QUESTÕES RACIAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Por: anpaulassa • 19/8/2015 • Relatório de pesquisa • 4.310 Palavras (18 Páginas) • 315 Visualizações
CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO DE ESPECIALIZAÇÃO EM DOCÊNCIA EM EDUCAÇÃO INFANTIL
ANA PAULA SILVA SANTOS – Turma A
QUESTÕES RACIAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Sorocaba
2015
ANA PAULA SILVA SANTOS
QUESTÕES RACIAIS NA EDUCAÇÃO INFANTIL
Memorial Acadêmico apresentado ao Curso de Pós-Graduação Especialização em Docência em Educação Infantil, da Universidade Federal de São Carlos - UFSCAR, Campus Sorocaba, como um dos pré-requisitos para conclusão da Pós-Graduação.
Sorocaba
2015
Ninguém nasce odiando outra pessoa.
Para odiar, as pessoas precisam aprender,
e se elas aprendem a odiar,
podem ser ensinadas a amar,
A bondade humana é uma chama
que pode ser oculta, jamais extinta.
Nelson Mandela
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
INFÂNCIA
VIDA PROFISSIONAL
CONSIDERAÇÕES FINAIS
BIBLIOGRAFIA
INTRODUÇÃO
Confesso que puxar da memória fatos do passado não é algo tão simples pois, além de perceber que nossa memória “é curta”, tal como está no dito popular, começamos a resgatar detalhes que pareciam mortos em nosso subconsciente.
Neste ponto, é bom lembrar o que, em seu livro autobiográfico Amkoullel, o menino fula, diz Amadou Hâmpaté Bâ sobre a memória africana: “tudo lá estava nos menores detalhes” (apud SANTOS, 2015, p.54), não porque, em meu caso, houve qualquer treinamento para isto, como informa o autor, mas, porque tudo estava gravado, pela dor, em minha alma, como se na cera virgem que Amadou relata.
Isto porque, em certas situações, tratam-se de episódios que resgatam também a dor do momento, sentimento que, muitas vezes, não é bom de se lembrar; infelizmente, de minha vida escolar na infância, não há nenhuma lembrança positiva, que, gravada em minha memória, mereça, aqui, qualquer menção.
No entanto, se não fosse por estas lembranças, é provável que eu não estivesse aqui tentando transformar meus alunos em não racistas, colocando, neles, antes da consolidação da ideia de recusa ao diferente, a ideia da necessidade deste pela complementariedade que representa.
É neste sentido e com este objetivo que, entre outros procedimentos, procuro, sempre, colocar bonecos negros entre os costumeiramente não negros que enfeitam as festas das escolas em que atuo, bem como, sempre que proponho, como atividade a meus alunos, o uso das cores nos bonecos, os estimulo a que, além da própria cor, em que o autoconhecimento é o alvo, o conhecimento da cor, negra, da professora, também é uso incentivado.
Minha intenção, portanto, é fazer o possível para produzir a diferença na vida destes pequenos, inserindo-lhes positividades na construção de suas identidades raciais, de maneira a promover o respeito e a valorização do próximo, independentemente de cor, classe social, religião, ou qualquer outra exclusão, cujo motivo será, sempre, injustificado. Assim almejo.
INFÂNCIA
A diferenciação entre a cor negra e a branca só foi por mim percebida quando iniciei minha vida escolar, cujo ambiente é definido por Silva e Sales (2013) como “de integração social onde há o encontro de diferentes grupos étnicos-raciais” (p.55); porém, esta integração, que deveria ser positiva desde meu ingresso no antigo “jardim de infância”, mais ou menos por volta dos meus três e quatro anos de idade, foi justamente quando vivenciei a discriminação racial mais frequentemente, já que meus colegas me chamavam de “cabelo de Bombril, macaca, preta fedida”, além de cantar músicas ofensivas, do tipo “negra seu sovaco tem manteiga...”, e assim por diante, criando em mim sentimentos de impotência e revolta que, creio eu, me impulsionaram à minha atual postura de professora que, antes de tudo, busca transmitir formação social básica a meus alunos, para que se assentem em poderosos antídotos à intolerância racial.
Ainda segundo Silva e Sales (2013): “práticas preconceituosas são constantes dentro da escola” (p.55); pena que só descobri isto sentindo na pele, por ser alvo de permanente desta prática.
Como consequência, a partir da vivência do racismo[1] percebi que eu era diferente dos outros alunos: era eu a única aluna negra em uma escola particular, frequentada pela classe média sorocabana, situada no centro da cidade.
Nesta época, fatos similares aconteciam comigo também na antiga escola de idiomas Pink and Blue, atual PBF, onde eu cursava aulas de inglês. Ali também eu era a única aluna negra, inserida junto a crianças brancas provenientes de bairros de níveis sociais elevados; portanto, também ali eu era objeto de atitudes racistas.
Convém explicar que, por racismo, entendo qualquer exclusão social infundada, que se baseia, unicamente, nas aparências ou preconceitos que a sociedade dominante impõe, como rótulo, àqueles que se mostram ou se comportam como fora do padrão que esta sociedade determina.
Também convém saber que, de meu ponto de vista, é necessário ampliar o conceito explicitado por Kabengele Munanga, já que os racistas, no conceito deste mestre, pensam que “têm direito de ocupar os melhores lugares na sociedade”; mas, além disto, na prática, hierarquizam estes direitos, impedindo acesso a eles àqueles que julgam inferiores. Para tanto, é preciso deter o exercício do poder, o que, certamente, é transmitido às crianças pelo exemplo dos pais.
Quanto ao contexto social em que eu me encontrava, parece perfeita a observação de Fernandes (2007) sobre os reflexos e entraves que a sociedade impõe, como limite, à mobilidade e evolução social dos negros, em função, apenas, da cor da pele; diz o autor “que a integração do negro ao sistema de classe não lhe proporciona, de fato, as condições de participação cultural, acessíveis ao branco” (p.68), o que só reafirma todo o processo educacional vivenciado por mim durante a infância, visto que tal humilhação era vista como “normal” pelos adultos.
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