Resenha : Reforma urbana e Revolta da Vacina
Por: Jessica17morena • 3/6/2015 • Artigo • 1.798 Palavras (8 Páginas) • 627 Visualizações
Resenha do texto:
BENCHIMOL, Jaime. Reforma urbana e Revolta da Vacina na cidade do Rio de Janeiro. In: FERREIRA, Jorge e DELGADO, Lucilia de Almeida Neves (orgs). O Brasil republicano (vol.1). O tempo do liberalismo excludente: da Proclamação da República à Revolução de 1930.
RESUMO
Em tempos republicanos, a cidade do Rio de Janeiro era a mais importante no cenário político, social e intelectual do Brasil. Entretanto, sua estrutura física e os costumes da população, especialmente das classes menos favorecidas, não condiziam com a posição ocupada pela cidade. Sentiu-se então a necessidade de realizar uma reforma que a modificasse em âmbito material, cultural e legal. Ademais, a dificuldade de combater doenças ameaçadoras levou o governo a uma preocupação com a saúde social. Nesse sentido, uma lei de obrigatoriedade de vacinação conduziu partes heterogêneas da sociedade a reivindicar não apenas contra a lei, mas também contra o autoritarismo e abuso do governo, abrindo espaço para uma tentativa de insurreição militar. É o que se conhece como Revolta da Vacina.
PALAVRAS CHAVE
Revolta da Vacina; Rio de Janeiro; reforma urbana; saúde coletiva; ideal estético; inspiração positivista; higienistas; sanitaristas; Brasil república.
Do ponto de vista positivista, pode-se distinguir estágios principais na evolução da cidade do Rio de Janeiro. No princípio, o Rio se expandiu lentamente por meio de aldeamentos de colonos não planejados, “feios e insalubres”. Mudanças significativas ocorreram na cidade quando se tornou a capital da colônia portuguesa na América. Mais tarde, no período imperial, transformações ainda maiores se deram com a instalação da Família Real portuguesa no principal centro urbano carioca, inclusive devido ao aumento súbito da população em 15 mil habitantes em decorrência dessa mudança da realeza (BENCHIMOL, 2008, p. 233-234). Benchimol, porém, ressalta a amplitude e importância da reforma da cidade do Rio de Janeiro ocorrida durante a República. Houve nesse período mudanças profundas na estrutura física de tal espaço urbano, bem como nos hábitos e costumes da população, em instituições sociais, na legislação e em questões tributárias.
No auge da economia cafeeira, o Rio tinha seu progresso guiado pela articulação da lavoura escravista do café. Ele era o empório comercial e financeiro mais próspero do país e nos extremos da sociedade, havia os senhores e os escravos. As ruas da cidade eram o local de trabalho dos escravos de ganho, os quais alugavam sua mão-de-obra e com parte do dinheiro que recebiam, se sustentavam, alguns chegando a pagar por estadia em cortiços. Além disso, crescia o espaço do trabalho assalariado, de forma que homens e mulheres pobres viviam da venda de sua força de trabalho; alguns se tornavam operários, outros tinham ocupação relativamente fixa, mas eram recorrentes também os chamados “bicos” (BENCHIMOL, 2008, p. 235).
Apesar do crescimento da cidade em decorrência de investimentos e empréstimos (BENCHIMOL, 2008, p. 235).
Apesar do crescimento da cidade em decorrência de investimentos e empréstimos externos após a segunda revolução industrial e da formação de novos bairros, situações críticas se aglomeravam no centro. Elas eram derivadas da desigualdade entre a estrutura material constituída em tempos anteriores e as relações que o capitalismo instigava. As ruas eram estreitas e cheias de curvas, estavam frequentemente tumultuadas e eram divididas entre os escravos de ganho, os indivíduos livres de classes mais baixas, animais e certos meios de transporte, tais como bondes e carroças. O centro abrigava também os mais diversos estabelecimentos e construções, desde cortiços e estalagens precariamente construídos a bancos e prédios públicos profissionalmente planejados e materializados (BENCHIMOL, 2008, p. 236). A diversidade de pessoas, atividades e estabelecimentos, assim como a inexistência de saneamento e a falta de preocupação com a limpeza dos meios públicos e privados, favoreciam o aparecimento de epidemias. As mais preocupantes com maior índice de mortes eram as de febre amarela, varíola e peste bubônica (BENCHIMOL, 2008 p. 265).
