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As Religiões De Matrizes Africanas E O Direito À Liberdade De Culto

Por:   •  1/4/2023  •  Trabalho acadêmico  •  2.181 Palavras (9 Páginas)  •  98 Visualizações

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AS RELIGIÕES DE MATRIZES AFRICANAS E O DIREITO À LIBERDADE DE CULTO

Após analisar alguns especialistas em Direito constitucional, tais como Flávia Bahia, Pedro Lenza e Marcelo Novelino, constatei que não há um só autor que trate de forma assertiva e particular sobre a garantia da manifestação de fé, das religiões de matrizes africanas, todos tratam de forma geral a liberdade de crença, limitado nos artigos 5º, incisos VI, VII e VIII e suas vertentes, mas não identifiquei se quer uma frase em que os adeptos dessas religiões de matrizes africanas, pudessem interpretar como defesa de seu culto, de seu rito de sua fé.

Há diferenças entre liberdade de culto e liberdade de crença, segundo Fábio Carvalho (2013) “a liberdade de culto representaria a livre manifestação exterior da crença, pela prática de atos próprios da religião”, ou seja, o indivíduo tem o livre arbítrio de demonstrar externamente sua religião, de forma individual ou coletiva, podendo praticar sua religião em qualquer lugar, e a liberdade de crença, segundo Leite (2010), é “direito que o indivíduo tem de filiar-se à religião que desejar ou não professar religião alguma; é ilimitada”.

Ainda que os autores vistos anteriormente também trabalhem com esta distinção, todos eles, quando citam o direito à liberdade de crença acabam por dar mais destaque a liberdade de crença e silenciando sobre a liberdade de culto. Para as religiões de matrizes africanas, a liberdade de culto é o tema a ser discutido, pois o racismo religioso, faz com que o candomblé e a umbanda tenham suas práticas religiosas perseguidas e silenciadas. Diante desta ausência, devemos então questionar por quê os principais constitucionalistas se silenciam sobre o tema.

A ausência da defesa à liberdade de culto, principalmente para as religiões de matrizes africanas, faz com que ideologias com viés religiosos radicais, contrários às religiões afro-brasileiras se propaguem e gerem atos considerados como racismo religioso.

As religiões mais perseguidas do país, pelo simples fato da existência do racismo religioso, as religiões que advieram do continente africano foram estigmatizadas desde o início da escravidão no Brasil, os negros foram obrigados a serem “batizados” perdendo suas características de origem e tendo seu direito de professar a fé, cerceado, e com o inconformismo nasceu o sincretismo religioso, com a ideia de ludibriar o Estado agregando aos seus cultos, santos cultuados dentro de igrejas, e os associando aos Orixás cultuados no candomblé para que assim, quando a polícia fosse até o terreiro de candomblé, não encontrasse nada além de imagens e símbolos de santos católicos.

Esse processo perdurou por muitos anos, até que a Igreja e Estado fossem separados, e sendo promulgada na constituição de 1988 a liberdade de crença e de culto, tendo as demais religiões distintas do catolicismo, liberdade de manifestar, crer, descrer, cultuar seus Deuses, sem que fossem criminalizados

Na procura de autores para ter base e escrever este artigo, tive inúmeras dificuldades de identificar aqueles que abordassem abertamente o tema, e com o retrocesso em que vivemos neste país, o problema da perseguição por caráter religioso, deve ser categoricamente discorrido.

Ainda que possamos relacionar o aumento do número de ataques ao povo de terreiro a maior denuncia realizada por essas pessoas, hoje mais ávidas a lutar por seus direitos e, portanto, por uma intervenção mais efetiva do Estado, é preciso olhar este aumento a partir da existência do racismo institucional velado, sendo este o fator preponderante desses inúmeros ataques.

O Estado se diz Laico ou não confessional, mas admite o uso de símbolos de religião que já foi a oficial do país em departamentos públicos, e pior, admite que o fato de manter esses objetos seja tratado como de caráter histórico-cultural, como aponta Pedro Lenza, passando por cima de um direito fundamental, o direito a liberdade, que neste caso o de crença, entendendo que este fato não fere a laicidade do Estado. Por outro lado, essa mesma posição se preocupa com os rituais que são ligados às religiões de matrizes africanas, a ponto de decidirem sobre a legalidade do sacrifício de animais em rituais religiosos, como acontece na Umbanda e no candomblé, fazendo com que os adeptos das religiões afro-brasileiras, tivessem que defender o direito de culto, que está previsto na Constituição do país, em juízo.

Esse tema é bem argumentado por Fábio Carvalho (2013), em seu artigo, onde o mesmo afirma que a garantia constitucional da liberdade religiosa implica um compromisso do Estado em respeitar e assegurar o respeito às mais variadas crenças e, consequentemente, às mais diferentes compreensões acerca da vida e de outros temas próprios do campo religioso, ou seja, cabe o Estado respeitar a pluralidade de crença e todos os seus ritos, independente de sua ideologia, desde que a mesma esteja de acordo com as leis do país.

É em torno desta questão que surgiu o embate que ocasionou a decisão do TJ/RS sobre garantir a liberdade de culto, que contempla o abate de animais para fins religiosos, mas sem uso de crueldade e excessos. A decisão em questão tornou o abate de animais para fins religiosos, lícito, por não tratar de vida (humana), e somente quando este tipo de prática fosse realizado de forma cruel e em excessos, poderia haver incidentes das leis penais.

Ressalta também na mesma decisão que não há em nosso ordenamento jurídico uma só lei que proíba o sacrifício de animais (não humanos), exceto os animais silvestres e outros animais em extinção, pois infringem as leis ambientais, visto que estes animais, utilizados em cultos de religião de matriz africana além de serem de pequenos portes, não são desperdiçados, os adeptos dessas regiões, utilizam todas as “partes” do animal e muita das vezes para próprio consumo de toda a comunidade religiosa, ou seja, não há excessos e/ou uso de violência , pois além dos animais serem parte da comunidade, há toda uma liturgia para então assim ser realizado qualquer tipo de sacrifício religioso.

Nesta vertente mais uma vez, devemos tratar este caso como uma falha do Estado, visto que o direito de praticar o culto que nele envolve abate de animais de pequeno porte, não deveria nem ser debatido de forma jurídica, tendo em vista que o ritual em questão é próprio de uma religião, e ao entrar neste mérito, infringiria o direito à liberdade de culto, que é um direito fundamental.

Todo e qualquer ritual particular em que a sociedade acredite não estar dentro dos padrões de religiões Eurocêntricas, causam estranheza e preconceitos, levando o debate para o campo jurídico.

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