Apelação Criminal - dosimetria e regime de pena
Por: jsilveira2 • 29/4/2018 • Tese • 6.688 Palavras (27 Páginas) • 462 Visualizações
Exma. Sra. Dra. Juíza de Direito da ____ª Vara da Comarca de ________.
xxxxxxxxxxx, já qualificado nos autos nº xxxxxxxxx da AÇÃO PENAL, através do seu advogado que a esta subscreve, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência, não tendo se conformado com a r. sentença de fls., interpor, com base no artigo 593, inciso I do Código de Processo Penal, o presente recurso de
APELAÇÃO
substanciado nas anexas razões de apelação, as quais requer sejam recebidas, processadas e encaminhadas à superior instância, na forma da lei.
Termos em que, espera receber
Deferimento.
xxxxxxxxxx, 16 de abril de 2018.
XXXXXXXXXXXXXXXXXX
ADVOGADO.
EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO XXXXXXXX
Apelante: xxxxxxx
Apelado: xxxxxx
ORIGEM: xxxxxxxxxxxxxx
RAZÕES DA APELAÇÃO
Ínclitos Julgadores,
A r. sentença de fls., proferida pelo d. Juízo da Vara da Comarca de xxxxxxx, merece ser reformada, pelos motivos que o Apelante passa a expor:
I-DOS FATOS
Conforme a r. sentença, assim decidiu a MM. Juíza no momento da dosimetria da pena:
“[...]d) Personalidade: desfavorável, visto que demonstra ser contumaz na prática de crimes, respondendo, inclusive, a outro processo neste mesmo juízo pela prática de homicídio tentado[...]”.
E ainda:
“[...]b) Circunstâncias legais: vislumbro a atenuante prevista no art. 65, inciso III, alínea ‘d’ (confissão), do Código Penal, porém deixo d aplica-la por compartilhar do entendimento do STF expressado no HC 102002; ademais, embora se trate de réu reincidente, tal condição já foi valorada nas circunstancias judiciais;[...] f)Regime inicial: a pena privativa de liberdade deverá ser cumprida em regime fechado, pois se trata de acusado reincidente e que registra circunstância judiciais desfavoráveis, conforme preceitua o art. 33, §§2º e 3º, do Código Penal[...]”
Desta forma, podemos verificar que a r. sentença deve ser reformada.
II-DO MÉRITO
DA PERSONALIDADE
Na dosimetria da pena a MM. Juíza assim decidiu:
“[...]d) Personalidade: desfavorável, visto que demonstra ser contumaz na prática de crimes, respondendo, inclusive, a outro processo neste mesmo juízo pela prática de homicídio tentado[...]”.
A fundamentação da MM. Juíza não é suficiente para determinar a personalidade do acusado como circunstancia desfavorável, pois a conclusão do julgador deve estar lastreada em dados concretos dos autos (por exemplo: vários antecedentes, a denotar inclinação para o crime, circunstância extremamente grave do ilícito, para evidenciar selvageria, desumanidade etc.) Na hipótese, não é possível compreender, a partir da leitura da sentença, o elemento concreto dos autos que permitiu a Juíza a concluir que a personalidade do acusado é desfavorável por haver apenas um outro processo de crime diferente no mesmo juízo, conforme entendimento do STJ:
RECURSO ESPECIAL Nº 1.688.010 - PE (2017/0193505-5) RELATOR : MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ RECORRENTE : MANOEL DE SOUZA SILVA ADVOGADOS : HELCIO FRANÇA - PE021728 JOSÉ AUGUSTO BRANCO E OUTRO (S) - PE016464 RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL RECORRIDO : OS MESMOS DECISÃO O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL interpõe recurso especial, fundado no "art. 105, III, alínea a e c da Constituição Federal, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (Apelação n. 0016456-34.2007.4.05.8300). O recorrente aponta a violação do art. 12, I, da Lei n. 8.137/1990 e dos arts. 70 e 71, ambos do CP, além da divergência jurisprudencial. Afirma que a sonegação foi superior a 4 milhões de reais, sendo de rigor a aplicação da agravante. Ademais, o réu reduziu mais de um tributo federal, o que atrai a regra do concurso formal. Por fim, como houve a prática de mais de 7 crimes, impõe-se a fração de 2/3 em decorrência da continuidade delitiva. MANOEL DE SOUZA SILVA, por sua vez, interpõe recurso especial, fundado no"art. 105, III, alínea a da Constituição Federal. Aponta a violação dos arts. 59 e 68, ambos do CP, pois equivocada a valoração negativa de sua personalidade, que deve ser afastada. Contrarrazões às fls. 523-528 e 531-549. Decisão de admissibilidade à fl. 551. Parecer do Ministério Público Federal "pelo improvimento do recurso especial da defesa e o parcial provimento do recurso especial do Parquet Federal, para que se aplicar a causa de aumento de pena prevista no art. 12, I, da Lei n. 8.137/1990, bem como elevar a fração referente à continuidade delitiva" (fl. 561). Decido. Os recursos preenchem os pressupostos de admissibilidade e, portanto, comportam processamento. I. Art. 59 do CP Com razão a defesa, quando, ao indicar a violação dos art. 59 e 68, ambos do CP, assevera que "a personalidade foi considerada desfavorável ao réu e assim mantida pelo TRF sem qualquer fundamentação" (fl. 487). O Juiz assinalou: Considerando a personalidade como sendo o conjunto de caracteres exclusivos de uma pessoa que, muitas vezes, se tornam patentes por intermédio de seus atos, volto-me às provas carreadas para concluir que, aos olhos deste magistrado, o réu se mostrou como sendo pessoa articulada, ardilosa e de má-fé, que em nada contribuiu para a elucidação dos fatos a si atribuídos (fl. 285). O acórdão, por sua vez, manteve a análise desfavorável da vetorial assinalada (fl. 475). A personalidade, circunstância judicial envolvida em intensos debates, por sua consideração, muitas vezes estar mais atrelada a outras áreas específicas de conhecimento (psicologia, psiquiatria), costuma ser admitida como desfavorável por este Superior Tribunal se a conclusão do julgador estiver lastreada em dados concretos dos autos (por exemplo: vários antecedentes, a denotar inclinação para o crime, circunstância extremamente grave do ilícito, para evidenciar selvageria, desumanidade etc.) Na hipótese, não é possível compreender, a partir da leitura da sentença, o elemento concreto dos autos que permitiu ao Juiz concluir, em análise objetiva, que o recorrido é pessoa articulada, ardilosa e de má-fé, de tal monta a demonstrar personalidade mais desfavorável quando comparado aos demais agentes condenados por crime de sonegação fiscal. Assim, verifico a violação do art. 59 do CP e extirpo a vetorial da individualização da pena-base. Em decorrência de duas circunstâncias judiciais negativas, culpabilidade (valor elevado de várias espécies de tributos federais sonegados) e personalidade, o Tribunal exasperou a pena-base para 2 anos e 6 meses de reclusão, considerando, para cada vetorial, 3 meses. Mantenho apenas a culpabilidade negativa e, afastada a consideração da personalidade, reduzo a reprimenda, na primeira fase da dosimetria, para 2 anos e 3 meses de reclusão. II. Art. 12, I, da Lei n. 8.137/1990 Passo a analisar a aplicação do art. 12, I, da Lei n. 8.137/1990, requerida no recurso especial do Ministério Público. A sentença violou o art. 68 do CP porque o montante elevado da sonegação caracteriza agravante, circunstância a ser considerada na segunda fase da individualização da pena, mas o Juiz sopesou a informação de que os tributos "foram em montante bastante elevado" para elevar a pena-base (fl. 284). Não houve apelação do Ministério Público, que concordou com a dosimetria. Assim, no ponto, ocorreu o trânsito em julgado para a acusação que, não pode, somente em recurso especial, pretender agravar a situação do réu. III. Crime único Consoante o enquadramento fático do acórdão, o réu valeu-se de omissões e declarações falsas para sonegar tributos federais (IRPJ, CSLL e COFINS) nos anos calendários de 1996 a 2003, o que resultou no débito fiscal de R$ 7.873.603,71. O não recolhimento de mais de um tributo não é considerado no tipo incriminador. Diversamente do que assere o Ministério Público, para fins de reconhecimento de crime único ou do concurso formal, é relevante analisar o bem jurídico protegido pela norma penal. O réu praticou ações nucleares do art. 1º, I, da Lei n. 8.137/1990 para violar o regramento que disciplina o direito da Fazenda Pública Federal de arrecadar tributos (ordem tributária). Praticou única ação e único resultado crime único , não obstante, no âmbito administrativo, sua conduta tenha resultado no lançamento de diversos tributos federais. Ilustrativamente: 1. No crime de sonegação fiscal o bem jurídico tutelado não é o patrimônio ou erário de cada pessoa jurídica de direito público titular de competência para instituir e arrecadar tributos - fiscais (entes federativos) ou parafiscais (entidades autárquicas) - mas, sim, a ordem jurídica tributária como um todo. 2. A conduta consistente em praticar qualquer uma ou todas as modalidades descritas nos incisos I a V do art. 1 da Lei nº 8.137/90 (crime misto alternativo) conduz à consumação de crime de sonegação fiscal quando houver supressão ou redução de tributo, pouco importando se atingidos um ou mais impostos ou contribuições sociais. 