O PARECER JURÍDICO DIREITO ESPECIAL CRIMINAL “CASO MOISE KABAGAMBE”
Por: Luiz Gustavo Kramer Dal Molin • 29/3/2022 • Resenha • 2.839 Palavras (12 Páginas) • 169 Visualizações
UNIVERSIDADE DE PASSO FUNDO
Luiz Gustavo Kramer Dal Molin
PARECER JURÍDICO
DIREITO ESPECIAL CRIMINAL
“CASO MOISE KABAGAMBE”
Passo Fundo
2022
INTRODUÇÃO AO TEMA
Há muito tem se falado acerca da violência que assola nosso país. Os crimes violentos não se restringem somente aos brasileiros, os imigrantes; que vieram ao Brasil para trabalhar e aspirar à uma vida mais digna, também padecem das mazelas que o crime impõe em nossa sociedade contemporânea. No presente trabalho, venho através deste parecer jurídico realizar a análise de um caso recente de violência contra estrangeiros, no qual houve intensa repercussão da mídia e veículos de comunicação, além de um forte clamor popular por justiça, trata-se do caso Moise Kabagambe, imigrante Congolês espancado e morto em uma praia, no Estado do Rio de Janeiro.
Com base nesse caso, farei uma diferenciação da tortura seguida de morte e do homicídio qualificado pela tortura, para entendimento de qual tipo penal o crime se encaixa e, ainda, expor minha opinião pessoal sobre a conduta dos acusados nesse ato bárbaro.
BREVE HISTÓRICO DOS FATOS
Moïse chegou ao Brasil em 2011, aos 13 anos, junto com três dos seus onze irmãos. Veio como refugiado da República Democrática do Congo para fugir da guerra e da fome, frequentes em seu país de origem.
O rapaz cursou até a segunda série do ensino médio e desde então realizava trabalhos ocasionais em restaurantes, lanchonetes e quiosques na praia. Sua principal atividade era trabalhar por diárias em um quiosque perto do Posto 8, na Barra da Tijuca/RJ, denominado Tropicália.
Como trabalhava com diárias, no dia 24 de janeiro de 2022, Moïse Mugenyi Kabagambe foi ao quiosque Tropicália, onde trabalhava, para cobrar duas diárias ainda não pagas. Segundo os familiares, ele foi amarrado e espancado, inclusive com um taco de beisebol. Parentes disseram ainda que os órgãos de Moïse teriam sido retirados do seu cadáver. Mesmo após o caso, o quiosque continuou funcionando normalmente, como se nada tivesse acontecido.
Existe um vídeo, que foi fundamental para a investigação policial, o qual circulou pela imprensa e nas redes sociais, onde exibe imagens da vítima discutindo com um funcionário, o qual pega um pedaço de madeira após Moïse tentar pegar uma bebida do freezer. Em resposta, Moïse pega uma cadeira e uma vassoura, soltando-as em seguida. A vítima, então, tira uma bolsa e sua camisa e abre o freezer, quando outro homem se aproxima e inicia a agressão contra Moïse. Outros dois homens não identificados se juntam à violência contra a vítima. Os agressores, ao notarem a falta de reação de Moïse, tentam prestar socorro com massagens cardíacas, mas sem sucesso. No fim do vídeo, e possível ver que a vítima está sendo arrastada desacordada. De acordo com um laudo do Instituto Médico Legal (IML), a causa da morte foi traumatismo do tórax, ferimento que impediu o Congolês de respirar, levando-o á óbito. O laudo aponta ainda que a causa da morte do congolês foi traumatismo no tórax com contusão pulmonar. Há sinais de hemorragia e aspiração de sangue e dez marcas dos golpes feitos com o taco de baseball, que foi apontado como sendo um instrumento usado em um dos quiosques para quebrar o gelo de bebidas.
No dia seguinte ao crime, os advogados do Tropicália descartaram qualquer envolvimento de Carlos Fabio da Silva Muzi, dono do quiosque Tropicália, com o crime ocorrido no local, e negam que houve qualquer dívida à Moïse, afirmando que ele não era funcionário fixo. Os advogados também afirmaram que Carlos Muzi tem recebido ameaças de morte e de depredação do seu patrimônio desde que o assassinato veio à tona.
Já durante o rumo das investigações policiais, de acordo com um depoimento de uma fonte policial, a Polícia Civil não crê que alguém tenha dado a ordem para matar Moïse, mas que os envolvidos agiram por vontade própria. De acordo com a mesma fonte, a investigação aponta que a dívida pode não ter sido o motivo real da confusão, ou seja, poderá haver indícios de racismo e xenofobia na motivação do assassinato brutal do imigrante congolês.
Na coleta de depoimentos, três dos envolvidos confirmaram a participação no incidente que resultou na morte da vítima. Aleson Cristiano de Oliveira Fonseca, afirma sua participação no crime, mas nega que a violência foi motivada por racismo, xenofobia, ou pelas dívidas. De acordo com os relatos, foi Aleson que chamou o SAMU após a morte de Moïse. Brendon Alexander Luz da Silva, outro preso, afirma que está com a "consciência tranquila" porque "apenas segurou" o imigrante, mas "não o estrangulou". Brendon afirma que não tinha intenção de matar. Fábio Pirineus da Silva afirmou ter espancado Moise, mas também afirmou que não tinha a intenção de matar a vítima.
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DIFERENCIAÇÃO DO HOMICÍDIO QUALIFICADO PELA TORTURA E DA TORTURA SEGUIDA DE MORTE
Após a exposição dos fatos faz-se necessário, para melhor entendimento do caso, distinguirmos a diferença entre a tortura seguida de morte do homicídio qualificado pela tortura. A grande diferença está na presença, ou não, do elemento subjetivo (dolo) do agente na conduta criminosa de sua ação.
A tortura seguida de morte está prevista na lei nº 9.455 de 7 de abril de 1997 em seu artigo 1º, parágrafo 3º, tipifica a tortura qualificada pela morte cominando uma pena de reclusão de 8 a 16 anos. Neste trilhar, o objetivo do tipo penal é punir o resultado morte derivado pela tortura a título de culpa, ou seja, estamos diante de um crime preterdoloso, onde há dolo na conduta antecedente (tortura) e culpa na conduta subsequente (morte). Ou seja, o sujeito ativo do crime de tortura tem o animus de tortura, somente, e não de matar a vítima, se o sujeito passivo morre, estamos diante de uma qualificadora com pena autônoma, que pune o resultado a título de culpa. Vejamos o seguinte exemplo: A com a intenção de causar sofrimento físico e mental em B, emprega meios que causem a efetiva tortura, por exemplo, o uso de choque para obter uma confissão, que sucessivas tentativas, B acaba falecendo. Nesse sentido, A só teria o dolo em relação a tortura para obter uma confissão, a morte foi derivada de culpa, por mera questão preterdolosa se configurando, assim, em um crime preterdoloso.
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