PARIDADE NORMATIVA ENTRE TRATADOS INTERNACIONAIS COMUNS (PÚBLICO E PRIVADO) E DIREITOS HUMANOS EM CASO DE CONFLITO EM DIREITO INTERNO
Por: Scheilla Christiano • 12/6/2017 • Trabalho acadêmico • 3.739 Palavras (15 Páginas) • 701 Visualizações
1 ORIGEM DOS DIREITOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS
Criado em resposta as barbáries cometidas no nazismo, surge no século XX o direito internacional de direitos humanos, após a Segunda Guerra Mundial, com fim de reconstruir os valores dos direitos humanos. O Direito Internacional dos Direitos Humanos é norma criada para por em prática esta entendimento e gerar o respeito dos direitos humanos em todos os países, no âmbito mundial.
Neste contexto, surge, em 1945, a Organização das Nações Unidas. E após, em 1948 é adotada a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
A Declaração Universal de Direitos Humanos, embora não seja teoricamente um tratado internacional é um legado que serve como fonte para todos os tratados internacionais de direitos humanos.
No decorrer do século XX, vários tratados de direitos humanos foram promulgados pelo mundo, no entanto, no Brasil, em 1989, já sob a égide da atual Constituição Federal, é que houve a ratificação do primeiro tratado de direitos humanos, a Convenção contra a tortura e outros tratamentos cruéis, desumanos e degradantes. A partir de então vários outros Tratados Internacionais de Direitos Humanos foram ratificados pelo Brasil.
2 HIERARQUIA NORMATIVA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS ANTES DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004
Nas Constituições francesa, grega e peruana os tratados prevalecem sobre o direito interno infraconstitucional, o que garante sua plena vigência, independentemente de leis internas posteriores que o contradigam.
Os tratados internacionais de direitos humanos, assim como os demais, no Brasil eram considerados pela doutrina e jurisprudência como lei ordinária, conforme posicionamento confirmado pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 1480-DF e no HC 72.131-RJ.
3 HIERARQUIA NORMATIVA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS APÓS A EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 45/2004
Após a Emenda Constitucional nº 45/2004, que incluiu o § 3º no artigo 5º da Constituição Federal, conferindo aos tratados de direitos humanos status de emenda constitucional, caso fossem aprovados com quórum especial de emenda.
Contudo, a referida emenda gerou a dúvida referente aos tratados de direitos humanos já aprovados antes da referida emenda. Bem como, a dúvida em relação aos conflitos entre tratados de direitos humanos aprovados na forma do artigo 5º, § 3º da Constituição Federal e normas internas anteriormente já inseridas no ordenamento jurídico brasileiro.
O STF já decidiu de três formas diferentes:
- Equiparando os tratados de direitos humanos à lei ordinária;
- Considerando os tratados de direitos humanos como norma supralegal;
- Equiparando os tratados de direitos humanos à Constituição Federal.
O entendimento majoritário, considerando os tratados de direitos humanos como norma supralegal, pode ser visto no Recurso Extraordinário 466.343 de dezembro de 2008.
Contudo no Habeas Corpus 87.858-8/TO, de 26 de junho de 2009, podemos visualizar o entendimento minoritário equiparando os tratados de direitos humanos à Constituição Federal, ou seja, materialmente constitucionais.
