O caso dos exploradores de cavernas é uma introdução à argumentação jurídica
Por: EdilVilhena • 14/9/2021 • Resenha • 1.420 Palavras (6 Páginas) • 256 Visualizações
O caso dos exploradores de cavernas é uma introdução à argumentação jurídica que traz o debate sobre a preservação da vida e da forma como podemos criar “normas” sociais e, também, apresenta contornos para a análise do debate jurídico, do papel dos juízes e das leis na sociedade.
Este livro descreve um caso legal baseado nos votos de cinco membros da Suprema Corte: Truepenny, Foster, Tatting, Keen e Handy. A votação discutiu o caso de diferentes ângulos factuais e diferentes princípios jurídicos. Este caso fictício aconteceu em uma caverna em Niugas. Como um deslizamento de terra bloqueou completamente a única saída possível, cinco espeleólogos ficaram presos em uma caverna. Haverá resgate após trinta e dois dias.
No entanto, descobriu-se depois que devido ao escasso suprimento alimentar, no vigésimo terceiro dia presos na caverna, os exploradores mataram o companheiro Whetmore a fim de consumir sua carne e subsistir até a remoção dos escombros. Sendo que Whetmore foi quem primeiro sugeriu esse plano e, quando foi tirada a sorte para determinar qual deles seria usado para tal fim, ele próprio acabou sendo o escolhido. Ao final do julgamento houve empate, com dois votos a favor e dois contra (um dos juiz não emitiu voto a favor, nem contra), dessa forma, os réus foram sentenciados e condenados a morte por enforcamento.
Cinco exploradores ficaram presos numa caverna, por causa de um deslizamento. Durante os trabalhos de resgate, houve outro deslizamento, e 10 operários morreram. No vigésimo dia a equipe de resgate conseguiu fazer contato com os exploradores por rádio. Um deles, chamado Whetmore, perguntou quanto tempo eles demorariam para ser resgatados. Os engenheiros responderam que, pelo menos, mais dez dias. Então o mesmo Whetmore pediu para falar com um médico e perguntou se, com as provisões que tinham, conseguiriam sobreviver por mais dez dias. O médico disse que as possibilidades eram muito poucas. Depois de oito horas, novamente Whetmore perguntou se eles sobreviveriam se se alimentassem da carne de um deles. O médico, a contragosto, disse que sim. Com isso cessaram as comunicações e, quando os homens foram resgatados, ficouse sabendo que, no trigésimo terceiro dia após a entrada na caverna, os demais comeram a carne do próprio Whetmore para se manterem vivos. Os quatro sobreviventes foram acusados pelo homicídio de Roger Whetmore e, perante o júri, ficou evidenciado que o Whetmore foi o primeiro a propor que um deles fosse morto para servir de alimento aos demais. Ele mesmo propôs também que fosse tirada a sorte nos dados (curiosamente, ele tinha um par de dados consigo). No entanto, antes de tirarem a sorte, ele – Whetmore – desistiu. Os outros prosseguiram. Quando chegou a vez dele, lançaram os dados para ele. E o “sorteado” foi o próprio Whetmore. Os quatro réus foram condenados à forca em primeiro grau. Apesar da condenação, tanto o júri quanto o juiz enviaram uma petição ao chefe do Poder Executivo para que este comutasse a pena de morte em prisão de seis meses, o que, até o momento do julgamento do recurso pelo tribunal, não tinha acontecido. Da condenação pelo tribunal do júri, houve recurso à Suprema Corte de Newgarth.
A Suprema Corte de Newgarth era composta por cinco juízes. Dois votam por manter a condenação, dois votam para absolver, e um se abstêm. Dentre estes, nós temos, claramente, um jusnaturalista, três 3 de 5 positivistas e um realista. A única diferença é que, dentre os três positivistas, dois têm “crise de consciência.” O último dos cinco a votar é o realista, e não é preciso muito esforço para perceber qual deles o Lon Fuller – que, lembre, era realista – apresenta como o juiz mais “descolado” dos cinco.
1. O primeiro a votar é o presidente da Suprema Corte, o Juiz Truepenny. É ele quem relata o caso, e recomenda ao Tribunal que mantenha a condenação, mas fazendo o mesmo que o juiz de primeiro grau e o júri. No entanto, no caso da Suprema Corte, diz que o mais adequado, diante das circunstâncias do caso, seria não pedir, mas recomendar ao Chefe do Poder Executivo comutar a pena. Com isso, eles ficariam dentro da legalidade, porque a comutação da pena pelo Chefe do Poder Executivo também está prevista no direito positivo. E é por isso que o Presidente da Corte, Juiz Truepenny, pode ser considerado um “positivista com crise de consciência.”
2. O segundo a votar é o Juiz Foster, claramente um jusnaturalista. Ele apresenta, para absolver os réus, dois argumentos independentes. O primeiro é que, presos dentro da caverna, eles não estavam submetidos às leis de Newgarth, mas estavam num verdadeiro estado de natureza. E, no estado de natureza, estavam sujeitos ao direito natural. Logo, seria válido o contrato que eles fizeram entre si e, por isso, o caso não poderia ser considerado um homicídio. O segundo argumento é baseado na finalidade da regra que pune o homicídio. O seu objetivo é defender a vida. E, portanto, considerando-se que a vida do pobre Whetmore foi tirada para preservar a dos quatro restantes, teria sido alcançada a finalidade da norma, algo semelhante ao que acontece na legítima defesa. Sobre este argumento, são necessários alguns esclarecimentos. Primeiro isso que o Juiz Foster fez é o que se chama de interpretação teleológica – interpretação que busca a finalidade da norma; segundo, no estado fictício de Newgarth a legítima defesa não estava prevista numa lei expressa, era uma criação jurisprudencial; terceiro aqui no Brasil é possível interpretar que esta situação hipotética seria enquadrada numa excludente de ilicitude prevista expressamente no Código Penal; e, neste caso, não seria exatamente a legítima defesa, mas o estado de necessidade.
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