ECA - ESTATUTO DA CRIANÇA E ADOLESCENTE
Por: Donaldo Reck • 26/11/2016 • Artigo • 25.420 Palavras (102 Páginas) • 384 Visualizações
ROTEIRO DE ESTUDOS
DIREITO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE: NOÇÕES ESSENCIAIS
Prof. Mestre Linara Silva
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1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DOS DIREITOS DA FAMÍLIA, INFÂNCIA E JUVENTUDE: DA INDIFERENÇA AO RECONHECIMENTO LEGAL
Até o momento de a família ser reconhecida como base da sociedade e até ser conferido a crianças e adolescentes ostatusde titulares de direitos e obrigações próprios à condição de sujeitos em pleno desenvolvimento, muitas lutas, divergências e debates ocorreram dentro do ordenamento jurídico. O avanço, que significou a implementação do ECA no Brasil, não foi resultado de um milagre, nem de uma dádiva do legislador repentinamente, mas de todo um processo de construção e valorização de direitos humanos, conquistados através de toda a evolução civilizatória da humanidade. Sendo assim, é de fundamental importância apresentar a caminhada pela qualo direito da família, infância e juventude percorreu ao longo dos tempos, para ser possível compreender o real significado que possui a instituição familiar, a criança e o adolescente perante o contexto social atual.
1.1 Família: do conceito patriarcal à contemporaneidade
A palavra família é de origem romana, famulus, que significa escravo. Isso se dava pelo fato de o termo família não se referir ao casal, filhos, parentes, mas ao agrupamento de escravos e servos que cultuavam os mesmos deuses e trabalhavam exclusivamente para sua subsistência, estando sob a autoridade do paterfamilias. Esse era entendido como o membro mais importante na família romana, responsável em administrar o patrimônio familiar, preservando e dirigindo o culto às divindades de seus antepassados. Ainda, distribuía a justiça, fazendo parte do senado romano por um longo período, sendo o único membro sui juris da família, ou seja, sujeito de seu próprio direito, exercendo poder absoluto sobre a mulher, os filhos e os escravos, todos alieni júris, isto é, aqueles que não gozam de direitos próprios e estão sujeitos à autoridade de alguém. Assim, a instituição familiar era entendida, de um lado, pela idéia de subordinação e, de outro, pela idéia de poder e mando. (LEITE, 2005, p. 23).
Cumpre-se salientar que não há consenso acerca da formação e evolução da família, existindo, no entanto, estudos históricos e sociológicos sobre sua criação. Entretanto, entende-se não ser necessário traçar toda a história da família, desde seus tempos mais remotos, pois é longa e muito antiga; além do mais, outras áreas da ciência, explicam sua geração, desde as
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formas mais primitivas. O que realmente importa, nesse estudo, é compreender aspectos de sua evolução sempre levando em consideração a maneira como a criança era tratada no decorrer dos séculos e que permitiram chegar em seu conceito contemporâneo.
Na Antiguidade, o centro da família estava em defender seu patrimônio e sua perpetuação, não havendo ligação de afetividade da mesma forma como ocorre a partir do século XIX. Desse modo, sua função era basicamente assegurar a transmissão da vida, do nome e dos bens materiais. Até o século XIV, o conceito de família baseava-se na sobrevivência e proteção, sendo os trabalhos realizados por todos os membros do grupo, independente da idade. Dessa forma, observa-se que, nessa fase, não havia proteção do Estado para a menoridade. (FREITAS, 2002, p. 29).
Já no século XV, as crianças eram proibidas de saírem de casa antes dos sete ou nove anos de idade. Após esse período, eram encaminhadas para escolas ou casas alheias, com o intuito de aprenderem um ofício e lá permaneciam até completarem no máximo dezoito anos, contudo, eram forçadas a realizar todo o trabalho pesado. Eram chamadas de aprendizes e possuíam certos mestres que, além de lhe ensinarem um ofício, ensinavam-lhe a servir. Acredita-se que, nas casas onde as crianças permaneciam, eram tratadas mais como criadas do que como aprendizes, já que serviam mesas, faziam as camas, secretariavam e auxiliavam o mestre em todas as atividades, pois achavam que, assim, estariam educando a criança para a vida. Como os filhos não ficavam com seus pais, as relações de afeto entre ambos era empobrecida. (FREITAS, 2002, p. 30).
No período medieval, era permitido às crianças conviverem juntamente com os adultos, não havendo nenhum tipo de segregação. O conhecimento era transmitido através dessa convivência constante, o que levava crianças de quatorze anos a participarem de guerras, onde acompanhavam um cavaleiro e lutavam ao lado de seu senhor. Somente após o século XV, os pais começaram a substituir a relação de aprendiz mestre pela escola, que deixa de ser um espaço reservado apenas para aqueles que queriam se dedicar à vida sacerdotal. Dessa feita, houve considerável aumento da frequência escolar e a educação passa a ser de responsabilidade da escola. Salienta-se que a educação da época visava conservar a inocência primitiva das crianças, afastando-as do mundo de tentações dos adultos. A consequência desse fato foi a preocupação dos pais na vigilância dos filhos e a aproximação da família, haja vista que essa passou a concentrar-se em torno da criança. (FREITAS, 2002, p. 31).
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A partir do século XVII, começam a surgir textos a respeito de educação, fazendo referência a instituições de ensino, à supervisão dos trabalhos na escola etc. Assim, a infância e adolescência, que até então eram livres, passam a ser disciplinadas. As escolas preocupam-se em transmitir valores morais, a fim de formar pessoas de boa índole. Apesar de os filhos serem encaminhados a uma escola, poderiam visitar suas famílias, alargando as relações afetivas com as mesmas. Nesse momento, a criança passa a ser valorizada, ao contrário do que ocorria outrora, e os pais passam a ser sujeitos ativos de sua educação. Graças à família e à escola, as crianças são retiradas do mundo dos adultos, também com o intuito de afastá-las da delinquência. (FREITAS, 2002, p. 32).
As variadas mudanças que ocorreram ao longo dos séculos, fizeram com que fosse ampliada a convivência entre pais e filhos, formando um grupo menor e mais específico, denominado família. Então, surge a família nuclear no início do século XX, composta por pai, mãe e filhos, conforme entendida atualmente, onde o baluarte é a casa, o lar. (BARRETO, 2006, p. 44). No entanto, é impossível falar apenas no modelo de família nuclear, haja vista que, em meados da década de 1970, são reconhecidas as famílias monoparentais, isto é, as famílias formadas por um dos genitores e a prole, genitores esses solteiros, separados, divorciados, viúvos que demonstram a plausibilidade de viver o afeto e a solidariedade em diferentes moldes. (SANTOS, 2009, p. 6). Dentre tantas outras fases de evolução pela qual atravessou a instituição familiar, pode-se afirmar que, para o presente estudo, o aspecto mais marcante foi a transformação na função da família, ou seja, essa é vista atualmente como a responsável direta e quase exclusiva na formação e desenvolvimento dos filhos, independentemente de seu modelo estrutural. Assim, desenvolve-se a consciência para a valorização de cada um de seus membros, zelando pelo seu bem-estar, os quais ganham individualidade, estabilidade, autonomia, liberdade de ação dentro da estrutura familiar, valoração do afeto, da convivência familiar e da igualdade entre os filhos biológicos e afetivos. (SEREJO, 2004, p. 23).
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