O RECURSO EM SENTIDO ESTRITO
Por: Cissak • 29/11/2016 • Trabalho acadêmico • 1.829 Palavras (8 Páginas) • 316 Visualizações
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DO EGRÉGIO TRIBUNAL DO JURI DA COMARCA DE CIDADE-ESTADO
RECORRENTE: JERUSA (SOBRENOME)
RECORRIDO: MINISTÉRIO PÚBLICO
JERUSA (SOBRENOME)
Brasileira, idade, estado civil, filiação, profissão, portador da cédula de identidade RG nº, inscrito no CPF nº, residente e domiciliado no endereço (...), Curitiba, Paraná, vem respeitosamente, à presença de Vossa Excelência, por intermédio de seu advogado ao final assinado, conforme mandato incluso, onde recebe notificações, nos termos do art. 581, IV do Código de Processo Penal, interpor:
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO
O que faz pelos motivos e argumentos lançados em razões a seguir expostas;
Requer à Vossa Excelência seja o presente recurso recebido e depois de ouvido a parte contrária, reforme a respeitável decisão proferida; requer também, caso não haja reforma, o encaminhamento do presente recurso para análise em superior instância, dando-se efeito suspensivo e devolutivo.
Termos em que pede deferimento,
Local, 09 de agosto de 2013.
Assinatura
Nome do Advogado/ OAB- UF
AO EGRÉGIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO
Excelentíssimo Senhor Relator,
RAZÕES RECURSAIS
DOS FATOS
A recorrente, respeitando os limites de velocidade no trânsito, dirigia seu automóvel quando em uma via de mão dupla decidiu ultrapassar o veículo que estava à sua frente abaixo da velocidade permitida.
Para tanto, a recorrente não efetuou a sinalização com a seta luminosa do veículo e, no momento da ultrapassagem, atingiu a vítima que conduzia uma motocicleta em alta velocidade no sentido oposto da via.
Em razão do acidente, a recorrente prestou socorro a vítima junto as testemunhas que presenciaram o feito.
Em que pese tenha sido realizado prontamente o socorro à vítima, em virtude de ferimentos sofridos pela colisão, veio a falecer.
A recorrente foi processada e pronunciada pela prática de homicídio doloso, conforme dispõe os art. 121 c/c art. 18, I ambos do Código Penal, da qual recorre; situação esta que não se pode prosperar por não se tratar de crime doloso contra a vida.
DO MÉRITO
Conforme consta nos autos, a recorrente foi pronunciada por crime de homicídio doloso – dolo eventual, entretanto, conforme será exposto, não se trata desta tipificação penal em razão da ausência de requisitos exigidos para sua caracterização, restando ao certo que se trata de ação culposa, uma vez que não foi observado o devido cuidado de agir, tornando a ação imprudente conforme é o entendimento de Bitencourt e Capez:
“Há dolo eventual quando o agente não quer diretamente a realização do tipo, mas a aceita como possível ou até provável, assumindo o risco da produção do resultado (art. 18, I, in fine, do CP). No dolo eventual o agente prevê o resultado como provável ou, ao menos, como possível, mas, apesar de prevê-lo, age aceitando o risco de produzi-lo. Assumir o risco é alguma coisa mais que ter consciência de correr o risco: é consentir previamente no resultado, caso este venha efetivamente a ocorrer[1]”.
“Na conduta culposa, há uma ação voluntária dirigida a uma finalidade lícita, mas, pela quebra do dever de cuidado a todos exigidos, sobrevém um resultado ilícito não querido, cujo risco nem sequer foi assumido.[...]Na culpa, o agente não quer jamais concretizar o resultado ilícito, nem mesmo assume o risco; este na realidade sobrevém por uma quebra do dever de cuidado.” [2]
Assim, resta evidente que a tipicidade penal foi inadequada ao fato ocorrido, embora tenha realizado o ato de ultrapassagem sem observar o devido cuidado de agir.
