A RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL NA INGLATERRA
Por: fabiheb • 15/11/2019 • Artigo • 6.773 Palavras (28 Páginas) • 291 Visualizações
A RESPONSABILIDADE CIVIL AMBIENTAL NA INGLATERRA
Hebert Alves Coelho[1]
Elcio Nacur Rezende[2]
RESUMO: O presente artigo analisa a responsabilidade civil ambiental na Inglaterra, com foco na responsabilidade objetiva, demonstrando a evolução desse tipo de responsabilidade no país desde o seu surgimento até os dias atuais. Procura proporcionar uma visão coerente e abrangente da aplicação da responsabilidade objetiva na Inglaterra, inclusive com a constatação da adesão por esse país à teoria do risco criado. Para isso, o artigo baseia-se, principalmente, nos precedentes judiciais, com destaque para o caso Ryland vs. Flecher e no Regulamento de Danos Ambientais ( Prevenção e Reparação ) de 2009, que introduziu no ordenamento jurídico inglês a Diretiva 2004/35 do Parlamento Europeu.
PALAVRAS-CHAVE: Responsabilidade civil ambiental - Inglaterra.
ABSTRACT: This paper analyzes the environmental liability in England, focusing on strict liability, showing the evolution of this type of liability in the country since its inception to the present day. It seeks to provide a coherent and comprehensive approach to the implementation of strict liability in England, including the verification of compliance by that country to risk theory created. For this, the article is based mainly on judicial precedents, especially the Ryland vs. Fletcher case and environmental damage regulations (prevention and repair) 2009, entered the English legal system directive 2004/35 of the European parliament.
KEY WORDS: Environmental liability - England
INTRODUÇÃO
A responsabilidade civil foi concebida, inicialmente, na maioria dos países com base no princípio de que uma pessoa que causa danos a outra com algum grau de culpa deve reparar tais danos. Essa clássica responsabilidade civil tem se desenvolvido em um grande número de países para introduzir a responsabilidade objetiva, sem discussão de culpa, pelos danos ambientais, onde, geralmente, atividades de risco têm sido desenvolvidas[3].
Há, no Brasil, grande discussão doutrinária e mesmo jurisprudencial a respeito das teorias que tratam da responsabilidade civil ambiental. É certo que a teoria que trata da responsabilidade objetiva pelo risco integral acaba por prevalecer na jurisprudência e doutrina brasileiras, já que muito mais protetiva do meio ambiente, direito fundamental de todos.
Com o propósito de contribuir com essa discussão, constata-se a importância de se aferir como e com qual fundamento surgiu o direito ambiental no mundo e, ainda, como, em regra, a responsabilidade civil ambiental é tratada no plano internacional, em especial diante de diretiva europeia que pretende uniformizar essa forma de tratamento no âmbito europeu.
Nesse contexto, importante o estudo da Responsabilidade Civil por danos ao meio ambiente na Inglaterra, já que foi nesse país que o meio ambiente começou a ser alterado com maior intensidade, a partir da Revolução Industrial iniciada no século XVIII[4] e foi também na Inglaterra do século XIX que, após a ocorrência de catástrofes ambientais, surgiu, pela primeira vez no mundo, a responsabilidade objetiva por danos ambientais.
A responsabilização civil objetiva por danos ao meio ambiente é uma tendência mundial e inegavelmente representa uma evolução da responsabilização civil subjetiva clássica.
O presente trabalho pretende identificar e analisar o surgimento da responsabilidade civil ambiental, com foco na análise do acolhimento da responsabilidade objetiva, em especial na Inglaterra, precursora deste tipo responsabilidade no mundo, procurando ainda explicitar sua evolução ao longo do tempo e sua relevância para a efetiva tutela do meio ambiente. Para isso, é necessário ir muito além da análise da legislação ambiental inglesa. É explorada outras fontes do direito na Inglaterra, como os precedentes judiciais (case law) e a regulamentação internacional incorporada no ordenamento jurídico inglês.
1. A RELEVÂNCIA DA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA EM MATÉRIA AMBIENTAL
A responsabilidade civil ambiental esteve, em sua origem, intrinsicamente ligado à ideia de culpa. Pela teoria da responsabilidade subjetiva não há responsabilidade sem culpa. Somente haveria responsabilidade quando alguém houver sofrido prejuízo causado a outrem de forma intencional ou, ao menos, com culpa ( imprudência, negligência ou imperícia ). Segundo CUSTÓDIO, 2006: “A concepção clássica da responsabilidade subjetiva, como a teoria da autonomia de vontade, procede de uma filosofia que concebe o homem como sendo dono de uma vontade consciente e possuidor de seu livre-arbítrio”. Expõe ainda, a referida autora:
Nesta ordem de apreciação, acrescenta Aguiar Dias que a teoria da culpa, “resumida com alguma arrogância”, por Von Ihering, na fórmula sem culpa, nenhuma reparação”, satisfez por longos anos à consciência jurídica, sendo ainda hoje influente, diante a resistência oposta por alguns autores.
O foco da responsabilidade subjetiva não está na reparação do dano propriamente, mas sim na responsabilização daquele que agiu de forma intencional ou culposa e, com isto, acarretou danos. Expõe MACHADO, 2008:
Ressalte-se que a existência da responsabilidade por culpa, como assinala Geneviève Viney, da Universidade de Paris, “deve-se aos canonistas, para quem a responsabilidade era antes de tudo destinada a moralizar as condutas individuais, e não a reparação do dano”.
Nada obstante, verificam-se diversas situações em que os prejuízos ambientais ocorrem, mesmo sem ter havido vontade ou culpa do causador do dano. A utilização da responsabilidade subjetiva, nesses casos, deixariam impunes os responsáveis pela degradação ambiental. Diante da insuficiência desse sistema clássico de responsabilidade subjetiva, constata-se uma tendência de evolução em diversos países, incluindo a Inglaterra, para o sistema responsabilidade objetiva, em que o foco é a reparação do dano e a discussão de culpa passa a ser irrelevante. Ao se promover a reparação do prejuízo procura-se o restabelecimento do equilíbrio rompido com a ocorrência do dano. A responsabilidade objetiva assume especial relevância diante da ocorrência de danos ambientais, já que contribui para uma maior efetividade em na tutela do meio ambiente.
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