Apontamentos sobre um projeto de reforma da metafisica
Por: ddddd13 • 31/8/2019 • Trabalho acadêmico • 4.892 Palavras (20 Páginas) • 191 Visualizações
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA
História da Filosofia Moderna II
Prof. Dr. Paulo Roberto Licht dos Santos
Dailson Dias de Lima RA:753000
Apontamentos sobre um projeto de Crítica da Razão Pura
“A analítica transcendental alcançou, pois, o importante resultado de mostrar que o entendimento nunca pode a priori conceder mais que a antecipação da forma de uma experiência possível em geral e que, não podendo ser objeto da experiência o que não é fenômeno, o entendimento nunca pode ultrapassar os limites da sensibilidade, no interior dos quais unicamente nos podem ser dados objetos. As suas proposições fundamentais são apenas princípios da exposição dos fenômenos e o orgulhoso nome de ontologia, que se arroga a pretensão de oferecer, em doutrina sistemática, conhecimentos sintéticos a priori das coisas em si (por ex. o princípio da causalidade) tem de ser substituída pela mais modesta denominação de simples analítica do entendimento puro.” (KANT, 2001)
A partir do excerto exposto e das leituras feitas ao longo do semestre, a presente investigação tem o objetivo de esclarecer a implicação que o resultado da analítica transcendental trouxe para a primeira parte da Metafísica [Ontologia], a saber “As suas proposições fundamentais são apenas princípios da exposição dos fenômenos” (KANT, 2001).
Em última instância a investigação a ser feita tentará esclarecer os limites que o entendimento encontra em relação a experiência a partir das consequências de uma “simples analítica do entendimento puro” (KANT, 2001) e qual a implicação disso para o projeto do Filósofo de Königsberg de uma Crítica da Razão Pura.
***
O problema da representação
Kant envia ao seu amigo Marcus Herz, em 1772, uma carta onde anuncia pela primeira vez o seu projeto de uma crítica da razão pura, que na época tinha o segundo título: Os limites da sensibilidade e da razão.
Nessa carta, o Filósofo compartilha com o amigo a informação sobre a descoberta de um problema:
“Ao refletir sobre a parte teórica em //10:130// toda a sua extensão, com as relações recíprocas de todas as partes, notei que ainda me faltava algo essencial, que eu, como outros, havia deixado de considerar em minhas longas investigações metafísicas e que constitui, na verdade, a chave de todo o segredo da metafísica, até então ainda oculto a ela própria.”[1]
A questão que é evidenciada pela Carta, e que data do início da História da Filosofia, com Platão e Aristóteles, refere-se à própria relação da representação do sujeito com o objeto, da seguinte forma descrita: “Perguntei a mim mesmo: sobre que fundamento repousa a relação entre o que se chama representação em nós e o objeto?”[2]
O pensamento filosófico que precedeu Kant respondeu ao problema da representação através do racionalismo ou do empirismo, ou seja, a questão, como foi colocada pelo Filósofo, já pressupõe uma forma de solução que lhe será peculiar, que será radicalmente diferente de tudo o que se especulou até então sobre o conhecimento. De acordo com Licht dos Santos: “A carta a Herz marcaria, então, o momento decisivo em que Kant, ao pôr em questão o uso real do entendimento, abriria o caminho para a reformulação da doutrina do entendimento e para a subsequente limitação crítica das categorias ao uso empírico.”[3]
O problema da representação tem relação direta com objetivo de Kant, que é averiguar a possibilidade da metafísica como ciência. Daí a importância de a solução encontrada estabelecer as condições nas quais seja possível um conhecimento objetivo das coisas, justamente aquele que, segundo Kant, os metafísicos ignoraram até então, e do qual dependem todas as demais ciências. O objetivo do Filósofo, portanto, será o de mudar a perspectiva de se tratar o problema do conhecimento, o que resultará na assim chamada revolução copernicana.
***
Uma revolução no modo de pensar
Kant tem um projeto cujo o objetivo é reformar a metafísica, de fundamentar o conhecimento em nível transcendental, ou seja, independente da experiência:
“O destino não foi até hoje tão favorável que permitisse trilhar o caminho seguro da ciência à metafísica, conhecimento especulativo da razão completamente à parte e que se eleva inteiramente acima das lições da experiência, mediante simples conceitos (não, como a matemática, aplicando os conceitos à intuição), devendo, portanto, a razão ser discípula de si própria; é, porém, a mais antiga de todas as ciências e subsistiria mesmo que as restantes fossem totalmente subvertidas pela voragem de uma barbárie, que tudo aniquilasse.”[4]
A metafísica nunca teve a mesma legitimidade que a matemática, a lógica e a física, pois é a mais antiga das ciências e se analisarmos a sua história, verificaremos que a metafísica sempre teve de retornar aos seus fundamentos e começar tudo de novo. Nunca houve um consenso entre os metafísicos sobre quais os métodos aplicar e objetos estudar.
“Se se quiser apresentar um conhecimento como ciência, importa, primeiro, poder determinar exactamente o seu carácter distintivo, o que ele não tem de comum com mais nenhum e o que, portanto, lhe é peculiar; de outro modo, os limites de todas as ciências confundem-se e nenhuma delas pode ser tratada a fundo, segundo a sua natureza.
Que esta peculiaridade consista na diferença de objecto, ou das fontes de conhecimento, ou ainda do modo de conhecimento, de algumas ou de todas estas coisas, é sobre ela que se funda acima de tudo a ideia da ciência possível e do seu domínio.”[5]
Um ponto central do projeto kantiano é o de que se a razão quer responder perguntas sobre a metafísica – ou quaisquer objetos que ultrapassem os limites a experiência – ela não pode mais recorrer a uma realidade externa, mas tem de ser aluna de si mesma, isto é, procurar as respostas nela mesma, nesse sentido é uma crítica da razão pela própria razão. A metafísica é, pois, o saber primeiro e mais importante da razão, é uma condição natural da razão procurar respostas sobre coisas que estão pra além de sua compreensão, que estão pra além dos limites da experiência. Entretanto, surge um problema, porque se é o saber próprio da razão, como pode essa mesma metafísica não ter tido até o momento um único conhecimento certo? Desde quando se falou em metafísica pela primeira vez não houve avanço algum. Segundo Kant:
...