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Aplicação Do CDC Nos Contratos Empresariais

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Por:   •  6/10/2014  •  8.295 Palavras (34 Páginas)  •  495 Visualizações

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Aplicação do Código de Defesa do Consumidor aos contratos bancários

Deltan Martinazzo Dallagnol

Resumo: O artigo analisa a aplicação do CDC aos contratos bancários, partindo da premissa de um direito privado constitucionalizado. Aborda a opinião de diversos autores que defendem a plena aplicação do Código, e que rebatem os poucos argumentos da doutrina contrária. Discorre também sobre a inviabilidade da ADIn n° 2591, que recentemente argüiu no STF a inconstitucionalidade da aplicação do CDC aos contratos bancários.

1. Introdução do tema;

Numa análise rápida, de aparência, dos contratos bancários e do Código de Defesa do Consumidor, pode-se já perceber que os contratos bancários devem se submeter às disposições consumistas cogentes. Aliás, absurda seria interpretação que conduzisse ao oposto, numa área da economia em que se vê tamanha desproporção de forças entre as partes contratantes.

Contudo, as instituições financeiras têm, reiteradamente, demonstrado o propósito e afastar dos contratos bancários a incidência das normas de proteção ao consumidor. Em face das constantes investidas, não é demais, nunca, repisar e tornar a demonstrar o que é até mesmo evidente para a grande maioria da doutrina pátria.

Nisso, não se pretende uma análise que esgote o assunto, mas apenas traçar em linhas gerais as posições da doutrina, inclusive quanto à inconstitucionalidade do Código de Defesa do Consumidor, argüida perante o Supremo Tribunal Federal na ADIn n° 2591.

Cumpre observar que as conclusões de uma abordagem científica dependem, em muito, das premissas do trabalho, que não podem ser outras que não a constitucionalização e repersonalização do Direito Privado.

2. Premissas: constitucionalização e repersonalização do Direito Privado;

Os fenômenos tão propagados por civilistas de vanguarda, da fragmentação e constitucionalização do Direito Civil, alcançam todo o direito privado, embora nos ramos comercial e bancário os autores não tenham dado tanto relevo ao assunto. O Direito Privado hoje está fragmentado, e a sua unidade e coerência conduzem à Constituição, base de sua validade e fundamento de sua interpretação.

Luiz Edson Fachin[1] destaca que a Constituição Federal de 1.988 operou uma inversão ao erigir como fundamento da República a dignidade da pessoa humana, impondo ao Direito Privado o abandono da postura patrimonialista herdada do século XIX e na qual se inspirou o Código Civil pátrio. Nessa repersonalização se submete o patrimônio à pessoa: aquele se legitima enquanto meio de realização desta.

O novo panorama constitucionalizado do direito privado atingiu em cheio os contratos, como notou Paulo Nalin na sua tese intitulada “Conceito Pós-Moderno de Contrato: em Busca de sua Formulação na Perspectiva Civil-Constitucional”.[2] Destaca o autor a superação do sistema codificado do contrato do Código Civil[3], com seu desenvolvimento teórico assentado no século XIX, baseado na vontade individual dos contratantes, o que não encontra mais ressonância na realidade fática.[4] Nesse sentido, afirma o autor:

“Há de se perseguir um mais amplo favorecimento da pessoa humana nas relações jurídicas e, especialmente, nas contratuais; conforme reafirmado nesta tese, a vontade contratual deixou de ser o núcleo do contrato, cedendo espaço a outros valores jurídicos, institutos, fundados na Carta. O paradigma da autonomia da vontade, em detrimento da tutela da pessoa na sua dimensão contratante, talvez até possa encontrar legitimidade no espaço do Código Civil, pois do homem em si não se ocupa, mas sempre estará em descompasso com a Constituição. Isso é observado com grande destaque nas relações jurídicas contratuais, em que a vontade surge como mero papel de impulso, quando não, completamente inexistente, no âmbito das relações de adesão e do contrato obrigatório, ambas conseqüências da massificação negocial”.[5]

A Constituição Federal de 1988 rompeu com a noção do contrato das obsoletas codificações privadas, operando uma transmutação do significado do comportamento contratual, do individual para o coletivo. A Constituição não é mera diretiva ao legislador, mas norma vinculante que se aplica diretamente nas relações interprivadas e cujo destinatário é também o juiz. E os primeiros artigos da Carta Magna, sem dúvida, elegeram a dignidade da pessoa humana, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e a erradicação da pobreza como valores fundamentais a serem perseguidos.

Não se derrogam os valores patrimoniais. Mas são submetidos aos existenciais. Neste sentido leciona Paulo Nalin, ressaltando a ampla extensão da diretriz constitucional:

“A aplicação do comando constitucional não está a depender desta ou daquela localização do contrato, neste ou naquele ordenamento infraconstitucional. Seja de consumo, civil ou comercial, a relação de crédito sempre estará nucleada no seu titular e não no crédito. O homem[6], ao menos enquanto perdurar o comando expresso do art. 1°, inc. III, associado ao art. 170, caput [7], todos da Carta, se posiciona no centro das atenções. A leitura do contrato, assim vista, não ignora sua função econômica[8], mas antes de se averiguar da realização da causa (econômica) do contrato, terá que se indagar se aquela relação em apreço levou em conta a dignidade dos contratantes. A interpretação constitucional do contrato transita do ter para o ser”.[9]

Todo esforço na abordagem dos temas do Direito Privado deve conter, pois, um esforço pela despatrimonialização e repersonalização dos diplomas sob exame, em consonância com o que estatuem os arts. 1o, 3o e 170, caput, da Constituição Federal.

A própria Constituição Federal já previu a defesa do consumidor, em seu art. 5°, XXXII, o qual determina que “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor”. De tão grande a importância dessa defesa, o poder constituinte originário determinou, no art. 48 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, urgência na elaboração do Código de Defesa do Consumidor.

A proteção a que se refere o art. 5° da Constituição deve ser interpretada em conjunto com o art. 1°, III, 170, caput, e com a função social do contrato. Na tutela do consumidor o que a Constituição quer tutelar é a dignidade da pessoa do consumidor, e não diretamente seu patrimônio, que é tutelado reflexamente.

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