O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA NO INQUÉRITO POLICIAL DENTRO DE UMA PERSPECTIVA CONSTITUCIONAL
Por: ROBIN SANTOS • 19/6/2018 • Artigo • 6.572 Palavras (27 Páginas) • 300 Visualizações
Revista do
CEJUR/TJSC: ISSN: 2319-0876 [pic 1]
Prestação Jurisdicional ISSN Eletrônico: 2319-0884
O PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA NO INQUÉRITO POLICIAL DENTRO DE UMA PERSPECTIVA CONSTITUCIONAL
Vinícius Rech[1]
RESUMO
O presente estudo teme como objetivo esclarecer a questão da aplicabilidade dos princípios do contraditório e da ampla defesa no inquérito policial, trazendo à luz a discussão doutrinária acerca do tema. Atualmente a atividade policial dedica-se à apuração (investigação) das infrações penais e à indicação de sua autoria por meio da utilização de um sistema inquisitório, no qual o indiciado é apresentado como “suspeito”, ou seja, não se tem um “acusado”, e, por ser assim considerado, ignora-se a observância da ampla defesa e do contraditório, prevista no art. 5º, inciso LV, da CF. A composição deste artigo destaca uma visão oposta ao entendimento majoritário acerca do tema e está estruturada em três eixos temáticos: no primeiro, aborda-se os sistemas processuais, em que são tratados os princípios da sistemática do processo penal; no segundo, faz-se uma análise do inquérito policial, observando suas características e garantias aplicáveis; e no terceiro e principal da pesquisa, expõe-se todos os argumentos favoráveis à adoção dos princípios do contraditório e da ampla defesa no inquérito policial. Destaca-se que, para que haja admissão desses princípios neste procedimento, faz-se necessário afastá-los do caráter inquisitório do inquérito policial, com a aplicação dos princípios insculpidos na Constituição Federal, que devem estar acima de qualquer norma jurídica. Dentro dessa perspectiva, amplia-se a garantia do respeito à dignidade da pessoa humana, distante do que se percebe no inquérito policial atual, que, por estar calcado em um sistema inquisitivo, o indiciado é muitas vezes tratado como objeto do direito e não detentor desse direito.
Palavras-chave: Processo penal. Contraditório. Ampla defesa. Constitucional. Inquérito Policial.
INTRODUÇÃO
O presente estudo norteia-se precipuamente na disposição contida no artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes” na sua implicação no Sistema Processual Penal Brasileiro.
Em breve análise da referida norma, o constituinte pretendeu estender tais garantias não só aos acusados da ação penal, mas também a qualquer cidadão, ao qual o Estado atribua a autoria de um fato, independente da fase do procedimento persecutório, seja esta de natureza judicial ou administrativa.
Contudo, evidencia-se grande divergência doutrinária quanto às referidas garantias, haja vista alguns juristas entenderem que o contraditório e a ampla defesa somente são assegurados àqueles que estão sendo processados judicialmente. Nesse contexto, o inquérito policial sempre foi entendido e defendido como um procedimento inquisitorial, e apontado não como processo, em face da inexistência de acusados, mas como mero procedimento informativo, portanto, sem a possibilidade de defesa durante sua formação.
Sob uma ótica garantista, busca-se analisar as repercussões de uma nova proposta a afetar a intangibilidade do inquérito policial dentro de uma perspectiva de persecução penal constitucional. Para tanto, alguns pontos de extrema importância foram destacados, como os princípios constitucionais que regem o processo penal e a inserção dos princípios do contraditório e ampla defesa, assegurados pelo artigo 5º, inciso LV, da Constituição da República Federativa do Brasil ao inquérito policial.
Novos contornos advindos da jurisprudência e da doutrina sinalizam que uma nova interpretação possa ser conferida à investigação criminal a fim de se possibilitar o contraditório e a ampla defesa do investigado dentro do procedimento de persecução penal.
SISTEMA PROCESSUAL PENAL
Para compreender o significado de sistema processual penal, é importante expor sua definição. Rangel (2009, p. 46) o conceitua nos seguintes termos: “[...] é o conjunto de princípios e regras constitucionais, de acordo com o momento político de cada Estado, que estabelece as diretrizes a serem seguidas para a aplicação do direito penal a cada caso concreto”.
Processo penal, nesse norte, é uma sequência lógica, orientado por princípios e regras, a fim de abranger cada caso conforme suas peculiaridades.
O sistema acusatório consiste na divisão de funções e funciona como uma pirâmide, ficando as partes na mesma plataforma, mantendo-se assim, a igualdade entre elas. O outro polo consiste no Estado-juiz, que está acima da pirâmide, cabendo-lhe a tutela jurisdicional e colocando-se como garantidor dos direitos fundamentais do acusado. Sobre as características do sistema em questão, explica Tourinho Filho:
“No processo penal acusatório, que campeou na Índia, entre os atenienses e entre os romanos, notadamente durante o período republicano, e que, presentemente, com as alterações ditadas pela evolução, vigora em muitas legislações, inclusive na nossa, existem, como traços profundamente marcantes: a) o contraditório, como garantia político-jurídica do cidadão; b) as partes acusadoras e acusada, em decorrência do contraditório, encontramse no mesmo pé de igualdade; c) o processo é público, fiscalizável pelo olho do povo (excepcionalmente se permite uma publicidade restrita ou especial); d) as funções de acusar, defender e julgar são atribuídas a pessoas distintas, e, logicamente, não é dado ao Juiz iniciar o processo (ne procedat judex ex officio); e) o processo pode ser oral ou escrito; f) existe, em decorrência do contraditório, igualdade de direitos e obrigações entre as partes, pois ‘non debet licere actori, quod reo non permittitur’; g) a iniciativa do processo cabe à parte acusadora, que poderá ser o ofendido ou seu representante legal, qualquer cidadão do povo ou órgão do Estado” (2012, p. 113-114).
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