão das atividades comerciais, salvo as essenciais, editadas pelos estados, parecem ser constitucionais, não usurpando competência reservada à União. 

Primeiro, porque, não há conflito frontal com as normas federais e então os estados podem legislar sobre matéria sujeita à competência concorrente, no exercício da sua competência suplementar (art. 24, § 2º), editando normas específicas que desenvolvam as normas gerais federais em atenção às peculiaridades locais. Segundo, porque a eventual edição de norma federal que determine, no presente momento, a reabertura das atividades comerciais nos estados mais atingidos pela pandemia, seria materialmente inconstitucional, por violação ao dever de proteção suficiente do direito fundamental à saúde.

Apesar dos esforços empreendidos por diversas esferas de governo, o Brasil, até o presente momento,não conseguiu estruturar adequadamente o seu sistema de saúde (com a garantia de leitos, respiradores e EPIs suficientes para o momento de pico da epidemia), adquirir número de testes para um diagnóstico em massa e nem montar uma estrutura estatal para o acompanhamento de doentes e suspeitos em larga escala. Deste modo, o presente entendimento do Ministério da Saúde é de que as Unidades da Federação que implementaram medidas de distanciamento social ampliado devem manter essas medidas até que o suprimento de equipamentos (leitos, EPI, respiradores e testes laboratoriais) e equipes de saúde (médicos, enfermeiros, demais profissionais de saúde e outros) estejam disponíveis em quantitativo suficiente, de forma a promover, com segurança, a transição para a estratégia de distanciamento social seletivo.

Essa também é a posição da Organização Mundial de Saúde. Em pronunciamento de 06 de abril de 2020, o Diretor-Geral da OMS afirmou que a decisão de suspender medidas de isolamento social deve estar condicionada a “parâmetros específicos, como a ocupação de leitos hospitalares, o ritmo de crescimento de novos casos e a proporção de resultados positivos em comparação à quantidade de pessoas testadas. E ao mesmo tempo precisam também implementar uma série de medidas, como fortalecer o sistema de saúde e orientar a população.”

Entretanto, há normas específicas estaduais e municipais que excedem os poderes legislativos que a Constituição Federal lhes conferiu. É o caso dos dispositivos do Decreto nº 47.006/20, do estado do Rio de Janeiro, que prevêem a suspensão de meios de transporte intermunicipal, interestadual, aeroviário, e portuário, pois, embora haja o condicionamento à aprovação da respectiva agência reguladora, a competência para dispor sobre transporte interestadual, aeroviário e portuário é privativa da União Federal, nos termos dos arts. 21, XII, “c” a “f” e XXII e 22, I e X. Desse modo, as regras estaduais são inconstitucionais.

Também parecem inválidas medidas que ultimamente vêm sendo cada vez mais adotadas por Prefeitos, consistentes em bloqueios generalizados do ingresso de não-residentes nos respectivos territórios municipais. Excetuam-se as barreiras sanitárias para orientar e educar viajantes.

Ao disciplinar o pacto federativo, o constituinte de 1988 reservou à União competência para legislar sobre trânsito e transporte (art. 22, XI) e para explorar os serviços de transporte rodoviário interestadual e internacional de passageiros (art. 21, XII, e). Conferiu aos municípios,a organização e a prestação de serviços de transporte coletivo de interesse local (art. 30, V), considerados, no próprio dispositivo constitucional, como serviços públicos “que tem caráter essencial”. Com base na competência residual (art. 25, § 1º), sobrou aos estados e ao Distrito Federal, por exclusão das atribuições municipais e federal, organizar e explorar o transporte coletivo intermunicipal de passageiros, nos respectivos territórios. Por isso, a disciplina legal de outras modalidades de transporte, que variam conforme o modal (aquaviário, ferroviário, aeroportuário) e a destinação pretendida (de cargas, individual de passageiros, turismo, ambulatorial etc.), é incumbência da União (arts. 21, XII, “c” e “d”, XXII, e 22, I e XI, da CF), a quem compete estabelecer os requisitos técnicos e econômicos da atividade, inclusive quanto ao seu início, seu término, as condições regulamentares de sua prestação e, ainda, as hipóteses válidas de sua interrupção, sempre observado o caráter de direito fundamental social de que o direito ao transporte se reveste (art. 6º, caput e IV, da CF). Complementariamente, é importante ressaltar que as medidas de bloqueio a circulação intermunicipal imposta por alguns prefeitos e governadores tinha caráter discriminatório e portanto também inconstitucional, ao determinar o grupo específico para o qual as medidas valeriam, excetuando os veículos privativos.  

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