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Eu Nunca Lhe Prometi Um Jardim de Rosas

Por:   •  18/10/2021  •  Trabalho acadêmico  •  4.262 Palavras (18 Páginas)  •  177 Visualizações

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“Eu nunca lhe prometi um jardim de rosas...”

O título do livro é algo convidativo, pois se pode pensar em várias questões, várias possibilidades, mas o fato é que “Eu nunca lhe prometi um jardim de rosas” foi uma frase dita algumas vezes, pela médica psiquiatra da personagem Deborah do livro em questão.

A médica, Dra. Fried, foi quem atendeu a paciente que chegou ao hospital psiquiátrico para ser internada por seus pais, por apresentar comprometimento de questões psíquicas. Deborah, que se encontrava com dezesseis anos, já trazia em seu histórico de vida algumas situações clínicas da ordem de uma patologia com sintomas psicóticos.

A Dra. Fried fez uma analogia com esta frase para relatar à Deborah que o mundo não é algo muito fácil de acessar. A Dra. afirma que o mundo não é perfeito, e muito menos um jardim de rosas, e que isto é mentira, dizia à Deborah. Acrescenta ainda que, na verdade, a dificuldade que a garota estava passando naquele momento, não se referia a ela somente, como parte da espécie humana e, sim, a algo inerente à nossa condição humana, já que todos, de um modo ou de outro, enfrentamos as limitações e as vicissitudes da vida, que nos são impostas, no decorrer da nossa existência. A diferença é que, cada um interpreta e elabora essas questões a sua maneira, ao seu modo, já que como algumas pessoas são mais intensas do que outras, acabam, assim, por ter um sofrimento psíquico maior. Com Deborah não era diferente, pois estava sendo internada para se tratar de algo que, supostamente, não ia bem, em relação a sua saúde mental.

A garota carrega, em seu histórico de vida, um sofrimento muito grande, acompanhado de narrativas psicóticas, revelando um mundo altamente conflitante.

A psiquiatra de Deborah, Dra. Fried, ofereceu a ela uma única realidade, que era o desafio da garota ficar boa, o que significava que as duas juntas venceriam esse mal estar, mas que, para isso, Deborah deveria de acordo com suas possiblidades, renunciar a toda vivência com o mundo Yr ao qual ela se submeteu até então, durante suas crises, e se inscrever no mundo da vida real.

Essa doença de Deborah foi uma forma desesperada que encontrou para salvaguardar sua saúde física e mental. Dra. Fried, uma médica psiquiatra com uma vasta experiência em seu currículo, enxergou no meio daquela desorganização mental exacerbada, uma luz no fim do túnel,  ela conseguiu perceber um sintoma de saúde e força em Deborah.

O ser humano é constituído da interação com o ambiente como um todo mas, ao nascer, já traz consigo uma capacidade e um potencial herdados, como uma força vital, isto é, o instinto de sobrevivência para o seu vir-a-ser.

A internação de Deborah foi uma solução encontrada por seus pais, tendo partido, com mais intensidade, de sua mãe, pois seu pai não estava tão seguro disto, e a decisão foi pensada e definida, sobretudo, porque Deborah havia tentado suicídio, o que culminou em fator decisivo para a internação.

A garota, ao chegar ao hospital, já se encontrava no seu mundo paralelo, local que Deborah desenvolvera para se refugiar e se proteger, acreditando que não teria contato com o seu sofrimento, segundo ela mesma relatava, por achar o mundo externo, mentiroso e hostil. Esse mundo de Deborah ficou conhecido como Yr, onde os habitantes, normalmente, eram muito exigentes com ela, punindo-a muitas vezes.

Os habitantes deste mundo criado pelo inconsciente de Deborah eram seres místicos e cósmicos, que se opunham totalmente ao mundo exterior. A garota, tão logo é internada, inicia o seu processo terapêutico, encontrando-se, semanalmente, com sua psiquiatra, Dra. Fried, com quem criou um bom vínculo.

Apesar da garota não se sentir segura com as pessoas com quem convivia, ela depositou confiança na médica, o que é possível observar tendo em vista seus relatos sobre fatos de sua infância, de seu sofrimento psíquico e também sobre o mundo paralelo que ela criou para suportar o mundo real, do qual ela sentia-se uma prisioneira. Apesar da prisão neste mundo paralelo, Deborah se sentia segura, pois se refugiava nele, por acreditar que Yr a defendia da realidade hostil.

Nesta dinâmica, é possível notar a transferência positiva que houve entre as duas, favorecendo sobremaneira, no comportamento de Deborah, levando-a a uma cura possível, para sua existência e sobrevivência na vida, dotada de condições normais de um ser humano normal. Se é que somos todos normais! A transferência, quando estabelecida na relação analítica, é um grande recurso do qual o analista pode lançar mão, no processo terapêutico, para beneficiar seu paciente na sua futura cura.

Deborah tem um diagnóstico de esquizofrenia. O esquizofrênico vive fora da realidade, isto é, não é regido pelo princípio da realidade, que, segundo a psicanálise, acredita que o indivíduo acometido por esquizofrenia vive segundo o princípio do prazer e do narcisismo. Deborah tem alucinações auditivas, que são caracterizadas por vozes de comando, isto é, essas vozes comandam as ações da pessoa. Deborah, durante suas crises, se submetia a “obedecer” às vozes que ouvia internamente, alertando-a sobre as maldades e mentiras do mundo real, o qual ela não conseguia enfrentar.

Alucinações auditivas são vozes que comentam e/ou comandam a ação do paciente. É possível se pensar que Deborah tem a esquizofrenia de forma hebefrênica, que é caracterizada por pensamento desorganizado, com comportamentos bizarros e afeto pueril.

Outras características típicas desse tipo de esquizofrenia estão relacionadas à negligência com os cuidados com si própria, como a higiene, roupas, saúde, além de ter um embotamento afetivo muito acentuado e também o distanciamento social, o que é facilmente observável, uma vez que Deborah não se envolve, afetivamente, com seus pais, não conseguindo se colocar no lugar deles, sentindo o sofrimento pelo quais passam. Deborah apresentava também um distanciamento social, desde pequena, incluindo comportamento avesso às amigas.

A psicanálise pode nos ajudar nesse ponto, quando pensamos na formação do inconsciente. Este sistema, que tem uma dinâmica muito peculiar, é estruturado por meio da linguagem, de um discurso, de onde provém todo o simbolismo ligado ao nascimento, à parentalidade, ao corpo próprio, à vida e à morte do ser humano. Portanto, o sujeito para se relacionar e conviver com os seus pares, se apropria e interage através dos sonhos, dos atos falhos e dos sintomas.

Deborah só consegue se relacionar com os seus, quando tomada pelos sintomas típicos, que são suas alucinações, provocadas pelo seu mundo paralelo o Yr. e, como a Dra. Fried menciona com muita propriedade, a doença é diferente do sintoma. É sabido que o ser humano é afetado por inúmeros fatores para se constituir enquanto sujeito: a herança genética, a cultura, os valores impostos pela família e pela sociedade na qual ele vive, sua condição orgânica, irmãos, dentre outros fatores. Esta é basicamente a história de vida do sujeito.

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