Raça e Educação brasileira: Uma perspectiva legislativa e social
Por: Thompson Alves • 24/10/2018 • Artigo • 4.012 Palavras (17 Páginas) • 334 Visualizações
Raça e Educação brasileira:
Uma perspectiva legislativa e social
Thompson Clímaco Alves
Resumo
O presente artigo tem por objetivo analisar os reflexos da negligência educacional brasileira frente a temática racial. Com enfoque nas mudanças legislativas ao longo do século XX e seus reais impactos sociais para a população negra brasileira. Sendo assim, este trabalho busca relacionar pesquisas historiográficas acerca da história do negro na educação e pesquisas sociológicas, antropológicas e educacionais em relação aos impactos do racismo para os negros brasileiros. Além das perspectivas de especialistas a respeito das recentes reformas educacionais voltadas para a temática racial.
Palavras-chave: Temática racial na educação; População Negra; Legislação educacional.
Introdução
O racismo estrutural e institucional obviamente está presente na educação brasileira, seja no currículo ou ambiente escolar. Desde o início da República é possível localizar a omissão do Estado quanto as políticas sociais voltadas para a superação do racismo e desigualdade racial. Nos últimos anos a historiografia tem abordado com frequência o processo de escolarização dos negros e as formas encontradas pelo mesmo para educar-se dentro de um sistema educacional excludente. Serão apresentados neste artigo algumas dessas medidas educacionais independentes do povo preto.
Os fatores políticos e econômicos presentes na educação também serão discutidos neste trabalho com o intuito de elucidar os planos educacionais e que o racismo nunca foi uma pauta efetiva nos mesmos. O que resulta em uma dupla função da educação para o negro: ascensão social e discriminação (Cruz, 2005).
Buscarei analisar as modificações da Lei de Diretrizes e Bases (LDB) desde a década de 1960 por meio de trabalhos de educadores com objetivo de localizar o debate racial e o ensino da história negra na mesma. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) também serão abordados sob olhares de especialistas como: Amauri Mendes Pereira e Lucimar Rosa Dias, destacando a ausência do ensino afro-brasileiro ou uma presença superficial nos currículos nacionais.
Após as análises desses processos, busco notabilizar as modificações com a implementação da Lei 10.639/03 de acordo com especialistas que visam discutir os reais resultados posteriores a implementação da Lei e seu real efeito para a população negra. Além das perspectivas futuras e a necessidade de mais ações e implementações para que de fato a temática racial seja inserida na educação brasileira de maneira efetiva.
Diante de toda a conjuntura educacional apresentado o presente artigo também destaca os efeitos deste cenário para a população negra em relação ao seu desempenho e frequência nas escolas. O quão o racismo influência neste processo de epistemicídio da história africana e afro-brasileira para os jovens negros pelo fato de não se enxergarem na história nacional ou terem a história retratada somente no período de escravização.
O Movimento Negro na luta pela escolarização no início do século XX
O processo de escolarização da população negra não foi um processo simples, Demartini (1989), afirma ter sido um processo conflituoso, principalmente em São Paulo. A mentalidade escravista estava fortemente inserida no princípio da república, onde o negro lutava para afirma-se como cidadão. O início da república é marcado pela inauguração de escolas públicas para o “povo”, a educadora Daniela Abreu nos evidencia o verdadeiro intuito do processo e quem teria o direito a educação:
As primeiras oportunidades concretas de educação escolar e ascensão da população negra surgem no Estado Republicano, quando o desenvolvimento industrial dos anos finais do século XIX impulsiona o ensino popular e o ensino profissionalizante. O ensino popular é estabelecido mediante a instalação dos grupos escolares urbanos e das escolas isoladas nos bairros. É na República que o ensino primário tem maior ênfase, ou seja, nesse período vai se enfatizar a disseminação da escola primária, a escola do povo. Mas quem era o povo que frequentava a escola? Esse fato tem como pano de fundo um caráter político e autoritário, pois, a escola primária serviria aos republicanos como uma solução ao problema do voto e da representação, além de manter a ordem vigente, isto é, propagar os valores morais e políticos republicanos.[1]
A exclusão republicana da população negra, faz com que os próprios negros passem a se organizar com o objetivo de preencher as lacunas negligenciadas pelo Estado. Logo nas primeiras décadas do século XX é possível visualizar a formação de clubes e de uma mídia negra como os jornais: Menelick fundado em 1915 e Clarim da Alvorada fundado em 1925. Todavia, a organização negra mais notável em relação as pautas educacionais, formada no início do século XX foi a Frente Negra Brasileira(FNB) fundada em 1931. A instituição continha projetos para educação do povo negro como afirma Petrônio Domingues, pois acreditavam que a educação proporcionaria a ascensão social do povo negro. Domingues expõe através de matérias do jornal a Voz da Raça (Outro jornal negro da época) como a entidade negra organizou-se de forma independente criando setores voltados para a educação:
O maior e mais importante departamento da FNB foi o de ins-trução, também chamado de departamento de cultura ou intelectual. Era o responsável pela área educacional da FNB. Um de seus motes propagandísticos conclamava: “Eduquemos mais e mais os nossos filhos, dando-lhe uma educação e uma instrução de acordo com as suas aspirações” (A VOZ DA RAÇA, 28/10/1933, p. 2). O conceito de educação articulado pela entidade era amplo, compreendendo tanto o ensino pedagógico formal quanto a formação cultural e moral do indivíduo. A palavra educação era usada frequentemente com esses dois sentidos. Já a palavra instrução tinha um sentido mais específico: de alfabetização ou escolarização. A educação era vista muitas vezes como a principal arma na “cruzada” contra o “preconceito de cor”. Os negros deviam estudar, afirmava José Bueno Feliciano, “a fim de não serem insultados a cada momento. Instruídos e educados seremos respeitados; far-nos-emos respeitar” (A VOZ DA RAÇA, 24/06/1933, p. 4). Acreditava-se que os negros, na medida em que progredissem no campo educacional, seriam respeitados, reconhecidos e valorizados pela sociedade mais abrangente. A educação teria o poder de anular o preconceito racial e, em última instância, de erradicá-lo.[2]
...