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OS ANORMAIS DE MICHEL FOUCAULT

Por:   •  14/11/2015  •  Resenha  •  2.543 Palavras (11 Páginas)  •  2.073 Visualizações

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Os anormais FOUCAULT, Michel. São Paulo: Martins Fontes, 2001 Curso no collège de France (1974-1975)

Em 1530, o erudito e tradutor de obras antigas, Guillaume Bude, sugere ao então vigente rei Francisco I, que seria conveniente criar um colégio em paris que atendesse às disciplinas até então não atendidas pela Universidade de Paris. Este colégio traria com ele humanistas que ficariam responsáveis por trabalhar e ministrar tais disciplinas a fim de trazê-las para o enriquecimento intelectual parisiense. Em resposta aos anseios de Bude é fundado no ano de 1550 o Collège Royal , que passa por tranformações de cunho anquitetônico e nomeal, assumindo seu atual nome, Collège de France , em 1870. Desde sua construção em 1550, seria referência para tal enriquecimento intelectual francês. Exatamente um século após sua última renomeação, no ano de 1970, o então collège de France recebe em sua cátedra recém-criada de História dos Sistemas de Pensamento, o professor Michel Foucault (1926-1984) em sucessão a Jean Hyppolite. Como de costume da instituição, o professor responsável pela cátedra deve oferecer um curso anual no qual exponha semanalmente seminários sobre suas pesquisas. Entre os anos de 1971 e 1984, Foucault ofereceu treze cursos no Collège de France, entre eles: Teorias e Instituições Penais (1972), A Sociedade Punitiva (1973), O Poder Psiquiátrico (1974) e Os

Anormais (1975). Sendo a terceira parte deste último o objeto desta redação. O Livro Os Anormais consiste nas onze aulas ministradas por Foucault entre 1974 e 1975 em forma de curso. O Curso apresenta uma reconstrução genealógica do conceito de anormal. Foucault perpassa essa reconstrução histórica apresentando elementos que definem as personagens antecedentes ao anormal, a raridade ou frequência de aplicação à noção que corresponde a essa anormalidade. A primeira aula do curso inicia pela função do exame psiquiátrico de imputabilidade penal, uma prática discursiva que sobrepõe a medicina mental e o direito penal tornando ambos alheios às suas próprias regras específicas, ao mesmo tempo, matando e produzindo novas verdades. Na segunda aula, Foucault trabalha a relação ambígua entre a Medicina e o Direito no que diz respeito da sanidade mental na criminalidade. E, por fim, na terceira aula, nos são apresentadas as três figuras que Foucault usa para problematizar o conceito histórico de anormalidade: o monstro humano, o indivíduo a ser corrigido e a criança masturbadora. Segundo o autor:

"Esses três elementos começam a se isolar, a se definir, a partir do século XVIII e eles fazem a articulação com o século XIX, introduzindo esse domínio da anomalia que, pouco a pouco, vai redescobrí-los, confiscá-los, de certo modo colonizá-los, a ponto de absorve-los" (2001, p.69). O contexto de referência da primeira das três figuras expostas, o monstro humano, é a lei, afirma Foucault. No entanto a noção de monstro é uma noção jurídica, no sentido lato do termo, "pois quem define o monstro é o fato de que ele constitui, em sua existência mesma e em sua forma, não apenas uma violação das leis da sociedade, mas uma violação das leis da natureza. Ele é, num registro duplo, inflação às leis em sua existência mesma." (2001, p.69). Portanto o surgimento do monstro pode ser entendido como um

fenômeno duplo. E, também, é uma fenômeno raro, pois na medida que é extremo é extremamente raro. É o que combina o impossível com o proibido. Segundo Foucault, paradoxalmente há no monstro também, um princípio de inteligibilidade; inteligibilidade essa propriamente tautológica, "pois é precisamente uma propriedade do monstro afirmar-se como monstro, explicar em si mesmo todos os desvios que podem derivar dele, mas ser em si mesmo ininteligível." (2001, p.71). A segunda figura a ser exposta, o individuo a ser corrigido, diferentemente do monstro, tem sua taxa de incidência e de frequência bem mais alta. O monstro é uma exceção; já "o indivíduo a ser corrigido é uma fenômeno corrente. É um fenômeno tão corrente que apresenta - e é esse o seu primeiro paradoxo - a característica de ser, de certo modo, regular na sua irregularidade." (2001, p. 72). E o contexto de referência deste individuo a ser corrigido é mais limitado: a família. No exercício interno de sua economia ou no máximo com suas relações institucionais. Nas palavras de Foucault: "(..) é a família mesma, no exercício de seu poder interno ou na gestão de sua economia; ou, no máximo, é a família em sua relação com as instituições que lhe são vizinhas ou que a apoiam. O indivíduo a ser corrigido vai aparecer nesse jogo, nesse conflito, nesse sistema de apoio que existe entre a família e, depois, a escola, a oficina, a rua, o bairro, a paróquia, a igreja, a polícia, etc. Esse contexto, portanto, é que é o campo de aparecimento do indivíduo a ser corrigido." (2001, p. 72) A partir dessa colocação, Foucault problematiza eventuais contradições que a figura do indivíduo a ser corrigido carrega em si. Uma delas seria que esse individuo se encontra no exato limite da indizibilidade: na medida que é frequente e se encontra imediatamente próximo a regra, sempre vai ser difícil determiná-lo, na medida que não há provas a dar, nunca se pode fazer exata demonstração que este indivíduo é um "incorrigível". Uma segunda contradição seria a incorrigibilidade deste indivíduo a ser corrigido.

O contexto de referência da terceira figura, o masturbador ou anonista ou a criança masturbadora, seria também a família. No entanto, se torna mais estreito, se torna mais restrito "[...] é o quarto, a cama, o corpo; são os pais, os tomadores de conta imediato, os irmãos e irmãs; é o médico - toda uma espécie de microcélula em torno do indivíduo e do seu corpo" (2001, p. 74). Essa figura do onanista que aparece no final do século XVIII apresenta uma repressão coercitiva um tanto intrigante. "Sendo o mal que todos praticam ou o segredo universal, o segredo compartilhado por todo mundo, mas que ninguém comunica a ninguém" é colocado quase que universalmente como a raiz possível de todos os males. Os médicos do XVIII vão vincular quase todas as formas de doenças corporais, nervosas e, até mesmo, psíquicas à prática do onanista. Esta figura, segundo Foucault, que tem seu desenvolvimento mais modesto que as demais, acaba por tomar, no final do XIX, uma importância maior e até encobrindo-as, quando não se comunicando. Pois, segundo o Filósofo, mesmo partindo de movimentos distintos, as três figuras acabam por se comunicarem em algum momento. Um exemplo seria a figura do monstro sexual, que seria a comunicação entre o monstro e o onanista.

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