Aborto - Avaliação de caso prático
Por: Amapola Souza • 2/11/2019 • Seminário • 2.200 Palavras (9 Páginas) • 110 Visualizações
DIREITO PENAL
SEMINÁRIO 1º BIMESTRE
Aborto (artigos 124-128, CP)
O aborto ou abortamento é a interrupção da gravidez, da qual resulta a morte do produto da concepção. Há aborto em qualquer que seja o momento da evolução fetal — a proteção penal ocorre desde a constituição do ovo ou zigoto até a fase em que se inicia o processo de parto, pois a partir de então o crime será de homicídio ou infanticídio. O Código Penal não faz distinção entre óvulo fecundado, embrião ou feto, sendo todos merecedores da tutela penal.
O aborto pode ser: a) natural; b) acidental; c) criminoso; d) legal ou permitido; e) eugênico ou eugenésico; f) econômico ou social.
Neste crime, o objeto jurídico é a vida humana, sendo certo que no aborto provocado por terceiro, sem o consentimento da gestante (artigo 125, CP), protege-se também a integridade física e psíquica da gestante. Já o objeto material é o feto, em todas as modalidades de aborto criminoso.
O sujeito ativo, nas modalidades tipificadas pelo artigo 124, se trata da gestante, se tratando de um crime de mão própria (somente a gestante pode cometê-los), admitindo participação. Já nos demais casos (artigos 125-128) o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa.
Trata-se de um crime de forma livre, ou seja, admiti-se qualquer meio de execução, comissivo ou omissivo, físico ou psíquico.
Necessário salientar que não existe a modalidade culposa para o crime em questão, sendo, portanto, o elemento subjetivo o dolo, seja ele direito ou eventual.
A consumação do crime, se dá com a morte do feto, seja no útero materno ou depois da prematura expulsão provocada pelo agente. Ou seja, é prescindível a expulsão do produto da concepção
Trata-se de ação penal pública incondicionada, em todas as modalidades do crime de aborto, sendo certo que a competência para julgar este crime é do Tribunal do Júri (artigo 5º, XXXVIII, d, CF).
1.1) Aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante (artigo 125, CP)
Neste caso, duas situações são possíveis: a) não houve efetivamente o consentimento da gestante; ou b) houve consentimento, mas sem os feitos jurídicos válidos, como nos casos apontados pelo artigo 126, parágrafo único do Código Penal (gestante menor de quatorze anos, ou alienada ou “débil mental”, ou se o consentimento é obtido mediante fraude, grave ameaça ou violência).
Vale ressaltar que trata-se de crime de dupla subjetividade passiva, vez que há duas vítimas: o feto e a gestante.
1.2) Aborto na modalidade tentada (artigos 124 - 128, c.c. artigo 14, II, CP)
O código penal admiti a tentativa de aborto, em todas as modalidades do aborto culposo. Admite-se a tentativa quando uma vez iniciada a execução – realizado o primeiro ato executório tendente à provocar o aborto, sendo empregado meio relativamente capaz de produzir o resultado — por circunstâncias alheias a vontade do agente, não há interrupção da gravidez ou o feto que nasceu prematuro sobrevive, configurando assim o delito na modalidade tentada.
Sobre o tema, escreve Fernando Capez: Por se tratar de crime material, é perfeitamente possível a tentativa. Será possível na hipótese de a manobra ou meio abortivo empregado, apesar de sua idoneidade e eficiência, não desencadear a interrupção da gravidez, por circunstâncias alheias à vontade do agente, ou então quando, apesar das manobras e meios utilizados, por estar a gravidez em seu termo final, o feto nasça precocemente, mas mantém-se vivo (CAPEZ: 2005, p. 115).
2. Caso concreto
Consta dos autos que Marília, quando estava grávida de 09 (nove) meses, procurou a ajuda de uma amiga, que é enfermeira, por estar sentindo fortes dores no estômago.
Essa suposta “amiga”, por sua vez, entregou ela o remédio “Cytotec”, o qual, apesar de auxiliar na redução da acidez estomacal, é majoritariamente conhecido por seu efeito abortivo.
Em razão disso, houve a antecipação do parto. O nascimento ocorreu de forma conturbada, em estado de urgência, com sedação da parturiente e uso de fórceps. Consequentemente, faltou oxigenação no cérebro de bebê, nos trabalhos de parto e pós-parto, o que lhe causou debilidade permanente em virtude de paralisia cerebral.
Diante dos fatos, não se pode dizer que se trata de uma lesão corporal gravíssima culposa, visto que a ré tinha nítida intenção de causar o aborto do feto. Primeiramente, para se enquadrar na modalidade culposa, é necessário que o agente pratique o fato mediante imprudência, imperícia ou negligencia, e com base nos ensinos do doutrinador Julio Fabbrini Mirabete, não é possível enquadrar as ações da ré em nenhuma dessas condutas.
Não se pode dizer que a enfermeira agiu com imprudência, porque seria necessário que ela tivesse tomado uma ação precipitada e sem cautela. O que ocorreu foi justamente o contrario. Ela, após ser procurada pela vítima, teve tempo o suficiente para escolher a medicação e conseguir a mesma para fornecer para a gestante. Ou seja, nada foi as pressas. Também não se pode dizer que a enfermeira agiu com imperícia, pois seria necessário constatar a inaptidão, ignorância, falta de qualificação técnica, teórica ou prática, ou ausência de conhecimentos elementares e básicos da profissão. Neste caso, a ré se trata de uma profissional qualificada, com anos de atuação na área da saúde. Por fim, tampouco pode se dizer que ela agiu com negligencia, pois esta se configura quando alguém deixa de tomar uma atitude ou apresentar conduta que era esperada para a situação, age com descuido, indiferença ou desatenção, não tomando as devidas precauções. A enfermeira não agiu com indiferença ou deixou de tomar uma precaução, muito pelo contrario, ela se aproveitou da confiança da vítima, vez que essa se dizia ser uma amiga, e se aproveitando também do momento de vulnerabilidade da gestante, induziu esta a ingerir o medicamento abortivo, para assim praticar seu crime.
É notório que se trata de uma tentativa de abordo provocado por terceiro sem o consentimento da gestante. Isso porque, a enfermeira possuía conhecimento do efeito abortivo do medicamento e do estado de gravidez da vítima, e mesmo assim o prescreveu a ela. O crime só não se consumou por circunstâncias alheias a sua vontade, no caso em questão, por causa da intervenção
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