O Caso de Cesare Battisti e suas repercussões no Direito Internacional
Por: Vanessa Goncalves • 1/3/2016 • Pesquisas Acadêmicas • 1.719 Palavras (7 Páginas) • 410 Visualizações
Aula Direito Internacional Público.[1]
Professor Flademir Jerônimo Belinati Martins
O Caso Cesare Battisti e suas Repercussões em matéria de Extradição.
- Cronologia do Caso Cesare Battisti
Battisti é escritor de nacionalidade italiana, militante de extrema esquerda, condenado na Itália à prisão perpétua por 4 homicídios cometidos na década de 1970. Preso em 1979 e condenado, em 1981, a pouco mais de 13 anos de prisão, Battisti fugiu da prisão ainda no ano de 1981, escondendo-se na França, onde permaneceu até 1982, quando fugiu para o México. No México permaneceu até 1990, quando retornou para França, na condição de refugiado, sob o amparo da “Doutrina Miterrand”, a qual previa a concessão de asilo político e não extradição de ex-ativistas italianos de extrema esquerda.
Em novo julgamento, realizado em 1988, agora com base em delação premiada e novos depoimentos de ex-integrantes do movimento de extrema esquerda do qual ele fazia parte, Battisti foi condenado à pena de prisão perpétua.
Com o retorno de Battisti à França, a Itália pediu sua extradição, que foi negada em 1991. Em 2002, novamente a Itália pediu sua extradição, o que o levou a ser preso em 2004, mas depois foi posto em liberdade vigiada. Deferida a extradição pela Corte de Apelações de Paris, Cesare permaneceu clandestino na França por certo tempo e depois fugiu para o Brasil ainda em 2004. Os advogados de Cesare chegaram a apresentar recurso perante a Corte Européia de Direitos Humanos contra o decreto de extradição. Mas a Corte entendeu que a extradição era cabível.
Cesare foi preso em 2007 no Brasil, em operação conjunta das polícias brasileira, francesa, italiana e a interpol. Após a prisão, o governo da Itália, com base em Tratado de Extradição existente entre Brasil e Itália, realizado em Roma em 1989, solicitou a extradição.
No curso do processo de extradição no STF, Cesare solicitou ao CONARE (Comitê Nacional para os Refugiados) refúgio, alegando ser refugiado político, com base no art. 1, inciso I, da Lei 9.474/97. Após o STF ser comunicado de que havia pedido refúgio, o processo de extradição foi suspenso, no aguardo da decisão.
O CONARE, por 3 votos a 2, indeferiu o pedido de refúgio ao argumento de que não havia prova da perseguição política. Cesare recorreu ao Ministro da Justiça, na forma do art. 29 da Lei 9.474/97, sendo que o então Ministro da Justiça reconheceu a condição de refugiado com base em dois fundamentos: a) risco de ser perseguido por crime político e b) dúvidas sobre a observância do processo legal.
Contra o ato do Ministro da Justiça que reconheceu o refúgio, o Estado Italiano apresentou Mandado de Segurança requerendo a anulação da decisão do Ministro, argumentando que a decisão que concedeu o refúgio teria sido dada em desacordo com as provas existentes no pedido de refúgio e como base em motivos falsos, pois a Itália a época dos fatos era uma democracia e Battisti foi condenado por tribunais regulares, com respeito ao contraditório e à ampla defesa.
Com base na concessão de status de refugiado, foi pedida a revogação da prisão preventiva para fins de extradição, mas o STF negou a concessão de liberdade, pois se entendeu que após a propositura do Mandado de Segurança a discussão jurídica posta, poderia levar ao acolhimento do pedido de extradição, havendo necessidade de que Cesare fosse mantido preso até que a questão fosse decidida pelo Supremo.
Em setembro de 2009, o STF passou a julgar o pedido de extradição. O Ministro Relator Cezar Peluso concluiu pela ilegalidade e ineficácia do ato de concessão de refúgio, por entender que o benefício teria sido concedido sem qualquer amparo nas hipóteses legais. Entendeu o STF que a concessão do status de refugiado se trata de ato vinculado aos requisitos expressos e taxativos previstos na Lei 9.474/97.
Peluso ressaltou que somente ao STF (competência exclusiva) caberia decidir sobre o caráter político ou não das infrações que informam o pedido de extradição, afirmando que os crimes cometidos não teriam conotação política (homicídios dolosos premeditados). Peluso foi acompanhado por mais 5 (cinco) Ministros. Outros 4 (quatro) Ministros entenderam que o STF não poderia analisar a concessão do status de refugiado, pois esta seria ato discricionário. Prevaleceu o voto no sentido de conferir caráter vinculado à concessão do status de refugiado, anulando o ato respectivo, bem como autorizando a extradição de Cesare.
Decida a questão pela extradição coube aos Ministros decidirem se a decisão do STF obrigaria ou não o Presidente da República a extraditar. Novamente por 5 votos a 4, o STF decidiu que a decisão de mandar extraditar não obriga necessariamente o Poder Executivo a fazê-lo, cabendo ao Presidente da República decidir se efetivaria ou não a extradição autorizada pelo Supremo. Caso optasse pela extradição, deveria adotar as providências necessárias a efetivação da medida.
Com base na decisão do E. STF, mais de um ano após a decisão do STF, o então Presidente Lula, baseando-se em Parecer da AGU, decidiu não extraditar Cesare ao argumento de que este não era criminoso comum, mas político, e poderia ser submetido atos de perseguição, situação em que, a seu ver, o próprio Tratado de Extradição com a Itália autorizaria a não extradição.
Foi a primeira vez na história que um Presidente da República não efetivou uma extradição julgada procedente pelo STF. O governo Italiano então propôs uma Reclamação perante o STF, a qual não foi conhecida, e uma Petição Avulsa, buscando anular o ato presidencial. Em 2011, na análise da petição avulsa, o STF, por maioria, decidiu que o ato do Presidente da República que nega a extradição é um ato de soberania e que não pode ser revisto pelo STF.
2. Principais lições de Interesse para o DIP no Caso Cesare Battisti
Algumas interessantes questões foram discutidas durante o julgamento do Caso Cesare Battisti. Vejamos as principais conclusões com base no que decidiu o E. STF.
A) Por ocasião do pedido de extradição do padre Olivério Medina, acusado de participação em crimes cometidos pelas FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), o E. STF havia decidido que o art. 33 da Lei 9.474/97 é constitucional, e, portanto, apto a suspender qualquer extradição, ainda que já deferida pelo E. STF.
Contudo, a partir do Caso Battisti, para o E. STF referido ato que concede o status de refugiado (mesmo suspendendo a extradição) é de natureza vinculada, portanto, sujeito a controle de legalidade pelo Judiciário. Assim, como conseqüência prática desta decisão, a concessão do status de refugiado não mais impõe a extinção automática do pedido de extradição. Caberá ao STF verificar se os requisitos legais para a concessão da condição de refugiado, previstos na Lei 9.474/97, foram ou não observados.
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