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Exclusão social, racismo e violência: representação do contexto político e social carioca na obra Cidade de Deus.

Por:   •  22/11/2019  •  Projeto de pesquisa  •  3.734 Palavras (15 Páginas)  •  228 Visualizações

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Exclusão social, racismo e violência: representação do contexto político e social carioca na obra Cidade de Deus.

Isabella Feques Amorim[1]

Resumo: Este artigo analisa o romance Cidade de Deus escrito e publicado por Paulo Lins em 1997, a obra retrata o cotidiano de moradores de uma comunidade de baixa renda no Rio de Janeiro durante três décadas. O objetivo do trabalho de pesquisa é demonstrar a possibilidade do uso da literatura para analisar o pensamento político e a conjuntura social de um contexto histórico. Dentro da narrativa de Lins, é possível perceber representações da realidade carioca, como a exclusão social, aumento da violência urbana e modificação das formas e dominância da criminalidade. Nos interessa entender como essas problemáticas foram tratadas pela polícia e pelo Estado vigente na época e como as comunidades e a sociedade foram afetadas.

Palavras chave: Violência. Criminalidade. Racismo. Exclusão Social. Literatura.

Abstract: This article analyzes the novel Cidade de Deus written and published by Paulo Lins in 1997, the work portrays the daily life of residents of a low income community in Rio de Janeiro for three decades. The objective of the research is to demonstrate the possibility of using literature to analyze political thinking and the social conjucture of a historical context. Within the narrative of Lins, it is possible to perceive representations of the Carioca reality, as social exclusion, increase of the urban violence and modification of the forms and dominance of the criminality. We are interested in understanding how these problems were handled by the police and the State in force at the time and how communities and society were affected.

Keywords: Violence. Crime, Racism. Social Exclusion. Literature.

Introdução 

O escritor e poeta Ferréz dedica um texto especial a Paulo Lins na edição de 2012 do romance, em um trecho do texto diz que Cidade de Deus foi um romance escrito por quem é o tema e que vivenciou a realidade de ser um morador de favela. Nascido no Rio de Janeiro em 1958, Lins se mudou ainda criança para o então conjunto habitacional, presenciando as diversas mudanças que o local sofreu ao decorrer do tempo. O romance foi extremamente marcante para a literatura Brasileira, possivelmente por seu tema central salientar um problema persistente na realidade carioca, a violência e a criminalidade. Publicado em 1997, foi escrito enquanto o escritor participava de um projeto sobre “Crime e criminalidade nas classes populares”, sob orientação da antropóloga Alba Zaluar. Em seus agradecimentos finais o escritor diz que sua obra se baseia em fatos reais, e que parte do material teria sido extraído de entrevistas com moradores e de artigos dos jornais O Globo, Jornal do Brasil e O Dia.

Com fortes influências do Naturalismo, Lins descreve a rotina de uma quantidade considerável de personagens, que entram em evidência e são descritos de uma forma pormenorizada e passageira, pois esses indivíduos rapidamente são consumidos pela violência e a morte que estão intimamente ligadas ao cotidiano da favela. Uma forte característica do naturalismo, por se tratar de uma forma exagerada do realismo, consiste em se basear na realidade e na experiência, buscando apreender os problemas sociais, o que Paulo Lins nitidamente fez, evidenciando em sua obra diversos problemas da sociedade brasileira e como essas adversidades refletem na vida social dos moradores da favela.  

A busca por uma proximidade com a realidade, em que o próprio autor se insere sendo morador da favela, Cidade de Deus se mostra não somente como uma produção literária de grande valor para a literatura brasileira, mas também como uma possível fonte para investigação histórica. Seu conteúdo foi escrito pensando em ilustrar a realidade vivida por aqueles que sofreram com a exclusão social e gerar um debate dentro da sociologia, história e da secretaria de segurança pública, com o intuito que houvesse a diminuição da violência policial e criminal nas favelas[2].

No intuito de se legitimar como disciplina e buscar se tornar objetiva e científica, a história define a fonte como um documento, que seria então expressão da autoridade e verdade, sendo assim a literatura, por fazer parte do universo da ficção e ter uma disposição à subjetividade, não seria considerada válida para atestar a verdade histórica. Diversas discussões e modificações foram inseridas dentro da Teoria da História e da Historiografia, esses parâmetros sobre o que seria considerado uma fonte histórica válida e verídica também sofreram transformações. A ideia de se trabalhar com os mais diversos tipos de fonte, inclusive as artísticas, passa a ser mais aceitável e difundida dentro da metodologia (PINSKY, 2009).

Representação do contexto político e social

O primeiro capítulo do romance, A História de Inferninho, se passa na década de 60 quando a Cidade de Deus era um recém-criado conjunto habitacional e recebia um grande número de moradores vindos de diversas favelas do Rio de Janeiro. Em 1960 Carlos Lacerda era o governador do Estado da Guanabara[3], dando início ao desenvolvimento de uma política de reforma urbana, que tinha o intuito principal embelezar e modernizar a cidade. Essa transformação implicava na remoção de um grande número de favelas que ocupavam as áreas com grande interesse econômico e imobiliário na zona sul do Estado. As remoções marcaram fortemente a gestão de Lacerda, que exerceu o cargo até 1965 após perder as eleições para Francisco Negrão de Lima[4], que consegue a maioria dos votos em cima da promessa de encerrar as remoções.

A instauração da Ditadura Militar em 1965 alavancou as políticas de remoção de favelas, a violência era a justificativa central para a presença militar ostensiva.  Dentre os anos de 1965 a 1974, cerca de 139 mil pessoas foram removidas de suas residências, esse número diz respeito apenas ao Estado do Rio de Janeiro (DAVIS, 2006: 110). As práticas repressivas e autoritárias se intensificam com o decreto do Ato Institucional n 5 em 1968, impedindo que houvesse resistência dos moradores e movimentos sociais ligados as favelas através de investigações, detenções arbitrarias e perseguição.

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