PARECER JURÍDICO
Por: Soyô Gaming • 24/4/2018 • Tese • 2.161 Palavras (9 Páginas) • 404 Visualizações
PARECER JURÍDICO
MULTA CONDOMINIAL – PERTURBAÇÃO DE SOSSEGO ALHEIO – VIOLAÇÃO ARTS. 57 E 58 DO ESTATUTO DO CONDOMÍNIO – INAPLICABILIDADE IN CASU – AUSENTE FUNDAMENTAÇÃO.
SOLICITANTE: LUIS LARGMAN
SOLICITADO: JOÃO OTÁVIO DE LIMA - ADVOGADO OAB/PR – 91.470
Ao condomínio,
RELATÓRIO
Trata-se de o expediente de uma consulta realizada com o solicitante para o fim de discutir a aplicabilidade dos arts. 57 e 58, do Estatuto do Condomínio Residencial Portinari à sua pessoa, em virtude de perturbação ao sossego alheio suposto em documento redigido pelo condomínio sustentando a necessidade da multa prevista nos referidos dispositivos.
Estudada a matéria, passo a opinar.
FUNDAMENTAÇÃO
1. DO ESTATUTO
A primeira questão a que se diz respeito é o teor dos dois dispositivos anteriormente mencionados: arts. 57 e 58 do Estatuto do condomínio em questão. O primeiro artigo faz menção apenas à penalidade da qual todos os condôminos estão sujeitos caso descumpram alguma norma redigida no referido instrumento. O segundo, por sua vez, enumera algumas hipóteses que podem servir de fundamento para aplicar a sanção prevista no artigo anterior, conforme dispõe:
“Art. 58. O Associado que não der à sua fração ideal, ou seja, ao seu lote, a mesma destinação para o qual foi idealizada o loteamento ASSOCIAÇÃO PARQUE RESIDENCIAL PORTINARI, que é puramente residencial (1), ou ainda não utilizar de maneira a respeitar o sossego (2), a segurança dos demais associados, bem como à salubridade do Loteamento (3), ou ainda em desrespeito à moral e aos bons costumes (4), além do desfazimento da obra, no caso da primeira hipótese (2), ficará ainda, quer naquela quer nestas, obrigado a pagar Multa no valor equivalente a 10 (dez) vezes o valor de suas contribuições mensais, além das perdas e danos (5) que se apurarem. Esta multa poderá ser aplicada diretamente pelo Presidente, independentemente de decisão em assembleia, nos termos da resolução interna da Associação (6).
- A primeira hipótese diz respeito à função exclusivamente residencial que a propriedade deve exercer dentro das dependências do condomínio;
- Que essa função não desrespeite o sossego dos demais associados e se, eventualmente uma “obra” – da qual não fora especificada a sua natureza – também prejudique o sossego dos moradores, deve ser desfeita;
- Tampouco coloque em risco a saúde e a segurança dos outros condôminos;
- Que respeite a moral e aos bons costumes.
- A segunda hipótese trazida pelo dispositivo em questão, impõe uma sanção pecuniária equivalente a dez prestações mensais do condomínio, cumulado com perdas e danos, se houver;
- Que essa sanção será aplicada pelo Presidente, independentemente de abertura de assembleia – que tacitamente faz menção ao art. 27, “e”, do Estatuto.
Ante o exposto, levanta-se o questionamento sobre o que, de fato, poderia ser considerado “perturbação de sossego alheio” arguido no referido dispositivo. Para tanto, tem-se o conceito expresso no art. 42, da Lei de Contravenções Penais, aqui usado de maneira análoga:
“Art. 42. Perturbar alguém o trabalho ou o sossego alheio:
I. com gritaria ou algazarra;
II. exercendo profissão incômoda ou ruidosa, em desacordo com as prescrições legais;
III. abusando de instrumentos sonoros ou sinais acústicos;
IV. provocando ou não procurando impedir barulho produzido por animal de que tem a guarda”
Dessa forma, em analogia ao conteúdo de “perturbação de sossego alheio” acima descrito, ao que interessa ao disposto no Estatuto do condomínio e ao teor veementemente destacado no comunicado expedido ao solicitante, contido nas duas primeiras partes do referido art. 58, explica-se:
- Doutrinariamente, entende-se como “gritaria” um conjunto de gritos sucessivos e misturados emitidos pela voz humana, em tom alto e com esforço, de modo que se possa ouvir de longe;
- Por sua vez, considera-se “abuso de instrumentos sonoros ou sinais acústicos” atos praticados pelo seu mau uso, excessivo ou injusto, pelos quais se torne impraticável demais convivências aos arredores do local;
- Ao final, ipsis litteris, não repelir barulho de animal de que tem a guarda.
2. DO CASO APRESENTADO
Procurado pelo solicitante, este me informou que havia sido multado pelo condomínio sob a alegação de perturbação de sossego alheio, violando a disposição dos arts. 57 e 58 do seu Estatuto.
Sabe-se, entretanto, que o motivo para esta autuação se estende a uma confraternização realizada pela filha do solicitante no dia em questão, com início por volta das dezesseis horas, estando presente alguns convidados que conjuntamente comemoravam o encerramento da etapa escolar. Havia o uso moderado de aparelhos de som, com música ambiente e que, naturalmente, não ultrapassava a limítrofe das propriedades vizinhas.
Todavia, pouco depois das dezessete horas o vizinho mais próximo adentrou-se a casa do solicitante, com humor visivelmente alterado e de maneira grosseira ordenou que o evento cessasse imediatamente, argumentando que estava deveras incomodado com o barulho. Educadamente um dos presentes abaixou o volume do aparelho de som e em consenso com os demais, buscaram amenizar o incômodo mesmo sem ter plena compreensão do que se tratava, pois tão logo o referido vizinho chegou, a esposa do solicitante telefonou à portaria inquerindo se alguém havia reclamado do evento anteriormente, recebendo, de plano, uma resposta negativa.
O fato é que assim que o vizinho deixou o local, imediatamente dirigiu-se a portaria para registrar uma reclamação e exigir que o condomínio multasse o solicitante pela realização da referida confraternização.
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Conforme visto acima, para que a multa determinada no Estatuto do condomínio encontre a possibilidade de ser aplicada, se faz necessário um exame da situação em questão para o fim de apurar se ela viola, ou não viola, os dispositivos que repelem a perturbação de sossego.
Entende-se, todavia, que essa conduta não deve ser tratada de maneira subjetiva e sob conceito único. A perturbação de sossego alheio é um incômodo que repercute à uma coletividade, sob a compreensão do homem médio e não de uma pessoa sob a sua singularidade.
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