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Resenha "As misérias do processo penal"

Por:   •  6/9/2017  •  Resenha  •  846 Palavras (4 Páginas)  •  314 Visualizações

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Quem se depara com o livro “As misérias do processo penal” há de se pensar: ‘Mais um livrinho (pelo pequeno tamanho) para falar sobre a temática de forma técnica; ou, dizer o que todos dizem, mas com um tom de sarcasmo; ou, ainda, esse autor há de criticar as leis, o sistema penal”. Mas não. Carnelutti traz a mais atual impressão sobre o processo penal, os sujeitos que atuam no processo, o acusado, as fases, os dramas,  o interesse da mídia e da sociedade. Em suma, nesta obra o processo é desnudado, mostra-se sua verdadeira face, sem reservas. O réu é apresentado como um ser humano, que deve assumir os erros e cumprir a pena que lhe é imposta.

A função do juiz é aplicar a lei, punir quando o réu é considerado culpado, o que revela, segundo Carnelutti, que ele dispõe de uma imponente dignidade, não estando em par de igualdade com as partes, disso surge o paradoxo: juiz é parte ou supraparte? Quem é o juiz, afinal? ‘Ser homem ou dever ser mais que homem?”.

Para o autor, a única certeza que se tem é aquela descrita nos evangelhos de Cristo, segundo o qual o julgador deverá ser alguém desprovido de pecado. Com isso, Carnelutti quer mostrar o quanto a função de julgar é delicada, melindrosa, porque envolve um dos bens mais preciosos do homem, a liberdade. “Um homem para ser juiz deveria ser mais do que um homem” (p. 39).

Os órgãos colegiados se inserem na análise de Carnelutti justamente nesta preocupação, porque a revisão de decisões traz uma unidade, um acordo entre várias decisões, geralmente de juízes mais experientes. É o “remédio para insuficiência do juiz”. Outro “remédio” seria a atuação do acusador e do defensor a fim da busca pela verdade. Cada um com a sua razão convergem para a verdade, que contribuem para a formação do convencimento do juiz. Há, neste sentido, uma parcialidade porque cada personagem tende para a sua verdade, ou a verdade das partes, chegando-se ao equilíbrio do processo. Trata-se do contraditório, da sua garantia, por meio da qual o juiz supera a dúvida.

Contudo, a apreciação sobre a função do juiz não se exaure. O que é preciso para ser juiz, ainda permeia a narrativa do autor. Um especialista em várias áreas, eis a melhor definição para aquele que deve exercer as funções de juiz, inclusive, conforme acrescenta o autor, a principal postura seria a de um historiador, porque em um processo há mais do que a reconstrução de um fato, há a vida, a alma, a própria história do indivíduo.

O processo penal é sem dúvida composto de fatos, pequenos pedaços da história, como explicita Carnelutti. No julgamento, tipo pelos mais entusiastas como um palco, uma atração, a história é relatada de forma diversa com a dubiedade própria do contraditório, cabendo às provas a reconstrução. No processo penal o passado se reconstrói para fazer as bases do futuro.

Na trilha por saber se o acusado é culpado ou inocente, o risco é errar o caminho e o processo ficar sujeito a degeneração. E o erro, é para o autor, o maior perigo no processo penal. Ele chega a dizer que cada sentença de absolvição é a descoberta de erro, é o reconhecimento da justiça de que aquele indivíduo que teve sua vida revirada e exposta a todos, apontado como delinqüente, na verdade não o é. E a única maneira de reparar o dano é com a declaração de inocência, simples assim.

Na liberdade do condenado está o fim do processo. O cárcere acaba, o condenado retorna ao convívio social, mas, conforme aborda Carnelutti, a pena está longe de acabar. Há uma tendência ao cárcere perpétuo, que apesar de não ser recepcionado na Constituição Federal e no Código Penal, está no imaginário das pessoas que não pensam que aquele é alguém que já ‘pagou a sua dívida’. Para a sociedade, e aqui também se inclui o Estado, o encarcerado não tem espaço entre os ‘bons e honestos, não sendo aquele merecedor de emprego, em especial os públicos. Quem é dissidente do sistema penal será sempre um ‘canalha’, a aí está o valor do problema penal na civilização.

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