4 DECISÕES JUDICIAIS
4.1 ADI 1480-DF
Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada com o objetivo de questionar a validade jurídico-constitucional do Decreto Legislativo nº 68/92, que aprovou a Convenção nº 158 da Organização Internacional do Trabalho (O.I.T.), e do Decreto nº 1.855/96, que promulgou esse mesmo ato de direito internacional público.O Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao deferir, parcialmente, sem redução de texto, o pedido de medida cautelar, proferiu decisão que restou consubstanciada em acórdão assim do:"AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE - CONVENÇÃO Nº 158/OIT - PROTEÇÃO DO TRABALHADOR CONTRA A DESPEDIDA ARBITRÁRIA OU SEM JUSTA CAUSA - ARGÜIÇÃO DE ILEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DOS ATOS QUE INCORPORARAM ESSA CONVENÇÃO INTERNACIONAL AO DIREITO POSITIVO INTERNO DO BRASIL (DECRETO LEGISLATIVO Nº 68/92 E DECRETO Nº 1.855/96)- POSSIBILIDADE DE CONTROLE ABSTRATO DE CONSTITUCIONALIDADE DE TRATADOS OU CONVENÇÕES INTERNACIONAIS EM FACE DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA - ALEGADA TRANSGRESSÃO AO ART. 7º, I, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA E AO ART. 10, I DO ADCT/88 - REGULAMENTAÇÃO NORMATIVA DA PROTEÇÃO CONTRA A DESPEDIDA ARBITRÁRIA OU SEM JUSTA CAUSA, POSTA SOB RESERVA CONSTITUCIONAL DE LEI COMPLEMENTAR - CONSEQÜENTE IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DE TRATADO OU CONVENÇÃO INTERNACIONAL ATUAR COMO SUCEDÂNEO DA LEI COMPLEMENTAR EXIGIDA PELA CONSTITUIÇÃO (CF, ART. 7º, I)- CONSAGRAÇÃO CONSTITUCIONAL DA GARANTIA DE INDENIZAÇÃO COMPENSATÓRIA COMO EXPRESSÃO DA REAÇÃO ESTATAL À DEMISSÃO ARBITRÁRIA DO TRABALHADOR (CF, ART. 7º, I, C/C O ART. 10, I DO ADCT/88)- CONTEÚDO PROGRAMÁTICO DA CONVENÇÃO Nº 158/OIT, CUJA APLICABILIDADE DEPENDE DA AÇÃO NORMATIVA DO LEGISLADOR INTERNO DE CADA PAÍS - POSSIBILIDADE DE ADEQUAÇÃO DAS DIRETRIZES CONSTANTES DA CONVENÇÃO Nº 158/OIT ÀS EXIGÊNCIAS FORMAIS E MATERIAIS DO ESTATUTO CONSTITUCIONAL BRASILEIRO - PEDIDO DE MEDIDA CAUTELAR DEFERIDO, EM PARTE, MEDIANTE INTERPRETAÇÃO CONFORME À CONSTITUIÇÃO.PROCEDIMENTO CONSTITUCIONAL DE INCORPORAÇÃO DOS TRATADOS OU CONVENÇÕES INTERNACIONAIS.- É na Constituição da República - e não na controvérsia doutrinária que antagoniza monistas e dualistas - que se deve buscar a solução normativa para a questão da incorporação dos atos internacionais ao sistema de direito positivo interno brasileiro.O exame da vigente Constituição Federal permite constatar que a execução dos tratados internacionais e a sua incorporação à ordem jurídica interna decorrem, no sistema adotado pelo Brasil, de um ato subjetivamente complexo, resultante da conjugação de duas vontades homogêneas: a do Congresso Nacional, que resolve, definitivamente, mediante decreto legislativo, sobre tratados, acordos ou atos internacionais (CF, art. 49, I) e a do Presidente da República, que, além de poder celebrar esses atos de direito internacional (CF, art. 84, VIII), também dispõe - enquanto Chefe de Estado que é - da competência para promulgá-los mediante decreto.O iter procedimental de incorporação dos tratados internacionais - superadas as fases prévias da celebração da convenção internacional, de sua aprovação congressional e da ratificação pelo Chefe de Estado - conclui-se com a expedição, pelo Presidente da República, de decreto, de cuja edição derivam três efeitos básicos que lhe são inerentes: (a) a promulgação do tratado internacional; (b) a publicação oficial de seu texto; e (c) a executoriedade do ato internacional, que passa, então, e somente então, a vincular e a obrigar no plano do direito positivo interno. Precedentes.SUBORDINAÇÃO NORMATIVA DOS TRATADOS INTERNACIONAIS À CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.- No sistema jurídico brasileiro, os tratados ou convenções internacionais estão hierarquicamente subordinados à autoridade normativa da Constituição da República. Em conseqüência, nenhum valor jurídico terão os tratados internacionais, que, incorporados ao sistema de direito positivo interno, transgredirem, formal ou materialmente, o texto da Carta Política.O exercício do treaty-making power, pelo Estado brasileiro - não obstante o polêmico art. 46 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados (ainda em curso de tramitação perante o Congresso Nacional) -, está sujeito à necessária observância das limitações jurídicas impostas pelo texto constitucional.CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE DE TRATADOS INTERNACIONAIS NO SISTEMA JURÍDICO BRASILEIRO.