CRIANÇA, INFÂNCIA E EDUCAÇÃO INFANTIL CONCEPÇÕES: PONTO DE PARTIDA
Por: Gleyciene Alves • 6/10/2016 • Bibliografia • 4.713 Palavras (19 Páginas) • 494 Visualizações
CRIANÇA, INFÂNCIA E EDUCAÇÃO INFANTIL
1 CONCEPÇÕES: PONTO DE PARTIDA
[pic 1]
1.1 Concepção de Infância e Criança
Vejam o que responderam algumas professoras frente às mesmas questões:
Quadro 1: Concepções
Criança | Infância |
Pessoinha na idade infantil. | Fase em que se é criança. |
Ser ingênuo. | Melhor época da vida. |
Ser natural. | Fase mais linda da vida. |
Ser que está aflorando. | Inocência. |
Baú de surpresa maravilhoso. | Brincar, descoberta. |
Observe que as idéias e concepções das professoras retratam uma concepção dominante de criança e infância, em certa medida romântica e própria de um discurso instituído socialmente.
Ao se falar de infância e criança, há uma tendência natural de traduzi-la como “anos dourados da vida”. As professoras que responderam às questões relataram ter vivido uma infância bastante semelhante. Relembraram com saudades da liberdade que tinham, do brincar na rua, do pouco controle dos pais, de um tempo de pouca violência e de uma época em que as mães não trabalhavam fora.
Mas será que toda criança e infância se enquadram nas concepções sugeridas pelas professoras? Se pensarmos numa criança de rua, aquela que fica no sinal vendendo balas, pode-se dizer que se trata da mesma criança e da mesma infância descritas anteriormente? Ou será que elas não são crianças? [pic 2]
Essas considerações iniciais são para chamar a atenção para o quanto é necessário explorar as ideias e concepções de criança e infância de forma reflexiva e crítica, avaliando-se em que medida se aproximam da criança real. Os programas de Educação Infantil, como já afirmamos, estão intimamente ligados às concepções. A opção por determinado programa vai depender daquilo que é criança e do que é infância num determinado contexto social e para as pessoas diretamente envolvidas. Entretanto,[pic 3]
Em síntese:[pic 4]
A literatura pertinente ao assunto nos mostra que existe uma evolução histórica da representação social de infância e da criança. Ocorreram ao longo da história da humanidade algumas variações das concepções. O significado social atribuído à infância e à criança não é homogêneo. A esse respeito, Rocha (1999, p.39) afirma que “uma mesma sociedade, em seu tempo, comportará a partir de sua constituição sócio-econômica e cultural, diferentes infâncias”. Ou seja, a história da criança e da infância não está isolada de seu contexto social, demográfico e temporal, razão pela qual tem se modificado ao longo dos séculos.
A infância, construída e transformada historicamente, se alterou entre sentimentos dicotômicos, tais como: paparicação e moralização; autonomia e controle; liberdade e subordinação; ternura e severidade. Essa dicotomia acabou por se refletir numa série de paradoxos vividos pela infância atualmente. Considera-se a criança tanto como alguém dotado de competências, como em falta delas. Uns valorizam o que a criança é de fato, outros o que ela poderá vir a ser.
Para Áries[1] (1981), o “sentimento de infância” que temos hoje não é um sentimento natural e que sempre existiu. Uma concepção diferenciada de criança só se iniciou ao final da Idade Média. No entanto, é importante que se entenda que a falta de um “sentimento de infância” não deve ser confundido com a ausência de afeto pelas crianças por parte dos adultos. Segundo Ariès (1981),[pic 5]
A construção histórica da evolução dessa consciência da particularidade infantil, segundo o mesmo autor (1981), pode ser assim sintetizada:
- Infância reduzida: Até por volta do século XII a duração da infância era reduzida. Reduzia-se ao seu período mais frágil, em que precisava dos cuidados indispensáveis à sobrevivência. Tão logo a criança adquirisse algum desembaraço físico era misturada aos adultos. Com eles, partilhava os trabalhos e jogos/brincadeiras. Nessa convivência lhes eram transmitidos os valores e conhecimentos. Em suma, a criança era desconhecida.
- Paparicação à criança nos seus primeiros anos de vida: Sentimento superficial de infância. Iniciou-se no século XIII e evolui nos séculos XV e XVI. A criança passou a ser vista como diferente do adulto. [...] “a criança por sua ingenuidade, gentileza e graça, se tornava uma fonte de distração e de relaxamento para o adulto” (ARIÈS, 1981, p.158).
- Sentimento de Infância: a partir do século XVII, período em que a criança e a família assumiram um novo lugar nas sociedades industriais. Esse sentimento trouxe consigo a preocupação dos educadores e moralistas com a disciplina e a racionalidade dos costumes. A partir de então, foi reconhecida a infância como etapa particular da vida. Gradativamente, o Estado, a sociedade e, em especial, as famílias, passaram a proteger e assegurar os direitos da criança.
Ariès (1981) argumenta, ainda, que esse novo “sentimento” inspirou toda a educação do século XX, por provocar interesse psicológico e preocupação moral em relação à infância. A partir dele ocorreram mudanças consideráveis. Era preciso separar a criança da família, para educá-la. Não era recomendável que ela ficasse misturada com os adultos e que aprendesse a vida diretamente. E então: [pic 6]
Mas e a infância, hoje?
De acordo com Corazza (2002), no período chamado Modernidade surgiu o “Indivíduo”, um sujeito grande que passou a atentar para as “gentes pequenas”, mas apesar disso a “infância nunca foi verdadeiramente assumida, efetivada, praticada, como idade, etapa ou identidade específicas” (2002, p.196). Para a autora, vivemos hoje, o “desaparecimento da infância”.
Assim, é fundamental que se incorpore a idéia de que, dada às distintas condições impostas às crianças, em diferentes tempos e lugares, não é possível viver uma infância idealizada. Como um ser social, as crianças participam das relações sociais, “apropriam-se de valores e comportamentos próprios de seu tempo e lugar, porque as relações sociais são parte integrante de suas vidas, de seu desenvolvimento” (KULHMANN JÚNIOR, 2001, p.31).
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