ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ACERCA DO GARANTISMO NO ORDENAMENTO JURÍDICO CONSTITUCIONAL PROCESSUAL E PENAL BRASILEIRO: ALCANCE E DIMENSÃO
Por: Mariana Cortez • 14/9/2017 • Trabalho acadêmico • 1.723 Palavras (7 Páginas) • 443 Visualizações
ALGUMAS CONSIDERAÇÕES ACERCA DO GARANTISMO NO ORDENAMENTO JURÍDICO CONSTITUCIONAL PROCESSUAL E PENAL BRASILEIRO: ALCANCE E DIMENSÃO
“O homem é o lobo do homem” já dizia Plauto, dramaturgo romano nascido no século III a.C. Sabe-se que o conflito, a guerra e a violência, marcaram a existência da humanidade, dos tempos primitivos até hoje. Desde embates entre tribos rivais até as grandes guerras do século XX, o ser humano, muitas vezes, optou pela alternativa diversa ao diálogo. A guerra não é meramente física, mas moral e cultural.
De tal modo, não foram poucos os que tentaram explicar de que forma as relações humanas regiam-se. Rousseau, Hobbes e Locke, cada um ao seu modo, formulou teorias sobre os contratos sociais. Paz em troca de liberdade, com o Estado sendo o agente regulador das situações de conflito, isto é, com o monopólio da violência. Cabe, ressaltar aqui, a reflexão execrada por Cesare Beccaria:
Ninguém fez gratuitamente o sacrifício de uma porção de sua liberdade visando unicamente ao bem público. Tais quimeras só se encontram nos romances. Cada homem só por seus interesses está ligado às diferentes combinações políticas deste globo; e cada qual desejaria, se fosse possível, não estar ligado pelas convenções que obrigam os outros homens. Sendo a multiplicação do gênero humano, embora lenta e pouco considerável, muito superior aos meios que apresentava a natureza estéril e abandonada, para satisfazer necessidades que se tornavam cada dia mais numerosas e se cruzavam de mil maneiras, os primeiros homens, até então selvagens, se viram forçados a reunir-se. Formadas algumas sociedades, logo se estabeleceram novas, na necessidade em que se ficou de resistir às primeiras, e assim viveram essas hordas, como tinham feito os indivíduos, num contínuo estado de guerra entre si. As leis foram as condições que reuniram os homens, a princípio independentes e isolados sobre a superfície da terra. (BECCARIA, 2003)
Frise-se, pois, que tais pensadores divergiam em uma vasta gama de aspectos, no que isso representa: a forma de controle social, a intensidade, e quais os agentes responsáveis por este. De tal modo, deitemo-nos os olhos sobre a vertente de pensamento garantista, objeto de análise neste estudo.
Destaque-se que, como uma espécie de avanço no que diz respeito à corrente garantista, ocorreu uma mudança nos aspectos basilares dos instrumentos jurídicos cujo papel perpassavam os vínculos entre o Estado e os indivíduos da sociedade. Entenda-se, por exemplo, a tripartição de Montesquieu, como uma mudança essencial para o garantismo.
Destarte, pode-se compreender que as ferramentas utilizadas pelo Estado tinham como fulcro sua atuação como detentor exclusivo da competência de punir. Tal competência era distribuída de acordo com as determinações constantes da ordem jurídica. O monopólio da violência, explica-se, era alicerçado no interesse coletivo. Mesmo que, por muitas vezes – e tristemente, até hoje – o interesse coletivo seja o de uma coletividade específica.
A ordem jurídica, contudo, não poderia se portar como óbice à liberdade, pois aquela veio para resguardar esta. De tal modo, compreende-se que o Estado deve agir conforme as leis, e se estas se baseiam no livre exercício da vontade humana, logo, entende-se como inconcebível que o Estado lhe fosse limitar.
O modelo clássico de direito penal, mínimo e liberal, focou-se, então, na preservação máxima da seara do livre-arbítrio humano, legitimando-se a responsabilidade penal do indivíduo apenas nos estritos limites do fato danoso que foi responsável (culpável) por causar (preconizando um direito penal do fato), punição esta proporcional ao desvio punível. Todos os princípios substanciais surgidos como consequência desse modelo servem como importantes mecanismos de contenção do arbítrio punitivo e de garantia da esfera de liberdade dos indivíduos, cumprindo o ideal iluminista de racionalização e limitação do poder político. (FERREIRA, 2014, p. 54)
De tal modo, elucida-se: a doutrina garantista analisada sob a ótica do direito processual penal é, ao menos na sociedade ocidental dos dias atuais, importantíssima no que condiz ao resguardo dos direitos individuais.
O pós-modernismo e a contemporaneidade trouxeram influências notáveis no que tange à interpretação dos instrumentos jurídicos que visam perpetrar o respeito às garantias individuais. A humanização do processo penal e as novas perspectivas de ressocialização são alguns exemplos de frutos colhidos dessa relação.
UMA PERSPECTIVA BRASILEIRA
Quando adentramos o âmbito do ordenamento jurídico pátrio, podemos compreender uma série de aspectos do garantismo penal. A presunção de inocência, isto é, a abstração jurídica de que o agente acusado é tido – pelo menos formalmente – como inocente em relação a um delito até que se prove o contrário, isto é, que a sentença criminal advinda de um tribunal legalmente competente transite em julgado. Sabe-se, pois, que o sujeito não é mais inocente quando, após o devido processo legal, esgotaram-se lhe os meios disponíveis para que rediscuta seu atestado de culpa.
Destarte, entende-se que o modelo de processo penal vigente nas terras brasileiras é o acusatório – com algumas ressalvas do Tribunal do Júri. Naquele, o dever de provar uma conduta criminosa é encargo do Estado, exercendo o poder de polícia do Executivo e do Ministério Público. O sistema inquisitorial, caracterizado pelo seu alto grau de autoritarismo ficou para trás – junto ao regime militar – mesmo 012que nossos Códigos ainda tragam influências deste nefasto período.
No que concerne a esta última temática, a Constituição Federal de 1988 instituiu um Estado Democrático, devendo este orientar-se a partir do seu novo núcleo principiológico. As regras e princípios penais estabelecidos requerem uma filtragem constitucional, tendo a sob a ótica da interpretação jurídica do aplicador do direito este principal parâmetro.
Deste modo, a Constituição resguarda àquele acusado de cometer qualquer conduta interpretada como crime uma série de direitos inerentes à dignidade da pessoa humana, restando ao Juiz de Direito a realização do exame dos fatos, e partindo do pressuposto de que este será imparcial em sua análise.
No que tange aos tribunais brasileiros, estes constituem-se a partir de uma estrutura dialética de processo, de modo que a prova e a instrução dos atos judiciais, no modelo penal brasileiro – acusatório – partem do princípio da garantia de um direito ao contraditório e à ampla defesa (art. 5º, LV), tendo como certo que toda decisão advinda do Poder Judiciário seja pública e fundamentada (art; 93, IX), sob pena de nulidade.
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