Violência Contra Mulheres
Por: Douglas Ramos • 12/4/2016 • Resenha • 1.550 Palavras (7 Páginas) • 1.176 Visualizações
RESENHA CRÍTICA - Violência Contra as Mulheres e Violência de Gênero: Notas sobre Estudos Feministas no Brasil.
1. Introdução
O artigo visa realizar um estudo crítico sobre as principais correntes teóricas das Ciências Sociais – dominação masculina, dominação patriarcal e relacional - relativas à casuística da violência contra a mulher no Brasil, desenvolvidas a partir da década de 1980; analisando-as a partir da visão de uma relação existente entre a origem da literatura sobre essa temática e o contexto social e político no Brasil nessa época.
Traz a lume também o fato de que os estudos sobre violência contra mulher esquivaram-se de se debruçar sobre a problemática da vitimização, focando-se na análise da sistemática das Delegacias da Mulher.
Por fim, o texto põe em discussão a dicotomia terminológica entre as expressões “violência contra a mulher” e “violência de gênero”.
2. Dominação, patriarcado e violência contra as mulheres
Os primeiros estudos sobre a violência contra a mulher na década de 1980, em virtude da implementação das Delegacias da Mulher, eram focados na sistemática desenvolvida nestas: tipos criminais denunciados, perfil da mulher vítima de violência e identificação dos potenciais agressores.
Para compreender esse fenômeno social, as articulistas selecionaram três das principais correntes teóricas que se firmaram como referências no estudo sobre a violência contra a mulher nos anos 80: a da dominação masculina, a da dominação patriarcal e a relacional.
2.1- Dominação Masculina
Essa corrente é fruto dos estudos da historiadora de filosofia brasileira, Marilena Chauí, dentre os quais a publicação do artigo “Participando do Debate sobre Mulher e Violência”.
Segundo Chauí, a violência contra as mulheres é resultado de uma ideologia de superioridade hierárquica do homem sobre a mulher, discursada não só pelos homens, mas também pelas próprias mulheres. Uma vez tratadas como objetos de dominação masculina, a mulher se cala diante da violência, perdendo sua autonomia e corroborando assim com a ideologia de que o homem lhe é superior, pelo simples fato de sua condição natural de ser do sexo masculino.
Aqui, a visão é a de que a mulher existe para servir aos outros, em condição de submissão, seja como mãe, filha ou esposa. Já para o homem, o papel de pai, filho e esposo é algo superveniente; sua real característica é a de ser pensante, provedor, dotado de total autonomia para tomar decisões e agir.
Uma realidade obscura, pois remonta aos primórdios da sociedade humana, em que predominada a dominação do homem sobre a mulher, não só ideologicamente, mas também pela força física, posto que a mulher poderia sofrer “sansões” em caso de desobediência.
Marilena Chauí, nesse trabalho, chega à conclusão de que a própria mulher é cúmplice da violência que sofre, pois são “instrumentos” da dominação masculina, vistas pelos homens como objeto e não como sujeito.
Há controvérsias. É fato que o silêncio diante de uma situação de dominação e violência entre seres historicamente elencados como desiguais hierarquicamente fortalece a ação do dominador. Entretanto, não se pode olvidar que diversos fatores põem em xeque uma possível tentativa da mulher em situação de violência fazer ouvir sua voz.
Principalmente observando-se o contexto dos anos 80, em que era regra a mulher se encontrar numa condição de dependência do homem em vários setores, como o de sua própria subsistência. Ainda nos dias atuais não é difícil identificar mulheres nessa mesma situação, em que o silêncio é a sua única opção.
Em consequência desse silêncio, há a “dissipação” da ideologia de que o homem domina e a mulher se subjuga, não só através de discursos, mas também por meio da simples tendência que o ser humano tem a querer se comportar como seus semelhantes.
2.2- Patriarcado
Essa segunda corrente analisada no artigo em questão foi desenvolvida pela socióloga Heleieth Saffioti, que realizou seu estudo sobre a violência contra as mulheres partindo da perspectiva feminista e marxista do patriarcado.
Para Saffioti, a dominação masculina sobre a mulher é fruto de um sistema de exploração, ligada ao aspecto econômico, e não político-ideológico, como defende Marilena Chauí.