Médicos intitulados higienistas julgavam ser fatores condicionantes das doenças epidêmicas as condições urbanas, naturais e orgânicas dos indivíduos de predisposição à contaminação. Os médicos em questão foram os primeiros a propor intervenções governamentais na cidade a fim de não só minimizar surtos epidêmicos como também dar à capital da República ares de maior surtos epidêmicos como também dar à capital da República ares de maior racionalidade e modernidade. Eles diziam que os pântanos eram focos de disseminação de miasmas, condenavam os hábitos das classes mais baixas, especialmente as condições das habitações coletivas em que viviam, além da falta de preocupação da comunidade em geral com questões de higiene e limpeza. Tal grupo de médicos contribuíram para a adoção das primeiras leis reguladoras do crescimento urbano e para o pensamento das camadas médias favorável a transformações para melhoramento da cidade (BENCHIMOL, 2008, p. 239-241).
O engenheiro Francisco Pereira Passos é citado pelo autor como importante colaborador nesse processo. O primeiro plano urbanístico para o Rio de Janeiro, do qual Passos participou, tinha inspiração em reforma promovida por Haussmann em Paris (BENCHIMOL, 2008, p. 242) e defendia abrir na cidade canais para que a melhor circulação do ar removesse os miasmas, bem como criar uma estrutura urbana esteticamente agradável com as atrações que uma cidade moderna deveria ter (BENCHIMOL, 2008, p. 243). A remodelação urbana teve dois eixos principais: o porto do Rio de Janeiro e a avenida Central da cidade. O porto foi ampliado, recebeu instalações de tecnologia mais moderna e passou a funcionar com base em energia elétrica. A avenida Central teve prédios demolidos, seus moradores foram despachados, o que inclusive gerou profunda insatisfação popular com relação ao governo - o qual era visto nas figuras de Pereira Passos e Oswaldo Cruz (BENCHIMOL, 2008, p. 262)-, foi ampliada e sua estrutura visava elevá-la ao “ápice da hierarquia arquitetônica da cidade” (BENCHIMOL, 2008, p. 258). O Estado tinha base legal que o permitia fazer as transformações em questão. Ademais, as avenidas eram a principal forma de remodelação da cidade, pois estavam relacionadas à saúde pública, à circulação urbana e à transformação das formas sociais de ocupação (BENCHIMOL, 2008, p. 259). O governo criou uma série de regulamentações que guiariam as ações da população frente à nova realidade urbana e consequente necessidade de adequação do comportamento social aos novos moldes. Uma série de relações recorrentes no meio carioca eram agora incompatíveis com a "cidade requerida pelo grande capital, e com a capital requerida pelo Estado republicano” (BENCHIMOL, 2008, p. 261). Foram feitas pelo prefeito uma variedade de interdições que atingiram a vida pessoal da população carioca censurando-a quanto a suas formas de trabalho, lazer, hábitos e costumes, tudo isso bastante enraizado na cultura e modo de vida daquelas comunidades (BENCHIMOL, 2008, p. 263). Buscava-se assim transformar à força a tão diversa sociedade carioca na concretização de estereótipos de interesse da burguesia, posto que permitiriam melhor domínio sobre o povo (BENCHIMOL, 2008, p. 264). Por outro lado, as dívidas externas feitas para possibilitar a reforma resultaram em uma política fiscal que atingiu duramente as camadas mais pobres da população. Diante dessa realidade, as milhares de pessoas expulsas de suas casas e comércios, logo, desabrigadas e desempregadas, eram obrigadas a ter a "vida errante dos vagabundos” (BENCHIMOL, 2008, p.264) e se aglomeravam nos centros. Não tinham condições de viver nos subúrbios, os quais eram ocupados pelas camadas médias da sociedade (BENCHIMOL, 2008, p. 265).
