Conflito Na Bolívia
Seminário: Conflito Na Bolívia. Pesquise 862.000+ trabalhos acadêmicosPor: lariolinda • 16/10/2014 • Seminário • 2.304 Palavras (10 Páginas) • 270 Visualizações
Apesar do seu pomposo impacto, a nacionalização das reservas de gás natural e petróleo da Bolívia, decretada em maio do ano passado pelo presidente Evo Morales, não foi a primeira do gênero no país. Propostas anteriores de nacionalização, como as lançadas na Revolução de 1952 (provavelmente a única revolução operário-camponesa acontecida na América do Sul), mostram que se trata de um processo quase recorrente na história boliviana. E refletir sobre o tema e sobre os fatos que levaram à derrocada desses processos ajuda a avaliar as possibilidades de êxito desse novo governo que, assim como o de 1952, busca ser revolucionário.
De início, vale lembrar que a ocupação das ex-colônias da América do Sul esteve ligada à exploração dos recursos naturais. No caso da Bolívia, os espanhóis encontraram recursos que logo justificariam a empreitada. As minas de prata andinas, marcadas pelo apogeu e pela decadência do Cerro Rico de Potosí, foram, provavelmente, a principal riqueza explorada pelos espanhóis em terras austrais. Mas não eram as únicas ali disponíveis. Após a independência (1826), o salitre, o estanho, o látex e o petróleo marcariam os ciclos econômicos do primeiro século de vida republicana do país.
Porém, a exploração desses recursos não se desvinculou do padrão vigente no período colonial. Exploradas por empresas diretamente ligadas a setores estrangeiros, responsáveis pela demanda desses recursos, essas atividades abasteciam uma elite demograficamente restrita e com nítida filiação étnica. A elite criolla, formada por gente nascida nas colônias e por descendentes de espanhóis, conservou a hegemonia política e econômica do país, e o conduziu a um sistema excludente, no qual a população indígena e chola (mestiços de classe média baixa) era mantida como mão-de-obra barata ou em sistemas como a pongueaje (prestação de serviços não remunerada, devida pelas comunidades indígenas aos proprietários das terras).
A nota trágica, que consagraria a imagem da Bolívia como país frágil e desagregado, seriam as perdas territoriais. Envolvida em guerras fronteiriças, a Bolívia se viu mutilada em mais de 50% do território que contava à época da independência. Dessas, além da derrota na Guerra do Acre, ao final da qual a Bolívia concordou em ceder o território acreano ao Brasil em troca de compensações econômicas, a mais dramática foi a perda da faixa litorânea para o Chile, na Guerra do Pacífico. Para um país cuja economia se baseava na exploração de recursos naturais voltada para uma demanda externa, a perda do litoral implicou prejuízos que ainda hoje marcam a economia boliviana.
Vocação Mineira,foi essa a Bolívia que ingressou no século XX. Do ponto de vista econômico, a vocação mineira boliviana teria continuidade com a exploração do estanho, na mesma região das esgotadas minas de prata (os departamentos de Oruro e Potosí). Mas, assim como no período anterior, essa exploração estava profundamente ligada aos interesses de uma oligarquia que estendia sua influência a todos os setores da vida boliviana. A "rosca", como viria a ser conhecido esse grupo, era a denominação aplicada inicialmente ao grupo das três maiores empresas exploradoras de estanho - Patiño, Hotschild e Aramayo -, todas, a princípio, de capital boliviano, mas com escritórios sediados na Europa e controladoras de quase 80% do setor. Porém, os tentáculos da "rosca" se prolongavam, em especial, nas esferas políticas, fazendo com que a condução do país se mantivesse de acordo com seus interesses. Nas questões sociais, ficava claro que o ideal do Estado passava pela exclusão, ou até mesmo a eliminação, do indígena. A idéia era que os indígenas seriam os responsáveis pelo "atraso" do país, interna e externamente.
Nesse contexto, o país se veria diante de um novo conflito. A Guerra do Chaco (1932-1935), decretada durante o governo de Daniel Salamanca, oporia Bolívia e Paraguai num conflito deflagrado, a princípio, pelo interesse boliviano no rio Paraguai, como forma de acesso ao Atlântico. Posteriormente, as companhias petrolíferas Standard Oil e Royal Dutch Shell seriam acusadas de insuflar o embate, em razão das prováveis reservas de hidrocarbonetos da região. O resultado foi uma nova derrota boliviana, a perda de dois terços do Gran Chaco, a região de planícies que divide os dois países, e a detonação de um processo de reflexão em âmbito nacional que imporia transformações profundas na trajetória do país.
Por um lado, a derrota lançou questionamentos sobre a soberania do país. Por outro, para o conflito concorreram basicamente indígenas e cholos, uma vez que a oligarquia não mandava seus filhos à guerra. Os relatos do período dão conta de recrutamentos forçados de camponeses indígenas, aqueles mesmos que em outros momentos eram considerados entrave ao desenvolvimento do país.
O processo de reflexão ocorreu em todos os níveis da sociedade. Indígenas retornavam do campo de batalha a suas comunidades trazendo ligações traçadas com setores sindicais urbanos. Além disso, o armamento não foi devolvidow, passando a formar pequenos arsenais de fuzis em posse dessas comunidades. Dessa forma, tinha início uma mobilização no meio rural, que elevou as tensões
entre proprietários de terras e indígenas insurretos.
Os militares se dividiam entre um setor nacionalista, que retornara do campo de batalha desejoso de reformas, e outro ligado às elites, que ainda ansiavam por manter-se no poder. Essa divisão se projetaria num conturbado cenário político, com alternâncias dos dois grupos à frente do Estado. A fase dos militares nacionalistas no governo seria conhecida como o período do "socialismo militar", com abertura política para a participação de indígenas e operários, mas sob forte controle estatal. Porém, a força da "rosca" permanecia, e tais governos terminaram, quase sem exceção, de forma trágica.
A criação da YPFB, o primeiro decreto de nacionalização da história boliviana data desse período. O governo do general David Toro, que governou por pouco mais de um ano, entre 1936 e 1937, expediu duas medidas de extrema importância no período: a criação do Ministério de Minas e Petróleo e da estatal YPFB (Yacimientos Petrolíferos Fiscales de Bolivia) e, posteriormente, a nacionalização das reservas da Standard Oil. A empresa americana havia sido acusada de traição à Bolívia, por haver vendido petróleo boliviano às forças paraguaias durante a guerra.
Mas a tensão e o acirramento dos ânimos marcariam o período com dois acontecimentos trágicos. O presidente German Busch (1937-1939) se suicidaria, acossado por pressões; e o major Gualberto Villaroel
...