A ORIGEM DA COLABORAÇÃO PREMIADA NO BRASIL
Por: Carla Martins • 30/9/2018 • Artigo • 6.854 Palavras (28 Páginas) • 193 Visualizações
- DESENVOLVIMENTO[a]
2.1 A ORIGEM DA COLABORAÇÃO PREMIADA NO BRASIL
A colaboração premiada tem exercido um papel importante no cenário jurídico brasileiro quanto ao combate do crime organizado, pois encurta os caminhos da investigação e faz emergir todos os seus meandros.
O primeiro registro histórico de sua aplicação no Brasil, inclusive com semelhanças no atual Instituto da [b]Colaboração Premiada, remete aos tempos do Brasil Colônia.
Esclarece Fonseca[1] que desde as Ordenações Filipinas, o Brasil tem se valido da colaboração premial desde 1603 até 1830 quando o código criminal entrou em vigor. Os documentos históricos registram o caso do Coronel Joaquim Silvério dos Reis que recebeu da Coroa Portuguesa a anistia de suas dívidas por delatar seus companheiros da Inconfidência Mineira.
No Livro VI, Título - CXVI do Código Filipino, a delação premiada avalia “como se perdoará aos malfeitores que deram outros à prisão” e, prevê até anistia judicial ao delator.
No período da ditadura militar de 1964 a delação dos opositores ao governo (pessoas contra o regime repressivo) foi estimulada. Sem qualquer embargo, o instituto[c] da delação premiada ocorre em países democráticos, cujos Estados Partes possuem um mecanismo eficiente de controle judicial, sendo, com esta característica, um instituto recente no e dentre eles está o Brasil.
Segundo Fonseca outros registros importantes aparecem já nos anos 80 e 90, com as Leis n°s 7.492/1986, (Lei do Colarinho Branco ou dos crimes contra o sistema financeiro, art. 25), 8.072/1990 (Lei dos Crimes Hediondos, art. 8°), 8.137/1990 (Lei dos crimes contra a ordem tributária art. 16), 9.034/1995 (a primeira Lei do combate ao crime organizado, art. 6°- revogada), 9.613/1998 (Lei dos crimes de lavagem de dinheiro, art. 1°,§ 5°), 9.807/1999 (Lei de Proteção a Vítimas e Testemunhas, art. 13), 10.409/2002 (revogada, Lei de Tóxicos, art. 32, § 2°), 11.343/2006 (atual Lei de tóxicos, art. 41), 12.529/2011 (Lei CADE, art. 86), 12.846/2013 (Lei Anticorrupção, art. 16°) por último a 12.850/2013, nova Lei de combate ao crime organizado.
Para Bitencourt e Busato[2], o referencial normativo anterior para a delimitação dos casos que envolvem uma suposta organização criminosa é a Convenção das Nações Unidas sobre Crime Organizado, também conhecida como Protocolo de Palermo (regulamentada pelo Decreto n. 5.015/2014). Esta Convenção define grupo criminoso organizado como:
“grupo estruturado de três ou mais pessoas, existente há algum tempo, e atuando concertadamente com o propósito de cometer uma ou mais infrações graves ou enunciadas na presente Convenção, com a intenção de obter, direta ou indiretamente, um benefício econômico ou outro benefício material”. [d]
Com o advento da Lei 12.694, de 24 de julho de 2012, passou-se a definir no país, finalmente, o fenômeno conhecido mundialmente como organização criminosa, nos seguintes termos:
“Para os efeitos desta Lei, considera-se organização criminosa a associação, de 3 (três) ou mais pessoas, estruturalmente, ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de crimes cuja pena máxima seja igual ou superior a 4 (quatro) anos ou que seja de caráter transnacional” (art. 2°).
Essa definição, contudo, não chegou a consolidar-se no âmbito do nosso direito interno do Brasil, pois o legislador pátrio editou nova lei redefinindo organização criminosa com outros contornos e outra abrangência. Ou seja, a lei 12.850, de 02 de agosto de 2013³, que assim define organização criminosa:
“Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com o objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais, cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos ou que sejam de caráter transnacional” (art.1°, § 1)[3].
NATUREZA JURÍDICA DA COLABORAÇÃO PREMIADA
No que concerne à natureza jurídica do instituto da colaboração premiada, ainda com divergências na doutrina e jurisprudência, o entendimento majoritário é que o depoimento do delator é tido como meio de obtenção de prova, e como prova, é através dele que se busca comprovar os fatos delatados.
Nesse sentido o acórdão proferido no julgamento do recurso extraordinário do habeas corpus n. 127.423 pelo Supremo Tribunal Federal, in verbis:
A colaboração premiada é um negócio jurídico processual, uma vez que, além de ser qualificada expressamente pela lei como “meio de obtenção de prova”, seu objeto é a cooperação do imputado para a investigação e para o processo criminal, atividade de natureza processual, ainda que se agregue a esse negócio jurídico o efeito substancial (de direito material) concernente à sanção premial a ser atribuída a essa colaboração[4].
O fato é que Por certo, nenhuma sentença pode se basear única e exclusivamente na confissão e apontamento do acusado, sob pena de se estar diante de uma ilegalidade latente, violação a legislação penal e uma afronta direta à Constituição.
Santos reconhece que sua natureza jurídica é “híbrida” dizendo que “a natureza da delação premiada, em verdade, é processual material - forma e conteúdo processuais, mas com efeitos materiais”[5], pois é delatada no processo de investigação criminal ou no processo de apuração de crime e pode, inclusive, até afetar o próprio direito em si.
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