As primeiras formas de combate às epidemias não obtiveram êxito. Entretanto, com avanços médicos e científicos introduzidos no Brasil inicialmente em especial por Domingos José Freire e Oswaldo Cruz, as medidas profiláticas e de tratamento tiveram maior eficiência no controle de surtos. Porém, ainda assim não eram grandemente satisfatórios, dada a incapacidade de erradicar doenças com alto grau de fatalidade e de evitar ocasionais epidemias, as quais fugiam ao controle. Em meio aos estudos a respeito da temida febre amarela, a vacina que Freire criou para tal doença teve ampla aceitação, mas foi abalada por novas teorias a respeito do agente causador e da natureza da doença (BENCHIMOL, 2008, p. 246-248). A opinião pública já admitia que as doenças que mais duramente acometiam a população eram causadas por micróbios, mas não havia consenso nem em âmbito acadêmico sobre quais as medidas profiláticas necessárias ao seu combate. As possibilidades variavam de acordo com cada germe (não se tinha certeza de qual germe era causador de cada doença) e com ospobres da população. Diante dessa realidade, as milhares de pessoas expulsas de suas casas e comércios, logo, desabrigadas e desempregadas, eram obrigadas a ter a "vida errante dos vagabundos” (BENCHIMOL, 2008, p.264) e se aglomeravam nos centros. Não tinham condições de viver nos subúrbios, os quais eram ocupados pelas camadas médias da sociedade (BENCHIMOL, 2008, p. 265).
As primeiras formas de combate às epidemias não obtiveram êxito. Entretanto, com avanços médicos e científicos introduzidos no Brasil inicialmente em especial por Domingos José Freire e Oswaldo Cruz, as medidas profiláticas e de tratamento tiveram maior eficiência no controle de surtos. Porém, ainda assim não eram grandemente satisfatórios, dada a incapacidade de erradicar doenças com alto grau de fatalidade e de evitar ocasionais epidemias, as quais fugiam ao controle. Em meio aos estudos a respeito da temida febre amarela, a vacina que Freire criou para tal doença teve ampla aceitação, mas foi abalada por novas teorias a respeito do agente causador e da natureza da doença (BENCHIMOL, 2008, p. 246-248). A opinião pública já admitia que as doenças que mais duramente acometiam a população eram causadas por micróbios, mas não havia consenso nem em âmbito acadêmico sobre quais as medidas profiláticas necessárias ao seu combate. As possibilidades variavam de acordo com cada germe (não se tinha certeza de qual germe era causador de cada doença) e com os interesses dos envolvidos na reforma dos meios urbanos (BENCHIMOL, 2008, p. 254). Na década de 1890, a abolição da escravidão, o grande contingente de imigrantes, conflitos políticos e problemas econômicos agravaram ainda mais a questão da saúde pública nas principais cidades brasileiras.
No caso da varíola, seu controle dependia da vacina. Diante disso, uma lei aprovada em 1904 tornava obrigatória a vacinação contra essa doença. Teve início então um movimento contra tal obrigatoriedade, constituído de forças sociais diversas e que contava com a colaboração de indivíduos que eram opostos ao governo por motivos diversos. A Revolta da Vacina não reivindicava apenas contra a lei em questão, mas também contra medidas despóticas que o governo vinha tomando com a intenção de modernizar e embelezar o Rio de Janeiro, além da invasão de direitos naturais da população. Ademais, militares se aproveitaram dessa situação para tentarem praticar uma insurreição militar objetivando depor o presidente da época (BENCHIMOL, 2008, p. 272-273). A Revolta foi violentamente reprimida pelas forças estatais e seu saldo foi duplamente negativo para o povo. Primeiro devido às perdas que a repressão causou e segundo porque no ano de 1908 houve uma epidemia de varíola com maior número de vítimas fatais que o Rio já tivera até o momento (BENCHIMOL, 2008, p. 277).
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