- O Poder Judiciário - fundado na supremacia da Constituição da República - dispõe de competência, para, quer em sede de fiscalização abstrata, quer no âmbito do controle difuso, efetuar o exame de constitucionalidade dos tratados ou convenções internacionais já incorporados ao sistema de direito positivo interno. Doutrina e Jurisprudência.PARIDADE NORMATIVA ENTRE ATOS INTERNACIONAIS E NORMAS INFRACONSTITUCIONAIS DE DIREITO INTERNO.- Os tratados ou convenções internacionais, uma vez regularmente incorporados ao direito interno, situam-se, no sistema jurídico brasileiro, nos mesmos planos de validade, de eficácia e de autoridade em que se posicionam as leis ordinárias, havendo, em conseqüência, entre estas e os atos de direito internacional público, mera relação de paridade normativa. Precedentes.No sistema jurídico brasileiro, os atos internacionais não dispõem de primazia hierárquica sobre as normas de direito interno. A eventual precedência dos tratados ou convenções internacionais sobre as regras infraconstitucionais de direito interno somente se justificará quando a situação de antinomia com o ordenamento doméstico impuser, para a solução do conflito, a aplicação alternativa do critério cronológico (" lex posterior derogat priori ") ou, quando cabível, do critério da especialidade. Precedentes.TRATADO INTERNACIONAL E RESERVA CONSTITUCIONAL DE LEI COMPLEMENTAR.- O primado da Constituição, no sistema jurídico brasileiro, é oponível ao princípio pacta sunt servanda, inexistindo, por isso mesmo, no direito positivo nacional, o problema da concorrência entre tratados internacionais e a Lei Fundamental da República, cuja suprema autoridade normativa deverá sempre prevalecer sobre os atos de direito internacional público.Os tratados internacionais celebrados pelo Brasil - ou aos quais o Brasil venha a aderir - não podem, em conseqüência, versar matéria posta sob reserva constitucional de lei complementar. É que, em tal situação, a própria Carta Política subordina o tratamento legislativo de determinado tema ao exclusivo domínio normativo da lei complementar, que não pode ser substituída por qualquer outra espécie normativa infraconstitucional, inclusive pelos atos internacionais já incorporados ao direito positivo interno.LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA CONVENÇÃO Nº 158/OIT, DESDE QUE OBSERVADA A INTERPRETAÇÃO CONFORME FIXADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.- A Convenção nº 158/OIT, além de depender de necessária e ulterior intermediação legislativa para efeito de sua integral aplicabilidade no plano doméstico, configurando, sob tal aspecto, mera proposta de legislação dirigida ao legislador interno, não consagrou, como única conseqüência derivada da ruptura abusiva ou arbitrária do contrato de trabalho, o dever de os Estados-Partes, como o Brasil, instituírem, em sua legislação nacional, apenas a garantia da reintegração no emprego. Pelo contrário, a Convenção nº 158/OIT expressamente permite a cada Estado-Parte (Artigo 10), que, em função de seu próprio ordenamento positivo interno, opte pela solução normativa que se revelar mais consentânea e compatível com a legislação e a prática nacionais, adotando, em conseqüência, sempre com estrita observância do estatuto fundamental de cada País (a Constituição brasileira, no caso), a fórmula da reintegração no emprego e/ou da indenização compensatória. Análise de cada um dos Artigos impugnados da Convenção nº 158/OIT (Artigos 4º a 10)."(ADI 1.480-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno) Acentue-se, por oportuno, que, em 20 de dezembro de 1996, o Estado brasileiro, por intermédio do Presidente da República, que agiu em sua condição de Chefe de Estado, denunciou a mencionada Convenção nº 158/OIT.Essa denúncia - que se tornou efetiva um ano após o seu registro junto à O.I.T., consoante previsto no Artigo 17, n. 1, da própria Convenção nº 158 - consubstanciou-se, formalmente, no Decreto nº 2.100, de 20/12/96, cujo teor é o seguinte:"O PRESIDENTE DA REPÚBLICA torna público que deixará de vigorar para o Brasil, a partir de 20 de novembro de 1997, a Convenção da OIT nº 158, relativa ao Término da Relação de Trabalho por Iniciativa do Empregador, adotada em Genébra, em 22 de junho de 1982, visto haver sido denunciada por Nota do Governo brasileiro à Organização Internacional do Trabalho, tendo sido a denúncia registrada, por esta última, a 20 de novembro de 1996."