O Foro privilegiado e a Constituição de 1988
Por: Iasmin Ferreira • 8/6/2016 • Trabalho acadêmico • 1.249 Palavras (5 Páginas) • 695 Visualizações
O foro privilegiado e a Constituição de 1988
Como citado anteriormente, a Constituição de 88 não expressa claramente em seu texto a proibição do foro privilegiado. Fato que causa, inicialmente, uma surpresa, pois a Carta tida como mais democrática e republicana quebra uma tradição que vem desde a primeira Constituição nacional e permanece durante toda a história constitucional, exceto durante a Polaca, constituição outorgada por Getúlio Vargas, em 1937, que dá início ao Estado Novo, excluindo, assim, do rol de garantias individuais a proibição do foro por prerrogativa de função. Contudo, no Artigo 5º, XXXVII, prevê que “não haverá juízo ou tribunal de exceção”, sem explicitar limites ao alcance da proibição de juízo ou tribunal de exceção. Portanto, cabe apurar se o foro privilegiado é abrangido por essa cláusula proibitiva, ou seja, se o conceito do foro por prerrogativa de função pertence ao conceito de juízo ou tribunal de exceção.
Por sua vez, o Ministro Celso de Mello destacou, em recente despacho, que o foro privilegiado estabelece uma “derrogação extraordinária aos postulados da igualdade e do juiz natural”, uma vez que a LII dispõe que “ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente”. Dessarte, pode-se dizer que a proibição de foro privilegiado inibe o tratamento privilegiado de um segmento social, sendo, nesse sentido, uma aplicação do princípio isonômico sob qual a Constituição de 1988 foi pautada. É, além disso, segundo Fábio Konder Comparato, inerente ao regime político modelado pela Carta Magna, que prevê a República Federativa do Brasil como um Estado Democrático de Direito (Artigo 1º).
Cabe ressaltar ainda que os pilares que dão sustento à ordem estatal brasileira, que são República, Democracia e Estado de Direito, derivam e retomam a um ideal isonômico de tratamento igualitário entre os cidadãos, sem distinguir governantes de governados, cabendo todos na concepção de povo. Sendo assim, é sob a perspectiva dessa ordem estatal que o princípio inscrito no art. 5º da Constituição deve ser compreendido, pois a isonomia constitucional não deve se diluir em um desdobramento apolítico de igualdade jurídica.
Assim, é perceptível que a proibição do foro por prerrogativa de função é, sobretudo, uma vedação de privilégio pessoal que não decorre apenas do caraterística isonômica, mas também da natureza republicana do regime político brasileiro, em que nenhum cidadão é dono do poder, natureza esta que influenciou a composição da Constituição de 88, não sendo viável outra interpretação para elucidar a falta de tratamento expresso acerca do imbróglio.
Contrário a isso, alguns expoentes sociais afirmam a necessidade da prerrogativa para impedir a incidência de ações acerca de improbidade administrativa em tribunais ordinários, atravancando assim o sistema judiciário do país. No entanto, a Constituição já trata em seu texto de ações civis públicas no entendimento da Lei 7.347/85, que regula os casos de litigância de má-fé, prevendo uma indenização por danos ao litigante. Destarte, esses argumentos são carentes de embasamento e, portanto, irrelevantes, não se aplicando à realidade jurídica do país.
O foro privilegiado e o princípio isonômico do Estado Democrático de Direito
O foro por prerrogativa de função é um claro desrespeito ao princípio de igualdade defendido pelos ideais republicanos, que defende que a lei deve regular de modo igualitário todos que a ela estão submetidos, independendo do cargo que exercem no viés político. Sendo assim, ele não possui justificativa ética e moral. Logo, quando não há julgamento equitativo, que independe dos cargos e ofícios exercidos, tem-se um governo que se desvia da democracia, tendendo a uma aristocracia, em que uma elite governante está acima da lei e, por vezes, rege a própria lei, moldado segundo suas aspirações. No Brasil, os beneficiados pelo foro privilegiado são autoridades dos três Poderes (presidente e vice-presidente da república, ministros de estado, senadores, deputados federais e ministros do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, do Tribunal Superior Eleitoral e Tribunal Superior do Trabalho) que respondem penalmente somente ao Supremo Tribunal Federal (STF), formando, assim, a aristocracia do país, o que acarreta contendas éticas e práticas.
No Sistema Judiciário Brasileiro, tanto os ministros que compõem o STF quanto o procurador geral da República, que é o responsável por acusações perante o STF, são indicados pelo presidente da República e precisam do aval do Senado para assumir o cargo. Desse modo, caso os governantes sejam indiciados, os seus julgadores serão aqueles que foram nomeados pelos possíveis acusados, o despautério torna-se ainda mais nítido quando, tendo em vista a adoção do presidencialismo de coalizão no país, sistema em que a governabilidade se dá por meio de alianças políticas pautadas em cargos ministeriais, é posto em cheque que os ministros, por vezes, devem favores aos governantes. Assim sendo, não há como haver um julgamento em que se tenha imparcialidade, que é uma característica vital para a execução da justiça.
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