Trabalho de Filosofia Geral

FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

FLÁVIA LOURENÇO MIYANO

CIDADANIA E JUSTIÇA SOCIAL NO PROCESSO DE CONSOLIDAÇÃO DA DEMOCRACIA

São Paulo, 2015

FLÁVIA LOURENÇO MIYANO

n.º USP 857 8931

CIDADANIA E JUSTIÇA SOCIAL NO PROCESSO DE CONSOLIDAÇÃO DA DEMOCRACIA

Trabalho de recuperação da disciplina Filosofia Geral I

Filosofia Geral I – FLF0116

Primeiro semestre de 2015

Prof. Ricardo Terra

São Paulo, 2015

1 Introdução

O trabalho a ser apresentado como dissertação de recuperação da disciplina “Filosofia Geral I” pretende discutir a democracia a partir das condições para a sua efetividade. Para tanto, torna-se fundamental discutir o conceito de cidadania, cujo conteúdo se confunde frequentemente com o da democracia e da qual a existência depende intrinsecamente, de maneira que pode se afirmar que a cidadania é o índice da democracia e que não há democracia se não houver cidadãos; e também é de fundamental importância discutir a questão da justiça social enquanto resultado direto de um regime político que se pretende inclusivo e igualitário, mas influenciado por uma série de variantes como a desigualdade social e cultural.

1.1 Origem histórica e o conceito de democracia

Segundo o linguista Antônio Houaiss, democracia é “1.governo do povo, governo em que o povo exerce a soberania; 2.sistema político cujas ações atendem aos interesses populares, 3.governo no qual o povo toma as decisões importantes a respeito das políticas públicas, não de forma ocasional ou circunstancial, mas segundo princípios permanentes de legalidade, 4.sistema político comprometido com a igualdade ou com a distribuição equitativa do poder entre todos os cidadãos, 5.governo que acata a vontade da maioria da população, embora respeitando os direitos e a livre expressão da maioria” (HOUAISS, 2001, p. 935). A partir do exposto, e considerando o elevado conteúdo histórico que envolve o tema, é possível definir democracia como sendo um sistema político de governo que demanda a participação daqueles a quem se dirige o poder; nele, os indivíduos participam ativamente e igualmente, por via direta ou através de representantes eleitos pela maioria por meio do voto, exercendo assim seu poder de escolha, de decisão, seu poder enquanto cidadãos.

Mas no que consistiria, por sua vez, a cidadania? E por que seu conceito está tão atrelado com o conceito de democracia? Impõe-se, em um exame filosófico desses conceitos e daquilo que os compõem, deter-se a examinar essa relação.

1.2 Conceito de cidadania

“A palavra ‘cidadania’ provém do latim civitatem que significa cidade. Isto nos remete a expressão grega polis, cidades-estados antigas; tipo de organização a que é atribuído, pela maioria dos historiadores, o conceito tradicional de cidadania. Nesta fase cidadania se restringia à participação política de determinadas classes sociais. Cidadão era o que morava na cidade e participava de seus negócios” 1.

Até o advento dos estados nacionais, cidadania no seu conceito civil, político e social era algo “uno” e restrito a grupos que compunham a sociedade, mas com o passar do tempo, com a difusão do sufrágio universal ao longo do século XX e a associação de regimes democráticos com economias de mercado, o conceito adquiriu novos contornos até atingir seu conceito moderno atual. É o que irá explicar o sociólogo britânico Thomas H. Marshall, na obra “Cidadania, Classe Social e Status”, de 1950. A compreensão e ampliação do conceito ocorrerá a partir do estudo clássico do autor, que descreveu a extensão dos direitos civis, políticos e sociais para toda a população de uma nação.

1.3 Cidadania em Marshall

Marshall dividiu a cidadania em três elementos principais: direito civil, político e social. A distinção envolve, além de direitos, três conjuntos de instituições nas sociedades modernas: o sistema jurídico, o sistema democrático de governo e o sistema de seguridade social, desenvolvidas a serviço da cidadania, que dessa forma foi ampliada e fortalecida, adquirindo a dimensão civil, depois a dimensão política e, finalmente, a dimensão social, tomando como base a história do desenvolvimento britânico.

Segundo Marshall, cidadania consiste num conjunto de direitos que foram conquistados numa dada ordem cronológica, no desenvolvimento histórico, que se passou a reconhecer como as gerações de direitos. O primeiro desses elementos constitutivos, ou a primeira geração, ocorreu na Inglaterra do século XVIII, com o advento do liberalismo clássico; trata-se dos direitos civis que envolvem as liberdades individuais, como o direito de ir e vir, o direito à vida e à segurança, a igualdade perante a lei e o direito à propriedade. Contemplam-se também nessa primeira geração os direitos políticos que dizem respeito ao sufrágio universal, a participação política, tanto ativa quanto passiva; o direito dos trabalhadores de se associar-se e de estabelecer sindicatos. A segunda geração de direitos diz respeito aos direitos conquistados com as lutas operárias e sindicais ocorridas no século XX, os direitos sociais. São os direitos relacionados ao bem-estar social: como o trabalho, a aposentadoria, o seguro-desemprego, a educação, saúde, como sendo de obrigatória provisão do Estado. A terceira geração de direitos foge da esfera individual, passando à da coletividade, a do povo, humanidade ou nação. Trata-se dos direitos difusos ou coletivos; são eles: direito ao meio ambiente, à paz, à autodeterminação dos povos...Estariam ainda englobados dentro desses direitos os interesses das mulheres, dos idosos, da criança e adolescente e minorias étnicas. Para Marshall é fundamental a existência um suporte institucional do Estado, através de políticas públicas de serviços sociais e educacionais, visto que são as instituições do Estado, como a Justiça Civil, garantindo a igualdade de