ARQUISSÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE
Por: Vicente Amêndola • 18/9/2018 • Tese • 3.054 Palavras (13 Páginas) • 141 Visualizações
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 4ª VARA DA SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SÃO JOSÉ DO RIO PRETO – SÃO PAULO.
Processo nº 0004043-77.2017.403.6106.
DIEGO DOS SANTOS MACHADO, brasileiro, solteiro, representante comercial, portador do RG sob nº 0720747791/SSP-BA e devidamente inscrito no CPF sob nº 015.185.605-20, residente e domiciliado na Avenida Jorge Amado, nº 62, bloco 38 A, apartamento 201, Parque Pituaçu, no Bairro Imbuí, CEP 41720-040, na cidade de Salvador - BA, atualmente resgatando pena no Centro de Detenção Provisória de São José do Rio Preto - SP, vem, sempre respeitosamente à presença de Vossa Excelência, por seu procurador que esta subscreve, apresentar,
ARQUIÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE
em face da PORTARIA SVS/MS 344/98, fazendo-a com arrimo nos substratos fáticos e jurídicos a seguir expostos.
I – DOS FATOS
O requerente foi preso em flagrante no dia, 02 de setembro de 2.017, sendo preso por supostamente praticar os delitos tipificados nos artigos 33, 40, I e V, da Lei nº 11.343/2.016 (Lei de Drogas) e artigos 180, 304 e 307, do Código Penal, conforme se depreende do auto de prisão em flagrante delito.
Foram apreendidos com o réu, 178,5 kg (cento e setenta e oito quilos e meio) de maconha (cannabis sativa) e 2 kg (dois quilos) do derivado da maconha denominado haxixe (cannabis sativa), conforme se denota dos laudos preliminares anexos às fls. 17/18 dos presentes autos, que tem como princípio ativo substancia proibida, citada na lista F2 da Portaria do Ministério da Saúde 344/98.
II- DO DIREITO
II.I – Da Competência Para Realização do Controle Difuso de Constitucionalidade
Como é sabido, o controle difuso de constitucionalidade pode ser feito por qualquer tribunal ou juiz, pois a faculdade de reconhecer ou declarar a inconstitucionalidade não é privativa do Supremo Tribunal Federal, mas, nos dizeres de Lúcio Bittencourt, "consectária da função jurisdicional e, por conseqüência, cabe a quem que legitimamente exerça esta última" (O controle jurisdicional da constitucionalidade das leis, Forense, 1949), inclusive o juiz, ex officio, afastando a aplicação da norma ao caso sob julgamento.
Desta forma, os magistrados singulares, no exercício da jurisdição constitucional, não só podem como devem declarar a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo do Poder Público, atuando inclusive de ofício, em uma situação que se assemelha à da nulidade do negócio jurídico, que deve ser pronunciada pelo juiz independentemente de alegações do interessado.
No controle difuso, mesmo que as partes ou o Ministério Público não suscitem a questão, até pelo princípio jura novit cúria, deve o juiz observar o problema e, se encontrar a lei ou ato normativo contrário à Constituição, que tenha relação com a causa, está na obrigação funcional de se manifestar, decretando a invalidade da lei ou do ato normativo, determinando sua não aplicação ao caso objeto da demanda (Zeno Veloso, in Controle Jurisdicional de Constitucionalidade, Ed. Del Rey, 2000).
No Brasil, o controle difuso de constitucionalidade existe desde a primeira Constituição Republicana e subsiste até hoje sem maiores alterações. Do juiz estadual recém-concursado até o Presidente do Supremo Tribunal Federal, todos os órgãos judiciários têm o dever de recusar aplicação às leis incompatíveis com a Constituição. (BARROSO, 2006, p. 47).
II.II – Dos Princípios Constitucionais e Sua Aplicabilidade
A palavra princípio, já nos remete o pensamento ao começo, ao início de algo, Paulo Bonavides traz a conceituação segundo Luís-Diez Picazo, "onde designa as verdades primeiras".
Para Celso Antonio Bandeira de Mello, princípio é por definição, mandamento nuclear de um sistema verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão (...) do sistema normativo, no que lhe dá sentido harmônico (...).
Para a doutrina contemporânea, os princípios constitucionais são revestidos de valoração e aplicabilidade como normas chaves de um sistema jurídico (Bonavides, 2004, p. 274)
Cito ainda o brilhante constitucionalista acerca dos princípios constitucionais.
[...] Fazem eles a congruência, o equilíbrio e a essencialidade de um sistema jurídico legítimo. Postos no ápice da pirâmide normativa, elevam-se, portanto, ao grau de norma das normas, de fonte das fontes. São qualitativamente a viga mestra do sistema, o esteio da legitimidade constitucional, o penhor da constitucionalidade das regras de uma Constituição[...] (Bonavides, 2004,p.294)
Conclui-se, que os princípios constitucionais são normas jurídicas revestidas de aplicabilidade com grau máximo de valoração.
Como nos traz Bonavides “a lesão ao princípio é indubitavelmente a mais grave das inconstitucionalidades, porque sem princípio não há ordem constitucional e sem ordem constitucional não há garantia para as liberdades” (Bonavides, 1993. p. 396)
II.III – Da Lesão ao Princípio da Dignidade Humana
O princípio da dignidade humana está expresso na Constituição Federal, no artigo 1°, III, como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito. Luís Roberto Barroso (Barroso,2010. p.234) nos traz a lição de Paulo Bonavides, esclarecendo que o princípio da dignidade da pessoa humana é o núcleo essencial de todos os direitos fundamentais. Continua ainda nos ensinando que a dimensão mais nuclear desse princípio vem da máxima kantiana segundo a qual, cada indivíduo deve ser tratado como um fim em si mesmo e não meio para realizações de metas coletivas.
Assim, se determinada política representa concretização de importante meta coletiva (como a garantia da segurança pública ou da saúde pública, por exemplo), mas, implica a violação da dignidade humana de uma só pessoa, tal política deve ser preterida, como há muito reconhecem os publicistas comprometidos com o Estado de Direito. (Barroso, 2010. p.234)
Na política proibicionista adotada pelo Brasil através da Lei 11.343/06, o Estado claramente fere o princípio da dignidade da pessoa humana, impondo uma conduta moral a ser seguida, criminalizando algumas drogas, e deixando outras na legalidade, mesmo essas drogas consideradas lícitas representando perigo maior para saúde e para sociedade (essa classificação iremos abordar no tópico do princípio da igualdade), ainda criminalizando o usuário o afasta do tratamento, criando uma estigmatização do indivíduo na sociedade.
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