Acerca disso, tem-se o tribunal superior de justiça entendido que:
“A doutrina penal brasileira instrui que o dolo, ainda que eventual, conquanto constitua elemento subjetivo do tipo, deve ser compreendido sob dois aspectos: o cognitivo, que traduz o conhecimento dos elementos objetivos do tipo, e o volitivo, configurado pela vontade de realizar a conduta típica. Se o dolo eventual não é extraído da mente do acusado, mas das circunstâncias do fato, conclui-se que a denúncia limitou-se a narrar o elemento cognitivo do dolo, o seu aspecto de conhecimento pressuposto ao querer (vontade). A análise cuidadosa da denúncia finaliza o posicionamento de que não há descrição do elemento volitivo consistente em ‘assumir o risco do resultado’, em aceitar, a qualquer custo, o resultado, o que é imprescindível para a configuração do dolo eventual. A comparação entre a narrativa ministerial e a classificação jurídica dela extraída revela a submissão do paciente a flagrante constrangimento ilegal decorrente da imputação de crime hediondo praticado com dolo eventual. Afastado elemento subjetivo dolo, resta concluir que o paciente pode ter provocado o resultado culposamente. O tipo penal culposo, além de outros elementos, pressupõe a violação de um dever objetivo de cuidado e que o agente tenha a previsibilidade objetiva do resultado, a possibilidade de conhecimento do resultado, o conhecimento potencial que não é suficiente ao tipo doloso. Considerando que a descrição da denúncia não é hábil a configurar o dolo eventual, o paciente, em tese, deu causa ao resultado por negligência” (STJ, HC 44.015/SP, Rel. Min. Gilson Dipp, j. 13-12-2005).
Nada obstante, se compreende, portanto, a desclassificação do crime imputado para homicídio culposo, conforme prevê o art. 302 da Lei 9.503/97, ante à ausência do dever de cuidar, salientando ainda que é de competência da Vara Criminal para julgar e não o Tribunal do Júri. É o que, por analogia, tem entendido os tribunais:
PENAL. HABEAS CORPUS. TRIBUNAL DO JÚRI. PRONÚNCIA POR HOMICÍDIO QUALIFICADO A TÍTULO DE DOLO EVENTUAL. DESCLASSIFICAÇÃO PARA HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. EMBRIAGUEZ ALCOÓLICA. ACTIO LIBERA IN CAUSA. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DO ELEMENTO VOLITIVO. REVALORAÇÃO DOS FATOS QUE NÃO SE CONFUNDE COM REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. ORDEM CONCEDIDA.1. A classificação do delito como doloso, implicando pena sobremodo onerosa e influindo na liberdade de ir e vir, mercê de alterar o procedimento da persecução penal em lesão à cláusula do due process of law, é reformável pela via do habeas corpus. 2. O homicídio na forma culposa na direção de veículo automotor (art. 302, caput, do CTB) prevalece se a capitulação atribuída ao fato como homicídio doloso decorre de mera presunção ante a embriaguez alcoólica eventual. 3. A embriaguez alcoólica que conduz à responsabilização a título doloso é apenas a preordenada, comprovando-se que o agente se embebedou para praticar o ilícito ou assumir o risco de produzi-lo. 4. In casu, do exame da descrição dos fatos empregada nas razões de decidir da sentença e do acórdão do TJ/SP, não restou demonstrado que o paciente tenha ingerido bebidas alcoólicas no afã de produzir o resultado morte. 5. A doutrina clássica revela a virtude da sua justeza ao asseverar que “O anteprojeto Hungria e os modelos em que se inspirava resolviam muito melhor o assunto. O art. 31 e §§ 1º e 2º estabeleciam: 'A embriaguez pelo álcool ou substância de efeitos análogos, ainda quando completa, não exclui a responsabilidade, salvo quando fortuita ou involuntária. § 1º. Se a embriaguez foi intencionalmente procurada para a prática do crime, o agente é punível a título de dolo; § 2º. Se, embora não preordenada, a embriaguez é voluntária e completa e o agente previu e podia prever que, em tal estado, poderia vir a cometer crime, a pena é aplicável a título de culpa, se a este título é punível o fato”. (Guilherme Souza Nucci, Código Penal Comentado,5. ed. rev. atual. e ampl. - São Paulo: RT, 2005, p. 243) 6. A revaloração jurídica dos fatos postos nas instâncias inferiores não se confunde com o revolvimento do conjunto fático-probatório. Precedentes: HC 96.820/SP, rel. Min. Luiz Fux, j. 28/6/2011; RE 99.590, Rel. Min. Alfredo Buzaid, DJ de 6/4/1984; RE 122.011, relator o Ministro Moreira Alves, DJ de 17/8/1990.7. A Lei nº 11.275/06 não se aplica ao caso em exame, porquanto não se revela lex mitior, mas, ao revés, previu causa de aumento de pena para o crime sub judice e em tese praticado, configurado como homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302, caput, do CTB). 8. Concessão da ordem para desclassificar a conduta imputada ao paciente para homicídio culposo na direção de veículo automotor (art. 302, caput, doCTB), determinando a remessa dos autos à Vara Criminal da Comarca de Guariba/SP.( STF, HC 107801 SP, Rel. Min. Cármen Lúcia, julgamento: 06/09/2011, 1ª Turma, Publicação: 13/10/2011 DJ-e)
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