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A IMPOSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DOS GENITORES POR ABANDONO AFETIVO

Por:   •  20/11/2019  •  Artigo  •  6.020 Palavras (25 Páginas)  •  143 Visualizações

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A IMPOSSIBILIDADE DE RESPONSABILIZAÇÃO CIVIL DOS GENITORES POR ABANDONO AFETIVO[1]

Fagner Santos de Sousa[2]

Elói Lopes da Silva[3]

RESUMO

O objetivo deste estudo é analisar a aplicabilidade dos institutos da responsabilidade civil no âmbito do direito de família, ponderando a possibilidade ou não de indenização ou reparação dos danos decorrentes de abandono afetivo dos pais contra os filhos. A pesquisa se desenvolveu através de revisão bibliográfica, complementada pelo uso de documentos diversos, onde se percebeu o dissenso doutrinário e jurisprudencial a respeito do tema, com a doutrina entendendo pela possibilidade de indenização por abandono afetivo, e a jurisprudência decidindo em contrário. Constatou-se que, ainda que verificado o dano afetivo, há uma grande dificuldade em se constatar o nexo de causalidade entre o dano e o abandono, e ainda valorar qual seja a indenização ou a reparação adequada para o caso. Verificou-se, ainda, a crescente demanda nesse sentido, que acaba por sobrecarregar o Poder Judiciário com causas que, ainda que julgadas procedentes em favor do abandonado, raramente terão sentenças com eficácia e aplicabilidade, e que não atingirão o fim desejado pelo autor.

Palavras-chave: Família, Abandono Afetivo, Dano Moral, Responsabilidade Civil, Processo Civil.

INTRODUÇÃO

Com o passar dos anos, as famílias, inevitavelmente, assim como toda a sociedade, vêm passando por um processo de mudança. Destacam-se como principais fatores de mudança, o aumento da independência feminina, o alcance de vários direitos por parte da mulher, da criança e adolescente, que refletiu sobremaneira na família, tanto na sua constituição quanto no seu comportamento.

Desta transformação, encabeçada pelas mudanças culturais e políticas da sociedade, resultaram novos institutos familiares; famílias que quebram o molde tradicional comumente estabelecido como “o macho e a fêmea, unidos pelo casamento, e a sua prole”, dando cada vez mais ênfase ao vínculo afetivo em detrimento do vínculo biológico, inclusive pelo Direito.

A evolução do conceito, da estrutura e do comportamento das famílias com o avanço do tempo traz, irremediavelmente, novos conflitos no que tange às relações familiares. Sendo superadas pelo Direito, questões como a legitimidade dos filhos havidos fora do casamento, o reconhecimento da união estável como família (e neste tópico insira-se o reconhecimento de união estável entre pessoas do mesmo sexo), entre outras, surgiram novos dilemas no âmbito das famílias e que, por consequência, merecem atenção jurídica.

Entre as novas problemáticas jurídicas envolvendo o direito de família está o abandono afetivo e a responsabilidade civil pelo dano moral que dele decorre. O abandono afetivo, que se configura na negligência afetiva de um dos genitores, geralmente o pai, vem sendo cobrado judicialmente por mães de forma cumulativa em ações alimentícias ajuizadas em nome de seus filhos. Nessas ações, além da busca pela imposição do pagamento de alimentos, constata-se ainda “o desejo de que os pais fossem também obrigados a prestar carinho regular, e o tão indispensável AFETO” (SILVA, 2012, p. 251).

Porém, nestes casos, pergunta-se: é realmente viável responsabilizar um genitor que deserta afetivamente da sua obrigação de pai ou mãe? E ainda: uma vez provada a possibilidade de responsabilização, seria o Poder Judiciário o meio hábil para resolver tão contenda?

Navegando em meio ao dissenso doutrinário e jurisprudencial a respeito do tema, entende este pesquisador pela impossibilidade da responsabilização do genitor, pretendendo, portanto, com a presente pesquisa, identificar as inconsistências jurídico-psicológicas da possibilidade de se responsabilizar civilmente o genitor que pratica o abandono afetivo.

A importância da compreensão do tema pesquisado reside na necessidade de se avaliar a relação entre o abandono afetivo e o dano efetivamente sofrido pelo abandonado, definindo-se o nexo causal entre ambos, um dos pré-requisitos para a aplicação do instituto da responsabilidade civil.

De outro ângulo, enquanto tal divergência não for solucionada, a crescente demanda nesse sentido acaba por sobrecarregar o Poder Judiciário com causas que, ainda que julgadas procedentes em favor do abandonado, raramente terão sentenças com eficácia e aplicabilidade, e que não atingirão o fim desejado pelo autor.

Por fim, verifica-se a necessidade de se encontrar soluções alternativas para a questão, tendo em vista que, em que pese o Direito, e especialmente o Poder Judiciário, não poder, em tese, adentrar à área do dano afetivo, o abandonado continua, efetivamente, sofrendo com o mesmo.

1 DA RESPONSABILIDADE CIVIL FRENTE AO DIREITO DE FAMÍLIA

A responsabilidade civil é, sem sombra de dúvidas, um dos institutos mais relevantes do Direito Civil Brasileiro. Não apenas isto, mas é também o instituto de Direito Civil que teve o maior desenvolvimento no Brasil nos últimos 100 anos (SANTOS, 2012, Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11875. Acesso em novembro de 2017). Este instituto entranha-se por todas as áreas do direito civil, em suas diversas ramificações, desde a decorrente de ato próprio até a responsabilidade civil no trânsito, inclusive no direito de família.

O vocábulo responsabilidade advém do latim respondere e “[...] representa a obrigação que alguém tem de assumir com as consequências jurídicas de sua atividade” (MORAIS, 2014). A raiz original da palavra, spondeo, era utilizada no Direito Romano como cláusula vinculante entre as partes no contrato verbal, recaindo a obrigação sobre o devedor (GAGLIANO; PAMPLONA FILHO, 2011).

Assim, tem-se que a responsabilidade civil, nos moldes do ordenamento jurídico vigente, configura-se na obrigação de reparação de dano causado e violação de direito causados por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, ou ainda o exercício de direito que exceda manifestamente os limites de seu fim econômico ou social, da boa-fé ou dos bons costumes (Código Civil de 2002, artigos 186, 187 e 927).

Por muito tempo, no entanto, entendeu-se doutrinária e jurisprudencialmente que os princípios gerais da responsabilidade civil aquiliana ou extracontratual eram suficientes para incidir sobre as hipóteses de dolo ou culpa no âmbito do direito de família. “[...] apenas recentemente a doutrina preocupou-se com situações específicas que podem gerar dever de indenizar entre membros da família, cônjuges, conviventes, pais e filhos” (VENOSA, 2012, p. 298).

2 PRESSUPOSTOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL

Caracterizar os pressupostos para a configuração da responsabilidade civil, porém, não é tão simples como nomeá-los, tendo em vista a grande disparidade de conclusões dos juristas a respeito do assunto.

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