3. Não há concurso formal, mas crime único, na hipótese em que o contribuinte, numa única conduta, declara Imposto de Renda de Pessoa Jurídica com a inserção de dados falsos, ainda que tal conduta tenha obstado o lançamento de mais de um tributo ou contribuição. 4. Recurso improvido. (REsp n. 1294687/PE, 6ª t., Rel. Ministra Maria Thereza de Assis Moura, DJe 24/10/2013). IV. Continuidade delitiva Quanto à continuidade delitiva, o Juiz assim realizou a fixação da pena, na terceira fase da dosimetria: "considerando o número de crimes perpetrados em cadeia a qual se estendeu de 1996 a 2003 , fixo no patamar de 1/3 (um terço)" (fl. 287). O Ministério Público não manifestou interesse em se insurgir, em apelação criminal. A fração de 1/3 transitou em julgado para a acusação. O Tribunal a quo, sem nenhuma fundamentação, aplicou o "aumento de 1/6 em razão da continuidade delitiva" (fl. 476). Violou o o art. 71 do CP e decidiu em confronto com a jurisprudência deste Superior Tribunal, pois: 2. A exasperação da pena do crime de maior pena, realizado em continuidade delitiva, será determinada, basicamente, pelo número de infrações penais cometidas, parâmetro este que especificará no caso concreto a fração de aumento, dentro do intervalo legal de 1/6 a 2/3. Nesse diapasão esta Corte Superior de Justiça possui o entendimento consolidado de que, em se tratando de aumento de pena referente à continuidade delitiva, aplica-se a fração de 1/6 pela prática de 2 infrações; 1/5, para 3 infrações; 1/4 para 4 infrações; 1/3 para 5 infrações; 1/2 para 6 infrações e 2/3 para 7 ou mais infrações. [...] (RHC n. 91.990/SP, Rel. Ministro Ribeiro Dantas, 5ª T., DJe 16/2/2018). Observado o limite da sentença, reconheço a violação do art. 71 do CP e restabeleço a fração de 1/3, que transitou em julgado para o Ministério Público e, portanto, não pode ser exasperada por meio de recurso especial. A pena do recorrido, após o julgamento dos recursos especiais da defesa e do Ministério Público, fica assim estabelecida: Pena-base, de 2 anos e 3 meses de reclusão, inalterada na segunda fase da dosimetria (porque o MP não pediu a aplicação do art. 12, I, da Lei n. 8.137/1990 em apelação), acrescida de 1/3 (fração que transitou em julgado para a acusação) em razão do art. 71 do CP, o que resulta em 3 anos de reclusão, em definitivo. Ante os mesmos critérios, como a sentença não realizou o somatório das multas, reduzo a pena pecuniária para 86 dias. Mantenho o regime aberto e a aplicação do art. 44 do CP, uma vez que, apesar da disposição do art. 33,§ 3º do CP e do não preenchimento do art. 44, III, do CP (culpabilidade negativa), o Ministério Público não se insurgiu contra o modo de cumprimento da pena e a aplicação de penas substitutivas (prestação de serviços e prestação pecuniária) para prevenção e repressão do crime, sendo vedado a reformatio in pejus. À vista do exposto: a) dou provimento ao recurso especial da defesa para reconhecer a violação do art. 59 do CP e afastar, para fins de exasperação da pena-base, a consideração negativa da personalidade e b) dou parcial provimento ao recurso especial do Ministério Público para reconhecer, tão somente, a violação do art. 71 do CP e restabelecer a fração de 1/3 fixada na sentença, a qual transitou em julgado para a acusação. Em razão do resultado do julgamento, fixo a pena definitiva do réu em 3 anos de reclusão e 86 dias-multa, mantido o regime inicial aberto a aplicação de duas penas substitutivas, por incidência do art. 44 do CP. Deixo de determinar a execução imediata da pena, haja vista o julgamento proferido pela Terceira Seção, no EAREsp n. 1.619.087/SC. Publique-se e intimem-se. Brasília (DF), 12 de março de 2018. Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ(STJ - REsp: 1688010 PE 2017/0193505-5, Relator: Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ, Data de Publicação: DJ 02/04/2018) (grifo nosso).
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