(grifei) Isso significa que, já decorrido o lapso temporal de 1 (um) ano - e revelando-se plenamente eficaz, desse modo, o ato unilateral da denúncia - cessou,"tractu temporis", quanto ao Estado brasileiro, a vigência da mencionada convenção internacional.Na realidade, consoante enfatiza autorizado magistério doutrinário (LUIZ P. F. DE FARO JUNIOR,"Direito Internacional Público", p. 352, item n. 829, 4ª ed., 1965, Borsoi; HILDEBRANDO ACCIOLY/GERALDO EULÁLIO DO NASCIMENTO E SILVA, "Manual de Direito Internacional Público", p. 34, 12ª ed., 1996, Saraiva; CELSO D. DE ALBUQUERQUE MELLO, "Os Tratados na Constituição" in "As Tendências Atuais do Direito Público - Estudos em homenagem ao Prof. AFONSO ARINOS", p. 138, 1976, Forense; JOSÉ FRANCISCO REZEK, "Direito dos Tratados", p. 485, item n. 405, 1984, Forense), a denúncia - enquanto manifestação soberana do Estado que a formula - qualifica-se, quanto à Alta Parte de que emana, como causa extintiva do tratado ou convenção internacional.Ve-se, portanto, que a Convenção nº 158/OIT não mais se acha incorporada ao sistema de direito positivo interno brasileiro, eis que, com a denúncia dessa convenção internacional, registrada, junto à O.I.T., em 1996, operou-se, quanto ao Brasil, a própria extinção do referido ato de direito internacional público, o que importa - considerada a integral cessação de sua eficácia - em situação configuradora de perda superveniente do objeto da presente ação direta de inconstitucionalidade.Não custa enfatizar, neste ponto, que, em decorrência do referido ato de denúncia, deixou de existir o próprio objeto sobre o qual incidiram os atos estatais - Decreto Legislativo nº 68/92 e Decreto nº 1.855/96 - questionados nesta sede de controle concentrado de constitucionalidade, não mais se justificando, por isso mesmo, a subsistência deste processo de fiscalização abstrata, independentemente da existência, ou não, no caso, de efeitos residuais concretos gerados por aquelas espécies normativas.A situação que vem de ser referida, não obstante a peculiaridade de que se reveste, equipara-se - considerada a cessação da vigência doméstica da Convenção nº 158/OIT - à revogação superveniente de diplomas legislativos ou de atos estatais impugnados em sede de ação direta, fazendo instaurar, por isso mesmo, típica hipótese de prejudicialidade do processo de controle normativo abstrato.Cabe rememorar, por oportuno, a propósito da situação que ora se registra na presente causa, que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, em sucessivas decisões, tem enfatizado que a revogação superveniente dos atos estatais impugnados em ação direta de inconstitucionalidade - à semelhança do que ocorre com o exaurimento da eficácia das normas temporárias - provoca a extinção do processo de controle normativo abstrato, independentemente da existência de efeitos residuais concretos que possam derivar da aplicação dos diplomas questionados (RTJ 154/396, Rel. Min. CELSO DE MELLO - RTJ 154/401, Rel. Min. PAULO BROSSARD - ADI 437-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU de 17/08/94 - ADI 876-RJ, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU de 01/07/93 - ADI 1.063-DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, DJU de 25/06/01):"A revogação superveniente do ato normativo impugnado prejudica a ação direta de inconstitucionalidade, independentemente da existência de efeitos residuais concretos. Esse entendimento jurisprudencial do Supremo Tribunal Federal nada mais reflete senão a própria natureza jurídica do controle normativo abstrato, em cujo âmbito não se discutem situações de caráter concreto ou individual. Precedentes."(RTJ 160/145, Rel. Min. CELSO DE MELLO) Sendo assim, e tendo em consideração as razões expostas, julgo extinto este processo de controle abstrato de constitucionalidade, em virtude da perda superveniente de seu objeto.Arquivem-se os presentes autos.Publique-se.Brasília, 26 de junho de 2001.Ministro CELSO DE MELLO Relator (STF - ADI: 1480 DF, Relator: Min. CELSO DE MELLO, Data de Julgamento: 26/06/2001, Data de Publicação: DJ 08/08/2001 PP-00003)
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