Ainda divergindo de Chauí, Saffioti discorda da ideia de cumplicidade da mulher em situação de violência. As mulheres, ao contrário, são vítimas, sendo consideradas, portanto, como sujeito de uma relação e não objeto.
2.2.1- O trabalho de Maria Amélia Azevedo
A autora Maria Amélia traz um conceito mais abrangente acerca da problemática da violência contra a mulher. Ela faz uma mescla entre as conclusões de Marilena Chauí e de Heleieth Saffioti. Para ela, a violência é a expressão de relações hierárquicas de dominância e submissão, no âmbito familiar, praticada, portanto, pelo marido ou companheiro.
Segundo seus estudos, a violência praticada contra a mulher decorrente de fatores condicionantes – estrutura sócio-econômica, discriminação contra a mulher, ideologia machista e educação diferenciada – e de fatores precipitantes – situações do cotidiano familiar, como uso de drogas e/ou álcool.
A visão dessa autora me parece ser mais razoável que a de Marilena Chauí. De fato, como mostram os estudos e pesquisas, os dois fatores acima elencados baseiam a quase totalidade dos casos de violência contra a mulher. Se não associados, ao menos um deles encontra-se presente.
2.3- Relativizando dominação-vitimização: teoria relacional contextualiza uma pesquisa realizada pela Fundação SEADE, a qual analisou denúncias de violência contra a mulher na primeira Delegacia de Defesa da Mulher em São Paulo, no ano de 1985, a qual vale-se do conceito de violência contra a mulher de Maria Amélia, ressalvando apenas a ideia de que deve-se ter cuidado quando da classificação dessa mulher como vítima, vez que também há dados que apontam-na como agressora.
O principal estudo realizado acerca desse tema é o de Maria Filomena Grregori, Cenas e Queixas. A ideia é inovadora, pois afasta a posição de vítima da mulher, colocando-a como sujeito ativo no cenário de violência, um sujeito que se auto-protagoniza como vítima, que não é, quando denuncia o “crime sofrido”. Para a autora, ao denunciar seu agressor, a mulher otimiza sua fragilidade, colocando-se como sujeito absolutamente passivo, em busca de proteção.
Tal posicionamento, apesar de no início ter sido alvo de críticas – pois Gregori não analisa os contextos nos quais a violência ocorre, além de que generaliza o significado das queixas-, deu azo a importantes debates nos estudos sobre violência contra a mulher, culminando em uma defesa da necessidade de relativizar dominação masculina x vitimização feminina, a fim de enaltecer uma maior investigação sobre o contexto no qual ocorre a violência.
Qual a verdadeira participação da mulher nesse tipo de situação? O que a leva a denunciar o agressor? Como essa mulher relata a cena de violência vivida? São questionamentos imprescindíveis nos estudos dos casos de violência contra a mulher, para que se compreenda e se identifique a raiz do problema, buscando-se, destarte, formas adequadas de resolução para cada tipo de situação e não só utilizar-se da punição penal para todo tipo de ação ocorrida nos diversos contextos existentes dessa problemática.
Tais questionamentos tornaram-se possíveis a partir dos estudos de Gregori e de sua teoria de relativização.
3. Gênero, violência e cidadania
O tópico trata da mudança ocorrida na nomenclatura da categoria “mulher” para a categoria “gênero”.
Muito embora ambas as terminologias venham sendo utilizadas como sinônimas, há que se destacar que a expressão “violência de gênero” é um tanto quanto mais abrangente que “violência contra a mulher”. Isso porque quando se fala em gênero, alocam-se aí as relações não só homem x mulher, mas também homem x homem e mulher x mulher.
Focalizam-se, aqui, na categoria gênero, as diferenças sociais entre o masculino e o feminino, e não tão somente as biológicas, como na categoria “mulher”.
Ademais, adotando-se essa nova classificação da violência no contexto familiar, abarcam-se as relações não só conjugais, mas também entre irmãos, pais e filhas, mães e filhos, podendo estas desenvolverem-se dentro ou fora do ambiente do lar.
É enfatizado, portanto, com essa nova categorização da violência, o poder relacional, que circula, podendo as relações serem verticais ou horizontais no âmbito familiar.
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