URBANIZAÇÃO, CIDADE E AMBIENTE URBANO EM QUATRO ABORDAGENS
Por: Roberta Romano • 3/5/2015 • Artigo • 4.401 Palavras (18 Páginas) • 512 Visualizações
URBANIZAÇÃO, CIDADE E AMBIENTE URBANO EM QUATRO ABORDAGENS
Roberta Giraldi Romano¹
INTRODUÇÃO
Compreender e discutir o processo de urbanização e a dinâmica das cidades dentro de um contexto interdisciplinar é de grande importância para uma melhor gestão dos ambientes urbanos, pois o ambiente urbano é dinâmico, transforma-se ao acompanhar as mudanças ocorridas em nossa sociedade e também a transforma.
Neste contexto, o presente texto apresenta reflexões com base nas aulas e bibliografia da disciplina “Urbanização, Cidade e Ambiente Urbano” do programa interdisciplinar de pós-graduação em Meio Ambiente e Desenvolvimento da Universidade Federal do Paraná.
São abordados os temas de cidade e ambiente, as configurações socioambientais urbanas atuais, componentes da gestão urbana brasileira e problemáticas sobre as questões socioambientais relacionadas ao consumo e aos resíduos sólidos urbanos.
CIDADE E AMBIENTE
A cidade pode ser considerada um lócus de construção social sob um sítio natural, chamada de meio ambiente urbano, abriga em seus limites desde grandes obras arquitetônicas até paisagens naturais intocadas, assim como a população urbana. Por esta natureza multifacetada, faz-se necessária uma abordagem interdisciplinar para compreender este ambiente, suas problemáticas e desafios.
Para Gottdiener (2010), as abordagens convencionais dos fenômenos urbanos não são suficientes para explicar a organização do espaço na atualidade. A ecologia urbana, a geografia e a economia urbana, dentre outras abordagens, por vezes não contemplam a organização social que pode produzir, manter e reproduzir os padrões de uso da terra.
Para o autor urge ir além das explicações voltadas à economia, sendo de grande importância incorporar a dimensão das transformações sociais e culturais e sua relação com o espaço (GOTTDIENER, 2010).
A obra de Alessandri Carlos (1994) Os caminhos da reflexão sobre a cidade e o urbano faz uma avaliação crítica da produção científica brasileira a respeito do urbano e a cidade e discute as limitações da ciência da geografia. Mais que corroborar com a necessidade de um debate interdisciplinar da cidade, a coletânea de artigos trata do papel da geografia nas questões urbanas, a superação de sua fase descritiva e o surgimento de uma produção teórica embasada no processo de produção espacial a partir da dimensão social. Por outro lado, também discute a dificuldade da geografia urbana em firmar-se como saber geográfico.
Tais questionamentos refletem a produção acadêmica de vinte anos atrás, com situações já superadas na contemporaneidade – considerando o grande avanço da geografia urbana – e outras ainda atuais, como o debate da interdisciplinaridade. Os desafios do ambiente urbano vão ao encontro do saber interdisciplinar e das dificuldades de sua prática, principalmente no que concerne à gestão das cidades, que apesar dos esforços ainda limitam questões claramente interdisciplinares (como as socioambientais) a uma ou outra secretaria.
Milton Santos (1988, p.15) faz referência à pluralidade do urbano no livro Metamorfose do espaço habitado:
Uma das características do 'espaço habitado é, pois, a sua heterogeneidade, seja em termos da distribuição numérica entre continentes e países (e também dentro destes), seja em termos de sua evolução. Aliás, essas duas dimensões escondem e incluem outra: a enorme diversidade qualitativa sobre a superfície da terra, quanto a raças, culturas, credos, níveis de vida etc.
Este espaço multifacetado é cerne de riquezas e de desafios, mas há que se destacar a problemática socioambiental urbana dentre estes. A formação das cidades no Brasil ocorreu sem o necessário planejamento e as consequências do rápido crescimento urbano assolam a população ainda hoje, seja com precárias condições das águas dos rios em cidades que sofrem com a seca ou com o grande desafio da mobilidade urbana em metrópoles engarrafadas. Jacobi (2006, p. 115) afirma:
Este conjunto de temas caracteriza um campo de conflitos que se manifestam através de formas muito diferentes, configurando práticas de apropriação do território e de seus recursos permeados por um conjunto de determinantes que complexificam o avanço rumo a uma gestão mais sustentável das cidades.
Para Santos (1993) todas as cidades brasileiras possuem problemáticas semelhantes, cada uma com seu grau e intensidade, dentre elas: emprego, habitação, transporte, lazer, água, esgoto, educação e saúde – quanto maior a cidade, mais visíveis se tornam as mazelas. O autor explica:
As cidades, e, sobretudo, as grandes, ocupam, de modo geral, vastas superfícies, entremeadas de vazios. Nessas cidades espraiadas, características de uma urbanização corporativa, há interdependência do que podemos chamar de categorias espaciais relevantes desta época: tamanho urbano, modelo rodoviário, carência de infraestrutura, especulação fundiária e imobiliária, problemas de transporte, extroversão e periferização da população, gerando, graças às dimensões da pobreza e seu componente geográfico, um modelo específico de centro-periferia. Cada qual dessas realidades sustenta e alimenta as demais e o crescimento urbano, é, também, o crescimento sistêmico dessas características. As cidades são grandes porque há especulação e vice-versa; há especulação porque há vazios e vice-versa; porque há vazios, as cidades são grandes. O modelo rodoviário urbano é fator de crescimento disperso e do espraiamento da cidade. Havendo especulação, há criação mercantil da escassez e o problema do acesso à terra e à habitação se acentua. Mas o déficit de residências também leva à especulação e os dois juntos conduzem à periferização da população mais pobre, e, de novo, ao aumento do tamanho urbano. As carências em serviços alimentam a especulação, pela valorização diferencial das diversas frações do território urbano. A organização dos transportes obedece a essa lógica e torna ainda mais pobre os que devem viver longe dos centros, não apenas porque devem pagar caro seus deslocamentos como porque os serviços e bens são mais dispendiosos nas periferias. E isso fortalece os centros em detrimento das periferias, num verdadeiro círculo vicioso (SANTOS, 1993, p.95-96).
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