O Direito do Consumidor
Por: Rafaella Davidson • 27/2/2018 • Pesquisas Acadêmicas • 5.811 Palavras (24 Páginas) • 204 Visualizações
Direito do Consumidor
Manual: Comentário ao CDC – Ed. Forense
1. Fundamentos
- Fundamento histórico: a defesa do consumidor tem início no final do século XIX, momento em que as teses de economia clássica liberalista começaram a estremecer diante da concentração empresarial e produção em massa formados a partir da Revolução Industrial, a qual desencadeou a formação de monopólios e oligopólios com amplo domínio sobre as relações de consumo.
Estado Liberal dá lugar ao Estado Social intervencionista e protecionista, para combater abusos do poderio econômico. Os princípios do liberalismo se revelavam em contradição com a nova realidade da concentração empresarial. O automatismo e autorregulação do mercado, não ocorrem na prática como se imaginava no pensamento liberalista. É diante deste cenário que nasce o Estado Social, ou Estado Intervencionista, na primeira metade do século XX, forma encontrada a para enfrentar às ameaças ao capitalismo, pois tornou-se nesse quadro impossível manter a livre concorrência efetiva e dar respostas à questão social. Tornava necessário, também, para tais fins, o manejo de um novo direito, que veio a se transformar no Direito Econômico, destinado à disciplina jurídica da regulação e atuação do Estado intervencionista. É, portanto, nesse contexto da concentração e dos abusos do poder econômico, bem como das novas demandas sociais, que geraram o surgimento do Estado Social, com função de legitimação que se insere a criação do Direito do Consumidor, como ilustração da multiplicação e nascimento de novos direitos no século XX.
Brasil: origem constitucional. A defesa do consumidor surge na década de 70, quando teve início a produção em larga escala no país, e ganha em força a venda em massa, que dá surgimento a uma sociedade de consumo. Lei da alienação fiduciária, de 1969, é uma preparação para vendas em massa, que decolam na década de 70 (“milagre brasileiro”, crescimento de 10% ao ano). Com o alargamento das relações de consumo, surge o Procon em 1976.
- Fundamento jurídico: correção das desigualdades/vulnerabilidades (Estado intervencionista). As vulnerabilidades são desdobramentos das desigualdades. As vulnerabilidades são as desigualdades concretas. São as desigualdades da relação de consumo que geram a necessidade de criar esse direito protetivo.
A questão do consumidor é uma desigualdade entre o poder econômico e o trabalhador. A questão do consumidor envolve a desigualdade: os consumidores são os trabalhadores, os que bancam o sistema. Já as empresas detêm o capital e meios de produção. Na relação de consumo o poder está com a empresa, porque é ela que faz o produto, estabelece a segurança dele, o consumidor fica vulnerável frente ao produto. O consumidor é frágil, porque ele não sabe de nada do outro lado. Dura realidade na qual se encontra o consumidor desde o surgimento da sociedade de produção e consumo de massa, cujo cenário é bem diferente daquele no qual existiam as figuras clássicas do comprador e contratante.
Empresa (Poder econômico, capital e meios de produção. Lucro como missão do poder econômico) x Consumidor (trabalhadores com salários e dependentes deste para consumir).
- Desigualdades na relação fornecedor-consumidor (base do Direito do Consumidor):
1º) Desigualdade econômica - capital, meios de produção x salário. Expressa-se através do poder econômico do fornecedor (capital). Capital não é só dinheiro em si, mas também meios de produção, como maquinários, instalações, tudo que gera reprodução da riqueza. Capital em caixa, aplicado, e em bens de produção. Enquanto, por outro lado, o consumidor tem seu salário, rendimento de aposentadoria, aluguéis;
2º) Desigualdade política - a superioridade política do Poder Econômico está no financiamento das campanhas eleitorais, lobbies no Legislativo, influência política na área tributária, de saúde, entre outras. Os fornecedores detêm maior influência política do que o consumidor e têm dinheiro para financiar campanhas e pressão legítima (lobbies);
3º) Desigualdade gerada pelo caráter coercitivo do consumo - motivo: atingimento da propaganda e marketing na população. Marketing, campanhas publicitárias, mídia audiovisual, e as circunstâncias mercadológicas, tudo isso está por trás desta coerção ao consumo (fornecedores incentivam o consumismo). O consumo que move a soc
iedade não é livre, mas sim coercitivo devido ao apelo para o mesmo e a influência que a empresa tem sobre os consumidores. "As empresas gastam muito para convencer e gastam migalhas para esclarecer" – relação com princípio da transparência/informação;
4º) Desigualdade tecnológica - empresas detentoras do saber tecnológico, gigantesco e incomparável. Resulta da própria sociedade, porque somos leigos e desconhecemos os processos tecnológicos;
5º) Desigualdade informativa/de conhecimento - o fornecedor tem conhecimento científico-tecnológico-informacional sobre o produto fabricado/fornecido superior ao do consumidor;
6º) Desigualdade jurídica
7º) Vulnerabilidade relativa a condição pessoal do consumidor ("supervulnerabilidade") - crianças, grande massa com pequena instrução, idade (ex: propagandas para persuadir idosos com seguros específicos), condição de enfermo, etc. Vulnerabilidades especiais: crianças, idosos, monopólio, qualidade de enfermo. Apesar de ser meio subjetivo, o CDC fala sobre condições especiais;
8º) Vulnerabilidade relacionada aos monopólios – exige intervenção do governo.
- Objetivo do Direito do Consumidor: diminuição das desigualdades. Ao estabelecer proteção específica ao consumidor, o que se promove é a igualização, por meio do direito, de uma relação faticamente desigual.
Matéria essencialmente constitucional: princípio da igualdade em busca da igualdade material. No âmbito constitucional aplica-se o princípio da isonomia material (geração de desigualdades no plano jurídico para suprir as desigualdades geradas no plano fático). O Direito tem que aplicar a isonomia material em função dessa desigualdade, ou seja, aplicação de uma desigualdade jurídica (contratual) para compensar a desigualdade no mundo real. A criação de desigualdades compensatórias e aplicação de igualdade material é papel do Estado Social.
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